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Processo n°: | CON - 09/00578564 |
Origem: | Prefeitura Municipal de São Francisco do Sul |
Interessado: | Luiz Roberto de Oliveira |
Assunto: | Consulta |
Parecer n° | COG-670/09 |
Município. Instituição do registro de ponto eletrônico para servidores ocupantes de cargos comissionados e agentes políticos.
O Município, ao regulamentar sobre a jornada de trabalho dos servidores públicos municipais, pode instituir o regime de ponto eletrônico para os servidores públicos, efetivos e comissionados.
Não comporta ao Município instituir sistema de registro de ponto aos agentes políticos, em razão da liberdade funcional necessária ao cargo.
Senhor Consultor,
Trata-se de consulta formulada pelo Sr. Luíz Roberto de Oliveira, solicitando orientação deste Tribunal de Contas acerca da legalidade de poder exigir dos ocupantes de cargos comissionados e de agentes políticos o registro eletrônico de presença.
Este, o breve relatório.
O consulente, na condição de Prefeito do Município de São Francisco do Sul, possui plena legitimidade para encaminhar Consulta a este Tribunal, consoante o que dispõe o art. 103, II, do Regimento Interno desta Corte (Resolução TC-06/2001).
Analisando a pertinência da matéria envolta no questionamento proposto, a mesma encontra guarida no inciso XII do art. 59 da Constituição do Estado de Santa Catarina, bem como no inciso XV do art. 1º da Lei Complementar nº 202/2000.
Observa-se ainda, que a consulta não veio instruída com parecer da assessoria jurídica do Município referenciado, conforme preceitua o art. 104, V, da Resolução nº TC-06/2001 (Regimento Interno do TCE/SC), contudo, o Tribunal Pleno poderá conhecer de consulta que não atenda a esta formalidade, conforme autoriza o parágrafo 2º, do artigo 105, Regimental, cabendo esse discernimento ao relator e aos demais julgadores.
A orientação solicitada pelo ilustre mandatário do Município de São Francisco do Sul diz respeito a procedimentos administrativos internos no que diz respeito à legalidade da Administração Municipal poder exigir dos ocupantes de cargos comissionados e dos agentes políticos, o registro eletrônico de presença (entrada e saída) dos respectivos locais de trabalho, sem o risco de vir a responder pelo pagamento de serviços extraordinários, diante do controle imposto.
A doutrina é assente de que compete ao Município organizar o serviço público local e elaborar o regime jurídico de seus servidores, estabelecendo a jornada de trabalho, as atribuições dos cargos, a composição da remuneração, tendo em vista as peculiaridades locais e as possibilidades do seu orçamento.
Hely Lopes Meirelles assim leciona:
"A competência do Município para organizar o serviço público e seu pessoal é consectário da autonomia administrativa de que dispõe (CF, art. 30, I). Atendidas as normas constitucionais aplicáveis ao servidor público (CF, arts. 37-41), bem como os preceitos das leis de caráter nacional e de sua lei orgânica, pode o Município elaborar o regime jurídico de seus servidores, segundo as conveniências locais." (Direito Municipal Brasileiro. 15ª ed. Malheiros Editores. São Paulo. p. 594).
Denota-se que, não obstante as suas competências, os Poderes Públicos devem sempre observar as regras e princípios estabelecidos na Constituição da República, tendo em vista a supremacia formal que a Carta Magna possui no ordenamento jurídico brasileiro. Partindo dessas premissas, passamos a analisar, primeiramente, alguns aspectos atinentes aos cargos em comissão.
A legislação específica dos servidores públicos de todas as esferas de Poder e a doutrina, não faz distinção entre o servidor efetivo e aquele ocupante de cargo de provimento em comissão, ambos considerados igualmente "servidores públicos em sentido estrito".
A diferença, dentro do regime jurídico que os abrange é, em suma, a forma de provimento e desprovimento do cargo, pela natureza da confiança que se impõe na relação jurídica e porque a lei assim o previu; e o sistema de aposentadoria atribuído pela Constituição Federal, com destaque para as modificações introduzidas pela Emenda Constitucional nº 20/98.
Seguindo uma tendência dos dias atuais, muitas cidades, organizadas em suas administrações, estão implantando o sistema de ponto eletrônico, que se traduz no ponto biométrico, pela leitura das digitais, para todos os servidores que compõem a administração, por ser considerado mais confiável e rápido, proporcionando uma avaliação mais correta do registro.
Um fator importante que leva as administrações a insituírem o ponto biométrico é relativamente ao tempo dispendido com o regime de controle que é muito mais eficiente, proporcionando até maior segurança no registro de horas- extras, no caso de serem necessárias.
É um sistema que efetivamente pode trazer benefício e rapidez nos controles, padronizando os horários e a forma de trabalhar administrativamente com todos os servidores sejam eles efetivos ou comissionados.
Portanto, nada obsta que, ao regulamentar sobre a jornada de trabalho dos servidores públicos municipais, o Município discipline sobre a instituição do regime de ponto eletrônico para os servidores públicos, efetivos e comissionados, até porque a Administração deve disciplinar sobre o pagamento de horas-extras e, no caso da municipalidade em foco, tais horas só poderão ser pagas em situações excepcionais de interesse público e o art. 64 da Lei Complementar Municipal nº 8, de 30/10/2003, que dispõe sobre o estatuto dos Servidores Públicos Municipais, veda o pagamento de horas extras aos comissionados.
O consulente indaga também se é permitido instituir o registro eletrônico de ponto aos agentes políticos, então, dessa forma, há que se fazer uma digressão sobre os referidos agentes.
Não existe um pensamento uniforme entre os doutrinadores, no entanto, trazem diversas explicações para conceituar o que são agentes políticos.
Para o saudoso hely Lopes Meirelles, agentes políticos são:
"Os componentes do governo nos seus primeiros escalões, investidos em cargos, funções, mandatos ou comissões, por nomeação, eleição, designação ou delegação para o exercício de atribuições constitucionais." (Direito Administrativo Brasileiro. Malheiros Editores. 21ª ed. 1996).
O autor inclui nessa categoria os chefes do Poder Executivo Federal, Estadual e Municipal e seus auxiliares diretos, os membros do Poder Legislativo, como também os da Magistratura, Ministério Público, Tribunais de Contas e demais autoridades que atuem com independência funcional no desempenho de atribuições governamentais, judiciais ou quase judiciais, estranhas ao quadro dos servidores.
O eminente Prof. Dirley da Cunha Júnior comunga o mesmo entendimento, manifestando:
"Os agentes políticos são todos aqueles que exercem funções políticas do Estado e titularizam cargos ou mandatos de altíssimo escalão, somente se subordinando à Constituição Federal. São os agentes que estão funcionalmente posicionados no escalão máximo da estrutura do Estado." (Curso de Direito Administrativo. Ed. Jus Podivm. 2ª ed.).
Diferentemente é o pensamento de Celso Antônio Bandeira de Mello, pois adota um conceito mais restrito de agente político, observando:
"Agentes políticos são os titulares dos cargos estruturais à organização política do País, isto é, são os ocupantes dos cargos que compõem o arcabouço constitucional do Estado e, portanto, o esquema fundamental do poder. Sua função é a de formação da vontade superior do Estado." (Curso de Direito Administrativo. Malheiros Editores. 21ª ed. 2006).
Para o conceituado autor, somente podem ser considerados agentes políticos o Presidente da República, os Governadores, os Prefeitos e respectivos auxiliares imediatos (Ministros e Secretários das diversas Pastas), os Senadores, os Deputados e os Vereadores. Neste mesmo sentido trilham os autores Diógenes Gasparini e, parcialmente Maria Sylvia Zanella Di Pietro (aceita os magistrados como agentes políticos).
Pelos conceitos acima mencionados pode-se inferir que a circunstância dos que governam e decidem é bem diferente da dos que simplesmente administram e executam encargos técnicos e profissionais, sem ônus decisório e opções políticas.
Daí a razão porque os agentes políticos precisam de ampla liberdade funcional e maior resguardo para desempenharem suas funções. As prerrogativas concedidas a esses agentes não são privilégios pessoais; são garantias inerentes ao pleno exercício de suas altas e complexas funções governamentais e decisórias.
Sem essas prerrogativas funcionais os agentes políticos ficariam restritos na sua liberdade de opção e decisão à vista da possibilidade de serem responsabilizados pelos padrões comuns da culpa civil e do erro técnico a que ficam sujeitos os servidores.
Evidentemente que, no caso do Poder Legislativo, dentro do sua competência para organizar seus serviços internos, pode a Câmara de Vereadores, a exemplo do que acontece na Câmara Federal e em diversas Assembléias Legislativas Estaduais, instituir um sistema de registro eletrônico de freqüência para a edilidade, mas, não dentro dos padrões exigidos aos demais servidores públicos.
Portanto, dentro do que foi visto, extrai-se que não comporta ao Município instituir sistema de registro de ponto aos agentes políticos, em razão da liberdade funcional necessária ao cargo.
Em consonância com o acima exposto e considerando que:
- o consulente, na condição de Prefeito do Município de São Francisco do Sul, está legitimado a encaminhar consultas de acordo com o disposto no art. 1º, inciso XV da Lei Complementar nº 202/2000 e art. 103, inciso II, do Regimento Interno do TCE/SC;
- que a consulta trata de matéria de competência do Tribunal de Contas, conforme determina o inciso XII do art. 59 da Constituição do Estado de Santa Catarina, bem como o inciso XV do art. 1º da Lei Complementar Estadual nº 202/2000.
Sugere-se ao Exmo. Sr. Conselheiro Relator Wilson Rogério Wan-Dall, que submeta voto ao egrégio Colegiado, sobre consulta formulada pelo Sr. Luiz Roberto de Oliveira, para respondê-la nos termos deste opinativo, que em síntese propõe:
1.1. O Município, ao regulamentar sobre a jornada de trabalho dos servidores públicos municipais, pode instituir o regime de ponto eletrônico para os servidores públicos, efetivos e comissionados.
1.2. Não comporta ao Município instituir sistema de registro de ponto aos agentes políticos, em razão da liberdade funcional necessária ao cargo.
2. Determinar que seja dado ciência desta decisão, do Parecer COG-670/09 e do Voto ao consulente.
MARCELO BROGNOLI DA COSTA Consultor Geral, em exercício |