ESTADO DE SANTA CATARINA
    TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
    CONSULTORIA GERAL

Processo n°: REC - 05/04118889
Origem: Câmara Municipal de São João do Itaperiú
RECORRENTE: Alzerino Bernardes
Assunto: (Recurso de Reconsideração - art. 77 da LC 202/2000) -TCE-04/03408059
Parecer n° COG-343/09

RECURSO DE RECONSIDERAÇÃO. CONHECER. PROVER, EM PARTE.

Senhora Consultora,

RELATÓRIO

Trata-se de Recurso de Reconsideração interposto pelo Sr. Alzerino Bernardes, ex-Prefeito Municipal de São João do Itaperiú, contra o Acórdão nº 1241/2005, proferido pelo Tribunal Pleno desta Corte de Contas, nos autos do processo nº TCE - 04/03408059, em sessão do dia 04/07/05.

O processo iniciou com a análise de documentos de fls. 02/479 realizada pela Diretoria de Controle dos Municípios - DMU, sobre os atos de pessoal referentes ao exercício de 2003 que resultou na elaboração do Relatório nº 1075/04 (fls. 480/507), através do qual foram apontadas irregularidades, sugerindo-se ao Pleno a conversão do processo em Tomada de Contas Especial - TCE - e a citação do gestor da Unidade para defesa.

A sugestão do órgão técnico foi acompanhada pelo Ministério Público junto ao Tribunal de Contas nas fls. 509/510. Entretanto, no despacho de fls. 510 (anverso), o Relator determinou o retorno dos autos à DMU para esclarecimentos.

Após a Informação nº 264/04, fls. 511/512, seguiu-se o voto do Relator, fls. 514/517, e da Decisão nº 3337/2004, fls. 518/519, convertendo o processo em TCE e determinando a citação do Responsável.

O Responsável apresentou defesa nas fls. 530/626.

Os autos retornaram à DMU, que emitiu o Relatório nº 614/05 (fls. 629/650), onde concluiu pelo saneamento parcial das irregularidades apontadas, sugerindo ao Relator a aplicação de multas e débitos ao gestor.

O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas se manifestou no parecer de fls. 652/653, acompanhando a análise procedida pela auditoria de controle externo.

Sobreveio o voto do Relator, consubstanciado nas fls. 654/657, no sentido de julgar as contas irregulares, com imposição de multas e débitos ao Responsável.

Levado perante o Tribunal Pleno desta Corte de Contas, o caso foi decidido no Acórdão nº 1241/2005, de fls. 659/661:

Inconformando-se com o Acórdão, o Sr. Alzerino Bernardes interpôs o presente Recurso de Reconsideração.

Observamos que nos autos deste Recurso existem duas folhas não numeradas após as fls. 28 e 41, respectivamente.

É o Relatório.

II. ADMISSIBILIDADE

O Acórdão recorrido foi prolatado em processo de Tomada de Contas Especial, por isso, o Recurso de Reconsideração mostra-se como instrumento idôneo para atacá-lo, nos termos do artigo 77 da Lei Complementar (LC) 202/2000 e artigo 136 do Regimento Interno (R.I.) do TC/SC.

No caso, verifica-se a legitimidade do Recorrente, em razão de sua condenação pelo Acórdão recorrido, assumindo, ainda, a qualidade de Responsável, pois ocupava o cargo de Prefeito Municipal de São João do Itaperiú, atendendo ao disposto no § 1º, alínea "a", do artigo 133, do R.I. e aos princípios do contraditório e da ampla defesa consubstanciados no inc. LV do art. 5º da Constituição Federal.1

      Em se considerando que a publicação ocorreu numa sexta-feira, o curso do prazo começou da segunda-feira, dia 05/09. Por isso, o Recurso é tempestivo.
      Presentes os requisitos de admissibilidade, passamos ao mérito.
        III. MÉRITO
        III.I Item 6.1.1. Débito. Não prover.
        Matéria de Fato. Prova Insuficiente.
        A tese recursal baseada em matéria de fato deve ser acompanhada de prova idônea.

    O item 6.1.1 condenou o Recorrente em débito em razão do pagamento de horas-extras sem que houvesse controle sobre a liquidação da despesa, em desacordo com as disposições do art. 63, §§ 1° e 2°, da Lei Federal nº 4.320/64.

    Em sua defesa, o Recorrente alega que não concorreu para a prática dos atos irregulares e que a responsabilidade deve ser atribuída aos Secretários Municipais, em razão das atribuições de suas pastas.

    Aduz que as divergências nos relatórios de controle de horas-extras devem ser lançadas à responsabilidade dos Secretários e do Chefe do Setor de Pessoal, a quem cabia o controle dos relatórios.

    O Recorrente pretende se isentar de responsabilidade sob o argumento de que as competências das Secretarias Municipais, discriminadas na Instrução Normativa nº 001/02, implicam em responsabilidade dos respectivos titulares.

    Em regra, a responsabilidade perante o Tribunal de Contas é lançada sobre o dirigente máximo do órgão público auditado, considerado ordenador primário de despesa. Todavia, nos casos de exercício de função delegada, é possível trazer à responsabilidade outras pessoas vinculadas à Administração Pública.

    Nesse sentido, colhemos a lição de Marcelo Brognoli da Costa:

          É preciso atentar para o fato de que nem sempre aquele que se responsabiliza pela remessa de dados relativos a contas, atos ou contratos é o responsável pelas irregularidades e ilegalidades detectadas. Lembremo-nos da figura da delegação de competência e do agente que exorbita as ordens recebidas.
          Para os fins da apuração da responsabilidade fiscal, apenas para esclarecer, já que se está tratando de responsáveis jurisdicionados ao Tribunal de Contas, firma-se que nesta seara o responsável é o dirigente máximo do Poder ou órgão.16
          Cabe realçar a distinção entre ordenador de despesa originário e ordenador de despesa derivado ou secundário. Para tanto, traz-se à colação excerto extraído da obra de Mileski, no seguinte sentido:
          Ordenador de despesa originário ou principal é a autoridade administrativa que possui poderes e competência, com origem na lei e regulamentos, para ordenar as despesas orçamentárias alocadas para o Poder, órgão ou entidade que dirige. Como se trata da autoridade principal, cujas competências e atribuições se originam da lei, o seu poder ordenatório é originário, cujo exercício cabe tão-somente a ele. Ostentam a condição de Ordenadores de despesa originários os Presidentes dos Poderes Legislativo e Judiciário; os Ministros e Secretários de Estado, assim como os dirigentes de autarquias, fundações, sociedades de economia mista e empresas públicas, por possuírem competências e atribuições fixadas em lei, regulamentos ou estatutos societários, para administrarem estas organizações estatais, aplicando os recursos financeiros postos a sua disposição. Ordenador de despesa derivado ou secundário é aquele com competências e atribuições derivadas do Ordenador originário, por isso, podendo ser chamado também de secundário. Ordenador de despesa derivado assume esta circunstância mediante o exercício de função delegada ou por ter exorbitado das ordens recebidas.17
          Assim, havendo delegação de competência regularmente instituída, ao agente delegado recairá a responsabilidade pelas irregularidades das contas e ilegalidades dos atos e contratos, bem como, o dever de indenizar os danos ao erário.
          A mera alegação de que a ação administrativa ou a gestão de recursos não se dera por parte da autoridade máxima do órgão não serve para afastar a sua responsabilidade, como reiteradamente tem decido este Tribunal de Contas, calcado em entendimento expresso no Parecer COG-361/05 da Lavra da Auditora de Controle Externo Walkíria Machado Rodrigues Maciel, exarado nos autos do Processo nº REC-03/03200626.
          Do referido parecer se extrai, de forma destacada, a seguinte e elucidativa citação acerca da delegação de competência:

    Dessa forma, vemos que a delegação é uma das hipóteses de isenção de responsabilidade do ordenador primário de despesa. Contudo, não é o que ocorre no caso.

    A Instrução Normativa nº 001/02 dispõe em seu art. 13, parágrafo único:

          Art. 13. Fica determinado que os Servidores Públicos Municipais vinculados aos seus respectivos órgãos ficam subordinados ao Secretário de sua pasta de competência:

    A partir da leitura do texto legal, vemos que não se trata de delegação para prática de atos de gestão, mas tão somente da fixação das regras de hierarquia dentro do órgão público municipal.

    Realmente, o objeto da instrução normativa em tela, demarcado no art. 1º, não consubstancia um ato de delegação capaz de afastar a responsabilidade do Recorrente.

    Quanto aos documentos juntados em sede recursal, fls. 16/61, observamos que se tratam das mesmas provas carreadas aos autos do processo principal, fls. 143/214.

    Examinando as provas, verificamos que os documentos de fls. 19, 28, 32, 33, 36, 37, 42, 47, 51 e 597 não estão assinados, por isso, não podem ser considerados eficazes para o processo.

    Os documentos de fls. 58 e 608 estão devidamente assinados. Porém, constatamos que os mesmos foram juntados aos autos do processo principal, nas fls. 150 e 151, respectivamente, sem assinatura.

    Sobre os dados registrados nos documentos restantes, acolhemos a manifestação da DMU como razões deste Parecer, haja vista a insuficiência das provas em razão da ausência do livro ponto e da inconsistência em relação ao ponto eletrônico.

          A partir do mês de julho de 2003 foi implantado o sistema de ponto eletrônico para os servidores da municipalidade. Verificou-se, todavia, que, apesar de feito o controle das horas trabalhadas através do ponto eletrônico, a quantidade de horas-extras pagas aos servidores, conforme anexo I, não coincide com os valores constantes nos relatórios do ponto eletrônico.

        No mérito, a decisão recorrida considerou descumprido o art. 63, §§ 1° e 2°, da Lei Federal nº 4.320/64.

    A realização da despesa pública envolve três fases: (1ª) empenho, (2ª) liquidação e (3ª) pagamento. A liquidação de despesa vem discriminada no art. 63.

          Art. 63. A liquidação da despesa consiste na verificação do direito adquirido pelo credor tendo por base os títulos e documentos comprobatórios do respectivo crédito.
          § 1° Essa verificação tem por fim apurar:
          I - a origem e o objeto do que se deve pagar;
          II - a importância exata a pagar;
          III - a quem se deve pagar a importância, para extinguir a obrigação.
          § 2º A liquidação da despesa por fornecimentos feitos ou serviços prestados terá por base:
          I - o contrato, ajuste ou acordo respectivo;
          II - a nota de empenho;
          III - os comprovantes da entrega de material ou da prestação efetiva do serviço.

    A liquidação de despesa consiste na demonstração de que o credor cumpriu sua parte da obrigação. Nesse sentido, ensinam Machado Jr. e Costa Reis:

          A liquidação é, pois, a verificação do implemento de condição. Quando o órgão de pessoal prepara a folha de pagamento do mês, deduzindo faltas e impontualidades, está na verdade liquidando a despesa de pessoal do mês, embora na prática não se costume utilizar tal expressão em relação a esse tipo de despesa.10

    A Lei nº 4.320 exige que o pagamento seja precedido de liquidação. Assim, há que ficar comprovada a real prestação do serviço.

    De fato, é necessário que haja uma forma de controle de freqüência que se mostre idôneo.

    Sob esse aspecto, os relatórios dos Secretários Municipais se mostram insuficientes para demonstrar a efetiva comprovação da presença do servidor no ambiente de trabalho, conforme destacou a DMU.

    Diante do exposto, as razões sob exame não devem ser providas.

        III.II Item 6.1.2. Débito. Prover.
        Tribunal de Contas do Estado. Competência.
        A matéria referente à execução dos serviços de fiscalização, lançamento, cobrança, arrecadação, recolhimento e controle das contribuições da União não é da competência do Tribunal de Contas de Santa Catarina.

    O item 6.1.2 condenou o Recorrente em débito em razão da não retenção do imposto de renda em folha de pagamento dos servidores, caracterizando renúncia ilegal de receita, em desacordo com o art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal.

    No recurso, é suscitada a tese de que a dedução ocorreu em função da existência de dependentes dos servidores, amparada no art. 1º e 10, I, da Lei nº 10.451/02.

    O Recorrente aduz, ainda, que a responsabilidade pela irregularidade deve recair sobre o chefe do setor de pessoal da prefeitura.

        Preliminarmente, verificamos uma questão impeditiva do exame de mérito.
        A imputação de débito decorrente da não retenção do imposto de renda teve como fundamento o disposto no art. 18, III, "c", da LC 202/2000, que dispõe:
            Art. 18. As contas serão julgadas:
            ... III - irregulares, quando comprovada qualquer das seguintes ocorrências:
            ...c) dano ao erário decorrente de ato de gestão ilegítimo ou antieconômico injustificado; ...
              Portaria MF nº 259/2001, Regimento Interno da SRF. Art. 1º A Secretaria da Receita Federal, órgão específico singular, diretamente subordinado ao Ministro de Estado da Fazenda, tem por finalidade: ...VII - dirigir, supervisionar, orientar, coordenar e executar os serviços de fiscalização, lançamento, cobrança, arrecadação, recolhimento e controle dos tributos e contribuições e demais receitas da União, sob sua administração; (grifei)
          De acordo com os artigos 70 e 71 da Constituição Federal, a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, com o auxílio do Tribunal de Contas da União, e pelo sistema de controle interno de cada Poder.
          Pelo exposto, entendemos que a matéria referente à execução dos serviços de fiscalização, lançamento, cobrança, arrecadação, recolhimento e controle dos tributos e contribuições da União não é da competência do Tribunal de Contas de Santa Catarina.
          Trata-se de incompetência em razão da matéria, que deve ser conhecida de ofício pelo órgão julgador.
          Razões expostas, opinamos pela nulidade do item 6.1.2, posto que o débito fora imputado além dos limites da competência da Corte de Contas Estadual, remetendo-se cópia dos autos à Receita Federal do Brasil, para o que entender de Direito.
            III.III Item 6.2.4. Multa. Prover.
            PROVA documental juntada em sede recursal. Possibilidade.
            Considera-se saneada a irregularidade decorrente da ausência de documentos quando os mesmos são juntados aos autos após a decisão.

        O item 6.2.4. aplicou multa ao Recorrente em razão da ausência de portaria para cessão de dois servidores para exercerem suas funções junto ao Serviço de Correios e Telégrafos - ECT do Município, conforme convênio firmado entre as partes, caracterizando afronta ao princípio da legalidade insculpido no art. 37, caput, da Constituição Federal.

        Em suas alegações, o Recorrente insiste na tese da responsabilidade do Secretário Municipal.

        Também argumenta que a cessão dos servidores foi ditada pela necessidade e precedida de autorização legislativa.

        A impossibilidade de isenção de responsabilidade do Recorrente já foi objeto de exame no item III.I deste Parecer.

        Quanto à ausência de portaria, destacamos no apontamento da DMU, após analisar as razões de defesa, o que segue:

              Entretanto, só há uma Portaria transferindo o servidor Rovâni Delmonego, inexistindo, portanto as Portarias relativas à cessão dos servidores Enio José Gonçalves e Maria Rosângela dos Santos Kuzkowski.
              Saliente-se que, embora haja lei autorizando o referido convênio e a cessão dos servidores, não houve Portaria ou Decreto que viesse a formalizar a cessão dos dois servidores.
              [...]
              Compulsando os autos deste Recurso, verificamos que as portarias designando os servidores Enio José Gonçalves e Maria Rosângela dos Santos Kuzkowski foram juntadas às fls. 63 e 62, respectivamente.
              Portanto, a irregularidade deve ser considerada saneada, cancelando-se a multa aplicada no item 6.2.4.
                III.IV Item 6.2.5. Multa. Não Prover.
                Prejulgado 1333 (texto parcial)
                "O exercício de funções contábeis e financeiras deve ser segregado em cargos e pessoas distintos, atendendo-se a um dos princípios do controle interno".

            O Recorrente se insurge contra a multa aplicada pelo item 6.2.5, em face da não-segregação das funções de Chefe do Departamento de Tesouraria e do setor de Contabilidade, em prejuízo do sistema de controle interno previsto nos arts. 74 da Constituição Federal e 4º da Resolução nº TC-16/94.

            No recurso é defendida a tese de que a função de Contador é exercida por servidor devidamente nomeado, consoante atesta a portaria de fls. 75.

            Com relação ao acúmulo de funções argumenta que o fato decorre das "precárias estruturas da Prefeitura Municipal, especialmente no tocante a grande carência de servidores".14

            A questão relativa à segregação das funções de tesouraria e contabilidade já foi objeto de exame em Processo de Consulta perante este Tribunal, que se manifestou através dos Prejulgados 988 e 1333, no seguinte sentido:

                  1. A prática de registros contábeis e demais atos afetos à contabilidade são atribuições que devem ser acometidas a contabilista efetivo habilitado e registrado no Conselho Regional de Contabilidade, sob pena de infração à norma regulamentar do exercício profissional.

                  Para suprir a deficiência no setor de contabilidade do Poder Legislativo, até que seja provido Contador em cargo efetivo, pela via do concurso público, excepcionalmente poderá ser concedida uma gratificação prevista em lei e paga pela Câmara Municipal, a servidor habilitado e registrado no CRC, para a execução dos serviços contábeis.

                  2. Para otimizar o controle interno é recomendável a segregação das funções de contabilidade e tesouraria, destinando tais atribuições a servidores distintos.
                  O exercício de funções contábeis e financeiras deve ser segregado em cargos e pessoas distintos, atendendo-se a um dos princípios do controle interno.

                  Não constitui irregularidade a subordinação a uma mesma pessoa dos que exercem, segregadamente as funções de contabilidade e de finanças. (grifo nosso).
                Do parecer que fundamentou o Prejulgado 1333, colhe-se importante lição trazida pelo Auditor Fiscal de Controle Externo Hamilton Hobus Hoemke:
                      Se uma das funções da contabilidade é a vigilância sobre as operações realizadas com o patrimônio, aí incluídas as operações financeiras, não pode a mesma ser ao mesmo tempo, executora e fiscalizadora, sob pena de comprometer a credibilidade da função.
                      O exercício das funções de contabilidade não se coaduna com o exercício das funções de tesouraria, caixa ou qualquer outro nome que se possa intitular as funções financeiras. O profissional de contabilidade, conhecedor dessa premissa, é também responsável pela valorização de sua profissão, abstraindo-se de assumir funções de execução financeira em acúmulo com a de contador.
                      A verificação de situações nas quais ocorra o acúmulo no exercício de funções de contabilidade com a de execução financeira compromete ambas as operações, colocando sob suspeita todos os registros e operações desde o início dessa irregularidade.
                    No caso, o próprio Recorrente admite que houve acúmulo de funções. A confissão expressa vem corroborada pelas constatações da equipe de auditoria, registradas no Relatório nº 614/2005:

                        A servidora Beatriz Rodrigues, através da Portaria nº 399/2001, foi nomeada para exercer o Cargo de Chefe do Depto. de Tesouraria. Entretanto, referida servidora, além das atribuições inerentes ao cargo para o qual foi designada, responde também pelo setor de Contabilidade, sendo responsável por atividades como emissão de empenhos, liquidação e pagamento das despesas, informações do ACP, entre outras. Caracteriza-se, desta forma, ausência de segregação de funções, impossibilitando o natural controle que um setor exerce sobre o outro, prejudicando, com isso, o funcionamento de um bom sistema de controle interno, conforme previsto na Res. TC - 16/94, art. 4º.
                        [...]
                        Acerca do presente apontamento, a Unidade afirma não haver infringência legal uma vez que o Sr. Roberto Trümmel é o responsável pela contabilidade.
                        Cabe salientar, entretanto, que a caracterização da restrição em tela baseou-se em informações obtidas "in loco", tanto por observação dos auditores deste Tribunal como por dados fornecidos pela própria servidora.

                  Diante do exposto, entendemos que as razões examinadas no tópico recursal não devem ser providas.

                      III.V Item 6.2.6. Multa. Não Prover.
                      Cessão de servidor. Contratação temporária.
                      É proibida a cessão de servidores municipais contratados em caráter temporário a órgão público estadual.

                  O item 6.2.6 aplicou multa ao Recorrente em face da cessão de servidores contratados em caráter temporário a órgão estadual, contrariando os fundamentos caracterizadores da contratação temporária, previstos no art. 37, IX, da Constituição Federal.

                  Em sua defesa o Recorrente alega que diante da necessidade de manter o fornecimento de água para o Município firmou convênio com a CASAN, comprometendo-se a disponibilizar dois servidores. Porém, como não dispunha de pessoal para a tarefa, contratou temporariamente os servidores para cedê-los à companhia.

                  Aduz que o convênio foi aprovado pelo Poder Legislativo Municipal, e que a CASAN ressarcia o Município mensalmente dos encargos salariais dos servidores cedidos.

                  Novamente, o tema em debate aborda uma questão já examinada nesta Corte de Contas.

                  Em Processo de Consulta formulada pela Prefeitura Municipal de Pouso Redondo, acerca da possibilidade de cessão de servidor municipal à CASAN, mediante reembolso, o Tribunal elaborou o Prejulgado 1228, estabelecendo a proibição da cessão de servidor contratado em caráter temporário.

                        Observados os requisitos dos arts. 20 da Constituição Federal e 116 da Lei Federal nº 8.666/93 e havendo autorização legislativa pelos respectivos municípios para cessão de pessoal, é permitida a celebração de convênios entre a CASAN e municípios objetivando a cessão de servidores municipais efetivos para operação de Sistema de Abastecimento de Água destinado à distribuição nos respectivos municípios beneficiados, temporariamente e com ressarcimento pela CASAN, até esta realizar concurso e admissão de pessoal para essa finalidade, sendo vedada a cessão de servidores contratados em caráter temporário, em estágio probatório ou ocupantes de cargo em comissão. (grifo nosso).

                  Diante do posicionamento fixado nesta Corte, entendemos que as razões recursais não devem ser providas.

                      III.VI Item 6.2.7. Multa. Não Prover.
                      Princípio da legalidade.
                      Por força do princípio da legalidade, a Administração Pública está submetida ao cumprimento do que a lei determina, e aos limites estabelecidos pela norma.

                  O item 6.2.7 aplicou multa ao Recorrente em razão da não-previsão legal para a realização de complementação temporária da carga horária de servidores municipais, que importou em despesas no montante de R$ 14.313,49, em afronta ao princípio da legalidade insculpido no art. 37, caput, da Constituição Federal.

                  No recurso sustenta-se que em razão da falta de pessoal e da impossibilidade de contratação temporária, a medida foi tomada dentro das necessidades e das possibilidade existentes.

                  Em que pese a falta de pessoal e a impossibilidade de contratação temporária sustentada pelo Recorrente, entendemos que tais circunstância não autorizam o gestor a administrar ao arrepio da lei.

                  Como órgão da Administração Pública Direta, a Prefeitura Municipal está vinculada ao princípio da legalidade19 e, ao contrário dos particulares, que podem fazer tudo que a lei não proíbe, a Prefeitura só poderia fazer aquilo que a lei determina, e nos limites estabelecidos pela norma20.

                  Nesse sentido, é a doutrina de Celso Antônio Bandeira de Mello:

                  E concluímos com o administrativista:

                  Ante o exposto, somos pelo não provimento das razões recursais.

                      III.VII Itens 6.2.1/6.2.3. Multas. Ausência de recurso.
                      Efeito devolutivo do recurso.
                      Por força do efeito devolutivo do recurso, o tribunal deve se manifestar apenas sobre os capítulos do acórdão especificamente impugnados pelo Recorrente.

                  Compulsando os autos, verificamos que não houve recurso contra os itens 6.2.1, 6.2.2 e 6.2.3.

                  Nesse caso, por força do efeito devolutivo do recurso, previsto no art. 515 do Código de Processo Civil - CPC ("A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada")23, o tribunal deve se manifestar apenas sobre os capítulos24 do acórdão especificamente impugnados pelo Recorrente.

                  Por oportuno, citamos a lição de Nery e Nery Júnior sobre o efeito devolutivo dos recursos:

                  No mesmo rumo, segue a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

                        TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. ICMS. FUNDO DE PARTICIPAÇÃO DOS MUNICÍPIOS. INTERPOSIÇÃO INTEMPESTIVA DE RECURSO DE APELAÇÃO. RECURSO ADESIVO. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE RECURSAL. INAPLICABILIDADE. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. INEXISTÊNCIA DE NULIDADE. NECESSIDADE DE PERÍCIA TÉCNICA. SÚMULA 07 DO STJ. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. MATÉRIA NÃO PREQUESTIONADA. SÚMULA 282 DO STF. ART. 515 DO CPC. TANTUM DEVOLUTUM QUANTUM APELLATUM. VEDAÇÃO À REFORMATIO IN PEJUS. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA.

                  Salientamos que a hipótese de devolução limitada por recurso parcial é diferente da transferência ao tribunal das questões suscitadas e discutidas no processo.

                  Esta, refere-se ao chamado efeito translativo do recurso, que está previsto nos parágrafos 1º, 2º e 3º do artigo 515 e no artigo 516 do CPC:

                        Art. 515. A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada.
                        § 1o Serão, porém, objeto de apreciação e julgamento pelo tribunal todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que a sentença não as tenha julgado por inteiro.
                        § 2o Quando o pedido ou a defesa tiver mais de um fundamento e o juiz acolher apenas um deles, a apelação devolverá ao tribunal o conhecimento dos demais.
                        § 3o Nos casos de extinção do processo sem julgamento do mérito (art. 267), o tribunal pode julgar desde logo a lide, se a causa versar questão exclusivamente de direito e estiver em condições de imediato julgamento.
                        ...
                        Art. 516. Ficam também submetidas ao tribunal as questões anteriores à sentença, ainda não decididas.

                  O efeito translativo do recurso devolve ao tribunal o exame das questões de ordem pública27, sobre as quais é possível a manifestação ex officio, consoante vem decidindo o Superior Tribunal de Justiça:

                        ...
                        3. As matérias de ordem pública (art. 267, § 3º, e 301, § 4º, do CPC) podem ser conhecidas de ofício, em qualquer tempo e grau de jurisdição, ainda que em sede de embargos infringentes, não havendo se falar em preclusão.
                        4. O recurso de embargos infringentes possui efeito devolutivo limitado ao voto vencido. Portanto, o que não foi objeto de divergência não poderá ensejar a interposição dos embargos. Porém, não se há olvidar que o efeito devolutivo de todo recurso é de ser entendido sob o ângulo de extensão e profundidade. A extensão diz acerca da análise horizontal da matéria posta em juízo, ao passo que a profundidade é a verticalização da cognição do julgador. Tal verticalização, por muitos considerada como efeito translativo dos recursos, consiste na possibilidade de o Tribunal, ultrapassada a admissibilidade do apelo, decidir matéria de ordem pública, sujeita a exame de ofício em qualquer tempo e grau de jurisdição, como é o caso das nulidades absolutas, das condições da ação, dos pressupostos processuais e das demais matérias a que se referem o § 3º do art. 267 e § 4º do art. 301.
                        5. No caso, quando do julgamento dos embargos infringentes, não era vedado ao Tribunal a quo - ao contrário, era-lhe imposto - a reapreciação de matérias de ordem pública, como condições da ação e coisa julgada. Assim, malgrado os embargos infringentes tenham extensão limitada ao voto vencido, no que pertine à profundidade, a cognição é ampla.

                  Diante do exposto, restam não examinados os itens em tela.

                    IV. CONCLUSÃO

                    Ante o exposto, sugere-se ao Exmo. Sr. Conselheiro Relator como proposta de voto ao Egrégio Plenário o que segue:

                    1 Conhecer do Recurso de Reconsideração, nos termos do art. 77 da Lei Complementar n° 202/2000, interposto contra o Acórdão nº 1241/2005, exarado na Sessão Ordinária de 17/08/2005 nos autos do Processo nº TCE - 04/03408059, e, no mérito, dar-lhe provimento parcial para:

                    1.1 Anular o item 6.1.2;

                    1.2 Cancelar a multa aplicada pelo item 6.2.4;

                    1.3 manter os demais termos do Acórdão recorrido.

                    2 Remeter cópia dos autos à Receita Federal do Brasil e ao Instituto Nacional do Seguro Social, para o que entender de Direito acerca dos fatos apurados no item 1.11 do Relatório nº 641/2005, fls. 629/650, dos autos do processo nº TCE - 04/03408059;

                    3 Determinar à Secretaria Geral a renumeração das folhas deste Recurso, a partir das fls. 28.

                    4. Dar ciência deste Acórdão, do relatório e voto que o fundamentam, bem como deste Parecer COG, ao Sr. Alzerino Bernardes, ex-Prefeito Municipal de São João do Itaperiú, e à Prefeitura Municipal de São João do Itaperiú.

                        COG, em 17 de junho de 2009.
                        CLAUTON DA SILVA RUPERTI
                                    Auditor Fiscal de Controle Externo
                                    De Acordo. Em ____/____/____
                                    HAMILTON HOBUS HOEMKE
                                    Coordenador de Recursos


                    1 CF/88. Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: ...LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes; ...

                    2 Art. 66, § 3º, do Regimento Interno.

                    3 Rec., fls. 03.

                    4 COSTA, Marcelo Brognoli da. Responsabilidade perante o Tribunal de Contas. In SANTA CATARINA. Tribunal de Contas. Ciclo de estudos de controle público da administração municipal (11). Florianópolis: Tribunal de Contas/Instituto de Contas, 2009. P. 126/128.

                    5 REC., fls. 14.

                    6 REC., fls. 10.

                    7 REC.

                    8 REC.

                    9 TCE., fls.482/483.

                    10 MACHADO JÚNIOR, José Teixeira; REIS, Heraldo da Costa. A Lei 4320 comentada. 31ª Ed. Rio de Janeiro, IBAM, 2002/2003. P. 149.

                    11 Portaria MF nº 95/2007. Art. 1º A Secretaria da Receita Federal do Brasil - RFB, órgão específico singular, diretamente subordinado ao Ministro da Fazenda, tem por finalidade: ...VII - dirigir, supervisionar, orientar, coordenar e executar os serviços de fiscalização, lançamento, cobrança, arrecadação, recolhimento e controle dos tributos e contribuições e demais receitas da União, sob sua administração;... (grifei)

                    12 Quando não houver Tribunais de Contas dos Municípios.

                    13 TCE., fls. 637/638.

                    14 REC., fls. 08.

                    15 Processo: CON-00/00493791 Parecer: COG-404/00 Decisão: 841/2001 Origem: Câmara Municipal de Itapoá Relator: Auditor Altair Debona Castelan Data da Sessão: 21/05/2001 Data do Diário Oficial: 06/07/2001.

                    16 Processo: CON-03/00290829 Parecer: COG-133/03 Decisão: 879/2003 Origem: Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina Relator: Auditor Clóvis Mattos Balsini Data da Sessão: 09/04/2003 Data do Diário Oficial: 17/06/2003.

                    17 TCE., fls. 638/639.

                    18 Processo: CON-01/01058675 Parecer: COG-155/02 Decisão: 2514/2002 Origem: Prefeitura Municipal de Pouso Redondo Relator: Conselheiro Luiz Suzin Marini Data da Sessão: 30/09/2002 Data do Diário Oficial: 10/12/2002.

                    19 Constituição da República, Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

                    20 Idem, Art. 5.º, II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;

                    21 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 19.ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2005. P. 93.

                    22 Idem. P. 90.

                    23 Aplicado subsidiariamente à espécie (art. 308, R.I.).

                    24 Colhemos da lição de Cândido Rangel Dinamarco o conceito de capítulos de sentença - também aplicável para decisões colegiadas: Cada capítulo do decisório, quer todos de mérito, quer heterogêneos, é uma unidade elementar autônoma, no sentido de que cada um deles expressa uma deliberação específica; cada uma dessas deliberações é distinta das contidas nos demais capítulos e resulta da verificação de pressupostos próprios, que não se confundem com os pressupostos das outras. (DINAMARCO, Cândido Rangel. Capítulos de Sentença. São Paulo: Malheiros, 2002. P. 34.)

                    25 NERY, Rosa Maria de Andrade; NERY JÚNIOR, Nelson. Código de Processo Civil Comentado. 9ª Ed. São Paulo: RT, 2006. P. 707.

                    26 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 867042/AL. Relator: Ministro Luiz Fux. Órgão Julgador: 1ª Turma. Brasília, DF, 17 de junho de 2008. Disponível em: <www.stj.gov.br>. Acesso em: 24 junho 2009. No mesmo Sentido: Resp 759904/DF, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito; Resp 498775/PE, Rel. Min. Paulo Gallotti.

                    27 NERY, Rosa Maria de Andrade; NERY JÚNIOR, Nelson. Ob. cit., p. 707 e 741.

                    28 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 304629/SP. Relator: Ministro Luis Felipe Salomão. Órgão Julgador: 4ª Turma. Brasília, DF, 09 de dezembro de 2008. Disponível em: <www.stj.gov.br>. Acesso em: 25 junho 2009. No mesmo Sentido: Resp 1080808/MG, Rel. Min. Luiz Fux; Edcl. no Resp 984599/DF, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima.