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Processo n°: | REC - 07/00387676 |
Origem: | Prefeitura Municipal de Criciúma |
RESPONSÁVEL: | Décio Gomes Góes |
Assunto: | (Reexame - art. 80 da LC 202/2000) -PDI-03/02597115 |
Parecer n° | COG-86/10 |
Retenção da contribuição previdenciária dos servidores na conta Depósitos de Diversas Origens. Obrigatoriedade de recolhimento para o órgão previdenciário.
Os valores retidos dos servidores para a previdência devem ser recolhidos para o órgão previdenciário competente, não podendo permanecer depositados na conta Depósitos de Diversas Origens durante todo o exercício, sob pena de apropriação indébita de recursos de terceiros.
Gastos com pessoal. Limite do art. 71 da Lei Complementar nº 101/2000.
1. Conforme o art. 71 da Lei Complementar nº 101/2000, até 2003 o acréscimo anual da despesa total com pessoal de cada Poder ou órgão não poderia exceder a 10% do exercício anterior.
2. Despesas com terceirização de atividades consideradas acessórias não devem ser computadas como "outras despesas de pessoal", segundo a interpretação do art. 18, § 1°, da Lei Complementar nº 101/2000, dada pela Lei 11.514/2007.
Valor da multa. Necessidade de fundamentação. Art. 93, IX, da Constituição Federal.
A ausência da exposição dos motivos que justificaram a fixação do valor das multas em patamar acima do mínimo autoriza o relator do recurso a reduzi-las, a seu critério, pois, nos termos do art. 93, IX, da Constituição Federal, do art. 16, § 5°, da Constituição Estadual, e do art. 50, II, da Lei nº 9.784/1999, todas as decisões, principalmente as que impõem sanção aos administrados, precisam ser adequadamente fundamentadas.
Senhora Consultora,
Tratam os autos de Recurso de Reexame (art. 80 da Lei Complementar nº 202/2000) interposto por Décio Gomes Góes, ex-Prefeito do Município de Criciúma, em face do Acórdão nº 1162/2007, proferido nos autos do Processo Diverso (PDI) nº 03/02597115.
Na decisão, o Pleno aplicou duas multas ao recorrente com base no art. 70, II, da Lei Complementar n° 202/2000 - uma de R$ 2.000,00, em face da retenção de contribuições previdenciárias para o Fundo Municipal de Seguridade Social sem o recolhimento ao órgão respectivo, em descumprimento ao art. 195, I e II, da Constituição Federal, e outra de R$ 1.000,00, em face da realização de gastos de pessoal acima do limite do art. 71 da Lei Complementar n° 101/2000 (LRF) (fls. 114-115).
Confira-se a íntegra do Acórdão:
É o sucinto relatório.
São requisitos para a admissibilidade do Recurso de Reexame, conforme se extrai do art. 80 da Lei Complementar nº 202/00: a legitimidade, a singularidade e a tempestividade.
No que se refere à legitimidade recursal, verifica-se que o recorrente a possui, já que tem interesse recursal em razão das multas aplicadas em seu desfavor. Enquadrou-se, ademais, na definição de responsável prevista no art. 133, § 1º, "a", do Regimento Interno.
A singularidade foi observada, pois interposto o recurso uma única vez. E, da mesma forma, a tempestividade, porquanto o Acórdão recorrido foi publicado no Diário Oficial do Estado nº 18.145, de 19/06/2007, e o recurso, protocolizado em 19/07/2007, respeitando-se, assim, o prazo de trinta dias para a interposição.
Logo, preenche os pressupostos de admissibilidade.
III.1 Da multa de R$ 2.000,00 "em face da retenção de contribuições previdenciárias para o Fundo Municipal de Seguridade Social sem o recolhimento ao órgão respectivo, em descumprimento à Constituição Federal, art. 195, incisos I e II" (item 6.2.1 do acórdão)
O recorrente afirma que os valores registrados no exercício de 2001 na conta Depósitos de Diversas Origens referem-se a saldos de exercícios anteriores descontados dos servidores, mas não recolhidos à previdência, tendo em vista que o regime próprio ainda não havia sido formalmente criado no município.
Informa, porém, que a medida saneadora foi devidamente tomada, já que no exercício seguinte, foi implantado o CriciúmaPrev por meio da Lei Complementar n° 019/2001, conforme "doc.1-a" constante às fls. 178-194.
Esclarece que "foram recolhidos ao instituto todos os valores anteriormente pendentes" (fl. 04), segundo atesta o "doc.1-b" de fls. 10-19.
A insurgência, no entanto, não tem condições de ser acolhida.
O corpo técnico constatou, no exercício de 2001, que a conta Depósitos de Diversas Origens, contendo valores retidos de servidores para a previdência, tinha o saldo inicial de 333.709,90, e, ao final do período, de R$ 333.547,40.
Durante o exercício, constam apenas movimentações de retenção no valor de R$ 276,84 e de recolhimento no valor de R$ 439,34.
Disso se depreende que a quantia existente na conta ao final de 2001, apesar de ter sido retida para a previdência dos servidores, não foi devidamente recolhida para o órgão respectivo - à época, o Fundo Municipal de Saúde -, caracterizando, assim, apropriação indébita de recursos de terceiros.
O recorrente junta a cópia da Lei que criou o CriciumaPrev, regime próprio de previdência dos servidores implantado no ano de 2002.
Nesse mesmo ano, o saldo da conta DDO ao final do período encontrava-se zerada, conforme indicam os demonstrativos de fls. 16-19 do recurso.
Porém, tanto a criação do CriciumaPrev quanto a movimentação dos recursos da conta DDO para o seu destino adequado ocorreram somente em 2002. Assim, é inegável a existência da irregularidade durante todo o período de 2001, apta a ensejar a penalização do responsável.
Cabe dizer, por fim, que os documentos de fls. 10-11 informam dados não relacionados com a questão, e que os documentos de fls. 12-15 referem-se ao exercício de 1999.
Por isso, entende-se que foi correta a aplicação de multa pelo Tribunal.
III.2 Da multa de R$ 1.000,00 "em face da realização de gastos com pessoal do Poder Executivo acima do limite estabelecido pelo art. 71 da Lei Complementar n. 101/2000" (item 6.2.2 do acórdão)
O recorrente sustenta que o limite estabelecido pelo art. 71 da LRF para gastos com pessoal não foi prejudicado.
Isso porque, a seu entender, as despesas no montante de R$ 2.223.321,64 foram indevidamente classificadas como despesas de pessoal, por se tratarem de gastos com "coleta e transporte de resíduos sólidos, serviços de vigilância, avaliação de imóveis, manutenção de semáforos, assessoria técnica especializada, limpeza e desentupimento de fossas, entre outros de natureza esporádica" (fl. 05), conforme relação de documentos anexada ao recurso ("doc.2-a, fls. 20-57).
Afirma, ainda, que o valor de R$ 460.826,08, referente a rescisão de funcionários, também deve ser excluído do cálculo, conforme relação de empenhos juntados às fls. 58-177 do recurso ("doc.2-b").
Para a verificação do limite previsto no art. 71 da LRF, utiliza-se como referencial a despesa total com pessoal, que é definida no art. 18 da mesma Lei:
Art. 18. Para os efeitos desta Lei Complementar, entende-se como despesa total com pessoal: o somatório dos gastos do ente da Federação com os ativos, os inativos e os pensionistas, relativos a mandatos eletivos, cargos, funções ou empregos, civis, militares e de membros de Poder, com quaisquer espécies remuneratórias, tais como vencimentos e vantagens, fixas e variáveis, subsídios, proventos de aposentadoria, reformas e pensões, inclusive adicionais, gratificações, horas extras e vantagens pessoais de qualquer natureza, bem como encargos sociais e contribuições recolhidas pelo ente às entidades de previdência. (grifei)
O § 1° do art. 18 complementa dizendo que: "Os valores dos contratos de terceirização de mão-de-obra que se referem à substituição de servidores e empregados públicos serão contabilizados como 'Outras Despesas de Pessoal'" (grifei).
A respeito deste dispositivo, a doutrina entende que não é toda terceirização que deve ser computada como despesas de pessoal. Certas funções terceirizadas, relativas a atividades-meio - como conservação, limpeza, segurança, vigilância, reprografia, telecomunicações, recepção, dentre outras - não devem ser incorporadas à despesa de pessoal, porque, em tal caso, não estaria havendo a substituição de servidores ou empregados públicos.
Confira-se comentários sobre o art. 18, § 1°, da LRF:
Vale conferir também a orientação contida no Guia da LRF elaborado pelo TCE/SC:
Não fosse isso, a partir de 2007 o ordenamento conta com a interpretação autêntica da Lei 11.514 sobre o art. 18, § 1°, da LRF, a qual estabeleceu expressamente que a norma não alcança contratos de terceirização de atividades acessórias:
Diante disso, assiste razão ao recorrente ao afirmar que despesas totalizando R$ 2.223.321,64 foram incluídas indevidamente no cálculo da despesa total com pessoal.
Conforme a relação de empenhos constante às fls. 20-24 do recurso, o valor foi empenhado à conta do elemento de despesa 3.1.1.0.01.00.00.00.00 (Outras Despesas de Pessoal) incluindo o pagamento de prestação de serviços relacionados a atividades complementares, como coleta e transporte de lixo, vigilância, manutenção de semáforos, limpeza, dentre outros.
No Anexo 2 do Resumo Geral da Despesa (fl. 10 do recurso), também consta a informação de que a conta "Outras Despesas de Pessoal" totalizava exatamente a quantia de R$ 2.223.321,64, constituindo um desdobramento da conta Despesa de Pessoal (3.1.1.0.00.00.00) - vale dizer, estava incluída neste montante.
Com efeito, tanto a unidade como a DMU não deduziram referido valor para chegar ao total:4
28.972.344,06
Refazendo os cálculos para excluir os R$ 2.223.321,64 do total de despesas com pessoal, que passará a ser de R$ 26.749.022,42, a variação do acréscimo anual relativamente ao exercício anterior fica em 3,41%, ou seja, abaixo dos 10% permitidos, restando cumprido, portanto, o limite de que trata o art. 71 da LRF.
31,10%
32,16%
Diante disso, opina-se pelo cancelamento da multa.
III.3 Inconformismo quanto ao valor das multas
O recorrente requer o afastamento integral das multas aplicadas, ou, alternativamente, a redução ao seu mínimo legal, aduzindo que a decisão recorrida não fundamentou o critério utilizado na gradação do quantum. Além disso, defende que na aplicação das penalidades não teria sido observado os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.
A fixação do valor é baseada nos seguintes parâmetros: a) o limite máximo previsto na Lei Orgânica (R$ 5.000,00); b) a gradação prevista no Regimento Interno, conforme o fundamento da multa; e c) o critério de razoabilidade do relator, conforme o caso concreto.
Na hipótese, as multas tiveram fundamento no art. 70, II, da Lei Orgânica, e 109, II, do Regimento Interno, que dispõem:
Lei Orgânica do TCE (Lei Complementar n° 202/2000)
Art. 70. O Tribunal poderá aplicar multa de até cinco mil reais aos responsáveis por:
[...]
II - ato praticado com grave infração a norma legal ou regulamentar de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial; (grifei)
Regimento Interno do TCE (Resolução n° TC-06/2001)
Art. 109. O Tribunal poderá aplicar multa de até cinco mil reais, observada a gradação abaixo, aos responsáveis por:
[...]
II - ato praticado com grave infração a norma legal ou regulamentar de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial, no valor compreendido entre oito por cento e oitenta por cento do montante referido no caput deste artigo;
As sanções pecuniárias, in casu, poderiam ter variado entre R$ 400,00 e R$ 4.000,00 (8 e 80% de R$ 5.000,00, respectivamente).
Assim, as multas aplicadas, por terem sido estipuladas em R$ 2.000,00 e R$ 1.000,00, encontram-se dentro do balizamento traçado na norma.
Com efeito, a determinação do valor da multa, em cada caso concreto, está submetida à fundamentação do relator, consoante critérios de razoabilidade. Nesse sentido, para que seja legal e válida, é suficiente que tenha sido estipulada dentro dos limites da lei, pois, do contrário, seria arbitrária - e conseqüentemente, ilegítima.
Infere-se do voto do relator que a imposição das penalidades ao responsável foram fundamentadas quanto ao mérito, porém, especificamente no tocante ao valor das multas, não foram mencionados os motivos que determinaram a aplicação em patamar superior ao mínimo.
Todas as decisões, mesmo as administrativas, precisam ser adequadamente fundamentadas, como corolário da garantia expressa no art. 93, IX, da Constituição Federal:
A Constituição do Estado de Santa Catarina, no seu art. 16, § 5°, dispõe expressamente que o alcance dessa exigência se estende a todos os Poderes do Estado:
Constituição Estadual
Art. 16 - Os atos da administração pública de qualquer dos Poderes do Estado obedecerão aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade.
§ 5º - No processo administrativo, qualquer que seja o objeto ou o procedimento, observar-se-ão, entre outros requisitos de validade, o contraditório, a defesa ampla e o despacho ou decisão motivados. (grifei)
Na mesma esteira, a legislação infraconstitucional afirma a necessidade de motivação para os atos administrativos, principalmente quando imponham sanções ao administrado (art. 50, II, da Lei nº 9.784/1999).
No caso, a exposição dos motivos permitiria conhecer o juízo de valor que levou à aplicação das multas acima do mínimo, e por conseqüência, aferir a razoabilidade da medida.
Como isso não foi feito, entende-se que, diante da ausência de fundamentação quanto à definição do valor das multas, o relator do recurso pode, a seu critério, reduzi-las.
Neste parecer, opinou-se pela manutenção da multa aplicada no item 6.2.1 e pelo afastamento da aplicada no item 6.2.2 do Acórdão. Quanto a esta última, se o afastamento não for a medida tomada pelo Relator, entende-se que poderá, ainda, reduzi-la a seu critério.
Diante de todo o exposto, opina-se pelo provimento parcial do recurso, para, no mérito, cancelar a multa do item 6.2.2.
Quanto ao valor das multas, registra-se que podem ser reduzidas, ante a ausência de fundamentos expressos para a fixação acima do mínimo legal.
Ante o exposto, o parecer é no sentido de:
IV.1 Conhecer do Recurso de Reexame n° 07/00387676, interposto em face do Acórdão nº 1162/2007, proferido nos autos do PDI n° 03/02597115, e, no mérito, dar-lhe provimento parcial, a fim de cancelar a multa do item 6.2.2;
IV.2 Dar ciência deste parecer, do voto do Relator e do Acórdão à Prefeitura Municipal de Criciúma, ao recorrente Décio Gomes Góes, ex-Prefeito, e ao procurador constituído à fl. 127 do processo originário, o advogado Mauro Antônio Prezotto (OAB/SC 12.082).
Consultora Geral 2
Por ser a mais prática forma até o momento divulgada, adota-se, aqui, a sistemática do Governo Federal através do Decreto Federal nº 2271/97, e transplantado para o art. 64 da Lei 9.995/00 LDO da União para o Orçamento de 2001:
I - DESPESAS COM PESSOAL DO PODER EXECUTIVO
Valor (R$)
Prefeitura Municipal
3.1.1.0-Pessoal
22.571.467,12
Terceirização para Substituição de Servidores (art. 18, § 1° - LRF)
249.882,56
3.1.9.1-Sentenças Judiciárias Relativas a Pessoal
49.551,87
Fundo Municipal de Saúde de Criciúma
3.1.1.0-Pessoal
7.039.536,41
TOTAL DAS DESPESAS COM PESSOAL DO PODER EXECUTIVO
29.910.437,96
(-) Dedução referente a reposição salarial e a 13° salário5
938.093,9
TOTAL APÓS A REINSTRUÇÃO
Despesa Total com Pessoal em 2000
R$ 23.626.441,67
% da RCL
Despesa Total com Pessoal em 2001
R$ 26.749.022,42
% da RCL (R$ 83.180.161,80)
Variação Relativa ao Exercício Anterior
Aumento de 3,41% Constituição Federal
Art. 93
IX - todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação. (grifei)
CONCLUSÃO
À consideração superior.
COG, em 16 de março de 2010
FLÁVIA BOGONI
De Acordo. Em ____/____/____
DE ACORDO.
À consideração do Exmo. Sr. Relator Gerson dos Santos Sicca, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.
COG, em de de 2010
ELÓIA ROSA DA SILVA
1
TOLEDO JÚNIOR, Flávio C. de. Lei de responsabilidade fiscal: comentada artigo por artigo. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Editora NDJ, 2005, p. 154.
" 64 - O disposto no § 1º do art. 18 da Lei Complementar nº 101, de 2000, aplica-se exclusivamente para fins de cálculo do limite da despesa total com pessoal, independentemente da legalidade ou validade dos contratos.
Parágrafo único. Não se considera como substituição de servidores e empregados públicos, para efeito do caput, os contratos de terceirização relativos a execução indireta de atividades que, simultaneamente:
I - sejam acessórias, instrumentais ou complementares aos assuntos que constituem área de
competência legal do órgão ou entidade;
II - não sejam inerentes a categorias funcionais abrangidas por plano de cargos do quadro de pessoal do órgão ou entidade, salvo expressa disposição legal em contrário, ou quando se tratar de
cargo ou categoria extinto, total ou parcialmente."
3 SANTA CATARINA. Tribunal de Contas. Guia da lei de responsabilidade fiscal: lei complementar n. 101/2000. p. 57-61. Disponível em: www.tce.sc.gov.br.
4 Relatório n° 5367a/2002, referente à Prestação de Contas do Prefeito de 2001 (fl. 31).
5 Relatório n° 212/2007 do processo originário, à fl. 106.