ESTADO DE SANTA CATARINA
    TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO
    CONSULTORIA GERAL

Processo n°: REC - 09/00568500
Origem: Secretaria de Estado do Desenvolvimento Regional - Seara
Interessado: Jairo Luiz Sartoretto
Assunto: Referente ao Processo -REP-09/00024747
Parecer n° COG - 309/10

Recurso de Reexame. Administrativo. Licitação. Exigência de Qualificação Técnica. Limites Legais.

O estabelecimento de quantitativo mínimo para qualificação técnica em processo licitatório deve observar as características da obra, respeitando aos princípios da razoabilidade e da competitividade.

Licitação. Qualificação Técnica. Atestado. Limitação.

Em face da natureza do objeto licitado, a limitação de apresentação de atestados para comprovação da capacidade técnica operacional dos interessados, constitui ofensa ao princípio da competitividade.

Capacidade Técnica. Exigência de Experiência Prévia em Material. Desnecessidade.

A especificidade no edital de experiência prévia em determinado material, é desnecessária quando não configura diferença técnica capaz de alterar substancialmente a execução do serviço licitado.

Senhora Consultora,

RELATÓRIO

Tratam os autos de manifestação recursal interposta contra o Acórdão 1.190/2009, prolatado no Processo REP - 09/00024747, deliberação proferida na sessão ordinária do dia 02/09/2009, razões recursais firmadas pelo Senhor, Jairo Luiz Sartoretto, identificado nos autos do processo como responsável em razão da sua condição de Secretário de Estado do Desenvolvimento Regional - Seara/SC, autuado nesta Corte de Contas como Recurso de Reexame, protocolo nº 018624, de 22/09/2009, com o objetivo de ver modificado o acórdão proferido que aplicou multa ao recorrente, fixando a penalidade na forma a seguir transcrita:

ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro no art. 59 c/c o art. 113 da Constituição do Estado e no art. 1° da Lei Complementar n. 202/2000, em:

6.1. Conhecer da Representação formulada nos termos do art. 113, §1°, da Lei (federal) n. 8.666/93 contra a Secretaria de Estado do Desenvolvimento Regional de Seara acerca de irregularidades na Concorrência n. 001//08, para considerar procedentes os fatos noticiados

6.2. Aplicar ao Sr. Jairo Luiz Sartoretto - Secretário de Estado do Desenvolvimento Regional de Seara, CPF n. 182.652.199-20, com fundamento no art. 70, II, da Lei Complementar n. 202/2000 c/c o art. 109, II, do Regimento Interno, as multas abaixo relacionadas, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico desta Corte de Contas, para comprovar ao Tribunal o recolhimento ao Tesouro do Estado das multas cominadas, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000:

6.2.1. R$ 1.000,00 (mil reais), em face da exigência para qualificação técnica quantidades de serviços, disposta no item 7.3.2 do Edital de Licitação, considerada restritiva e que pode impedir a participação de maior número de empresas, contrariando o disposto nos arts. 3º, § 1º, I, c/c art. 30, II, da Lei (federal) n. 8.666/93 e 37, XXI, da Constituição Federal (item 2.1 do Relatório DLC);

6.2.2. R$ 800,00 (oitocentos reais), pela exigência de comprovação de aptidão mediante apresentação de no máximo 02 (dois) atestados, configurando infringência aos arts. 3º, § 1º, I, e 30, II e § 5º, da Lei (federal) n. 8.666/93 e 37, XXI, da Constituição Federal (item 2.1 do Relatório DLC);

6.2.3. R$ 800,00 (oitocentos reais), em virtude da exigência para qualificação técnica pavimentação com asfalto borracha, disposta no item 7.3.2 do Edital de Licitação, considerada restritiva e que pode impedir a participação de maior número de empresas, contrariando o disposto nos arts. 3º, § 1º, I, c/c art. 30, II da Lei (federal) n. 8.666/93 e 37, XXI, da Constituição Federal (item 2.2 do Relatório DLC);

6.3. Dar ciência deste Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, bem como do Relatório DLC/Insp.1/Div.1 n. 116/09, à Representante e ao Sr. Jairo Luiz Sartoretto - Secretário de Estado do Desenvolvimento Regional de Seara.

Esse é o relatório.

PRELIMINARES DE ADMISSIBILIDADE.

O recurso proposto como Recurso de Reexame foi autuado pela Secretaria Geral desta Corte de Contas, considerando-se tratar de processo de representação que abrange fiscalização em licitações, contratos, convênios e atos jurídicos análogos, a teor do disposto nos artigo 79 e 80 da Lei Complementar 202/2000, que determina:

Art. 79 - De decisão proferida em processos de fiscalização de ato e contrato e de atos sujeitos a registro, cabem Recurso de Reexame e Embargos de Declaração.

Art. 80. O Recurso de Reexame, com efeito suspensivo, poderá ser interposto uma só vez por escrito, pelo responsável, interessado ou pelo Ministério Público junto ao Tribunal, dentro do prazo de trinta dias contados da publicação da decisão no Diário Oficial do Estado.

No que tange aos pressupostos de admissibilidade da peça recursal, considerando o princípio da ampla defesa, o recorrente é parte legítima para o manejo do recurso na modalidade de Reexame, a propositura ocorreu de forma tempestiva posto que o Acórdão 1.119/2009, lavrado na Sessão do dia 02/09/2009, foi publicada no DOTC-e do dia 16/09/2009, e as razões recursais foram protocoladas nesta Corte de Contas no dia 22/09/2009, atendendo ao prazo de trinta dias fixado no artigo 80 da Lei Complementar 202/2000.

Uma vez preenchidos os requisitos legais, deve o recurso proposto ser admitido.

DISCUSSÃO.

O recorrente em suas razões recursais busca afastar as multas que lhe foram aplicadas, para tanto inicia a sua argumentação fazendo um breve resumo dos fatos que resultaram na aplicação das pré faladas multas salientando do seguinte modo:

a) "exigência de execução anterior de quantidades acima do necessário para cumprir a exigência de experiência na execução dos contratos";

b) 'exigência de experiência prévia em serviço de pavimentação com especificidade desnecessária e conhecimento ainda restrito as poucas empresas";

c) "comprovação de aptidão mediante apresentação de dois atestados";

Seguindo-se a este resumo o recorrente argumenta acerca do caráter geral da licitação no que tange as questões restritivas, afirmando que a decisão exarada não atentou para os argumentos defensivos, tampouco da doutrina e jurisprudência citadas, constituindo-se em análise equivocada, divorciada do entendimento predominante aceito, para a seguir argumentar sobre cada um dos fatos que resultaram em aplicação da multa.

Como a presente análise buscará examinar exaustivamente todos os aspectos da defesa na ordem em que foi apresentado, segue adiante a análise de mérito da defesa apresentada.

1. Item 6.2.1 - Licitação. Exigência de Qualificação Técnica. Limites Legais.

O estabelecimento de quantitativo mínimo para qualificação técnica em processo licitatório deve observar as características da obra, respeitando aos princípios da razoabilidade e da competitividade.

Foi aplicada multa ao recorrente em razão de constar do ato convocatório, item 7.3.2, exigência para qualificação técnica considerada restritiva à participação de um maior número de empresas em razão de estabelecer como limite uma comprovação quantitativa de prestação de serviço semelhante, em desacordo com a Lei.

As razões do entendimento que levaram o relator sugerir ao Plenário a aplicação da multa encontra-se no item 2.1 do Relatório DLC 116/09. e podem ser assim resumidas:

A exigência de comprovação conforme o Edital de execução de 70% das quantidades previstas para a obra licitada em apenas dois atestados é bastante restritiva a participação de outras empresas interessadas, considerando que a complexidade técnica exigida para realização de uma quantidade não é diferente para a realização de uma quantidade vinte ou trinta por cento inferior a exigência feita, sem que isso torne-se impedimento técnico para a execução da totalidade licitada.

O recorrente contrapõe-se ao entendimento da Diretoria Técnica por entender que o modo de agir da administração teve como viés proteger o erário e estabelecer critérios objetivos para os julgamentos das propostas.

Após transcrever o dispositivo de lei dito ofendido pela instrução, defende o recorrente o seu ponto de vista afirmando:

De clareza solar que a restrição vedada diz respeito ao comprometimento restritivo e frustrante do caráter competitivo, e das distinções, quanto ao domicílio etc.

Obviamente que tal dispositivo deve ser interpretado a luz de todo ordenamento licitatório, bem como dos princípios constitucionais vigentes, não se podendo concluir que exigência de comprovação de qualificação técnica infringe tal dispositivo, até porque, expressamente previsto no artigo 30.

Ora, segundo quer fazer crer o relatório, ilegal seria, exigir do licitante, comprove ele, já ter realizado, em outra oportunidade, ao menos 70% dos quantitativos mínimos exigidos para a obra.

Neste contexto, tratando-se a licitação de construção de edifício de 10 andares, deveria o licitante, comprovar que já executou semelhante tarefa em construção de no mínimo 07 andares.

Evidente que, deverá o edital, através de critérios objetivos dizer quais as condições o licitante deverá preencher, senão vejamos:

[...]

Portanto, a ausência de critérios objetivos é que deve ser rechaçada punida, repudiada e não a presença dela.

No caso em apreço, conclui o relatório que exigência de qualificação técnica no percentual de 70% dos quantitativos licitados é ilegal.

Segundo tal entendimento, desnecessária, ilegal e restritiva tal condição, já que, uma empresa que teria, em outra oportunidade pavimentado, qualquer metragem, independentemente da quantidade estaria apta.

[...]

Ora a prosperar tais entendimentos, inócuo seria a exigência de qualificação técnica, já que, não podendo limitar, exigir similitude com a obra licitada, bastaria comprovar que executou serviços daquela natureza.

[...]

Sabendo que a administração pública está subordinada aos princípios constitucionais da economicidade, legalidade, eficiência entre outros, necessários que os entes públicos, no momento de licitarem contratação de serviços e outros de natureza diversa, exijam dos participantes, comprovação de que dispõe de condições técnicas para realizar o mister que se propõe.

Assim, aquele que participa de licitação para construção de obra deve comprovar que já o fez em outra oportunidade, como características semelhantes, tendo realizado o trabalho a contento, o que o credencia, para tarefa de igual natureza.

No caso presente, a controvérsia restringe-se a saber, se quem executou, independentemente da quantidade, características, os serviços exigidos no edital, detém qualificação para executar a obra licitada.

[...]

No caso em apreço o recorrente foi punido exatamente por cumprir a lei, isto é exigir do licitante qualificação técnica em obra de características similares a licitada ou seja, em quantitativos de até 70% do total licitado.

Flagrante o equivoco, e, certamente merecerá desta corte o tratamento adequado.

De pronto convém salientar que o Tribunal de Contas não aplicou a multa em exame por haver o edital de licitação em seu item 7.3.2 fixado um limite mínimo de comprovação de execução de trabalho semelhante a obra licitada, mas sim, por entender que o percentual mínimo estabelecido, tendo em vista a especificação da obra a ser contratada configuraria restrição a participação de interessados por não ser razoável.

A questão portanto não está afeita a fixação de uma quantidade mínima, mas sim na razoabilidade dos valores estabelecidos em razão da natureza da obra licitada.

Todo o arcabouço doutrinário e jurisprudêncial trazido pelo recorrente em suas razões recursais carreiam para o entendimento de que a exigência de quantidades mínimas com comprovação de qualificação técnica, constitui-se regra aceita, porém da mesma forma, todos os entendimentos esposados ressaltam para a questão da razoabilidade na fixação da quantidade a ser estabelecida.

É justamente este viés que conduziu a instrução a sugerir aplicação da multa em exame, uma vez que entendeu ser o índice de 70% inadequado considerando-se a natureza do serviço a ser contratado, uma vez que a empresa que já tenha executado por exemplo, o correspondente a 40% em obra semelhante, dispunha de todas as qualificações técnicas para a execução da obra licitada.

Plausível portanto o argumento utilizado pela instrução quando afirma:

a) A tecnologia para executar 4.000t. ou 9.210t de CBUQ é a mesma, ou seja, usinagem do CBUQ em usina de asfalto, transporte em caminhão basculante, espalhamento com vibro-acabadora e compactação com rolos de chapa e de pneus.

b) O equipamento necessário, para os dois casos pode ser o descrito no Anexo nº 02 do Edital, como Relação de Equipamento Mínimo, destacando-se no caso dos principais equipamentos, é exigida a utilização de usina de asfalto com capacidade de 80-100 t/h, vibro-acabadora com capacidade de 100 t/h, 2 rolos lisos vibratórios, 2 rolos de pneus de pressão variável e 8 caminhões basculantes com 10m³ da capacidade.

c) Portanto, nos dois casos a única diferença seria o tempo de execução do serviço.

Como se pode observar, a experiência de ter executado uma quantidade inferior a 70% da quantidade a ser executada na obra, não quer dizer que a empresa não tem capacidade técnica de executar o serviço.

Este fato contraria o disposto no art. 3º, §1º, inciso I c/c art. 30, inciso II da Lei Federal nº 8.666/93 e art. 37, XXI, da Constituição Federal, podendo ser considerada restritiva e portanto, impedir a participação de um maior número de empresas.

Consoante a este entendimento colhe-se na doutrina os ensinamentos de Pedro Jorge Rocha de Oliveira conforme segue1:

A execução das quantidades mínimas definidas para determinado objeto, conforme as características da obra podem ser facilmente demonstradas com mais de um atestado técnico, uma vez que, muitas vezes, são serviços repetitivos e a participação da quantidade exigida em nada interfere na capacidade técnica de quem os tenha executado.

Assim, se há exigência para comprovação, por exemplo, de 10.000m (objeto 20.000m) de pavimentação asfáltica, não há qualquer problema se essa extensão tenha sido, por exemplo, executada em 02 dois contratos (02 atestados) de 5.000 ou em um de 7.000m somados a outro de 3.000m, pois quem faz 3.000, faz 5.000 ou faz 10.000m.

Colhe-se ainda na doutrina outras manifestações que entende em iguais circunstâncias ser a exigência conforme feita no Edital em exame indevida, senão vejamos o que aduz a respeito Joel de Menezes Niebuhr2, após mencionar o afirmado por Marçal Justen que a regra a ser observada quanto a exigência deverá ser encontrada a partir da natureza do objeto licitado:

Por conseguinte, é necessário avaliar as peculiaridades de cada caso, partindo do pressuposto, em prol do princípio da competitividade, de que em regra é permitido somar os quantitativos havidos em mais de um atestado desde que a natureza e o modo de execução do serviço do objeto licitado não seja afetado em decorrência do volume utilizado em cada contrato.

Por exemplo, em licitações para a pavimentação de rodovias, a complexidade do serviço e a técnica empregada não dependem da dimensão do objeto do contato. Quem oferece 5.000 (cinco mil) toneladas de CBUQ (concreto betuminoso usinado à quente) em um contrato, e outras 5.000 (cinco mil) toneladas de CBUQ em outro, comprova capacidade técnica para oferecer 10.000 (dez mil) toneladas.

Acerca do tema temos ainda decisão prolatada pelo TCU3 onde ficou registrado que:

O art. 30 da Lei 8.666 de 1993, e seu inciso II dizem, entre outras coisas, que a exigência para a qualificação técnica deve ser compatível em quantidades. Portanto é possível se exigir quantidades, desde que compatíveis. Por compatível, se entende se assemelhada, não precisa ser idêntica. A semelhança depende da natureza técnica da contratação pois, para certas coisas, quem faz uma, faz duas. Para outras coisas, a capacidade para fazer uma não garante capacidade para fazer duas. Em abstrato, é lógico que a exigência de quantidade não pode superar a estimativa na contração, sendo aí evidente o abuso.

Portanto, a regra a ser seguida em situações análogas a ora em exame deve ser a de prevalência dos princípios da competitividade e da razoabilidade o que leva ao entendimento de que persiste as razões para a aplicação da multa conforme decidido pelo Acórdão 1.190/2009.

Assim sugere-se a manutenção da multa aplicada.

2. Item 6.2.2 - Licitação. Qualificação Técnica. Atestado. Limitação.

Em face da natureza do objeto licitado, a limitação de apresentação de atestados para comprovação da capacidade técnica operacional dos interessados, constitui ofensa ao princípio da competitividade.

No item 6.2.2 do acórdão recorrido foi aplicada multa ao recorrente por haver o Edital do processo licitatório feita a exigência de comprovação para a qualificação técnica limitado a dois (02) atestados para seis serviços diferentes.

Tal limitação no entender do Plenário constitui-se em impedimento da participação de interessados, ferindo ao princípio da competitividade, em afronta ao disposto no art. 3º, § 1º, I, e 30, II e § 5º, da Lei 8.666/93.

A decisão vem assentada na narrativa da instrução, quando em seu relatório conclusivo afirma:

Quanta à limitação da comprovação em apenas dois atestados, a Instrução não aventou a hipótese de comprovação da execução de um serviço em "n" atestados, mas sim considerou a permissão de apresentação de apenas 2 (dois) atestados para a comprovação de 6 (seis) serviços diferentes, três de terraplanagem e três de pavimentação. Esta limitação exclui da licitação empresas que executaram os serviços em mais de dois contratos, fato que não significa estarem sem condições de executar os serviços em conjunto.

Em sua defesa o recorrente reafirma que a exigência editalícia busca atender a necessidade de comprovação de execução anterior de obra com características similares, consoante a doutrina e a jurisprudência sobre o tema.

Para tanto afirma:

Ora como poderia o interessado comprovar "objeto idêntico", com número ilimitado de atestado?

[...]

Ora insignes julgadores, evidente que a punição aplicada ao recorrente, decorre, exatamente do cumprimento de suas obrigações como administrador público, do cumprimento das recomendações e imposições elementares, devidamente ensinadas pela doutrina e jurisprudência.

A prevalecer tal penalidade, impossível será impor em edital quaisquer limitações, restrições de ordem técnica, financeira etc, e que tenha por objetivo, exatamente assegurar a qualidade da obra, sua segurança etc.

Permitir que o licitante atendesse a qualificação técnica exigida com número ilimitado de atestados, implicaria em total ineficácia da precaução do legislador, culminando em ausência da necessária similitude entre a obra atestada e a licitada.

Oportuno colacionar ensinamentos do ilustre Marçal Justen, regularmente propalado pelo recorrente em suas alegações de defesa, quando aquele autor manifesta a questão do somatório de atestados, afirmando:

Questão tradicional é a do somatório dos atestados, Surge quando um licitante não conseguir evidenciar, em uma única contratação, o preenchimento dos requisitos exigidos no ato convocatório. Pretende, então, somar diferentes obras e serviços. Questiona-se a possibilidade e parece que o problema tem sido mal colocado.

A qualificação técnica operacional consiste na execução anterior de objeto similar àquele licitado é que determina a possibilidade ou não de somatório. Dá-se um exemplo: uma ponte de mil metros de extensão não é igual a duas pontes de quinhentos metros. Muitas vezes, a complexidade do objeto licitado deriva de certa dimensão quantitativa. Nessas casos, não terá cabimento o somatório de contratações anteriores. Já haverá outros casos em que a questão não reside numa contração única, mas na experiência de executar certo quantitativo, ainda que em oportunidades sucessivas. Enfim, a solução deverá ser encontrada a partir da natureza do objeto licitado.4

Por obvio que o objeto da licitação em tela se enquadra na segunda hipótese tratada pelo mestre, ou seja, trata-se de obra que permite o somatório de comprovação de execução de obras, podendo assim, ser objeto de um número indeterminado de atestados, sem que com isso comprometa a capacidade técnica operacional do interessado.

Ademais, convém ressaltar aqui que a multa não tem com razão de sua aplicabilidade tão somente o fato da previsão limitada de atestado, mas vai um pouco mais além, uma vez que decorre de haver o Edital exigido o limite de dois atestados para seis espécies de serviço a ser operacionalizado.

E neste contexto que se caracteriza a limitação a participação de interessados, uma vez que, havendo interessados que mesmo tendo executados as quantidades exigidas, mas tenha prestados cada um dos serviços em contratos separados, não poderia participar por não poder comprovar a sua capacidade técnica operacional em face do número limitado de atestados exigidos pelo ato convocatório.

Caracterizada portanto a ofensa ao princípio da competitividade, em face da exigência limitadora imposta no Edital de Licitação.

Sugere-se a manutenção da multa aplicada.

3. Item 6.2.3 - Capacidade Técnica. Exigência de Experiência Prévia em Material. Desnecessidade.

A especificidade no edital de experiência prévia em determinado material, é desnecessária quando não configura diferença técnica capaz de alterar substancialmente a execução do serviço licitado.

A multa decorrente do item 6.2.3 do acórdão recorrido advém do entendimento esposado pela instrução de que a exigência feita no edital de licitação de prévia experiência da empresa interessada em pavimentação asfáltica com borracha na composição do CBUQ, é desnecessária, constituindo-se em uma especificidade que resulta no cerceamento da participação de interessados.

A questão e eminentemente técnica, refoge portanto do aspecto jurídico, e foi assim abordada pela Diretoria de Controle, pelo Auditor Fiscal de Controle Externo, Engº Ricardo Caruso Mac-Donald:

A afirmação que os procedimentos de compactação são diferentes para os dois tipos de CBUQ é totalmente descabida. Os dois tipos de misturas asfálticas são compactadas com o mesmo equipamento, da mesma forma, só diferenciando na temperatura de compactação da massa e sendo controlada com os mesmos ensaios.

Finalmente os ensaios relativos à qualidade do ligante asfáltico é que são diferentes dos usuais, porém estes ensaios são realizados pelas empresas fornecedoras do ligante asfáltico com borracha, uma vez que os equipamentos necessários ainda não são comuns no meio rodoviário, sendo que em Santa Catarina nenhuma empresa consultora, construtora ou órgão rodoviário possui ainda equipamento ou conhecimento técnico para realização dos ensaios.

Realmente existem diferenças, porém pequenas, na execução de CBUQ com asfalto borracha do CBUQ convencional, mas que de maneira alguma é obstáculo para uma empresa com experiência em pavimentação asfáltica.

O recorrente sustenta em suas razões de recurso exatamente o contrário do entendimento da Diretoria de Controle, trazendo como argumento transcrições de estudos acadêmicos elaborados sobre o composto asfáltico com borracha, argumentando que a exigência se faz necessária para a garantia do erário e o bem andamento da obra licitada.

A análise do edital, especificamente o constante do anexo 02, (fls. 55) que estabelece a relação de equipamento mínimo necessário para o desempenho do serviço a ser contratado, empresta razão a afirmação feita pela Diretoria de Controle, uma vez que não se vem em tal relação nenhuma referência a equipamentos especiais para a execução de CBUQ com borracha.

O rol de equipamentos mínimos conduz a acreditar que a empresa que disponha de tais equipamentos detém a capacidade de execução da obra licitada, não importando para tanto a experiência na compactação asfáltica especifica.

Assim, sugere-se a manutenção da multa aplicada.

CONCLUSÃO

Ante o exposto, sugere-se ao relator que em seu Voto propugne ao Pleno para:

1) Conhecer do Recurso de Reexame, nos termos do art. 80 da Lei Complementar nº 202/2000, interposto contra o Acórdão 1.190/2009, proferido na Sessão Ordinária do dia 02/09/2009, no Processo REP - 09/00024747, e, no mérito, negar-lhe provimento para:

2) Manter na íntegra os termos do acórdão recorrido;

3) Dar ciência desta Decisão, bem como do Parecer e Voto que a fundamentam ao Sr. Jairo Luiz Sartoretto, Secretário de Estado da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Regional de Seara.

  ELÓIA ROSA DA SILVA

Consultora Geral


1 OLIVEIRA. Pedro Jorge Rocha de. Obras Públicas. Tirando suas Dúvidas. Ed. Forúm. Belo Horizonte/MG. 2010. p. 72.

2 NIEBUHR. Joel de Menezes. Licitação Pública e Contrato Administrativo. Ed. Zenite. Curitiba. 2008. p. 255.

3 TCU. Decisão nº 1.090/2001 - Plenário.

4 JUSTEN FILHO, Marçal, Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 10 ed. São Paulo. Dialética, 2004, p. 326.