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Servidor público. Remuneração.
Revisão geral anual da remuneração.
A revisão geral
anual representa recomposição do poder aquisitivo da moeda.
Reajuste de remuneração.
O reajuste
ultrapassa os índices inflacionários, reprentando acréscimo no vencimento.
Piso salarial.
Existindo plano de
cargos e salários vinculando o vencimento ao piso salarial, tanto a revisão
geral anual, como o reajuste incidirão sobre o piso.
Sr. Consultor,
1. INTRODUÇÃO
Trata-se
de
Na qualidade de Prefeito do Município
de Lages venho por intermédio deste solicitar consulta com relação a seguinte
situação:
Anualmente, a municipalidade
concede reajuste salarial aos seus servidores, como também fixa o piso
salarial dos mesmos. O piso salarial tem sido fixado em razão do aumento do
salário mínimo de modo que não existem vencimentos inferiores ao mínimo
nacional.
O piso salarial em vigor foi
fixado no mês de janeiro do corrente ano através da Lei nº 3635/2010, sendo no
valor de R$ 520,00 (quinhentos e vinte reais).
Por outro lado, o reajuste anual
foi concedido pela Lei nº 3639/2010 de 01/03/2010 no percentual de 5% (cinco
por cento) sobre os valores percebidos em dezembro de 2009 (art. 1º),
vigorando a partir de março de 2010.
Percebe-se que o piso salarial e
o reajuste são institutos distintos.
Feito este esclarecimentos,
passamos a consulta.
O Município de Lages, através da
Lei Complementar nº 296 de 17/09/2007 implantou um novo Plano de Cargo,
Carreiras e Vencimentos para seus servidores.
Nesta nova estruturação dispôs
sobre a matriz hierárquica da seguinte forma:
Art. 15 – A matriz hierárquica
dos cargos definidos nesta lei é estruturada em padrões de vencimento, classes
e níveis de capacitação de acordo com os ambientes organizacionais e as
especialidades.
Ainda, definiu no art. 16 o
padrão de vencimento como sendo:
[...] a posição do servidor
público municipal, dentro da classe e do respectivo nível de capacitação, que
permite identificar a situação do mesmo na estrutura hierárquica e de
vencimentos do cargo no qual está investido.
Parágrafo único – Os padrões de
vencimento, os índices, e os respectivos valores são os constantes no ANEXO
VII.
Através do Anexo VII temos a
tabela de padrão de vencimento a qual está dividida em padrão/índice/valor. O
valor constante no padrão ‘01’ refere-se ao piso salarial da época em que a
lei entrou em vigor.
Para se chegar aos valores dos
demais padrões de vencimento constantes da tabela em comento utilizou-se como
base de cálculo o valor do padrão 01, ou seja, o piso salarial da época,
multiplicando-o pelos demais índices.
Anualmente, é realizado o
reajuste dos vencimentos aplicando-se o percentual determinado em lei ao
vencimento recebido pelo servidor, independentemente do seu enquadramento na
tabela do Anexo VII, pois este reajuste (5%) é um percentual único a todos os
servidores.
Assim, pergunta-se: a forma como
está sendo aplicado o reajuste salarial é legal? Ou a forma adequada seria
multiplicar-se o percentual do reajuste pelo piso salarial, como ocorreu na
criação da tabela constante do Anexo VII apesar da Lei Complementar nº
296/2007 não especificar claramente esta forma de correção?
Para melhor elucidar este
questionamento trazemos a seguinte situação hipotética.
Servidor ‘A’ enquadrado, na
época de implementação da Lei Complementar nº 296/2007, no padrão 66, com
índice 7,98 tinha o vencimento no valor de R$ 3.112,20, pois o piso salarial
da época era de R$ 390,00.
No ano de 2009, com o devido
reajuste, este servidor ‘A’ recebia seu vencimento no valor de R$ 3.596,07.
No ano de 2010 qual a forma
correta de reajuste?
1.
Aplicação do reajuste de 5%: vencimento de R$ 3.596,07 + 5% = R$
3.775,87.
2.
Multiplicação do índice 66 pelo piso salarial fixado em 2010 – R$
520,00: R$ 3.596,07 x R$ 520,00 = R$ 4.011,03.
...
1.1
PRELIMINARES DE ADMISSIBILIDADE
Prefacialmente, cabe a análise das
formalidades inerentes às consultas, definidas no art. 104 do Regimento
Interno desta Corte de Contas (Resolução nº TC-06/2001), in verbis:
Art. 104 - A
consulta deverá revestir-se das seguintes formalidades:
I - referir-se à
matéria de competência do Tribunal;
II - versar sobre
interpretação de lei ou questão formulada em tese;
III - ser subscrita
por autoridade competente;
IV - conter
indicação precisa da dúvida ou controvérsia suscitada;
V - ser instruída
com parecer da assessoria jurídica do órgão ou entidade consulente, se
existente.
Deste modo, a seguir será visto se
presentes os requisitos de admissibilidade acima mencionados.
1.1.1
DA COMPETÊNCIA EM RAZÃO DA MATÉRIA
A
matéria versada na consulta trata de remuneração dos servidores públicos,
sendo matéria pertinente à competência desta Corte de Contas, o que legitima
este Tribunal a manifestar-se sobre o indagado, superando, assim, a
condicionante elencada no inciso I do art. 104 da Resolução nº TC-06/2001.
1.1.2 DO
OBJETO
Verifica-se
que a indagação apresentada, pelo Consulente requer o posicionamento deste
Tribunal acerca de reajuste salarial.
O artigo 104 da Res. TC nº 06/01, em
seu inciso II, estabelece que as consultas endereçadas ao Tribunal de Contas
devem versar sobre interpretação de lei ou questão formulada em tese, o que se
verifica na peça em apreço, sendo por este motivo, devido o seu conhecimento.
1.1.3 DA
LEGITIMIDADE DO CONSULENTE
A consulta em apreço tem por
subscritor o Prefeito do Município de Lages, quem, à luz do disposto no art.
103, II, da Resolução nº TC-06/2001, tem legitimidade, para a subscrição da
peça indagativa, vencendo, destarte, o requisito constante no inciso III do
art. 104 do mesmo diploma regimental.
1.1.4
DA INDICAÇÃO PRECISA DA DÚVIDA
A
questão requer a posição deste Tribunal acerca de remuneração dos servidores e
reajuste salarial, indicando de forma precisa a dúvida do consulente,
atendendo ao disposto no inciso IV do art. 104 da Resolução nº TC-06/2001.
1.1.5
DO PARECER DA ASSESSORIA JURÍDICA
A
consulta não se faz acompanhada do parecer jurídico do ente consulente,
deixando de atender o pressuposto estabelecido no inciso V do art. 104 da
Resolução nº TC-06/2001. Oportuno registrar que um Município no porte de
Lages, teria perfeitas condições de instruir a consulta com parecer jurídico e
optou em não fazê-lo, prática recorrente por parte daquela municipalidade nas
consultas enviadas a esta Casa.
Contudo,
forçoso lembrar que § 2º do art. 105 da Resolução nº TC-06/2001 possibilita o
conhecimento da consulta que deixe de atender a formalidade supracitada.
1.1.6
DO EXAME DOS PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE
Examinados
os pressupostos de admissibilidade, entende-se que possa esta Consultoria
Geral bem como o Exmo. Conselheiro Relator propugnar, preliminarmente, pelo
conhecimento da consulta.
2. ANÁLISE
Ensina Hélio Saul Mileski[1]:
Como a resposta à consulta não corresponde à decisão de nível jurisdicional do Tribunal de Contas, envolvendo julgamento ou exame de legalidade para fins de registro, mas sim o posicionamento técnico-jurídico do órgão fiscalizador sobre determinada matéria, a resposta oferecida pelo Tribunal de Contas tem caráter normativo e constitui prejulgamento da tese, mas não do fato ou caso concreto.
Nesse sentido, assim dispõe o § 3º, do art. 1º, da Lei Orgânica deste Tribunal de Contas (Lei Complementar nº 202/2000):
Art. 1º Ao Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, órgão de controle externo, compete, nos termos da Constituição e do Estado e na forma estabelecida nesta Lei:
...
§3º As decisões do Tribunal de Contas em processo de consulta, tomadas por no mínimo dois terços dos Conselheiros que o compõem, têm caráter normativo e constituem prejulgamento da tese.
Quanto ao mérito da consulta,
a dúvida repousa na forma de reajuste dos servidores. Nota-se que ora se fala
em revisão do piso, ora se fala em reajuste. Cabe então, a princípio,
diferenciar a revisão do reajuste.
O inciso X do art. 37 da
CF, reza nos seguintes termos:
A remuneração dos
servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão
ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa
em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem
distinção de índices;
O caráter anual da revisão
foi instituído pela Emenda Constitucional nº 19, 05/06/1998, antes disso havia
determinação para a recomposição da remuneração, mas sem fixação de lapso
temporal para sua concretização.
Observe-se que o texto constitucional
autoriza aumento na remuneração dos servidores públicos e nos subsídios dos
agentes políticos, enquanto que determina a revisão geral anual, donde se
conclui que revisão e reajuste são institutos distintos. Ao passo que a revisão
geral anual tem por finalidade repor as perdas financeiras ocorridas no
período, face à desvalorização da moeda, o reajuste da remuneração ou do
subsídio, significa realmente acréscimo financeiro com ganho real. A primeira
mantém o poder aquisitivo, enquanto que o segundo eleva o poder aquisitivo.
Apesar da garantia
constitucional, o que a torna obrigatória, todos os anos a revisão deve ser
fixada por lei específica, respeitando em cada caso a iniciativa privativa,
sempre na mesma data e não discriminatória, sem distinção de índices entre as
categorias de servidores.
Na esfera federal, o inciso X do art.
37 da CF é regulamentado através da Lei nº 10.331, de 18/12/2001, a qual
determina que a revisão geral seja efetivada sempre no mês de janeiro. Contudo,
faz-se necessária sempre a edição de lei específica, definindo o índice.
Neste Tribunal de Contas, a revisão
geral anual é tratada em prejulgados[2],
dos quais se cita:
Prejulgado
1686[3]
|
A revisão tem por escopo
atualizar as remunerações, mantendo-as de acordo com o poder aquisitivo da
moeda, repondo a perda inflacionária se esta restar presente. Trata-se de
direito subjetivo dos servidores e dos agentes políticos garantido pela
Constituição Federal.
Em relação ao reajuste
pode-se afirmar que são os outros acréscimos concedidos, que não a revisão, respeitando critérios
conforme já orientado em prejulgados desta Casa:
Prejulgado 1607[5] |
||
Objetivando corrigir distorções salariais e adequar as
remunerações ao grau de complexidade e responsabilidade dos cargos, nada
obsta que, mediante lei específica, a municipalidade proceda ao reajuste dos
servidores públicos por categoria funcional ou por função e com índices
diferenciados, obedecidos: |
Para
elucidar melhor a diferenciação entre reajuste e revisão geral anual, vale
citar o magistério de Hely Lopes Meirelles[6]:
Há
duas espécies de aumento de vencimentos: uma genérica, provocada pela alteração
do poder aquisitivo da moeda, à qual poderíamos denominar aumento impróprio,
por se tratar, na verdade, de um reajustamento destinado a manter o equilíbrio
da situação financeira dos servidores públicos; e outra específica, geralmente
feita à margem da lei que concede o aumento geral, abrangendo determinados
cargos ou classes funcionais e representando realmente uma elevação de
vencimentos, por se fazer em índices não proporcionais ao do decréscimo do
poder aquisitivo.
No
tocante à primeira espécie, a parte final do inc. X do art. 37, na redação da
EC 19, assegura “revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de
índices”, dos vencimentos e dos subsídios. A revisão já era prevista pela mesma
norma na sua antiga redação, que, todavia, não a assegurava. Agora, no entanto,
na medida em que o dispositivo diz que a revisão é “assegurada”, trata-se de
verdadeiro direito subjetivo do servidor e do agente político, a ser anualmente
respeitado e atendido pelo emprego do índice que for adotado, o qual, à
evidência, sob pena de fraude à Constituição e imoralidade, não pode deixar de
assegurar a revisão...
A
segunda espécie ocorre através das chamadas reestruturações, pelas quais se
corrigem as distorções existentes no serviço público, tendo em vista a
valorização profissional observada no setor empresarial, para que a
Administração não fique impossibilitada de satisfazer suas necessidades de
pessoal...
A
intelecção de que revisão e reajuste são institutos diversos, é consentânea,
pois assim já decidiu o Supremo Tribunal Federal, como se depreende da ADI nº
2.726-3[7]
e da ADI nº 3.599-1[8],
sendo que desta se extrai trecho do voto do Exmo. Ministro Carlos Britto:
Entendo
que em matéria de remuneração há apenas duas categorias ou dois institutos. Ou
o instituto é da revisão, a implicar mera reposição do Poder aquisitivo da
moeda, por isso que a Constituição no inciso X do artigo 37 fala de índices e
datas absolutamente uniformes, iguais; ou, não sendo revisão, será reajuste –
que eu tenho como sinônimo de aumento. Então, de um lado, temos ou revisão, que
não é aumento, é mera recomposição do poder aquisitivo da moeda, ou, então, aumento.
Mesmo que a lei chame de reajuste, entendo que é um aumento. Aí, sim, há uma
elevação na expressão monetária do vencimento mais do que nominal e, sim, real.
Aumento tem a ver com densificação no plano real, no plano material do padrão
remuneratório do servidor; revisão não. Com ela se dá uma alteração meramente
nominal no padrão remuneratório do servidor, mas sem um ganho real.
Restando
clara a diferença entre revisão e reajuste, passa-se à análise da questão
suscitada pelo consulente. Informa o mesmo que a municipalidade concede
anualmente reajuste salarial a seus servidores, como também fixa o piso
salarial dos mesmos. O piso salarial, segundo o consulente, “tem sido fixado em
razão do aumento do salário mínimo de modo que não existem vencimentos inferiores
ao mínimo nacional”.
A
garantia de remuneração não inferior ao salário mínimo, estendida aos
servidores públicos, como se infere do inciso IV do art. 7º, c/c § 3º do art.
39 da CF, não se refere, contudo, ao vencimento base, pois remuneração é o conjunto
constituído pela somatória do vencimento, gratificações e vantagens. Assim já
decidiu o STF:
CONSTITUCIONAL. VENCIMENTOS.
SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. SALÁRIO MÍNIMO. INCIDÊNCIA DO ABONO PARA EFEITO DE
CÁLCULO DE GRATIFICAÇÕES E OUTRAS VANTAGENS. IMPOSSIBILIDADE. I - O Plenário
desta Corte, por maioria, confirmou sua jurisprudência no sentido de que a
incidência de gratificações e outras vantagens sobre o resultado da soma do
vencimento com o abono - este utilizado para se atingir o salário mínimo - contraria
o art. 7º, IV, da CF, por implicar vinculação nele vedada. II - A garantia
do salário mínimo, a que se referem os artigos 7º, IV, e 39, § 3º, da CF,
corresponde ao total da remuneração percebida pelo servidor e não ao seu
salário-base. III - Agravo regimental improvido[9].
(grifou-se)
Por
outro lado, deve ser considerado que o salário mínimo não é referência para o
salário básico dos servidores públicos e sim limite mínimo para a remuneração
percebida. Denota-se que o piso salarial não pode ser fixado em múltiplos do
salário mínimo e este igualmente não pode ser usado como indexador de base de
cálculo de vantagens.
O
STF, por meio da Súmula Vinculante nº 04, assevera:
Salvo nos casos previstos na Constituição, o salário mínimo não pode ser usado como indexador de base de cálculo de vantagem de servidor público ou de empregado, nem ser substituído por decisão judicial.
A matéria está assentada na jurisprudência
do STF:
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. FERROVIA
PAULISTA S/A – FEPASA. ABONO CONCEDIDO AOS SERVIDORES EM ATIVIDADE. PISO SALARIAL. VINCULAÇÃO
AO SALÁRIO MÍNIMO: VEDAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE MODIFICAÇÃO DA BASE DE
CÁLCULO POR DECISÃO JUDICIAL: SÚMULA VINCULANTE N. 4 DO SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO[10].
(grifo acrescido)
Agravo regimental no recurso extraordinário. Administrativo. Equiparação
de vencimentos. Súmula 339 do STF. Vinculação ao salário mínimo.
Impossibilidade. Precedentes. 1. Pacífica a jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal no sentido de que “não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função
legislativa, aumentar vencimentos de servidores públicos, sob fundamento de
isonomia”. 2. Impossibilidade de vinculação de piso salarial a múltiplos do
salário mínimo. 3. Agravo regimental não provido[11].
(grifo acrescido)
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ADMINISTRATIVO. 2.
Equiparação de vencimentos com fundamento no princípio da isonomia: incidência
da Súmula 339[12]
do Supremo Tribunal Federal. 3. Impossibilidade de fixação do piso salarial
em múltiplos do salário mínimo. Precedentes. Agravo regimental ao qual se
nega provimento[13].
(grifou-se)
Professores do Estado do Paraná.
Piso Salarial de três salários mínimos. - Falta de prequestionamento das
questões relativas aos incisos XXXV e LV do artigo 5º da Constituição. - A
vinculação desse piso salarial a múltiplo de salários mínimos ofende o disposto
no artigo 7º, IV, da Constituição Federal. Precedentes do S.T.F. -
Inexistência de ofensa por parte do acórdão recorrido aos artigos 39, § 2º, 7º,
V e VI, e 206, V, da Constituição Federal. Recurso extraordinário conhecido
pela letra "c" do inciso III do artigo 102, da Constituição, mas não
provido[14].
(grifou-se)
Ressalte-se que a vinculação do vencimento do recorrido ao
salário-mínimo pode acarretar sérias implicações, na medida em que --- com o
aumento do mínimo --- haverá majoração do vencimento, independentemente da
existência de fontes de receitas suficientes, ficando o estado membro à mercê
da legislação federal. Ante o exposto, com base no artigo 557, § 1º, do
Código de Processo Civil, dou provimento ao recurso[15].
O Superior Tribunal de Justiça, é uníssono:
ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM
MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO
ESTADUAL. PISO SALARIAL. VALOR VINCULADO AO SALÁRIO-MÍNIMO. IMPOSSIBILIDADE. ART. 7º, INCISO IV, CF.
1.
Deve ser afastada a pretensão de servidores públicos estaduais de terem
seus vencimentos vinculados ao salário mínimo vigente no país, com fundamento
na Lei Estadual 10.054/86, sendo conveniente reafirmar que qualquer disposição
nesse sentido não foi recepcionada pelo art. 7º, IV, da Constituição Federal de
1988. Precedentes do STJ e do STF.
2. Agravo regimental não provido[16].
Deve-se
ponderar, todavia, que o consulente afirma que o piso salarial tem sido fixado
em razão do aumento do salário mínimo, mas não vincula aquele a este,
implicando em valores idênticos, mesmo porque a revisão geral anual deve ser
precedida de lei específica, não pode simplesmente ser aplicada vinculando a
determinado índice. Carece de legalidade a revisão automática do piso, em
virtude do aumento do salário mínimo.
O STF,
através da Súmula 681, firmou entendimento de que “é inconstitucional a
vinculação do reajuste de vencimentos de servidores estaduais ou municipais a
índices federais de correção monetária.” Embora trate de reajuste, o mesmo
entendimento é aplicado à revisão, pois a orientação é de que não haja revisão
ou rejuste automáticos em função de índices federais de correção monetária. A
respeito da Súmula 681 Lucas Rocha Furtado[17]
comenta:
A edição desta súmula
deveu-se ao fato de que se havia tornado comum a aprovação de leis estaduais e
municipais fixando que os salários dos seus respectivos servidores seriam
anualmente reajustados com base em determinado índice. Essas leis teriam tido o
propósito de dar efetividade à regra contida na parte final do mencionado
inciso X do art. 37 da Constituição Federal, que assegura “revisão anual,
sempre na mesma data e sem distinção de índices”. Se a revisão, nos termos da
Constituição Federal, deve ser feita anualmente, qual seria o impedimento à
adoção de determinado índice para servir de parâmetro para correção dos
vencimentos dos servidores? A resposta é simples: a necessidade de que tanto a
fixação quanto a revisão sejam fixadas em lei específica, e não por meio de lei
genérica que utilize certo índice para as futuras revisões. Não há, a rigor,
qualquer impedimento de que certo índice seja usado para definir a revisão dos
vencimentos dos servidores. Porém, para cada revisão, deverá, em cada ano, ser
aprovada lei específica. A partir dessa interpretação da Constituição, foi
elaborada a mencionada Súmula nº 681.
Se a finalidade da revisão anual é
recompor o poder aquisitivo em função da perda inflacionária no período, deve
ser aplicado índice que apure essa perda.
Não existe um
índice específico a ser adotado, ficando a critério do ente federado. Como já
ponderado em parecer desta Consultoria:
Para os fins de
revisão geral de remuneração de servidores públicos, em observância ao disposto
no artigo 37, X, da Constituição Federal, o Município pode adotar, a seu
critério, um dos índices fornecidos por entidades que analisam a
economia nacional e apuram a inflação. O índice escolhido deve ser o mesmo para
todos os beneficiários, sem quaisquer distinções.
Tal indicação não
obriga o Município a adotar um ou outro, porém seja qual for o índice
escolhido, deverá ele aplicar-se a todos os servidores e agentes políticos, ou
seja, sua aplicação será geral, incluindo na esfera Municipal o Poder Executivo
e o Legislativo, estando a distinção de índices vedada pelo inciso X do artigo
37 da Constituição Federal[18].
Apesar da não determinação de um
índice específico, os mais utilizados para a efetivação da recomposição do
poder de compra da remuneração dos servidores públicos são o INPC - Índice
Nacional de Preços ao Consumidor e o IPCA - Índice de Preços ao Consumidor
Amplo, fornecidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Este
Tribunal já firmou orientação:
Prejulgados
1163[19] |
Reformado 1. A revisão geral anual é obrigatória, nos termos do art.
37, X, da CF, com redação dada pela EC nº 19/98, constituindo-se em direito
subjetivo dos servidores públicos municipais e dos agentes políticos. |
Volvendo à indagação do consulente, questiona-se
a forma correta de reajuste, se deve o mesmo ser concedido sobre o vencimento,
conforme dispõe a Lei Municipal nº 3.639/2010, ou se deve ser atrelado ao piso,
fixado como padrão de vencimento pela Lei Complementar nº 296, de 17/09/2007 (plano
de cargos e salários).
O
sistema remuneratório dos servidores públicos é definido no Plano de Cargos e
Salários e cada ente federado tem autonomia para criá-lo, respeitando as regras
constitucionais e infraconstitucionais.
No
ensinamento de Diógenes Gasparini[20],
temos:
Como
há muito ocorria, a União, os Estados Membros, os Municípios e agora, também o
Distrito Federal, como corolário da autonomia que lhes é assegurada pelo art.
18 da Constituição da República, podem dispor sobre a organização de seus
servidores de modo muito abrangente, mediante as respectivas leis federal,
estadual, distrital e municipal, quando escolherem o regime institucional ou
estatutário para eles se ligarem. Assim, cabe-lhes regular, no que respeita a
seus servidores estatutários, a admissão, a promoção, os direitos, os deveres,
a ação e o procedimento disciplinar, as penas cabíveis e a extinção do vínculo.
Cada uma dessas entidades é, assim, autônoma para organizar se pessoal, ou,
como diz Celso Antônio Bandeira de Mello (Apontamentos, cit. P. 41), “cada uma
dessas pessoas políticas legisla para si, fixando as regras que melhor lhes
pareçam para organização e disciplina de atividade funcional de seus agentes”.
Nesse particular, só encontramos limites na Constituição Federal.
...
A
competência do Estado Membro e do Distrito Federal para organizar seu pessoal é
ampla, devendo o seu exercício observar os princípios estabelecidos na
Constituição Federal, as disposições das respectivas Constituições e as normas
nacionais relativas a servidores. Assim, nenhuma lei federal editada para organizar
os servidores federais é aplicável aos servidores públicos estaduais,
distritais e municipais. Em relação ao Município, ocorre o mesmo. Este,
atendidas as disposições constitucionais federais, as normas nacionais e as de
sua Lei Orgânica, tem liberdade para organizar seu pessoal, segundo o interesse
local. De sorte que pode elaborar a lei de seus servidores sem qualquer
ingerência das demais esferas de governo. Nem mesmo a Constituição do Estado
pode intervir no teor dessa regulamentação.
...
No exercício
da autonomia para organização do seu quadro de pessoal, o Município de Lages
criou plano de cargos e salários, o qual estabeleceu o sistema remuneratório
dos seus servidores públicos. Vejamos o art. 16 da Lei Municipal nº 296, de
17/09/2007[21]:
Art. 16 Define-se como padrão de vencimento a posição do
servidor público municipal, dentro da classe e do respectivo nível de
capacitação, que permite identificar a situação do mesmo na estrutura
hierárquica e de vencimentos do cargo no qual está investido.
Parágrafo Único - Os padrões de vencimento, os índices, e os respectivos
valores são os constantes no ANEXO VII.
Reportando-nos ao anexo VII da citada
lei complementar, percebe-se que cada padrão de vencimento possui um índice, o
qual por sua vez, é multiplicado pelo piso que tem caráter genérico, sendo
idêntico para todo quadro de pessoal. Então o que diferencia o vencimento de
cada cargo é o índice. Porém, esse é apenas um multiplicador que é atrelado ao
piso salarial. Então o vencimento depende diretamente do piso.
O
critério adotado no Município de Lages, vinculando o vencimento ao piso, não é
padrão em todos os planos de cargos e salários. Os servidores públicos da
União, por exemplo, têm fixado o vencimento básico para cada cargo que depende
da posição em que se encontra na tabela de remuneração, não há vinculação ao
piso[22].
Entretanto,
ambas as modalidades estão escorreitas, posto que vencimento tem acepção
estrita e corresponde à retribuição pecuniária a que faz jus o servidor pelo
efetivo exercício do cargo. É igual ao padrão
ou valor de referência do cargo fixado em lei.
Situação
assemelhada ao Município de Lages é encontrada no quadro de pessoal, cargos,
funções e vencimentos dos servidores deste próprio Tribunal de Contas, onde o
vencimento do cargo é vinculado ao piso[23].
Cada cargo, dependendo do nível e referência, possui um índice que é o fator
multiplicado pelo piso de vencimento, este último idêntico para todos os
cargos. Assim, a revisão geral anual e o reajuste incidem sobre o piso de vencimento,
critério este já determinado em lei[24].
Desta
feita, o que se deve esclarecer ao consulente é que tanto a revisão, como o
reajuste serão aplicados no piso salarial e repercutirão diretamente no
vencimento. No momento do reajuste há de ser verificado o piso vigente à época.
Oportuno
ressaltar, por fim que o plano de cargos, carreiras e vencimentos foi
reestruturado por meio de lei complementar e a lei ordinária que conceder a
revisão ou o reajuste não tem o condão de alterá-la.
Consoante
todo explanado na presente consulta, será sugerida a alteração do Prejulgado
1686 para inclusão da resposta proposta nos seguintes termos:
Existindo plano de cargos e salários, vinculando o vencimento
do respectivo cargo ao piso salarial do ente, tanto a revisão geral anual, como
o reajuste, incidirão sobre o piso.
3. CONCLUSÃO
a) A revisão corresponde à recuperação das perdas inflacionárias a que estão
sujeitos os valores, em decorrência da diminuição, verificada em determinado
período, do poder aquisitivo da moeda, incidente sobre determinada economia;
b) O caráter geral da revisão determina a sua concessão a todos os
servidores e agentes políticos de cada ente estatal, abrangendo todos os
Poderes, órgãos e instituições públicas;
c) O caráter anual da revisão delimita um período mínimo de concessão, que é
de 12 (doze) meses, podendo, em caso de tardamento, ser superior a este para
incidir sobre o período aquisitivo;
d) O índice a ser aplicado à revisão geral anual deve ser único para todos
os beneficiários, podendo a porcentagem ser diferente, de acordo com o
período de abrangência de cada caso;
e) A revisão geral anual sempre na mesma data é imposição dirigida à
Administração Pública, a fim de assegurar a sua concessão em período não
superior a um ano, salvo disposição constitucional adversa;
f) Existindo
plano de cargos e salários, vinculando o vencimento do respectivo cargo ao
piso salarial do ente, tanto a revisão geral anual, como o reajuste,
incidirão sobre o piso.
2. A única forma autorizada pelo ordenamento jurídico para se promover a
majoração do subsídio dos Vereadores durante a legislatura é a revisão geral
prevista na parte final do inciso X do art. 37 da Constituição Federal, que
deve ocorrer sempre na mesma data da revisão anual da remuneração dos
servidores públicos municipais, e sem distinção de índices, desde que a lei
específica que instituir a revisão geral anual também contenha previsão de
extensão aos agentes políticos.
3. REVOGADO
4. A iniciativa de lei para a revisão geral anual da remuneração dos
servidores municipais e dos subsídios dos agentes políticos é de competência
exclusiva do Chefe do Poder Executivo, configurando-se o ato do Poder
Legislativo que iniciar o processo legislativo com este objetivo como
inconstitucional por vício de iniciativa.
Auditor Fiscal
de Controle Externo |
De Acordo
Coordenadora |
Consultor Geral |
[1] MILESKI, Hélio Saul. O Controle da Gestão Pública. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 362
[2] Prejulgados 859, 1153, 1163, 1203, 1310, 1428, 1499, 1531, 1544, 1565, 1686 e 2061
[3] Prejulgado reformado pelo Tribunal Pleno em sessão de 19.07.2010, mediante a Decisão nº 3093/2010 exarada no Processo ADM-07/00576487.
[4]
Processo:CON-00/04299108. Parecer: COG-541/00. Decisão: 4029/2000.
Origem:Fundação Universidade do Estado de Santa Catarina – UDESC. Relator:
Auditor José Carlos Pacheco. Data da Sessão: 13/12/2000. Data do Diário
Oficial: 22/03/2001 |
[5] Processo: CON 04/04684700. Parecer
COG-294/2004. Decisão: 3814/2004. Origem: Prefeitura Municipal de Pedras
Grandes. Relator: Conselheiro José Carlos Pacheco. Data da sessão: 24/11/2004.
DOE: 04/03/2005.
[6] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São
Paulo: Malheiros, 2010, 36ª ed., p. 513.
[7] ADI 2.726-3 – Distrito Federal.
Relator: Ministro Mauricio Correa. Publicação: D.J. 29/08/2003.
[8] ADI 3.599-1 – Distrito Federal.
Relator: Ministro Gilmar Mendes. Publicação: D.J. 14/09/2007.
[9]RE 497222 AgR / RN. Relator(a): Min. Ricardo Lewandowski. Julgamento: 05/05/2009 Órgão Julgador: Primeira Turma. Publicação DJe-05/06/2009.
[10] AI 700945 AgR / SP. Ag.Reg. no Agravo de Instrumento. Relatora: Min. Cármen Lúcia.Julgamento: 08/02/2011. Órgão Julgador: Primeira Turma. Publicação: DJe-042. Divulgação: 02-03-2011. Public: 03-03-2011.
[11]RE 431427 AgR / CE. AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. Relator: Min. DIAS TOFFOLI. Julgamento: 19/10/2010. Órgão Julgador: Primeira Turma.Publicação: DJe- 14-03-2011
[12] Súmula 339: NÃO CABE AO PODER
JUDICIÁRIO, QUE NÃO TEM FUNÇÃO LEGISLATIVA, AUMENTAR VENCIMENTOS DE SERVIDORES
PÚBLICOS SOB FUNDAMENTO DE ISONOMIA
[13]RE 524020 AgR / CE. AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO.Relator: Min. GILMAR MENDES. Julgamento: 28/09/2010. Órgão Julgador: Segunda Turma. Publicação: DJe-15/10/2010. No mesmo sentido: RE 467011 AgR / CE. AG.REG.NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. Relatora: Min. CÁRMEN LÚCIA. Julgamento: 15/09/2009. Órgão Julgador: Primeira Turma. Publicação: DJe-16/10/2009
[14] RE 273205 / PR. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. Relator: Min. MOREIRA ALVES. Julgamento: 26/02/2002. Órgão Julgador: Primeira Turma. Publicação: DJ 19/04/2002. No mesmo sentido: RE 288189 / PR. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. Relator: Min. MOREIRA ALVES. Julgamento: 16/10/2001. Órgão Julgador: Primeira Turma. Publicação: DJ 16/11/2001.
[15] RE 351323/PA.
Relator: Min. EROS GRAU. Julgamento: 12/05/2005. Publicação: DJ 13/06/2005.
[16] AgRg no RMS 16239/GO. Relator: Min. HÉLIO QUAGLIA BARBOSA. Julgamento: 04/05/2006. Órgão Julgador: Sexta Turma. Publicação: DJ 26/06/2006.
[17] FURTADO, Lucas Rocha. Curso de Direito Administrativo. Belo
Horizonte: Fórum, 2010, p. 947.
[18] Parecer COG-388/2005 da lavra do
Auditor Fiscal de Controle Externo Hamilton Hobus Hoemke. Processo: CON
05/01027459.
[19] Processo: CON 02/00394339. Parecer:
COG-229/2002. Decisão: 979/2002. Origem: Câmara Municipal de Guaraciaba.
Relator: Auditor Clóvis Mattos Balsini. Data da sessão: 27/05/2002. DOE:
19/07/2002. Item 4 reformado pelo Tribunal Pleno em 19.12.2007, mediante a
Decisão nº 4194/2007, exarada nos autos do Processo CON-07/00337652.
[20] GASPARINI, Diógenes. Direito
Administrativo. São Paulo: Saraiva, 2007, 12ª ed., p. 173/174.
[21] Dispõe sobre a criação e
transformação de cargos na administração direta e indireta, reestrutura o plano
de cargos, carreiras e vencimentos dos servidores públicos municipais de Lages,
instituído pela Lei 1.575, de 11/10/1990 e dá outras providências.
[22]Informação obtida em
www.servidor.gov.br/publicacoes.
[23] Lei Complementar nº 255, 12/01/2004,
alterada pela Lei Complementar nº 496, de 26/01/2010.
[24] Art. 1º da Lei Complementar nº 496,
26/01/2010.