Processo
nº: |
Fls. 00 |
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Unidade
Gestora: |
Câmara Municipal de Joinville |
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Interessado: |
Odir Nunes da Silva |
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Assunto:
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Revisão Geral Anual para servidores do
Poder Legislativo em caso de omissão do Poder Executivo |
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Parecer
Nº: |
COG - 227/2011 |
Revisão geral anual. Lei específica.
Iniciativa da lei.
A
revisão geral anual da remuneração dos servidores da Câmara Municipal e do
subsídio dos vereadores, neste último caso, se houver limite conforme arts.
29, VI e 37, XI da Constituição Federal, poderá ser realizada através de lei
de iniciativa do Poder Legislativo, sendo aplicado o mesmo índice de correção
para servidores e vereadores.
Reajuste e revisão geral anual. Dedução de
percentual.
A
superveniência de revisão geral anual deve deduzir o percentual anteriormente
concedido aos servidores e membros do Poder Legislativo para repor perdas
inflacionárias dentro do mesmo período.
Revisão geral anual. Índice inferior ao
oficial. Pagamento de diferenças. Prejulgado 1499.
Em
havendo precedente sobre o assunto objeto da consulta, deve-se remeter cópia
do respectivo prejulgado ao consulente.
Sr. Consultor,
1. INTRODUÇÃO
Trata-se de
...
1
– É possível este Poder Legislativo conceder, através de lei de sua iniciativa,
revisão anual dos vencimentos de seus servidores, na data-base prevista no
estatuto dos servidores do Município (art. 226, da Lei Complementar nº 266/08,
cópia anexa), em percentual não superior à variação do índice utilizado a cada
ano (INPC), diante da recusa do Poder Executivo municipal em deflagrar o
processo de revisão geral anual?
1
– Em desdobramento à indagação acima, pode o Legislativo conceder revisão em
percentual inferior à variação do índice oficial supracitado e complementar a
revisão dos vencimentos de seus servidores após a edição da lei de revisão
geral anual, mediante a Fls.
00
...
Juntou-se
tão somente cópia[1] de
parte da Lei Complementar Municipal nº 266/2008, especificamente a página que
contém o art. 226, mencionado pelo consulente. Nada mais foi juntado.
É o
breve relatório.
1.1 PRELIMINARES DE ADMISSIBILIDADE
Prefacialmente, cabe a análise das formalidades inerentes às consultas, definidas no art. 104 do Regimento Interno desta Corte de Contas (Resolução nº TC-06/2001), in verbis:
Art. 104 - A consulta deverá
revestir-se das seguintes formalidades:
I - referir-se à matéria de
competência do Tribunal;
II - versar sobre interpretação
de lei ou questão formulada em tese;
III - ser subscrita por
autoridade competente;
IV - conter indicação precisa da
dúvida ou controvérsia suscitada;
V - ser instruída com parecer da
assessoria jurídica do órgão ou entidade consulente, se existente.
Os requisitos de
admissibilidade foram atendidos em parte. Trata-se de matéria afeta ao
exercício das atribuições do TCE, o objeto da consulta pode ser abordado como
questão em tese, foi subscrita por autoridade competente e houve indicação
precisa da dúvida.
A consulta não se faz
acompanhada do parecer jurídico da Câmara Municipal, deixando de atender o
pressuposto estabelecido no inciso V do art. 104 da Resolução nº TC-06/2001. Oportuno
registrar que a Câmara Municipal de Joinville teria perfeitas condições de
instruir a Consulta com parecer jurídico, devido à estrutura que detém, porém,
optou em não fazê-lo. Contudo, forçoso Fls.
00
2. ANÁLISE
Preliminarmente, é importante registrar que como o
processo de consulta não envolve julgamento ou exame de legalidade para fins de
registro por este Tribunal de Contas, conforme leciona Hélio Saul Mileski, a
resposta ora oferecida não constitui prejulgamento do fato ou caso concreto,
mas apenas o prejulgamento da tese apresentada pelo consulente.
Ensina Hélio Saul Mileski[2]:
Como a resposta à consulta não
corresponde à decisão de nível jurisdicional do Tribunal de Contas, envolvendo
julgamento ou exame de legalidade para fins de registro, mas sim o
posicionamento técnico-jurídico do órgão fiscalizador sobre determinada
matéria, a resposta oferecida pelo Tribunal de Contas tem caráter normativo e
constitui prejulgamento da tese, mas não do fato ou caso concreto.
Nesse sentido, assim dispõe o § 3º, do art. 1º, da Lei
Orgânica deste Tribunal de Contas (Lei Complementar nº 202/2000):
Art. 1º Ao Tribunal de Contas do
Estado de Santa Catarina, órgão de controle externo, compete, nos termos da
Constituição e do Estado e na forma estabelecida nesta Lei:
[...]
§3º As decisões do Tribunal de
Contas em processo de consulta, tomadas por no mínimo dois terços dos
Conselheiros que o compõem, têm caráter normativo e constituem prejulgamento da
tese.
Quanto à matéria perquirida
na consulta, refere-se à revisão geral anual, a qual está assegurada no inciso
X do art. 37 da Constituição Federal, nos seguintes termos:
Fls. 00
O texto
constitucional autoriza o aumento da remuneração e do subsídio, ao mesmo tempo
em que assegura a revisão geral anual para ambos.
Faz-se
pertinente diferenciar revisão geral anual de aumento de vencimento. A primeira
é obrigatória e trata-se de um direito subjetivo dos servidores públicos e dos
agentes políticos, tendo por finalidade repor as perdas financeiras ocorridas
no período de um ano, face à desvalorização da moeda. Já o aumento real da
remuneração, significa realmente acréscimo financeiro, elevando o poder
aquisitivo e não apenas mantendo-o como na revisão.
Para diferenciar a
revisão do aumento, recorremos ao magistério de Hely Lopes Meirelles[3]:
Há
duas espécies de aumento de vencimentos: uma genérica, provocada pela alteração
do poder aquisitivo da moeda, à qual poderíamos denominar aumento impróprio,
por se tratar, na verdade, de um reajustamento destinado a manter o equilíbrio
da situação financeira dos servidores públicos; e outra específica, geralmente
feita à margem da lei que concede o aumento geral, abrangendo determinados
cargos ou classes funcionais e representando realmente uma elevação de
vencimentos, por se fazer em índices não proporcionais ao do decréscimo do
poder aquisitivo.
No
tocante à primeira espécie, a parte final do inc. X do art. 37, na redação da
EC 19, assegura “revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de
índices”, dos vencimentos e dos subsídios. A revisão já era prevista pela mesma
norma na sua antiga redação, que, todavia, não a assegurava. Agora, no entanto,
na medida em que o dispositivo diz que a revisão é “assegurada”, trata-se de
verdadeiro direito subjetivo do servidor e do agente político, a ser anualmente
respeitado e atendido pelo emprego do índice que for adotado, o qual, à
evidência, sob pena de fraude à Constituição e imoralidade, não pode deixar de
assegurar a revisão...
A
segunda espécie ocorre através das chamadas reestruturações, pelas quais se
corrigem as distorções existentes no serviço público, tendo em vista a
valorização profissional observada no setor empresarial, para que a
Administração não fique impossibilitada de satisfazer suas necessidades de
pessoal...
Fls. 00
O
intuito da revisão é repor as possíveis perdas financeiras ocorridas no período
de um ano em virtude da desvalorização da moeda frente à inflação, se esta
restar presente.
Com
essas breves colocações, passaremos a analisar as indagações trazidas à lume
pelo consulente.
De
início, é apresentada a seguinte dúvida:
É
possível este Poder Legislativo conceder, através de lei de sua iniciativa,
revisão anual dos vencimentos de seus servidores, na data-base prevista no
estatuto dos servidores do Município (art. 226, da Lei Complementar nº 266/08,
cópia anexa), em percentual não superior à variação do índice utilizado a cada ano
(INPC), diante da recusa do Poder Executivo municipal em deflagrar o processo
de revisão geral anual?
Como
dito alhures, por previsão constitucional, a revisão da remuneração e do
subsídio deve ser efetuada sempre na mesma data, ou seja, a revisão geral anual
fica vinculada à data base estipulada em lei, de livre arbítrio nos diversos
entes.
A
dúvida apresentada pelo consulente, contudo, faz referência à omissão por parte
do Chefe do Poder Executivo ante à chegada da data base. Diante da lacuna
deixada pelo Poder Executivo, cogita a possibilidade do Poder Legislativo
iniciar projeto de lei com a finalidade de fixar índice revisional para os seus
próprios servidores.
O
ponto crucial a ser esclarecido é que os servidores públicos e os agentes
políticos[4]
têm direito, assegurado pela Constituição Federal, à revisão da respectiva
remuneração ou subsídio uma vez ao ano, sob pena de violação de direito
subjetivo.
Fls. 00
Em
observância ao Princípio da Separação de Poderes, cada Poder tem autonomia para
estruturar a carreira do respectivo funcionalismo, assim como, criar, organizar
e distribuir os cargos e ainda ter iniciativa de lei para dispor sobre a
remuneração de seus servidores, adstritos sempre às regras ditadas pela Lei
Maior, bem como, legislação infraconstitucional que dite regras gerais a
respeito.
Nesse
cotejo, se cada Poder tem autonomia para dispor sobre o sistema remuneratório
de seus servidores, não poderia ser empregado tratamento diverso à revisão
geral anual, pois esta é afeta à remuneração.
O
Supremo Tribunal Federal, ao julgar a ADI 3.599-1[6],
do Distrito Federal, proposta pelo Presidente da República em função das Leis
Federais nº 11.169/2005 e 11.170/2005 que alteraram a remuneração dos
servidores públicos integrantes dos quadros de pessoal da Câmara dos Deputados
e do Senado, conheceu parcialmente a ação e a julgou improcedente. A Corte
Suprema considerou que as leis impugnadas não se referiram à revisão geral
anual e sim a reajuste de remuneração. Mesmo assim, vários excertos da decisão
podem nos servir como suporte neste momento, ressaltando que todos acompanharam
integralmente o voto do Relator.
No
voto da Excelentíssima Ministra Cármen Lúcia constatamos comentário relevante à dúvida ora discutida. Vejamos:
No que respeita à isonomia – temos insistido que a
jurisprudência do Supremo é doutrina secular -, trata mesmo diferentemente e,
inclusive, do regime remuneratório. Aliás,
o que a Constituição quer, a partir da Emenda Constitucional n. 19, é o
estabelecimento da verdade remuneratória, é preciso mesmo que se fixe, para as
diversas categorias dos órgãos e dos Poderes Públicos, aquilo que seja
adequado, coerente com cada categoria. Logo, não haveria quebra de
princípio de isonomia alguma, ainda que fosse desigualado com critérios objetivos
e legítimos. (grifo acrescido)
Do
voto do Excelentíssimo Ministro Carlos Britto extraímos:
Fls. 010
No
voto supra referido, adota-se o entendimento de que a iniciativa da revisão
geral anual incumbe a cada Poder. Nesse diapasão, convém lembrar que no âmbito
estadual, pelo menos em Santa Catarina, a iniciativa provém de cada Poder
isoladamente, ou seja, Poder Executivo, Poder Judiciário e Poder Legislativo
deflagram o processo legislativo objetivando a revisão geral anual da
remuneração de seus respectivos servidores. Se no plano estadual é adotado esse
critério, a princípio, poder-se-ia adotá-lo do mesmo modo nos municípios onde a
iniciativa da revisão geral anual partiria do Poder Executivo e do Poder
Legislativo, respeitando as regras constitucionais e infraconstitucionais.
Ainda
em relação a ADI 3.599, vale citar o voto do Excelentíssimo Ministro Cezar
Peluso no seguinte trecho:
Na verdade, a norma
dirige-se a cada Poder. Impõem a cada Poder a necessidade de, pela iniciativa
exclusiva já prevista em outras normas, fazer aprovar uma lei específica. Nesse
sentido, é norma cujos destinatários são os Três Poderes. E, depois,
estabelece, em favor dos funcionários, uma garantia, que é a de obterem, pelo
menos em cada ano, na mesma data, sem distinção de índice, a reposição do
resíduo inflacionário que implicou perda do poder aquisitivo daquela quantidade
de moeda representada pelos seus vencimentos. Tal norma não distinguiu entre aumento a título de reestruturação – ou
seja lá o que for -, e a chamada revisão geral, a não ser para assegurar a
todos os funcionários dos Três Poderes esta revisão anual.
Fls. 011
De modo que, a mim
não me impressiona, nem para argumentar, que as duas leis aqui impugnadas veiculassem,
na verdade, a dita revisão geral. Isso, para mim, não faria nenhuma diferença,
porque teria sido aprovada, ainda que em termos de argumentação, por uma lei
específica para cada Poder e, portanto, para cada Mesa, como dispõem os artigos
51 e 52. (grifos
acrescidos)
Como
se vê, o entendimento de que a revisão geral anual pode ter iniciativa em cada
Poder, é consentânea naquela Corte, ainda que tenha sido tratada de forma
incidental.
No
mesmo sentido, o Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais já decidiu que a
iniciativa da revisão geral anual pode partir do Poder Legislativo Municipal. Da
Consulta nº 811.256[7]
extrai-se:
...
Ocorre que, assim
como para a fixação dos valores da remuneração e dos subsídios, a revisão geral
anual deve respeitar a iniciativa privativa de legislar para cada caso.
...
Dessa
forma, não se configura possível que uma lei municipal, de iniciativa do Chefe
do Executivo local tendente a readequar o valor nominal da remuneração dos
servidores do Poder Executivo seja utilizada para revisar o subsídio dos
agentes políticos, haja vista que a iniciativa para a propositura desse diploma
é diversa.
Quanto ao
sentido da expressão contida no inciso X do art. 37 da CR/88 "sempre na
mesma data e sem distinção de índices", esclareça-se que essa
homogeneidade de tratamento refere-se ao âmbito de cada poder, pois a cada um
deles foi atribuída competência privativa para regulamentar sobre seus próprios
agentes públicos. Descaberia, por exemplo, fixar-se um determinado percentual
de revisão para os subsídios dos vereadores e outro diferente para a
remuneração dos servidores do legislativo local, haja vista serem ambos agentes
públicos pertencentes ao mesmo órgão.
Permitir
que uma lei que disponha sobre a revisão geral anual dos servidores públicos do
Poder Executivo Municipal englobe os valores percebidos pelos agentes políticos
e, também, pelos servidores públicos ocupantes de cargos do Legislativo
exorbita a competência que foi outorgada pelo texto constitucional a cada um
dos Poderes, fato que infringe regras e princípios constitucionais, Fls.
012
...
Entendo
pela obrigatoriedade da revisão geral anual para a recomposição dos valores dos
subsídios percebidos pelos agentes políticos; entretanto os índices a serem
aplicados devem ser fixados por meio de lei específica, observada a iniciativa
privativa estabelecida pela CR/88, não sendo obrigatória a utilização do mesmo
índice aplicado na revisão geral anual dos servidores públicos do Município.
Citando
a ADI 3.599, acima mencionada, bem como a ADI 2.061, o doutrinalista Gustavo
Terra Elias[8], defende
a competência de cada Poder para a iniciativa de lei de revisão geral anual,
como se vê:
Entrementes, a lei específica, di-lo o inciso
X do art. 37 da Constituição, é de “iniciativa privativa em cada caso”, ou
seja, em respeito à autonomia administrativa e financeira decorrente do
princípio da separação de poderes, cabe ao chefe de cada um dos Poderes das
diversas entidades federadas fazer a propositura da lei de revisão de
remuneração. É nesse sentido que caminhou o entendimento do Ministro Carlos
Britto, em outro trecho de seu voto lançado na referida ADI nº 3.599-1/DF:
No inciso X do artigo 37, ao falar de revisão geral anual, a Constituição teve
o cuidado de prever “... observada a iniciativa em cada caso, ...” Ora,
significa, “observada a iniciativa em cada caso...”, que o poder executivo
cuida dessa iniciativa de lei, em se tratando de revisão remuneratória no
âmbito da administração direta e indireta sob a autoridade máxima do Presidente
da República — estou falando no plano federal — , e, no âmbito dos demais
Poderes, a iniciativa é de cada um deles. É do Poder Judiciário quando se
tratar de revisar a remuneração dos cargos próprios do Poder Judiciário, e no
âmbito do Congresso Nacional, Fls.
013
Depois de transcorrido um ano da edição da Emenda
Constitucional nº 19, de 04 de junho de 1998, sem que houvesse a deflagração de
projetos de lei referente à revisão geral de remuneração, sobrevieram diversas
ações diretas de inconstitucionalidades por omissão, especialmente em face da
inércia dos Governos Federal e Estaduais em proporem a regulamentação da
matéria.
Ao enfrentar esta controvérsia, a Excelsa Corte declarou a
inconstitucionalidade da omissão do Poder Executivo Federal em propor o projeto
de lei, mas recusou-se a supri-la. Assim, deteve-se o STF, consoante deixa
evidente a emblemática ADI nº 2.061-7/DF, Rel. Min. Ilmar Galvão, j. 25.04.01
em proclamar a mora do Poder Executivo Federal na regulamentação do texto
constitucional, sem condená-lo a providência cominatória, em função de deter o
Chefe do Poder Executivo, no entendimento do STF, discricionariedade para
avaliar a conveniência da propositura de medida legislativa visando à
regulamentação da revisão geral. A propósito, reproduzimos a ementa da ADI nº
2.061-7/DF:
Ementa: Ação direta de inconstitucionalidade por
omissão. Art. 37, X, da Constituição Federal. Norma constitucional que impõe ao
Presidente da República o dever de desencadear o processo de elaboração da lei
anual de revisão geral da remuneração dos servidores da União, prevista no
dispositivo constitucional em destaque, na qualidade de titular exclusivo da
competência para iniciativa da espécie, na forma prevista no art. 61, §1º, II,
“a”, da CF.
Mora que, no caso, se tem por verificada, quanto à
observância do preceito constitucional, desde junho de 1999, quando
transcorridos os primeiros doze meses da data da edição da referida EC 19/98.
Não se compreende, a providência, nas atribuições de natureza
administrativa do Chefe do Poder Executivo, não havendo cogitar, por isso, da
aplicação, no caso, da norma do art. 103, §2º, in fine, que prevê a fixação de
prazo para o mister.
Assim,
considerando a autonomia do Poder Legislativo para dispor sobre a remuneração
de seus servidores, na qual se coaduna “a iniciativa privativa em Fls.
014
Preponderante
destacar, contudo, que o índice aplicado deve ser o mesmo para servidores e
vereadores, quando oportuna a revisão para esses últimos[9].
Não se fala em índices diferenciados dentro de um mesmo Poder, sob pena de
afronta ao Princípio da Isonomia.
Por
derradeiro, caso o Poder Executivo promova a revisão geral anual para os
servidores municipais, incluindo os servidores do Legislativo, deve-se retirar
do cômputo o período que o Legislativo já abarcou na sua própria revisão, pois
configuraria recebimento de valores em duplicidade.
A
segunda indagação apresentada pelo consulente tem o seguinte conteúdo:
Em
desdobramento à indagação acima, pode o Legislativo conceder revisão em
percentual inferior à variação do índice oficial supracitado e complementar a
revisão dos vencimentos de seus servidores após a edição da lei de revisão
geral anual, mediante a edição de nova lei de sua iniciativa, prevendo o
pagamento das respectivas diferenças?
A
propositura de lei visando à revisão geral anual da remuneração que não atinja
a finalidade almejada, parece-nos inócua, pois não estará repondo a inflação
resultante no período apurado. A Constituição Federal no inciso X do art. 37
assegura a revisão sempre na mesma data. Então, se o percentual indicado pelo índice
adotado na propositura da lei for inferior à defasagem ocorrida, estará sendo
descumprido o preceito constitucional, ainda que o restante seja implementado
posteriormente, pois não será respeitada a data base[10].
Ademais,
este Tribunal já firmou entendimento no seguinte sentido:
Fls. 015 |
||
A implementação da revisão geral anual, de que trata o art.
37, X, da Constituição Federal, deve ocorrer a partir da data em que se
completar o período de abrangência, aplicando-se o percentual total apurado
pelo índice adotado para a revisão. |
Desta
forma, ainda que haja o posterior pagamento das diferenças, alcançado, assim, o
índice oficial, tal prática não se reveste de economicidade, pois pode dar margem
à responsabilização da Administração Pública, inclusive com potencial geração
de passivo ao órgão, considerando eventual aplicação de correção monetária e
juros legais.
Nessas
circunstâncias, acreditamos que o Prejulgado mencionado esclarece a dúvida
apresentada.
A
terceira pergunta apresentada tem o seguinte teor:
Em
outra hipótese, pode o Legislativo municipal iniciar lei para conceder reajuste
de 5% (cinco por cento), a ser aplicado no Quadro de Vencimentos de seus
servidores, incluindo no respectivo projeto dispositivo prevendo que a lei de
iniciativa da Câmara a ser editada após a publicação da lei da revisão geral
anual irá dispor sobre a dedução do aludido reajuste de 5% do montante
concedido na lei geral de revisão.
Pode
ser concedido reajuste, neste caso somente para os servidores, sem que sejam
abrangidos os Vereadores, pois quanto ao subsídio deve ser respeitado o
Princípio da Anterioridade, introduzido pela Emenda Constitucional nº 25/2000,
consoante inciso VI do art. 29 da CF.
Quando
do julgamento ADI 3.599[12]
no STF, o Ministro Relator prolatou em seu voto:
Fls. 016
Da
ementa da ADI 2.726[13],
citamos:
O inciso X do artigo 37 da Carta Federal autoriza a
concessão de aumentos reais aos servidores públicos, lato sensu, e determina a revisão geral anual das respectivas
remunerações. Sem embargo de divergência conceitual entre as duas espécies de
acréscimo salarial, inexiste óbice de
ordem constitucional para que a lei ordinária disponha, com antecedência, que
os reajustes individualizados no exercício anterior sejam deduzidos da próxima
correção ordinária.
A ausência de compensação importaria desvirtuamento de
reestruturação aprovada pela União no decorrer do exercício, resultando
acréscimo salarial superior ao autorizado em lei. Implicaria, por outro lado,
necessidade de redução do índice de revisão anual, em evidente prejuízo às
categorias funcionais que não tiveram qualquer aumento. (grifo acrescido)
Outrossim,
em recente voto emitido no STF, em 09/06/2011, quando da decisão do Recurso
Extraordinário 565.089/SP[14],
o relator do processo, Exmo. Ministro Marco Aurélio de Mello, assim
contextualizou:
3. DISTINÇÃO ENTRE
AUMENTO E REAJUSTE. PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL À REMUNERAÇÃO DOS SERVIDORES
PÚBLICOS
Atentem para a distinção entre aumento e reajuste. O
Direito, tanto o substancial quanto o instrumental, é orgânico e dinâmico,
descabendo confundir institutos que têm sentido próprio. Na espécie, não se
trata de fixação ou aumento de remuneração – estes, sim, a depender de lei, na dicção
do inciso X do artigo 37 da Carta da República. Versa-se o reajuste voltado a
afastar os nefastos efeitos da inflação.
Objetiva-se a necessária manutenção do poder aquisitivo da remuneração,
expungindo-se o desequilíbrio do ajuste no que deságua em vantagem indevida
para o Poder Público, a aproximar-se, presente a força que lhe é Fls.
017
Fica
claro que o “reajuste”, buscando correção monetária ou como assevera o
Ministro: “voltado a afastar os nefastos efeitos da inflação”, não pode ser
tratado como um aumento, um plus na
remuneração.
Nesse
sentido, pode ser respondido ao consulente que é possível conceder reajuste aos
servidores da Câmara Municipal e por ocasião da data base da revisão geral
anual, deduzir o índice já concedido, desde que a motivação para o reajuste
seja a recuperação de perdas inflacionárias. No entanto, tal entendimento
desconfigura os institutos do reajuste e da revisão, pois se a finalidade é a
reposição de perdas inflacionárias, está se tratando de revisão, ainda que o
reajuste possa ter esse alcance. Ao se permitir que uma revisão geral futura
seja compensada pelo reajuste setorizado pretérito, está se admitindo que o
reajuste possua natureza de reposição inflacionária.
Portanto,
a interpretação lógica que se faz dos institutos é pela preservação da natureza
jurídica de cada um, ou seja, o que caracteriza revisão não afeta o reajuste, e
vice-versa, muito embora o STF tenha reconhecido a verossimilhança do reajuste
à revisão geral anual, afastando-o do aumento.
Nesse
cotejo, imperioso aceitar que se houve recuperação de perdas inflacionárias
dentro do período utilizado para apuração da revisão geral anual, deve haver a
dedução do quantum já concedido.
Assim, apurado o índice de recuperação econômica a ser aplicado, deve ser
descontado o percentual já concedido com a mesma finalidade.
2.1
REFORMA DE PREJULGADOS
Este
Tribunal de Contas conta com Prejulgados que tratam da revisão geral anual,
dentre eles destacamos os seguintes: 1153, 1163, 1203, 1334, 1428, 1531, 1544,
1565, 1686 e 1914. Todos se apresentam total ou parcialmente contrários ao
entendimento aqui exposto de que a iniciativa do projeto de lei objetivando a
revisão geral anual pode partir do Poder Legislativo.
Caso
se considere o presente parecer e com a finalidade de evitar divergências,
devem ser revogados:
Fls. 018
A revisão geral anual é obrigatória, nos termos do art.
37, X, da Constituição Federal, com a redação da Emenda nº 19/1998, no entanto,
é vedado ao Poder Legislativo, por ato próprio, iniciar o processo legislativo
com o objetivo de conceder revisão geral anual aos Vereadores e servidores,
pois não possui competência constitucional para tal desiderato.
Tratando-se de lei visando à revisão geral anual da remuneração dos servidores
públicos e do subsídio, a iniciativa é do Chefe do Poder Executivo. Contudo, em
relação aos subsídios dos Vereadores, mesmo havendo direito à revisão, o
pagamento estará restrito aos limites determinados na Constituição Federal,
arts. 29, V e VI, e 29-A.
Itens 3 e 4 do Prejulgado 1163:
3.
A
iniciativa de lei para a revisão geral anual da remuneração dos servidores
municipais (incluídos os do Poder Executivo e os do Poder Legislativo) e dos
subsídios é de competência exclusiva do Chefe do Poder Executivo.
4.
Não
se admite a extensão aos vereadores, por meio de lei de iniciativa do
Legislativo, de revisão geral anual concedida aos servidores. É dever do chefe
do Poder Executivo Municipal incluir os agentes políticos (Prefeito,
Vice-Prefeito, Secretários Municipais e Vereadores) como beneficiários da
revisão geral anual, de acordo com o artigo 37 da Constituição Federal.
Item
2 do Prejulgado 1203:
A
iniciativa de lei para a revisão geral anual da remuneração dos servidores
municipais (incluídos os do Poder Executivo e os do Poder Legislativo) e dos
subsídios é de competência exclusiva do Chefe do Poder Executivo.
Item
3 do Prejulgado 1334:
3.
O reajuste decorrente da revisão geral anual prevista na parte final do art.
37, X, da Constituição Federal, englobando todos os servidores municipais,
sempre na mesma data e sem distinção de índices, também é admitido para
subsídios dos agentes políticos, desde que expressamente previsto na lei
específica de iniciativa do Chefe do Poder Executivo e os valores individuais e
despesas totais de pessoal estejam compreendidos nos limites da Constituição
Federal e da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Item 1 do Prejulgado
1428:
A
iniciativa de lei para a revisão geral anual da remuneração dos servidores
municipais (incluídos os do Poder Executivo e os do Poder Legislativo) e dos
subsídios, de que trata o art. 37, X, "in fine", da Constituição da
República, é de competência exclusiva do Chefe do Poder Executivo.
019 Fls.
Item
4 do Prejulgado 1686:
4.
A iniciativa de lei para a revisão geral anual da remuneração dos servidores
municipais e dos subsídios dos agentes políticos é de competência exclusiva do
Chefe do Poder Executivo, configurando-se o ato do Poder Legislativo que
iniciar o processo legislativo com este objetivo como inconstitucional por
vício de iniciativa.
Item 3 do Prejulgado
1914:
3.
Em se tratando de Revisão Geral Anual, o aumento a ser concedido ao valor do
subsídio do Prefeito Municipal não pode ter índice diferenciado dos demais agentes
públicos municipais, nos termos do art. 37, X, da Constituição Federal, sendo a
iniciativa de lei, no caso, do Poder Executivo.
2.2
ALTERAÇÃO DE PREJULGADO
Ainda,
caso seja adotado o presente parecer e no sentido de evitar divergências, devem
ser alterados os seguintes prejulgados:
Item
1 do Prejulgado 1531:
Redação
atual:
1.
Cabe ao Chefe do Poder Executivo Municipal a iniciativa de lei para a revisão
geral anual de que trata o art. 37, X, in fine, da Constituição Federal,
podendo nela ser incluídos os servidores do Programa de Saúde da Família - PSF,
ainda que regidos por legislação própria, editada especificamente para o
programa, prevendo a contratação por tempo determinado para atender a
necessidade temporária de excepcional interesse público.
Nova
redação:
1.
Os servidores do Programa de Saúde da Família - PSF podem ser abrangidos pela
lei que concede revisão geral anual, de que trata o art. 37, X, in fine, da
Constituição Federal, aos servidores do Poder Executivo Municipal, ainda que
regidos por legislação própria, editada especificamente para o programa,
prevendo a contratação por tempo determinado para atender a necessidade
temporária de excepcional interesse público.
Alínea
“c” do item 2 do Prejulgado 1544:
Redação
atual:
c)
lei específica, de iniciativa do Chefe do Poder Executivo (art. 37, X, da
Constituição Federal);
Nova
redação:
c)
lei específica;
Fls. 020
Redação
atual:
c)
lei específica, de iniciativa do Chefe do Poder Executivo (art. 37, X, da
Constituição Federal);
Nova
redação:
c)
lei específica;
3.
CONCLUSÃO
Diante do
exposto, a Consultoria Geral emite o presente Parecer no sentido de que o Exmo.
Conselheiro Wilson Rogério Wan-Dall proponha ao Egrégio Tribunal Pleno decidir
por:
3.2.1. A
revisão geral anual da remuneração dos servidores da Câmara Municipal e do
subsídio dos vereadores, neste último caso, se houver limite conforme arts. 29,
VI e 37, XI da Constituição Federal, poderá ser realizada por meio de lei de
iniciativa do Poder Legislativo, sendo aplicado o mesmo índice para servidores
e vereadores.
3.2.2. A superveniência de revisão geral anual deve deduzir o percentual anteriormente
concedido aos servidores e membros do Poder Legislativo para repor perdas
inflacionárias dentro do mesmo período.
3.3.
3.4.
Fls. 021
Prejulgado 1531
1.. Os servidores do
Programa de Saúde da Família - PSF podem ser abrangidos pela lei que concede revisão
geral anual, de que trata o art. 37, X, in fine, da Constituição Federal, aos
servidores do Poder Executivo Municipal, ainda que regidos por legislação
própria, editada especificamente para o programa, prevendo a contratação por
tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional
interesse público
...
Prejulgado 1544
...
2...
c) lei específica;
...
Prejulgado 1565
...
2...
c)
lei específica;
...
3.6.
Recomendar à Câmara Municipal de
Joinville que, doravante, as consultas enviadas ao Tribunal de Contas sejam instruídas
com parecer jurídico, conforme preconiza o inciso V do art. 104 do Regimento Interno (Resolução nº TC-06, de 28 de dezembro
de 2001).
3.7.
Dar ciência da Decisão,
do Relatório e Voto do Relator, do Parecer do Ministério Público junto ao
Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina e do Parecer da Consultoria
Geral ao Sr. Odir Nunes da Silva e à Câmara Municipal de Joinville.
Consultoria Geral, em 14
de junho de 2011.
ADRIANA REGINA DIAS
CARDOSO
AUDITOR FISCAL DE CONTROLE EXTERNO
022 Fls.
De
acordo:
VALERIA ROCHA LACERDA
GRUENFELD
COORDENADORA
De acordo.
Encaminhem-se os Autos à elevada consideração do Exmo.
Sr. Relator Conselheiro Wilson Rogério Wan - Dall, ouvindo preliminarmente o
Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.
HAMILTON HOBUS HOEMKE
CONSULTOR GERAL
[1] Fl. 03
[2]MILESKI, Hélio Saul. O Controle da Gestão Pública. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 362.
[3] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2010, 36ª ed., p. 513.
[4] Para a revisão geral anual dos
agentes políticos deve ser considerado o teto, o que pode inviabilizar a
aplicação da revisão geral anual, e ainda, o período aquisitivo mínimo de um
ano, antes do qual, não se aplica a revisão, pois não perdas a repor.
[5] Consulta nº 11/00024155. Parecer COG: 068/2011. Origem: Câmara Municipal de Itajaí. Relatora: Auditora Sabrina Nunes Ioken.
[6] Relator: Ministro Gilmar Mendes.
Requerente: Presidente da República. Requerido: Congresso Nacional. Sessão do
Tribunal Pleno: 21/05/2007. Publicação: 14/09/2007.
[7] Consulta nº 811.256. Origem: Câmara
Municipal de Varginha. Data da sessão: 10/03/2010. Relatora: Conselheira
Adriene Andrade. Publicação: Revista do TCEMG, V.77, N.4, OUT./DEZ. 2010, p.
197
[8] ELIAS, Gustavo Terra. Revisão geral e anual da remuneração dos
servidores públicos: subsídios hermenêuticos para sua redenção. Biblioteca
Digital Fórum Administrativo – FA, Belo Horizonte, ano 11, n. 122,
abr. 2011. Disponível em: <http://www.bidforum.com.br/. Acesso em: 10
junho 2011. |
[9] Consulta nº 11/00024155. Parecer COG:
068/2011. Origem: Câmara Municipal de Itajaí.. Relatora: Auditora Sabrina Nunes
Ioken.
[10] Conforme art. 226 da Lei Complementar
Municipal nº 266/2008, a data base para revisão geral anual da remuneração dos
servidores de Joinville é 1º de maio de cada ano.
[11] Processo: CON-03/07436721. Parecer:
COG-586/2003. Decisão: 4345/2003. Origem: Câmara Municipal de Palhoça. Relator:
Conselheiro José Carlos Pacheco. Data da sessão: 22/12/2003. Data do Diário
Oficial: 18/03/2004.
[12] Já citada neste Parecer.
[13] Relator: Ministro Mauricio Corrêa. Requerente: Partido Social Liberal. Requerido: Presidente da República. Sessão do Tribunal Pleno: 05/12/2002. Publicação: 29/08/2003