PROCESSO
Nº: |
REC-09/00545631 |
UNIDADE
GESTORA: |
Prefeitura Municipal de Otacílio Costa |
RESPONSÁVEL: |
|
INTERESSADO: |
Altamir José Paes |
ASSUNTO:
|
Referente ao Processo -TCE-04/03407834 |
PARECER
Nº: |
COG - 277/2011 |
Recurso de
Reconsideração. Fungibilidade. Conhecimento. Mérito. Recurso parcial.
Provimento parcial para cancelar as multas dos itens 6.2.6, 6.2.7, 6.2.9,
6.2.10 e 6.211.
1. A conversão do processo APE - Auditoria in loco de Atos
de Pessoal em processo de Tomada de Contas Especial é possível quando se
identificar a presença de possível dano ao erário, ainda que ao final não
venha a se concretizar a sua existência.
2.São autoaplicãveis o art. 69 da Lei Complementar
Estadual n. 202/2000 e o art. 108, parágrafo único, do Regimento Interno desta
Corte de Contas.
3. Os serviços contábeis contratados possuem ligação
direta com as atividades desenvolvidas pelo cargo de contador municipal. Em
face da Constituição Federal o preenchimento do desempenho dessas funções deve
ser feita por servidor público aprovado em concurso público, ressalvadas as
hipóteses de contratação excepecional e por tempo determinado. Situação não
caracterizada no caso concreto.
4. A nomeação de pessoas para cargos comissionados
somente é admitida para o exercício de funções que se enquadram como
atividades de assessoramento, chefia e direção.
5. A forma pela qual será feita o controle de horas é
questão de ordem interna na Administração a qual compete ao gestor público
disciplinar no exercício do poder discricionário.
6. No Município
de Otacílio Costa a lei complementar fez consignar expressamente a
possibilidade de se remunerar as horas extraordinárias prestadas pelos
servidores públicos ocupantes de cargos comissionados. Reconhecimento da
autonomia administrativa e política do ente federativo no atual sistema
republicano.
7. Ante a omissão do legislativo municipal em
regulamentar o art. 47 da Lei Complementar municipal n. 45/32003, tem-se que a
norma insculpida na CLT poderia ser acolhida por aplicação analógica, ante o
previsto no art. 4º da Lei de Introdução ao Direito Brasileiro para assegurar
um direito fundamental do servidor público previsto na Constituição Federal de
1988.
8. Há servidores que atuam em atividade administrativa
que caracterize a habitualidade na execução de serviços que extrapolem a
jornada de trabalho normal. A realidade local é que irá conferir e confirmar
esta situação. A habitualidade no pagamento de horas extraordinárias não se
apresenta de todo proibida, uma vez atendidas as hipóteses previstas em lei.
9. Reconhecimento
do princípio da confiança entre o agente público que assina a ordem de
pagamento e os servidores que atualizam as informações cadastrais de cada
servidor na preparação da folha de pagamentos. Falha de pequena monta que não
caracteriza motivo para aplicação de penalidade pelo órgão de controle externo
(princípio da proporcionalidade).
Sr. Consultor,
1. INTRODUÇÃO
Trata-se
os autos de recurso de Reexame interposto com fundamento no art. 79 e 80 da Lei
Complementar n. 202/2000 pelo Sr. Altamir José Paes, ex-prefeito do Município
de Otacílio Costa, qualificado nos autos do processo nº TCE 04/03407834, em
face do Acórdão nº 1.050/2009, exarado na Sessão de 27/07/2009, publicado no
DOTC-e n. 310, de 10/08/2009, nos seguintes termos:
Acórdão n. 1050/2009
1. Processo n. TCE - 04/03407834
2. Assunto: Grupo 3 – Tomada de Contas Especial - Conversão do Processo n. APE-04/03407834 - irregularidades praticadas no exercício de 2003
3. Responsável: Altamir José Paes - ex-Prefeito Municipal
4. Entidade: Prefeitura Municipal de Otacílio Costa
5. Unidade Técnica: DMU
6. Acórdão:
VISTOS, relatados e discutidos estes autos, relativos à Tomada de Contas Especial pertinente a irregularidades praticadas no âmbito da Prefeitura Municipal de Otacílio Costa no exercício de 2003.
Considerando que o Responsável foi devidamente citado, conforme consta na f. 670 dos presentes autos;
Considerando que as alegações de defesa e documentos apresentados são insuficientes para elidir irregularidades apontadas pelo Órgão Instrutivo, constantes do Relatório DMU n. 738/2006;
ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro no art. 59 c/c o art. 113 da Constituição do Estado e no art. 1° da Lei Complementar n. 202/2000, em:
6.1. Julgar irregulares, sem imputação de débito, na forma do art. 18, III, alínea "b" c/c o art. 21, parágrafo único, da Lei Complementar n. 202/2000, as contas pertinentes à presente Tomada de Contas Especial, que trata de irregularidades constatadas quando da auditoria realizada no Município de Otacílio Costa, com abrangência sobre atos de pessoal referentes ao exercício de 2003.
6.2. Aplicar ao Sr. Altamir José Paes - ex-Prefeito Municipal de Otacílio Costa, CPF n. 521.814.489-49, com fundamento no art. 69 da Lei Complementar n. 202/2000 c/c o art. 108, parágrafo único, do Regimento Interno, as multas abaixo relacionadas, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico desta Corte de Contas, para comprovar ao Tribunal o recolhimento ao Tesouro do Estado das multas cominadas, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000:
6.2.1. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face da cessão de 17 servidores municipais para atender a deficiências de pessoal de outros órgãos públicos estaduais, com ônus para a Prefeitura, sem caracterização de excepcional interesse público demonstrado em lei autorizativa, em descumprimento ao disposto no art. 62 da Lei Complementar n. 101/00 (item 1.1 do Relatório DM);
6.2.2. R$ 400,00 (quatrocentos reais), pela contratação de pessoal, por tempo determinado, em número de 47, sem a realização de processo seletivo simplificado e publicidade, em inobservância aos princípios da impessoalidade, da isonomia e da moralidade, previstos no art. 37, caput, da Constituição Federal, bem como ao art. 4º da Lei Complementar n. 01/97, que dispõe sobre a contratação de pessoal em caráter temporário no Município de Otacílio Costa (item 1.2 do Relatório DMU);
6.2.3. R$ 400,00 (quatrocentos reais), devido à contratação de serviços contábeis de caráter não eventual, cujas atribuições são inerentes às funções típicas da administração, previsto no quadro de pessoal, em descumprimento à Lei n. 495/1990, bem como fuga ao concurso público, em desacordo com o disposto no inciso II do art. 37 da Constituição Federal (item 1.3 do Relatório DMU);
6.2.4. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em virtude da nomeação de dois servidores para cargos comissionados, cujas atribuições não são de direção, chefia ou assessoramento, segundo exigência da Constituição Federal, art. 37, V, evidenciando ausência de concurso público nos termos do art. 37, II, da Carta Magna Federal (item 1.4 do Relatório DMU);
6.2.5. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em razão da prestação de serviços à administração municipal por pessoa física sem vínculo contratual, formal ou empregatício, caracterizando fuga à abertura de concurso público, desrespeitando o disposto na Constituição Federal, art. 37, II (Item 1.5 do Relatório DMU);
6.2.6. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face da ausência de ficha de controle de horas extras prestadas, evidenciando deficiência no controle interno da Unidade, em detrimento ao disposto no art. 4º da Resolução n. TC-16/94 (item 1.6 do Relatório DMU);
6.2.7. R$ 400,00 (quatrocentos reais), pelo pagamento de horas extras a servidor ocupante de cargo comissionado, em desacordo com os arts. 6º e 7º da Lei n. 495, de 23 de março de 1990, que dispõe sobre o quadro de pessoal da administração do Município de Otacílio Costa (item 1.8 do Relatório DMU);
6.2.8. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em virtude da concessão de adicional de insalubridade, sem amparo em lei específica regulamentadora do percentual e dos critérios de concessão, conforme exigência do art. 47 da Lei n. 45, de 20.06.2003 (Estatuto dos Servidores Públicos de Otacílio Costa), representando despesas no montante de R$ 116.551,34 (item 1.10 do Relatório DMU);
6.2.9. R$ 400,00 (quatrocentos reais), devido ao pagamento de horas extras efetuado com habitualidade, praticamente em todos os meses, de forma fixa, configurando remuneração indireta e descaracterizando o caráter extraordinário desta prestação pecuniária, em desacordo com o art. 48, § 2º, da Lei Complementar n. 45/03 e a Lei (federal) 4.320/64, art. 63, § 2º, III (item 1.7 do Relatório DMU);
6.2.10. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em razão da concessão de adicional de insalubridade, sem amparo em Levantamento Ambiental de Insalubridade NR-15 Portaria 3.214/78, realizado na Prefeitura Municipal de Otacílio Costa, em desacordo com o disposto no art. 47, §§ 1º e 2º, da Lei Complementar n. 45/03 (item 1.9 do Relatório DMU);
6.2.11. R$ 400,00 (quatrocentos reais), pelo pagamento de função gratificada, sem amparo em lei específica, em desacordo com o art. 44 da Lei n. 45/03 (item 1.11 do Relatório DMU).
6.3. Determinar ao atual Prefeito Municipal de Otacílio Costa, Sr. Denilson Luiz Padilha, que adote as providências administrativas, nos termos do art. 5º da Instrução Normativa n. TC-03/2007, alterada pela Instrução Normativa n. TC-06/2008, visando ao ressarcimento ao erário, pelos servidores beneficiados, dos valores pagos indevidamente, a seguir descritos:
a) Pagamento de horas extras efetuado com habitualidade, praticamente em todos os meses, de forma fixa, no montante de R$ 36.082,61 (trinta e seis mil oitenta e dois reais e sessenta e um centavos), configurando remuneração indireta e descaracterizando o caráter extraordinário desta prestação pecuniária, em desacordo com o art. 48, § 2º, da Lei Complementar n. 45/03 e a Lei (federal) 4.320/64, art. 63, § 2º, III (item 1.7 do Relatório DMU);
b) Concessão de adicional de insalubridade, no montante de R$ 25.818,68 (vinte e cinco mil oitocentos e dezoito reais e sessenta e oito centavos), sem amparo em Levantamento Ambiental de Insalubridade NR-15 Portaria 3.214/78, realizado na Prefeitura Municipal de Otacílio Costa, em desacordo com o disposto no art. 47, §§ 1º e 2º, da Lei Complementar n. 45/03 (item 1.9 do Relatório DMU);
c) Pagamento de função gratificada, no montante de R$ 149,75 (cento e quarenta e nove reais e setenta e cinco centavos), sem amparo em lei específica, em desacordo com o art. 44 da Lei n. 45/03 (item 1.11 do Relatório DMU).
6.3.1. Fixar o prazo de 95 (noventa e cinco) dias, a contar da comunicação desta deliberação, para que o Prefeito Municipal de Otacílio Costa, comprove a este Tribunal o resultado das providências administrativas adotadas (art. 5º, § 4º, da IN n. TC-03/2007, e alterações).
6.3.2. Caso as providências referidas no item anterior restarem infrutíferas, deve o atual Prefeito Municipal proceder à instauração de tomada de contas especial, nos termos do art. 10, § 1º, da Lei Complementar n. 202/00, com a estrita observância do disposto no art. 12 da Instrução Normativa n. TC-03/2007, e alteração posterior, que dispõe sobre os elementos integrantes da tomada de contas especial, para apuração dos fatos, identificação dos responsáveis e quantificação do dano, pertinentes às irregularidades descritas no item 6.3, "a" a "c", desta deliberação, sob pena de responsabilidade solidária.
6.3.3. A fase interna da tomada de contas especial deverá ser concluída no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias, a contar da data de sua instauração, conforme dispõe o art. 11 da referida Instrução Normativa.
6.3.4. Determinar ao atual Prefeito Municipal de Otacílio Costa, com fulcro no art. 13 da citada Instrução, e alteração, o encaminhamento a este Tribunal de Contas do processo de tomada de contas especial, tão logo concluída.
6.4. Alertar o atual Prefeito Municipal de Otacílio Costa que o não cumprimento do item 6.3, e subitens, desta deliberação implicará, conforme o caso, na definição de sua responsabilidade solidária quanto ao débito apontado, nos termos do art. 10, da Lei Complementar n. 202/2000, além da cominação das sanções previstas no art. 70, VI e § 1º, do mesmo diploma legal.
6.5. Determinar à Secretaria Geral - SEG, deste Tribunal, que acompanhe a deliberação constante do item 6.3, e subitens, retrocitados e comunique à Diretoria Geral de Controle Externo - DGCE, após o trânsito em julgado, acerca do cumprimento da determinação para fins de registro no banco de dados e encaminhamento à Diretoria de Controle competente para análise.
6.8. Determinar ao atual Prefeito Municipal de Otacílio Costa que adote as providências cabíveis com o fim de corrigir as situações irregulares descritas nos subitens do item 6.2 da presente decisão que, porventura, ainda persistam no âmbito da administração municipal.
6.9. Dar ciência desta Decisão, do Relatório e Voto do Relator que a fundamentam, bem como do Relatório DMU n. 738/2006:
6.9.1. ao Sr. Altamir José Paes - ex-Prefeito Municipal de Otacílio Costa;
6.9.2. à Prefeitura Municipal de Otacílio Costa e ao responsável pelo controle Interno daquele Município, com remessa de cópia da Instrução Normativa n. TC-03/2007, consolidada.
7. Ata n. 46/09
8. Data da Sessão: 27/07/2009 – Ordinária.
É
o breve relato. Passa-se a análise dos requisitos de admissibilidade.
2. ANÁLISE
Os
pressupostos de admissibilidade dos recursos são cabimento e adequação,
legitimidade, tempestividade e singularidade.
Quanto
ao cabimento e adequação, verifica-se que o ato impugnado é acórdão proferido
quando da análise de atos administrativos.
No
presente caso, foi manejado o Recurso de Reexame, quando o adequado é o Recurso
de Reconsideração, previsto no art. 77 da Lei Complementar estadual n. 202/00
(LOTCESC), manejável contra decisão proferida em processo de prestação ou
tomada de contas de administrador.
Assim, uma vez atendido aos demais pressupostos, urge aplicar ao caso
concreto o princípio da fungibilidade recursal.
Da
mesma forma, no que tange à legitimidade, verifica-se que o Recorrente é
habilitado a se irresignar contra decisão desta egrégia Corte de Contas, haja
vista ter sido apontado como Responsável pelo ato de gestão irregular no
acórdão atacado.
Pelo
que se extrai dos autos, o recurso é singular, haja vista que não há notícia ou
registro da interposição de outro recurso contra o acórdão n. 1050/2009.
Por
fim, em relação à tempestividade, verifica-se que o acórdão acima referenciado
foi publicado no DOTC-E n. 310, de 10/08/2009 e o presente recurso foi
interposto em 04/09/2009 (fl. 02), portanto, atendido ao prazo legal
estabelecido no art. 77 da Lei Complementar estadual n. 202/2000 (recurso de
reconsideração).
Por
estarem preenchidos todos os pressupostos de admissibilidade, e aplicando-se o
princípio da fungibilidade recursal, sugere-se ao Excelentíssimo Senhor
Conselheiro Relator que conheça do presente Recurso de Reconsideração.
Dessa
forma, passa-se ao exame das prejudiciais ao mérito levantadas pelo Recorrente.
O
Recorrente arguiu que houve impropriedade processual quando do julgamento do
processo TCE 04/03407834 por entender que a aplicação de multa somente tem
lugar se estiver a Corte de Contas a julgar processo de Prestação ou de Tomada
de Contas, de modo que as multas aplicadas somente poderiam subsistir se
houvesse sido convertido os autos em Tomada de Contas Especial, pois o processo
originário tratava de análise de atos jurídicos, e não de contas públicas. E
conforme a Constituição Estadual não lhe atribuir competência para julgar os
atos jurídicos, mas apenas para julgar contas públicas (fl. 04).
A
conversão do processo APE – Auditoria in loco de Atos de Pessoal em processo de
Tomada de Contas Especial é possível quando se identificar a presença de
possível dano ao erário, ainda que ao final não venha a se concretizar a sua
existência.
A
Tomada de Contas possui regramento no art. 10 da Lei Complementar estadual n.
202/2000 quando dispõe que:
Art. 10 - A autoridade administrativa competente, sob pena de responsabilidade solidária, deverá imediatamente adotar providências com vistas à instauração de tomada de contas especial para apuração de fatos, identificação dos responsáveis e quantificação do dano, quando não forem prestadas as contas ou quando ocorrer desfalque, desvio de dinheiro, bens ou valores públicos, ou ainda se caracterizada a prática de qualquer ato ilegal, ilegítimo ou antieconômico de que resulte prejuízo ao erário.
§ 1º - Não atendido o disposto no "caput" deste artigo, o Tribunal determinará a instauração da tomada de contas especial, fixando prazo para cumprimento dessa decisão.
§ 2º - A tomada de contas especial prevista no "caput" e no § 1º deste artigo será, desde logo, encaminhada ao Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina para julgamento, se o dano for de valor igual ou superior à quantia para esse efeito fixada pelo Tribunal de Contas em cada ano civil, na forma estabelecida no Regimento Interno.
§ 3º - Se o dano for de valor inferior à quantia referida no parágrafo anterior, a tomada de contas especial será anexada ao processo da respectiva prestação ou tomada de contas anual do administrador ou ordenador da despesa, para julgamento em conjunto.
Igualmente
regula a Tomada de Contas o art. 32 da Lei Complementar estadual n. 202/2000 ao
dispor que:
Art. 32. Configurada a ocorrência de desfalque¸ desvio de bens ou outra irregularidade que resulte dano ao erário, o Tribunal ordenará desde logo, a conversão do processo em tomada de contas especial se o dano apurado for de valor igual ou superior àquele previsto no § 2º do art. 10 desta Lei.
A
multa aplicada pelo teve como fundamento no art. 70, II, da LC nº 202/2000 c/c
109, II, da Resolução TC 06/2001, Regimento Interno (RI), ou seja, ato
praticado com grave infração a norma legal ou regulamentar de natureza
contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial.
Diante
do exposto acima, opina-se pelo afastamento da preliminar aventada pelo
Recorrente, por considerar que a decisão desta Corte de Contas era apropriada a
reconhecer irregularidade em procedimentos relativos a atos de pessoal, e
assim, impor sanção ao Responsável pela gestão de recursos públicos, na forma
prevista em lei.
O
Recorrente argumenta que não praticou os atos apontados como irregulares, e que
a Diretoria Técnica o elegeu como responsável “apenas pelo fato de ter sido
Prefeito do Município, no período a que se referem os atos fiscalizados” (fl.
06). Segundo o Recorrente, a Diretoria Técnica “em não tendo identificado o
agente praticante da irregularidade, buscou responsabilizar e sugerir
penalidade ao Ordenador Primário”.
Esta
preliminar se confunde com o mérito. Por ora, cabe apenas adiantar que, no que
tange a tese sustentada pelo Recorrente, esta Corte de Contas trilha o
entendimento de que há que se demonstrar a participação dos agentes no ato
administrativo irregularmente promovido no exercício das funções
administrativas como requisito para responsabilidade.
Contudo,
não se esta afirmando neste momento que não haja a responsabilidade do
ex-Prefeito pelos atos apontados como irregulares no Acórdão n. 1050/2009,
posto que a responsabilidade será analisada mais adiante quando da análise dos
fatos que levaram o Plenário a reconhecer a ilegalidade do ato praticado e a responsabilidade
do Recorrente.
O
Recorrente arguiu que o art. 69 da Lei Orgânica do Tribunal de Contas do Estado
e art. 108, parágrafo único, do Regimento Interno desta Corte de Contas não são
autoaplicáveis tendo em vista a inexistência de previsão do que seria grave
infração à norma legal, o que resultaria na impossibilidade de aplicação de
multa, e por via de consequência, no exercício do direito ao contraditório e a
ampla defesa, ante a alegada violação ao princípio de direito penal da “reserva
legal”.
Os
argumentos apresentados pelo Responsável a título de preliminar não são novos
perante esta Corte de Contas, isso porque tais questionamentos já foram
realizados em âmbito de ação direta de inconstitucionalidade julgada
improcedente pelo Supremo Tribunal Federal em âmbito recursal, no Recurso
Extraordinário 190.985-4, publicado no Diário da Justiça de 24/08/2001.
A
Lei Orgânica Estadual atual, Lei Complementar Estadual 202/2000, prevê a
possibilidade de aplicação de multa aos responsáveis por contas julgadas
irregulares de que não resulte débito em razão da prática de ato de gestão
ilegítimo ou antieconômico, ou grave infração a norma legal ou regulamentar de
natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional.
O
Regimento Interno atual (Resolução TC-01/2006), em seu art. 108, prevê a mesma
situação, já mencionada no art. 69 da LCE n. 202/2000.
Na
Ação Direta de Inconstitucionalidade acima mencionada, o Supremo Tribunal
Federal entendeu pela auto-aplicabilidade das normas que prevêem penalidades pelos Tribunais de Contas, cuja
ementa transcreve-se:
EMENTA: Recurso extraordinário. Ação direta de inconstitucionalidade.
2. Pedido acolhido, em parte, pelo Tribunal de Justiça catarinense, para declarar a inconstitucionalidade dos artigos 76 e 77, incisos I, III, IV, V, VI e VII, da Lei Complementar n.º 31/90.
3. Alegação de ofensa ao art. 71, VIII, da CF.
4. Parecer da PGR pelo provimento do recurso extraordinário.
5. Afastada a incompetência do Tribunal a quo para processar e julgar, originariamente, a ação direta de inconstitucionalidade de normas estaduais, em face de expresso dispositivo da Constituição do mesmo Estado.
6. Recurso extraordinário conhecido e provido para julgar improcedente a ação direta de inconstitucionalidade e declarar a constitucionalidade dos arts. 76 e 77, incisos I, III, IV, V, VI e VII, ambos da Lei Complementar n.º 31, de 27.9.1990, do Estado de Santa Catarina.
7. Não é possível,
efetivamente, entender que as decisões das Cortes de Contas, no exercício de
sua competência constitucional, não possuam teor de coercibilidade.
Possibilidade de impor sanções, assim como a lei disciplinar.
8. Certa está que, na hipótese de abuso no exercício dessas atribuições por agentes da fiscalização dos Tribunais de Contas, ou de desvio de poder, os sujeitos passivos das sanções impostas possuem os meios que a ordem jurídica contém para o controle de legalidade dos atos de quem quer que exerça parcela de autoridade ou poder, garantidos, a tanto, ampla defesa e o devido processo legal.
9. As normas
impugnadas prevêem possam as multas ser dosadas, até o máximo consignado nessas
regras legais. Disso resulta a possibilidade, sempre, de se estabelecer relação
de proporcionalidade entre o dano e a multa.
Conforme
se pode verificar, a tese apresentada nestes autos a título de preliminar já há
muitos anos é rechaçada pelo plenário do Supremo Tribunal Federal.
Diante
do exposto, opina-se pelo afastamento da preliminar aventada pelo Recorrente,
por considerar que as decisões das Cortes de Contas, no exercício de sua
competência constitucional, possibilitam a imposição de sanções aos
Responsáveis pela gestão de recursos públicos, na forma prevista em lei.
Passada
a análise das preliminares, será abordada a análise do mérito das
irregularidades apontadas no acórdão recorrido, e sua correlação com a autoria
de cada uma dessas ocorrências, em atenção aos elementos trazidos pelo
Recorrente na sua “segunda preliminar” (fls. 05-09).
Nas
razões recursais não há menção à este aspecto da decisão, de forma que não
houve recurso expresso quanto ao item 6.2.1 do acórdão recorrido, motivo pelo
qual não há razões para alteração da decisão neste ponto.
Nas
razões recursais não há menção à este aspecto da decisão, de forma que não
houve recurso expresso quanto ao item 6.2.2 do acórdão recorrido, motivo pelo
qual não há razões para alteração da decisão neste ponto.
O
acórdão recorrido em seu item 6.2.3 apontou como irregular o fato de o
Recorrente ter contratado os serviços contábeis, em caráter não eventual, em
desacordo com o disposto na Lei n. 495/90 e art. 37, inc. II da Constituição
Federal.
Destacou
a Diretoria Técnica que o Recorrente realizou a contratação da empresa AM
Assessoria e Consultoria Ltda. por meio do processo licitatório n. 032/2002,
para a execução de serviços contábeis, uma vez que a ocupante do cargo de
contadora do município, Sra. Andréa Zapelini, estava cedida para o Instituto de
Previdência e Assistência do Município de Otacílio Costa – IPAM, por meio da
Portaria n. 171/2003 (fl. 151), desde o dia 21/05/2003.
Argumentou
o Recorrente que os serviços de contabilidade foram prestados pela empresa AM
Assessoria e Consultoria Ltda., contratada mediante processo licitatório n.
032/2002. Afirmou ainda que estaria encaminhando cópia do referido processo,
com o objetivo de comprovar que não se tratava de serviços de contábeis, mas
sim, de assessoria (fl. 15).
Em
primeiro lugar, o Recorrente não apresentou a cópia do processo licitatório n.
032/2002. Assim, não fez a prova mencionada.
Entretanto,
nos autos consta cópia do contrato n. 066/2002, decorrente do Convite n.
024/2002 (processo licitatório n. 032/2002), onde consta que os serviços
contratados foram os relativos a:
- Fechamento mensal dos balancetes;
- Elaboração PPA, LDO;
- Execução dos relatórios de execução orçamentária e de gestão fiscal;
- Acompanhamento diário do Boletim de Caixa;
- Prestação de contas de convênios estadual e federal;
- Acompanhamento da execução orçamentária;
- Emissão de relatórios/planilhas bimestral (execução orçamentária) e quadrimestral (gestão fiscal) ao TCE – Tribunal de Contas do Estado.
Para
a Diretoria Técnicas estes serviços caracterizam serviços contábeis, repassados
por via de contrato a terceiros, em violação à regra do concurso público.
Em
suas razões de defesa, o Recorrente, durante a instrução justificou a
contratação afirmando que a contadora do município, aprovada em concurso
público,
“embora tivesse conhecimento teórico, não possuía os conhecimentos práticos à complexidade do cargo, em razão das inúmeras ações a serem desencadeadas em cumprimento às leis e normas (...) optou-se em disponibilizar a referida profissional para um órgão menor, com funções menos complexas e monitorada pela Contabilidade Central (...) decidiu-se terceirizar a contabilidade, tendo sido contratada a empresa que ofereceu a melhor proposta de acordo os critérios de julgamento previamente estabelecidos. A decisão foi com base unicamente em propiciar mais eficiência na área contábil” (fls. 768-769 dos autos TCE 04/03407834).
A
contabilidade deve evidenciar perante a Fazenda Pública a situação de todos
quantos, de qualquer modo, arrecadem receitas, efetuem despesas, administrem ou
guardem bens a ela pertencentes ou confiados, e devem ser organizados de forma
a permitirem o acompanhamento da execução orçamentária, o conhecimento da
composição patrimonial, o levantamento dos balanços gerais, a análise e a
interpretação dos resultados econômicos e financeiros, evidenciando os fatos
ligados à administração orçamentária, financeira, patrimonial e industrial,
conforme disposto nos arts. 83 a 89 da Lei n. 4320/64. E mais, dispõe o art. 90
desse diploma legal que a contabilidade deverá evidenciar, em seus registros, o
montante dos créditos orçamentários vigentes.
Ainda,
dispõe o art. 101 da Lei n. 4.320/64 que o serviço de contabilidade deverá
preparar os resultados gerais do exercício no Balanço Orçamentário, no Balanço
Financeiro, no Balanço Patrimonial e na Demonstração das Variações
Patrimoniais.
Portanto,
inegável que os serviços contratados possuem ligação direta com as atividades
desenvolvidas pelo profissional contabilista, atividades estas afetas ao cargo
de contador municipal a qual havia servidor aprovado em concurso público.
A
materialidade da infração e a autoria estão demonstradas com o ato de cessão da
servidora Andréia Zapeline foi autorizada pelo Sr. Lindomar Figueiredo da
Costa, ex-prefeito em exercício, conforme Portaria n. 171/2003 (fl. 151), o que
demonstra a existência de profissional contábil nos quadros de pessoal do
Município, e a contratação irregular desenvolvida pelo Sr. Altamir José Paes,
ora Recorrente, em vista do repasse de atividades contábeis a terceiros, por
via de terceirização de serviços relacionados com a atividade fim do setor de
contabilidade municipal, firmado em 21 de maio de 2002, conforme cópia do
contrato n. 66/2002 (fls. 146-148 dos autos TCE 04/03407834).
Diante
do exposto, opina-se pela manutenção da penalidade imposta pelo item 6.2.3 do
acórdão recorrido.
A
Diretoria Técnica apontou que as Senhoras Elizete Farias e Marli Ferreira do
Amaral estavam exercendo funções estranhas às de direção, chefia e
assessoramento, pois a primeira realizava atendimento pessoal aos munícipes
mediante entrevistas, encaminhamentos, triagens sociais, e a segunda, atuava
com recepcionista, ouvindo as solicitações dos munícipes e realizando o
encaminhamento dos mesmos ao serviço de assistência social, conforme a
necessidade. Apontou ainda que “não há razão lógica que justifique o exercício
das funções de Assistente Social e Recepcionista, que exigem apenas o correto
exercício de suas atribuições”, quando para os cargos comissionados para as
funções de livre nomeação e exoneração pressupõe-se que “devem ser ocupados por
pessoas detentoras da mesma ideologia política, vez que são eles que vão
transmitir as diretrizes administrativas” (fl. 771 dos autos TCE 04/03407834).
Para
a Diretoria Técnica, as funções exercidas pelas servidoras nomeadas em cargos
comissionados deveriam ser providas por concurso público (fl. 772 dos autos TCE
04/03407834). Para reforçar esse entendimento, colacionaram a decisão do
egrégio Supremo Tribunal Federal proferido na Ação Direta de
Inconstitucionalidade nº 1.141.
Já
o Recorrente, em suas razões recursais questiona o entendimento manifestado
pela Diretoria Técnica, e por via de consequência, o acerto da decisão plenária
manifestada no item 6.2.4 do acórdão recorrido.
Aduziu
o Recorrente que em municípios o cidadão não se contenta em falar com
servidores públicos, mas sim, diretamente com o Prefeito, pois “sente-se mais
seguro quando relata as suas preocupações à autoridade que tem a resolução para
as suas dificuldades” (fl. 15), e em sendo assim, “as funções do cargo em
comissão estão intimamente interligadas com as funções de execução” (fl. 15).
Argumentou
ainda que “não é proibido aos exercentes de cargo em comissão fazer o
atendimento do cidadão, dar-lhe atenção, emprestar-lhe seus conhecimentos
acerca dos fatos apresentados, fazer o encaminhamento que o assunto merece ou
encaminhá-lo para órgão responsável”. (fl. 15).
Destacou
o Recorrente um comparativo com o cargo
de assessor jurídico o qual além de emitir orientações verbais, também atua
mediante pareceres escritos (atividade de execução), elaboração de pareceres,
minutas de contratos etc.
E
para encerrar sua linha argumentativa, o Recorrente expôs seu desconhecimento
acerca do que ele chamou de “estratégia e artimanha” na realização das
entrevistas realizadas na Secretaria de Desenvolvimento Comunitário,
Assistência Social e Habitação, pois entende que “pode ser que [os servidores
entrevistados] tenham sido induzidos a dizer aquilo que [os auditores] queriam
ouvir”, de forma que “a Corte de Contas não fez a acareação para saber a
verdade do outro lado”, pois a decisão teria se baseado “única e
exclusivamente, nos assentamentos feitos no relatório” (fl. 16).
Em
primeiro lugar, cabe esclarecer que esta Corte de Contas não se utiliza de
estratégias ou artimanhas imorais ou ilegais para o exercício do poder de
fiscalização lhe outorgado pela Constituição Federal e Estadual. Os auditores
quando o exercício da fiscalização possuem poderes para acessar documentos e
informações necessários à realização de seu trabalho, podendo utilizar de todas
as técnicas de investigação afetas ao exercício do controle externo que, dentre
outras, inclui-se a entrevista direta com servidores públicos e particulares
que tenham alguma ligação com o objeto investigado, pois de acordo com o
princípio dos poderes implícitos, quem da os fins, também dá os meios, ou seja,
se a Constituição outorgou a missão institucional às Cortes de Contas para promoverem
a fiscalização da gestão dos recursos públicos, igualmente conferiu,
implicitamente, os meios e instrumentos necessários para o exercício desse
mister.
Em
segundo lugar, não é correta a afirmação apresentada pelo Recorrente de que
esta Corte de Contas “não fez acareação para saber a verdade do outro lado”,
pois durante a tramitação do feito, houve a realização da citação do Recorrente
para que este apresentasse suas justificativas e/ou alegações de defesa,
conforme se pode constatar à fl. 680 dos autos TCE 04/03407834, sendo que o
próprio Recorrente em 18/07/2005 apresentou suas alegações de defesa,
demonstrando as suas considerações para as nomeações apontadas como
irregulares. Portanto, não há que se falar que a decisão, ora recorrida,
considerou “única e exclusivamente, nos assentamentos feitos no relatório”,
conforme salientado pelo Recorrente.
Passada
esta questão levantada pelo Recorrente, analisemos os demais argumentos
apresentados.
Quanto
ao fato de que “não é proibido aos exercentes de cargo em comissão fazer o
atendimento do cidadão, dar-lhe atenção, emprestar-lhe seus conhecimentos
acerca dos fatos apresentados, fazer o encaminhamento que o assunto merece ou
encaminhá-lo para órgão responsável” (fl. 15), considera-se correto este
destaque apresentado pelo Recorrente.
Contudo,
não é esta a questão de fundo que se está a discutir nos presentes autos, mas
sim a nomeação de pessoas em caráter comissionado para o exercício de funções
que não se enquadram como atividades de assessoramento, chefia e direção, mas
sim, de funções inerentes aos servidores públicos nomeados para cargos de
provimento efetivo.
Ao
comentar o disposto no art. 37, inc. V, a professora e ministra do Supremo
Tribunal Federal Cármen Lúcia Antunes Rocha leciona que:
“Pelos termos claros e taxativos da norma, vê-se, pois, que inexiste possibilidade de ter o legislador infraconstitucional discricionariedade para dispor sobre a natureza do provimento de cargo público que não seja de direção, chefia e assessoramento, pois não tenho tais atribuições há vinculação legislativa, e o provimento de tal cargo é, necessariamente e pelo fundamento constitucional, efetivo”[1].
Nesse
sentido, não está a natureza do cargo de provimento em comissão ligado ao fato
noticiado pelo Recorrente, ou seja, se pode ou não o comissionado atender ao
público, ou exercer funções de execução no âmbito administrativo. O ponto
fulcral da discussão não é este, mais se as funções inerentes ao cargo estão
dentre as funções indicadas pela Constituição Federal.
A
Diretoria Técnica trouxe a informação baseada em entrevista local de que duas
pessoas não estavam incumbidas desse mister constitucionalmente estabelecido,
de modo que a nomeação realizada era irregular, por vício de
constitucionalidade.
A
gravidade da infração é explícita, pois o ato apontado afronta diretamente o
texto constitucional, lei maior do sistema jurídico brasileiro. Afronta,
igualmente, um dos princípios fundamentais que regem a atividade administrativa
no país, qual seja, a de que o ingresso nos quadros do serviço público deva
ocorrer, como regra, mediante a aprovação em concurso público de provas ou de
provas e títulos, salvo as nomeações para funções de chefia, direção e
assessoramente previstas no já mencionado art. 37, inc. V da Constituição
Federal de 1988.
Ainda
que a designação do cargo comissionado possa dar a ideia de que se enquadra nas
hipóteses constitucionalmente estabelecidas, cumpre ao Tribunal de Contas
verificar se não há desvio de função nas nomeações realizadas, é dizer, constatar
se na prática não está havendo o exercício de funções que deveriam ser
prestadas por servidores nomeados em provimento efetivo.
Por
desvio de função entende-se presente quando uma pessoa é nomeada para exercer
as funções de um determinado cargo público e passa a desempenhar funções
diversas desse cargo para o qual foi nomeado. Tal situação somente poderá ser
admitida em situações precárias e temporárias, como em razão do afastamento do
titular do cargo que se pretende substituir por razões de saúde, por exemplo,
ou em outras situações as quais a lei expressamente venha a admitir. As
nomeações em que se verifica o desvio de função são nulas de pleno direito.
Assim,
não importa se o comissionado atende ao público ou não, esse fato é
irrelevante. Não importa se executa funções de execução ou meramente atos
preparatórios. A Constituição Federal exige apenas que as funções sejam ligadas
às atividades de chefia, direção ou assessoramento.
Chefiar,
dirigir ou assessor não se limita a atender ao público ou a servir de
recepcionista para atendimento aos munícipes. Exige-se a outorgar de funções
especiais que se destacam dessas meras atividades administrativas, por importar
na concessão de poderes de mando, de coordenação, de orientação, de decisão em
determinada área ou setor que compõe a estrutura administrativa da
Administração Pública.
Ao
Recorrente na fase instrutória caberia ter demonstrado a esta Corte de Contas
que as servidoras identificadas pela Diretoria Técnicas estavam desempenhando
funções em uma dessas três hipóteses, demonstração esta que poderia ser
mediante a descrição pormenorizada das funções desempenhadas, as atividades
desenvolvidas etc., de modo a que o egrégio Plenário tivesse conhecimento das
funções desenvolvidas pelas servidoras segundo a posição do gestor.
Oportunidade lhe foi conferida quando da instrução do feito.
A
materialidade e a autoria estão caracterizadas pela juntada da Portaria n.
206/2003 (fls. 153-161 dos autos TCE 04/03407834) quando o art. 1º, inc. XIII e
art. 2º, inc. XLVII houve a nomeação para os cargos comissionados os quais,
segundo se apurou não eram se destinavam a funções de chefia, direção e
assessoramento, situação que caracterizou o desvio de função e a irregularidade
apontada pela Diretoria Técnica.
Diante
do exposto, opina-se pela manutenção da penalidade imposta no item 6.2.4 do
acórdão recorrido.
Quando
da realização de auditoria a Diretoria Técnica apontou como irregular a
contratação do Sr. Dilson Rocha, o qual prestava serviços de digitação e
confecção da folha de pagamento do município, apresentando nota fiscal de
prestação de serviços, sem qualquer formalização do ato contratual. Apontou a
Diretoria que tal fato caracteriza burla ao concurso público, uma vez que os
serviços eram de natureza contínua, necessária para o bom andamento do serviço
público, uma vez que “a demanda dos serviços do Departamento de Recursos
Humanos requer um servidor com conhecimentos em informática e digitação” (fl.
630 dos autos TCE 04/03407834).
Durante
a instrução, o Responsável reconheceu que tal situação efetivamente ocorreu.
Nas
razões recursais não há menção à este aspecto da decisão, de forma que não
houve recurso expresso quanto ao item 6.2.5 do acórdão recorrido, motivo pelo
qual não há razões para alteração da decisão neste ponto.
A
Diretoria Técnica destacou quanto da realização de auditoria que havia ausência
de ficha de controle de horas extras prestadas, fato que evidenciava
deficiência no controle interno da Unidade, em detrimento ao disposto no art.
4º da Resolução n. TC-16/94.
O
Recorrente argumenta que “a precariedade do sistema de controle externo não
caracteriza que inexiste qualquer controle ou que houve irregularidade no seu
pagamento; ele por ser deficiente, mas não inexistente, como deseja impor a
instrução” (fl. 16);
Segundo
o Recorrente, “não há que se falar em ‘ausência de fichas de controle de horas
extras prestadas’, mas da precariedade e deficiência de ditos controles” (fl.
16).
Quanto
as fichas, entende que o Recorrente que “é compreensível a substituição de
fichas por outra forma de ‘certificação’, visto que se trata de servidores em
atividades de campo (...) e de pessoas em busca de tratamento fora do
domicílio, o que inviabiliza o registro mecânico no ponto” (fl. 16).
Destacou
o Recorrente que os motoristas de transporte escolar e de transporte de
pacientes iniciam ou concluem seus serviços antes ou além do horário normal de
expediente, caso contrário alunos ou pacientes não chegariam no horário
previsto para início das aulas ou para a realização de consultas e/ou exames em
cidades distantes.
No
que tange a materialidade, apontou o Recorrente que os documentos juntados às
fls. 753-755 dos autos TCE 04/03407834 não são suficientes para a
caracterização da infração noticiada, pois entende que “o fato de uma Unidade
interna controlando o número de horas extras realizadas, e a liquidação da
despesa não caracteriza que a ficha de controle de horas extras prestadas a que
se refere a Instrução, seja melhor e
mais eficiente em relação ao controle então existente naquela oportunidade”
(fl. 17).
A
questão de centro cinge-se ao modo pelo qual deveria o gestor comprovar a
realização dos serviços em horas extraordinárias, uma vez que a Unidade
utilizava-se de planilha elaborada pelo servidor responsável pelo controle de
cada setor interessado no pagamento das verbas remuneratórias.
Para
a Diretoria Técnica não basta esta planilha, pois segundo entendimento firmando
nos autos TCE “independentemente das atividades desenvolvidas pelos servidores
municipais, a ausência da folha de ponto devidamente e assinada pelo próprio
servidor, ou ainda, quando possível, de cartão-ponto das horas extras
efetivamente prestadas evidenciam deficiência no controle interno da Unidade”
(fl. 777 dos autos TCE 04/03407834).
Como
fundamento para a restrição alegou a Diretoria Técnica a violação ao disposto
no art. 4º da Resolução TC nº 16/94, que orienta no sentido de que “a ação
fiscalizadora do Tribunal levará em conta o grau de confiabilidade do sistema
de controle interno, considerando a estrutura organizacional e o nível de
segmentos administrativos e financeiros informatizados na unidade gestora”.
Como
se vê, o dispositivo não serve para fundamentar a restrição apontada pela
Diretoria Técnica. Para fins de imposição de penalidade exige a Lei
Complementar Estadual n. 202/2000 que reste caracterizada uma grave violação à
norma legal ou regulamentar de natureza contábil, financeira, orçamentária,
operacional e patrimonial, conforme disposto no art. 69 c/c os artigos 21,
parágrafo único e 18, alínea “b”.
Não
há elementos suficientes para considerar os pagamentos realizados com base em
anotações feitas pelos servidores públicos responsáveis como ilegais.
Qual
a razão pela qual a Diretoria Técnica entendeu que o sistema de controle
interno adotado pelo Município não era confiável? O fato de haver pagamentos
que se utilizaram de relatórios preparados pelas áreas interessadas
(Secretarias municipais de Saúde e de Obras).
Será
que foram constatados alguns pagamentos que não estivessem de acordo com os
serviços prestados? Não houve investigação nesse sentido, pois o relatório é
omisso quanto aos pagamentos irregulares por serviços não prestados.
Definitivamente,
a Diretoria Técnica não trouxe nenhum elemento que justifique a desconfiança
apontada no sistema de controle interno. Dizer que os pagamentos deveriam
ocorrer somente diante de cartão-ponto ou ficha assinada pelo servidor, ainda
que seja recomendado, não é suficiente para caracterizar como ilegal a forma
adotada, tampouco para considerar como suficientemente grave ao ponto de
justificar a imposição de penalidade pelo Tribunal de Contas.
O
tratamento jurídico acerca das horas extraordinárias está previsto nos artigos
41, inc. VI e 48 da Lei Complementar Municipal n. 45/2003 nos seguintes termos:
Art. 41 - Além do vencimento e das vantagens previstas nesta Lei,
serão deferidos aos servidores as seguintes gratificações e adicionais:
VI - o adicional pela prestação
de serviço extraordinário;
Art. 48. O adicional pela prestação de serviço extraordinário
será pago por hora de trabalho que exceda o período normal de expediente,
acrescido de 50% (cinqüenta por cento) da hora normal de trabalho, nos dias
normais e de 100% (cem por cento) nos feriados e domingos.
§ 1º. O valor da hora normal de trabalho será
determinado com base na remuneração do servidor.
§ 2º. Somente será permitido serviço
extraordinário para atender a situações excepcionais e temporais, conforme
dispuser o regulamento.
§ 3º. Os servidores poderão ter jornada de
trabalho especial de prorrogação e/ou compensação de horas de trabalho, desde
que observado o máximo de 10 (dez) horas diárias, a folga dominical e o limite
de horas mensais.
§ 4º - As horas trabalhadas em regime de
compensação não serão consideradas como extraordinárias.
Como
visto a norma legal acima mencionada não disciplinou a forma pelo qual deveria
ser reconhecido o direito do servidor à percepção do valor correspondente às
horas extraordinárias. Dispõe o § 2º do art. 48 da Lei Complementar Municipal
n. 45/2003 que as situações excepcionais e temporais seriam previstas em
regulamento.
Em
consulta realizada no dia 14/06/2011 ao sítio da internet da Prefeitura
Municipal de Otacílio Costa (www.otaciliocosta.sc.gov.br)
não foi possível localizar o regulamento.
Por
sua vez, a Diretoria Técnica também não trouxe aos autos informação sobre a
existência e/ou sobre a disciplina regulamentar acerca das horas
extraordinárias.
Contudo,
a ausência desse regulamento não afasta o direito do servidor em perceber a
verba remuneratória. Trata-se de norma de eficácia limitada ou reduzida, a qual
possui ampla extensão até que venha o regulamento a reduzir o seu campo de
atuação.
A
forma pela qual será feita o controle é questão de ordem interna na
Administração a qual compete ao gestor público disciplinar no seu poder
discricionário. Assim, não há como manter a restrição sob a alegação de que o
controle feito pelo município não era confiável, principalmente pelo fato de
que não foi trazido aos autos nenhum elemento que justificasse essa conclusão.
Assim,
diante do exposto, opina-se pelo cancelamento da penalidade imposta pelo item
6.2.6 do acórdão recorrido.
Anotou
a Diretoria Técnica que houve irregularidade administrativa em virtude de ter
sido autorizado o pagamento de horas extras a servidor ocupante de cargo
comissionado, em desacordo com os arts. 6º e 7º da Lei n. 495, de 23 de março
de 1990, que dispõe sobre o quadro de pessoal da administração do Município de
Otacílio Costa.
Reza
os arts. 6º e 7º da Lei Municipal n. 495/90 que:
Art. 6º
- Os Empregos em Comissão regidos pelo critério de
confiança são de livre nomeação e exoneração do Chefe do Poder Executivo.
Art. 7º
- Ficam alteradas as respectivas denominações e valores
dos Empregos em Comissão, conforme anexos V, VI e VII, partes integrantes desta
Lei.
Apontou
a Diretoria Técnica que houve o pagamento de horas extras ao servidor Getúlio
Macedo Michielin, assessor de imprensa, cargo de provimento em comissão, o que
seria indevido em vista da natureza das funções exercidas pelo comissionado.
Trouxe a opinião doutrinária e o
Prejulgado desta Corte de Contas n. 275 para subsidiar sua posição.
O
Recorrente em suas razões recursais aduziu que efetivamente houve o pagamento
indicado pela Diretoria Técnica, contudo, rechaça a alegação de irregularidade,
uma vez que não há norma legal que impeça o pagamento de horas extraordinárias
aos comissionados, ao menos no município de Otacílio Costa.
Em
primeiro lugar, cabe mencionar que a Lei n. 495/90 foi revogada pelo art. 32 da
Lei Complementar Municipal n. 44/2003, que dispõe sobre o Plano de Carreira dos
servidores públicos municipais do município de Otacílio Costa e estabelece
outras providências.
Em
segundo momento, cabe esclarecer que os dispositivos mencionados pela Diretoria
Técnica, ainda que vigentes, não sustentariam a restrição apontada, uma vez que
o fato de os Comissonado ainda que regidos pelo critério de confiança não
impedem a percepção de horas extraordinárias, como pretendeu indicar. Por
sua vez, o art. 7º da Lei n. 495/90 indicado pela instrução é complemente
alheia ao caso sob exame, não havendo nenhuma pertinência.
Outra
questão que merece destaque é o fato de que a instrução destacou apenas a
primeira parte do Prejulgado n. 275 desta Corte de Contas, destacando a ideia
da vedação ao pagamento de horas extraordinárias, porém, deixou de consignar a
segunda parte onde restou afirmado que “ao município é facultado, frente a sua
autonomia, estabelecer a forma de remunerar seus servidores, sempre em
conformidade com autorização legislativa específica”.
Logo,
é de se concluir que cabe ao Município, como ente político e autônomo que é em
nosso regime Federativo (art. 1º da Constituição Federal de 1988) disciplinar a
forma de remunerar seus servidores públicos, sejam providos em caráter efetivo
ou comissionado.
E
ao assim fazê-lo, o Município de Otacílio Costa expressamente fez consignar a
possibilidade de se remunerar as horas extraordinárias prestadas pelos
servidores públicos ocupantes de cargos comissionados.
De
fato, reza o art. 2º em seus incs. I e II da Lei Complementar Municipal n.
45/2003 que:
Para efeito deste Estatuto servidor público é a pessoa legalmente investida em cargo público”.
Por sua vez,
“Cargo público é o conjunto de atribuições e responsabilidades cometidas a um servidor, criado por lei, em número certo, com denominação própria e pago pelos cofres públicos para provimento em caráter efetivo ou em comissão”.
Como
visto, o regime jurídico dos servidores públicos municipais estabelece que
servidor público é todo aquele investido em cargo público, de provimento
efetivo ou em comissão.
Por
sua vez, dispõe o art. 41, inc. VI do mesmo estatuto que além do vencimento e
das vantagens previstas nesta Lei, serão deferidos aos servidores o adicional
pela prestação de serviço extraordinário.
Veja-se
que o legislador municipal não estabeleceu distinção entre a natureza
definitiva ou provisória da nomeação ao cargo para fins de remuneração acerca
do adicional ora examinado. E ao não fazê-lo, não cabe ao intérprete e
aplicador da lei fazê-lo.
Note-se
que o legislador municipal quando pretendeu conferir tratamento jurídico
distinto aos comissionados o fez expressamente, como, por exemplo, no § 2º do
art. 62 ao dispor que as licenças previstas nos incisos IV (para o serviço
militar), V (para atividade política ou desempenho de mandato classista ) e VI
(para tratar de interesses particulares ) não se aplicam ao servidor cujo
vínculo com o Município decorrer apenas do exercício de cargo em
comissão.
Ademais,
tanto a opinião da Diretoria Técnica, quanto à do Prejulgado n. 275 desta Corte
de Contas foram expostas com base na opinio
doctorum (doutrina), não na legislação municipal ora examinada.
No
caso concreto, fundou-se a Diretoria Técnica no entendimento apresentado pela
professora Lúcia do Valle Figueiredo, a qual se baseou em norma legal prevista
na Lei n. 8.112/90 (Estatuto dos Servidores Públicos Civis da União).
Ocorre
que as normas jurídicas que disciplinam a matéria são diversas, principalmente
ante a autonomia dos entes federados para disciplinar a matéria. Ademais, não
há norma constitucional que vede o pagamento de horas extraordinárias aos
ocupantes de cargos comissionados, de forma que há que respeitar a legislação
municipal que não veda esse pagamento, pelo contrário, deixa claramente aberta
a possibilidade de realizar o pagamento do adicional previsto no art. 48, inc.
VI da Lei Complementar Municipal n. 45/2003 aos comissionados, eis que
integrantes da categoria “servidores públicos”.
Diante
do exposto, opina-se pelo cancelamento da penalidade imposta pelo item 6.2.7 do
acórdão recorrido.
Apontou-se
como irregular a concessão de adicional de insalubridade sem amparo em lei
específica regulamentadora do percentual e dos critérios de concessão, conforme
exigência do art. 47 da Lei n. 45, de 20.06.2003 (Estatuto dos Servidores
Públicos de Otacílio Costa).
Em
suas razões recursais argumentou o Recorrente que a Diretoria Técnica
considerou regular os pagamentos feitos com base no Levantamento Ambiental de
Insalubridade (fls. 444-532), firmado pelo engenheiro inscrito no CREA/SC sob.
Nº. 25.748-8, de modo que somente os pagamentos realizados para atividades não
incluídas no citado levantamento seriam irregulares, o que totalizaria R$
25.818,68 (vinte e cinco mil, oitocentos e dezoito reais e sessenta e oito
centavos). Entende o Recorrente que ao assim considerar a Unidade Técnica não
há razão para se considerar irregular os pagamentos por falta de amparo legal e
definição de critérios para concessão, consoante fixou estabelecido no item
6.2.8 do acórdão recorrido.
O
inc. XXIII do art. 7º da Constituição Federal de 1988 prevê como direito dos
trabalhadores urbanos e rurais o recebimento de adicional de remuneração para o
fim mencionado.
Não
se negue o direito constitucional à percepção de adicional de remuneração para
as atividades penosas, insalubres ou perigosas, mas atente-se para a forma
prevista em lei.
Entretanto,
por si só, este direito não é estendido aos servidores públicos, pois o § 3º do
art. 39 da Carta Política de 1988 não determina a sua aplicação aos servidores
públicos.
Ainda
que assim a Constituição Federal não a preveja como garantia mínima de direitos
aos servidores públicos, o fato é que não é vedado o legislador
infraconstitucional estender este adicional de remuneração aos servidores
públicos. Mas em qualquer caso, a percepção terá que obedecer à forma prevista
em lei.
É
de se verificar que a norma constitucional inserida no inc. XXIII do art. 7º da
Constituição Federal de 1988 possui eficácia, de modo a irradiar seus efeitos
jurídicos, contudo, há que se destacar, segundo as palavras do professor José
Afonso da Silva, “é que a eficácia de certas normas constitucionais não se
manifesta na plenitude dos efeitos jurídicos pretendidos pelo constituinte
enquanto não se emitir uma normação jurídica ordinária ou complementar
executória, prevista ou requerida”[2].
Assim,
o disposto no inc. XXIII do art. 7º da Carta Constitucional de 1988, segundo o
mencionado professor José Afonso da Silva, se refere a norma constitucional de
eficácia limitada ou reduzida[3],
onde não se verifica a produção de todos os seus efeitos essenciais com a
simples entrada em vigor, uma vez que “o legislador constitucional, por
qualquer motivo, não estabeleceu, sobre a matéria, uma normatividade para isso
bastante, deixando essa tarefa ao legislador ordinário ou a outro órgão do
Estado”[4].
O
legislador ordinário municipal por sua vez, fez publicar a Lei Complementar
municipal n. 45/2003, que estabelece o Estatuto Jurídico dos Servidores
Públicos do Município de Otacílio Costa, onde, em seu art. 41, inc. V
estabeleceu genericamente a previsão do direito a percepção do adicional aos
servidores municipais que atuem, habitualmente, em condições penosas,
insalubres ou perigosas, cujo adicional será de até 50% incidente sobre o
vencimento do cargo efetivo, conforme regulamentação a ser feita por ato do
Poder Executivo Municipal.
Art. 41 - Além do vencimento e das vantagens previstas nesta Lei,
serão deferidos aos servidores as seguintes gratificações e adicionais:
V - o adicional pelo exercício
de atividades em condições penosas, insalubres ou perigosas.
(...).
Art. 47. O servidor que realizar atividades em condições penosas, insalubres ou perigosas faz jus a um adicional mensal, regulamentado em lei específica.
§ 1º. Os adicionais não são
acumuláveis, devendo o servidor optar por um deles.
§ 2º. O direito ao adicional previsto neste artigo cessa quando deixar o servidor de realizar a atividade ou com a eliminação das condições ou risco a que deram motivo a sua concessão.
No
caso, verifica-se que não havia norma regulamentar a dar concretude à norma
posta no art. 47 da Lei Complementar municipal n. 45/2003. Esta lei somente
veio ao mundo jurídico por intermédio da Lei Complementar municipal nº 71/2005.
Pelo
que se extrai dos autos, os pagamentos foram autorizados com base em Laudo
Técnico para fins de demonstração de que atividades prestadas em locais
insalubres, perigosos ou penosas.
Ante
a omissão do legislativo municipal em regulamentar o art. 47 da Lei
Complementar municipal n. 45/32003, tese que admitimos ad argumentandum tantum, tem-se que a norma insculpida na CLT poderia
ser acolhida por aplicação analógica, ante o previsto no art. 4º da Lei de
Introdução ao Direito Brasileiro (LICC) e com atenção ao princípio fundante da
República, a saber, a proteção à dignidade da pessoa humana, principalmente
quando se está a recompensar os prejuízos pessoais a que está exposto no
desempenho de determinadas atividades laborais.
Partindo
dessa premissa, está a se exigir a realização de Exame Técnico no local para
prestação dos serviços nas condições prejudiciais à saúde indicados no art. 7º,
inc. XXIII e 47 da LCM n. 45/2003.
Nesse
sentido, o comando inserido no art. 195 da CLT, com a redação dada pela Lei n.
6.514/77 assim reza:
‘Art. 195. A caracterização e a classificação da insalubridade e da periculosidade, segundo as normas do Ministério do Trabalho, far-se-ão através de perícia a cargo de Médico do Trabalho ou Engenheiro do Trabalho, registrados no Ministério do Trabalho.
Na
Orientação Jurisprudencial nº 278 do Tribunal Superior do Trabalho, por
exemplo, consta que “a realização de perícia é obrigatória para a verificação
de insalubridade”.
No
caso não se pode alegar que o pagamento espontâneo supre a necessidade de
perícia técnica para os fins do art. 195 da CLT, uma vez que não possui o
administrador público discricionariedade para esse mister, uma vez que
encontra-se jungido aos preceitos de legalidade e impessoalidade no trato da res publica, alçados a princípios
constitucionais inafastáveis na condução das competências lhe outorgadas pela
legislação de referência. Nesse sentido, afasta-se de pronto a aplicação da
tese carreada na Orientação Jurisprudencial n. 406 do TST.
Entretanto,
considerando que a ausência de norma legal específica não deve inviabilizava o
reconhecimento do direito reconhecido pela Constituição Federal e assegurado
pela Lei Complementar municipal n. 45/2003 aos servidores públicos municipais,
e considerando que houve a realização de perícia técnica, tais fatos se
apresentam como aptos a assegurar o reconhecimento do direito dos servidores
beneficiados com os pagamentos autorizados pelo Recorrente.
Contudo,
há que se destacar que a Diretoria Técnica apontou que houve pagamentos para
situações que não estavam previstas no Levantamento Ambiental de Insalubridade,
fato esse mencionado pelo próprio Recorrente (fls. 20).
Nesse
sentido, esses pagamentos que redundaram em despesas na ordem de R$ 25.818,68
(vinte e cinco mil, oitocentos e dezoito reais e sessenta e oito centavos)
foram realizados ao arrepio das normas aplicadas por analogia (art. 195 da CLT)
e ao largo da análise técnica elaborada pelo engenheiro do trabalho, de modo
que permanece a restrição nesse aspecto, uma vez que esses pagamentos foram
realizados em desconformidade com o disposto no art. 47 da Lei Complementar
municipal n. 45/2003, pois além de não se atender à legislação análoga (art.
195 da CLT), igualmente foram autorizadas em amparo em lei específica
municipal, uma vez que esta somente veio a ser estabelecida pelo legislador no
ano de 2005, posteriormente, portanto, aos pagamentos.
No
que se refere à materialidade e a autoria os documentos juntados as fls. 253
usque 443 dos autos TCE 04/03407834 demonstram os pagamentos realizados aos
servidores.
Nesse
sentido, opina-se pela manutenção da penalidade imposta pelo item 6.2.8 do
acórdão recorrido, com a ressalva de que as despesas irregulares ficam
restritas aos pagamentos em situações desconformes ao Levantamento Ambiental de
Insalubridade NR 15 – Portaria n. 3214/78 apontadas pela Diretoria Técnica na
ordem de R$ 25.818,68 (vinte e cinco mil, oitocentos e dezoito reais e sessenta
e oito centavos).
Informou
a Diretoria Técnica que o pagamento de horas extras era efetuado com
habitualidade, praticamente em todos os meses, de forma fixa, configurando
remuneração indireta e descaracterizando o caráter extraordinário desta
prestação pecuniária, em desacordo com o art. 48, § 2º, da Lei Complementar n.
45/03 e a Lei (federal) 4.320/64, art. 63, § 2º, III.
Iniciou
o Recorrente aduzindo que não cabe ao Tribunal de Contas emitir juízo de valor
sobre procedimentos que o Administrador deve tomar, e nem firmar orientação de
como se deve administrar o município em seus relatórios de inspeção.
Contudo,
no que toca à recomendação exarada à fls. 26 do Relatório n. 738/2006 destacou
o Recorrente que a sua implantação na prática administrativa é difícil e
inimaginável, face as características dos serviços prestados pelos motoristas,
principalmente os de ambulâncias que realizam os transporte de pacientes para
Tratamento Fora do Domicílio (TFD).
No
que tange ao mérito, destacou o Recorrente que em verdade o pagamento de horas
extraordinárias em situação mais duradora atingiu apenas 3% do total dos
servidores em razão das características dos serviços prestados. Informou que
não há intenção de estabelecer uma forma de remuneração indireta para os
servidores beneficiados, mas apenas pagar pelos serviços efetivamente prestados
pois tratava-se de serviços que não se limitavam à jornada de trabalho normal
na repartição. Para exemplificar, destacou a situação do médico veterinário e
dos motoristas de transporte escolar e de ambulâncias (fls. 32).
No
que toca aos motoristas, ponderou o Recorrente que “estes servidores não
iniciam e nem terminam a sua jornada de trabalho de acordo com o horário de
expediente das repartições. Os motoristas do transporte escolar iniciam sua
jornada antes do clarear do dia, para fazer o transporte dos alunos do interior
para a sede, e só encerram a sua jornada quando retornam após ter deixado o
último aluno no destino” (fl. 32). Já quanto aos motoristas de ambulância,
prossegue o Recorrente, estes “partem de madrugada para chegar ao seu destino
nas primeiras horas do dia, e na maioria das vezes só retornam ao final do dia,
enfrentando um longo caminho de volta, para no dia seguinte fazer tudo igual”
(fl. 32). Em sua conclusão, o Recorrente aduziu que “se estes profissionais
cumprissem o horário dos expedientes da repartição, jamais os alunos residentes
fora da sede estariam as 07h45min nas salas de aula, e nem os pacientes em
tratamento fora do domicílio chegariam aos seus destinos nas primeiras horas do
dia” (fl. 32).
Verifica-se
que a média anual de servidores no Município que perceberam horas
extraordinárias foi de 29,28%, ou seja, quase 30% dos servidores perceberam
valores a título de horas extraordinárias ao longo do ano de 2003, conforme
demonstrativo abaixo, produzido com base nos documentos de fls. 534-545 dos
autos do processo TCE 04/03407834.
Mês/2003 |
Quant. Func. |
Quant. Func. HE 50% |
Quant. Func. HE
100% |
% HE 50% |
% HE 100% |
% HE Geral |
Jan |
392 |
30 |
25 |
7,65% |
6,38% |
14,03% |
Fev |
414 |
72 |
35 |
17,39% |
8,45% |
25,85% |
Mar |
415 |
96 |
23 |
23,13% |
5,54% |
28,67% |
Abr |
415 |
99 |
43 |
23,86% |
10,36% |
34,22% |
Mai |
413 |
110 |
89 |
26,63% |
21,55% |
48,18% |
Jun |
417 |
77 |
56 |
18,47% |
13,43% |
31,89% |
Jul |
418 |
70 |
19 |
16,75% |
4,55% |
21,29% |
Ago |
417 |
48 |
11 |
11,51% |
2,64% |
14,15% |
Set |
425 |
67 |
41 |
15,76% |
9,65% |
25,41% |
Out |
426 |
85 |
53 |
19,95% |
12,44% |
32,39% |
Nov |
423 |
95 |
65 |
22,46% |
15,37% |
37,83% |
Dez |
422 |
93 |
61 |
22,04% |
14,45% |
36,49% |
Média Anual |
416 |
79 |
43 |
18,85% |
10,43% |
29,28% |
Graficamente,
pode-se perceber que há uma uniformidade nos pagamentos de horas
extraordinárias. Por exemplo, já um crescente aumento no número de servidores
beneficiados nos meses de janeiro a maio, com um decréscimo nos meses de junho
a agosto, e um novo crescimento nos meses de setembro a novembro de 2003,
conforme se pode observa abaixo.
Desses
servidores que perceberam horas extraordinárias a Diretoria Técnica constatou
que 17 servidores, percebiam verbas de modo habitual, sendo eles carpinteiro,
médico veterinário, operador de equipamento II, almoxarife, motorista, auxiliar
administrativo, guarda e auxiliar de serviços gerais (fls. 778/779 dos autos
TCE 04/03407834).
Esse
quantitativo equivale a média anual de 4,08% do total de servidores (17 de
416), percentual o qual se considera insuficiente para o fim de caracterização
da intenção de burlar o sistema remuneratório estabelecido por lei aos
servidores públicos do Município de Otacílio Costa.
Ainda
que seja questionável os pagamentos feitos em relação aos cargos de
carpinteiro, auxiliar administrativo e auxiliar de serviços gerais de forma
habitual, os quais via de regra devem atender aos horários de funcionamento
normal, verifica-se que não há provas de que tais serviços não foram
efetivamente prestados. Ademais, para fins de controle de regularidade, tem-se
que considerar que houve a manifestação de um servidor público o qual foi
designado internamente para realizar o controle e registrar as horas prestadas
pelos demais servidores. Não havendo indícios fortes que demonstrem que os
registros não sejam verdadeiros, não há razão para se imputar responsabilidade
ao ex-gestor, ora Recorrente.
No
que tange aos demais cargos, é plausível que estes servidores desempenhem suas
funções em carga horária superior ao estabelecido em lei para os seus cargos,
principalmente os motoristas que atuam no transporte de alunos em horários
diversos daqueles que a lei ou o regulamento estabelece para a sua jornada de
trabalho.
Destaca-se
que não fez prova a Diretoria Técnica da carga horária de cada cargo, tampouco
trouxe elementos que servissem de fundamento para se desconsiderar os valores
registrados no controle interno. Salvo prova em contrário, há que se considerar
como corretos estes registros.
Contudo,
o que se pode extrair das razões que levaram o Tribunal Pleno a considerar
irregular não foi diretamente a deficiência no controle interno, tampouco em
relação à correção ou não dos registros efetuados, mas sim o fato de que os 17
servidores estavam sendo remunerados com horas extraordinárias em caráter
habitual.
Afinal,
em determinadas situações excepcionais, é possível o pagamento de horas extras
habituais?
Em
primeiro lugar, cabe ressaltar que a partir do ano de 2005, com a entrada em
vigor das Leis Complementares do Município de Otacílio Costa nºs 74 e 76 foi
vedada à percepção cumulativa da gratificação de antecipação e/ ou prorrogação
da jornada de trabalho - GAP com a remuneração de horas extraordinárias
aos motoristas de transporte escolar e aos motoristas de ambulâncias.
Contudo,
no ano de 2003 não havia previsão semelhante e pelo que destacou o Recorrente,
corroborado com os registros efetuados no setor competente do município aos
quais serviram de base para a liquidação das despesas, os
serviços prestados em sobretempo à jornada normal do servidor deveriam ser
remunerados, a teor do disposto no art. 41, inc. VI da Lei Complementar n.
45/2003.
Parece
evidente que os serviços de transporte escolar e os de pacientes para
tratamento fora do domicílio iniciam-se e/ou encerram-se, no mais das vezes, em
períodos diversos daqueles aos quais estão submetidos os demais servidores
públicos, o que em tese justifica se considerar como superiores às 6(seis) ou 8
(oito) horas diárias as quais estão submetidos os demais servidores públicos.
Não
se alegue que resta impossível se verificar o tempo despendido pelo servidor
motorista em seus deslocamentos, haja vista que pela administração é conhecida
a rota utilizada e o tempo médio gasto nessas viagens, ademais, igualmente é
possível verificar o tempo de partida e chegada mediante a verificação do
registrador instantâneo e inalterável de velocidade e tempo, conhecido por
tacógrafo, cuja instalação nos veículos de transporte escolar e em determinados
veículos de transporte de pessoas para tratamento ambulatorial, são
obrigatórios por regulamentação do Conselho Nacional de Trânsito – CONTRAN para
os veículos de transporte e condução de
escolares, nos de transporte de passageiros com mais de dez lugares e nos de
carga com capacidade máxima de tração superior a 19 toneladas[5].
Para
os fins de controle de jornada, observa-se que o art. 2º da Resolução n. 92/99
do CONTRAN prevê que o registrador instantâneo e inalterável de velocidade e
tempo deverá apresentar e disponibilizar a qualquer momento, pelo menos, as
seguintes informações das últimas vinte e quatro horas de operação do veículo:
I. velocidades desenvolvidas;
II. distância
percorrida pelo veículo;
III. tempo de
movimentação do veículo e suas interrupções;
IV. data e hora de início
da operação;
V. identificação do
veículo;
VI. identificação dos
condutores;
VII. identificação de abertura do compartimento que contém o
disco ou de emissão da fita diagrama.
Reza
o parágrafo único do art. 2º da Resolução n. 92/99 que para a apuração dos
períodos de trabalho e de repouso diário dos condutores, a autoridade
competente utilizará as informações previstas nos incisos III, IV, V e VI acima
indicados.
Portanto,
possível se apresenta verificar os eventuais sobretempos nos deslocamentos fora
do horário normal da jornada de trabalho.
Assim,
não é demais supor que os servidores que atuam nesse segmento da atividade
administrativa possam, de fato, encontrar-se em situação que caracterize a
habitualidade na execução de serviços que extrapolem a jornada de trabalho
normal. A realidade local é que irá conferir e confirmar esta situação ou não.
Cabe
esclarecer que não se pretender ver aplicado o reconhecimento legal do direito
à percepção ao adicional de horas extraordinárias, uma vez que o mesmo já
encontra previsão no art. 41, inc. VI da Lei Complementar municipal n. 45/2003,
até porque esta Corte de Contas já se manifestou por meio do Prejulgado n. 1299
que não caberia aplicar as regras da CLT, eis que os servidores públicos são
regidos por outro regime jurídico. Cabe ressaltar que o art. 4º da Lei de
Introdução às normas do Direito Brasileiro (redação dada pela Lei nº
12.376, de 2010), dispõe que “quando a lei for omissa, o
juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios
gerais de direito”. No caso, há uma omissão da lei (sentido amplo), uma vez que
não trouxe regulamentação completa para a concessão de um direito
reconhecimento pela lei complementar municipal.
Entretanto,
a situação aqui verificada é acerca do reconhecimento de hipóteses em que se
poderia autorizar o pagamento de horas extraordinárias, haja vista que se trata
de um direito do servidor expressamente consignado no estatuto jurídico do
servidor público do município de Otacílio Costa, o qual caberia ao regulamento
infralegal disciplinar as hipóteses nos termos do § 2º do art. 48 da Lei
Complementar n. 45/2003. Nesta situação excepcional e restrita, é que se busca
nas normas da CLT, regramento para fins de aplicação analógica.
No
sentir da disciplina encartada na CLT pode-se observar que o pagamento habitual
das horas extraordinárias não encontra vedação absoluta, haja vista que a sua
percepção ao longo de pelo menos um ano junto ao mesmo empregador confere ao
trabalhador uma série de vantagens (Súmula TST 291), tais como a incorporação
desse valor na remuneração do empregado para fins de indenização por
antiguidade (Súmula TST 24), da gratificação natalina (Súmula TST 45), aviso
prévio (Súmula TST 94 e art. 487, § 5º do CLT), repouso semanal remunerado
(Súmula TST 172).
Ainda
que não se aplique estas disposições na sua integralidade aos servidores
públicos por estarem submetidos a regime jurídico estatutário, há que se
destacar que a habitualidade no pagamento de horas extraordinárias não se
apresenta de todo proibida, uma vez atendidas as hipóteses previstas em lei.
Dispõe
a CLT que “a duração normal do trabalho poderá ser acrescida de horas
suplementares, em número não excedente de 2 (duas), mediante acordo escrito
entre empregador e empregado, ou mediante contrato coletivo de trabalho”,
segundo previsão expressa no art. 59 caput.
Não
parece ser esta a hipótese dos casos mencionados pela Diretoria Técnica, uma
vez que não há acordo individual ou coletivo para disciplinar os serviços em
sobretempo. Entretanto, há outra previsão da CLT que trata das horas
extraordinárias. Assim, o art. 61 da CLT dispõe que ocorrendo necessidade
imperiosa a) para fazer face a motivo de força maior, ou b) para atender à
realização ou conclusão de serviços inadiáveis, ou ainda, para c) atender a
situações cuja inexecução possa acarretar prejuízo manifesto às partes, poderá
a duração da jornada de trabalho exceder o limite legal ou convencional.
Aqui,
extrai-se, por analogia, o fundamento para o pagamento de horas extraordinárias
em relação aos principais serviços indicados pela Diretoria Técnica,
principalmente médico veterinário e motorista de transportes escolares e/ou de
pacientes, principalmente quando os serviços precisavam ser antecipados e/ou
prorrogados para atendimento às demandas sociais que se manifestavam na
municipalidade.
É
certo que para fins de pagamento das horas extraordinárias não se leve em
consideração, de forma absoluta, esse critério, eis que se deve considerar a
jornada de trabalho de cada servidor que fizer jus à percepção do
adicional. Entretanto, não fez prova a
Diretoria Técnica que os pagamentos foram irregulares sob o ponto de vista da
não execução dos serviços, eis que se limitou a aduzir que os pagamentos eram
habituais.
Assim,
considerando que os serviços indicados pela Diretoria Técnica em sua maioria
podem ser enquadrados como serviço que necessite, de fato, de antecipação ou
prorrogação jornada de trabalho, opina-se, com base nos apontamentos acima
expostos, pelo cancelamento da penalidade imposta no item 6.2.9 do acórdão
recorrido.
A
irregularidade indicada no item 6.2.10 do acórdão recorrido encontra previsão
no item 6.2.8 acima analisado, de modo que a sua manutenção acarreta bis in
idem, ou seja, dupla penalização pelo mesmo fato, o que além não se apresenta
possível ante o princípio de direito o qual indica que ninguém pode sofrer duas
penas em face do mesmo ato.
Nesse
sentido, de plano opina-se pelo cancelamento da penalidade imposta no item
6.2.10 do acórdão recorrido.
Apontou
a Diretoria Técnica que com a revogação
da Lei Complementar Municipal n. 02/97 o servidor Edemilson Lopes de Souza
deixou de ter direito à percepção do valor correspondente à Função Gratificada
a partir do mês de junho de 2003, o que totalizaria o valor de R$ 149,75 (cento
e quarenta e nove reais e setenta e cinco centavos), pagos a maior (fls. 794-797).
O
Recorrente argumentou que tal situação foi provocada em “razão da desatenção
dos serviços da folha de pagamento, que não exclui do sistema o valor da
gratificação de R$ 29,75 por mês, após a entrada em vigor da Lei Complementar
n. 45, de 18 de junho de 2003” (fl. 23).
De
acordo com o Recorrente “não houve da parte do Recorrente, decisão no sentido
de que, uma vez extinta a Função Gratificada nos termos do art. 44 da LC nº
45/2003, mantivesse o benefício em favor do servidor” (fl. 23).
Aduziu
que o processo de tomada de contas não identificou o responsável pelo
lançamento irregular, uma vez que não foi o Recorrente quem deu causa ao
pagamento a maior.
Assiste
razão ao Recorrente, pois conforme verificado e acolhido pela instrução técnica
houve a manutenção na folha de pagamento de um servidor, de valor de R$ 29,75
(vinte e nove reais e setenta e cinco centavos) a título de função gratificada
a qual havia sido extinta no mês de junho.
Não
há qualquer indicativo de que o Recorrente tivesse consciência desta irregularidade
ao autorizar o pagamento da folha de salário, principalmente pela
impossibilidade de o mesmo exercer uma prévia auditoria sobre a composição de
todos os itens componentes da folha de salários.
Há
o princípio da confiança entre o agente público que assina a ordem de pagamento
e os servidores que atualizam as informações cadastrais de cada servidor,
prepararam e fazem expedir (rodar, no jargão administrativo) a folha de
pagamentos.
Não
há como o Prefeito analisar caso a caso, a situação de cada servidor
previamente à autorização.
Assim,
não havendo consciência e vontade do gestor na prática do ato irregular, não há
que se falar em responsabilidade ante a ausência de conduta dolosa. No tocante
à culpa, não trouxe a Diretoria Técnica elementos que demonstrassem a sua
presença. A culpa se manifesta pelas formas tradicionais da negligência,
imprudência ou imperícia.
No
caso, se estivéssemos diante da hipótese em que normalmente o Prefeito realiza
a análise detida de todos os componentes das folhas de pagamentos, é possível
que se caracterizasse falha no dever de fiscalização, por via do reconhecimento
de negligência. Contudo, não é essa a conduta normal do administrador público.
Este por força de lei ou regulamento delega a atribuição e responsabilidade
pela elaboração da folha de pagamentos.
No
caso concreto, verificou-se que a falha administrativa recaiu sobre apenas um
servidor, e sobre parcela de valor reduzido, o que no mais das vezes, não
desperta a atenção do gestor no momento da autorização.
Ausente
a conduta dolosa, tampouco a culposa do agente, não há se faltar de tipicidade
de ato administrativo irregular. A resposta do órgão de controle externo não
pode ser maior que a própria nocividade intrínseca manifestada no ato
irregular. O princípio da proporcionalidade impõe apenas a chamada de atenção
do gestor para que medidas corretivas sejam tomadas, ante a insignificância do
valor e a inexpressividade de lesividade ao erário.
Ademais
não faz qualquer sentido aplicar-se uma multa de R$ 400,00 (quatrocentos reais)
para uma falha na composição da folha de pagamentos a qual apresentou uma
discrepância de R$ 149,75 (cento e quarenta e nove reais e setenta e cinco
centavos).
Considerando-se
que não há razões que permitam concluir pela intenção do gestor em beneficiar o
servidor indicado pela Diretoria Técnica, tampouco de causar prejuízo ao
erário, e ante a aplicação do princípio da proporcionalidade, opina-se pelo
cancelamento da multa aplicada no item 6.2.11 do acórdão recorrido.
3. CONCLUSÃO
Diante
do exposto, a Consultoria Geral emite o presente Parecer no sentido de que o
Conselheiro Julio Garcia proponha ao Egrégio Tribunal Pleno decidir por:
3.1. Conhecer
do Recurso de Reexame interposto nos termos do art. 80 da Lei Complementar nº
202, de 15 de dezembro de 2000, contra o Acórdão nº 1.050/2009, exarada
na Sessão Ordinária de 27/07/2009, nos autos do Processo nº TCE 04/03407834, e
no mérito dar provimento parcial para:
3.1.1. Cancelar
as multas aplicadas ao Responsável, Sr. Altamir José Paes, constante dos itens
6.2.6, 6.2.7, 6.2.9, 6.2.10 e 6.2.11 do Acórdão Recorrido.
3.1.2. Ratificar
os demais termos da Deliberação Recorrida.
3.2. Dar
ciência da Decisão, do Relatório e Voto do Relator e do Parecer da Consultoria
Geral ao Sr. Altamir José Paes e à Prefeitura Municipal de Otacílio Costa.
Consultoria Geral, em 16 de junho de
2011.
SANDRO LUIZ NUNES
AUDITOR FISCAL DE CONTROLE EXTERNO
De acordo:
JULIANA FRITZEN
COORDENADORA
Encaminhem-se os Autos à elevada consideração do Exmo.
Sr. Relator Conselheiro Julio Garcia, ouvido preliminarmente o Ministério
Público junto ao Tribunal de Contas.
HAMILTON HOBUS HOEMKE
CONSULTOR GERAL
[1] Princípios constitucionais dos servidores públicos. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 179.
[2] Aplicabilidade das normas constitucionais. 7ª ed., São Paulo: Malheiros, 2007, pp. 81-82.
[3] O autor propõe a classificação das normas constitucionais em três categorias: a) normas constitucionais de eficácia plena (aplicabilidade direta, imediata e integral); b) normas constitucionais de eficácia contida (aplicabilidade direta, imediata, mas não integral) e c) normas constitucionais de eficácia limitada ou reduzida (aplicabilidade indireta, mediata).
[4] Op. cit., pp. 82-83.
[5] Conforme item 21, do inciso I do art. 1º da Resolução CONTRAN nº 14/98.