PROCESSO Nº:

REC-09/00474270

UNIDADE GESTORA:

Prefeitura Municipal de Capinzal

INTERESSADO:

Nilvo Dorini

ASSUNTO:

Recurso de Reexame referente Processo RPJ 04/01314677

PARECER Nº:

COG - 309/2011

 

Licitação. Dispensa. Emergência. Comprovação.

É dispensável a licitação nos casos de emergência, quando caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, devendo tal situação estar caracterizada nos autos, a teor do disposto no artigo 24, IV e parágrafo único, I, da Lei nº 8.666/93.

Contrato administrativo. Regularidade do contratado com a Seguridade Social e FGTS. Necessidade.

Em toda e qualquer contratação, deve a Administração comprovar a situação de regularidade fiscal do contratado com a Seguridade Social e com o FGTS, em atendimento ao disposto no art. 195, § 3º, da Constituição Federal e art. 47, I, a, da Lei 8.212/91 e art. 27, a, da Lei nº 8.036/90 e art. 2º, da Lei nº 9.012/95.

 

Sr. Consultor,

 

1. INTRODUÇÃO

 

Trata-se de Recurso de Reexame em face do Acórdão nº 0882/2009, proferido na sessão ordinária do dia 22 de junho de 2009, nos autos do processo RPJ-04/01314677 – Representação do Poder Judiciário/Vara Única da Comarca de Capinzal com informe de irregularidades na contratação, nos exercícios de 2003 e 2004, de empresas sem prévios processos licitatórios, na Prefeitura Municipal de Capinzal.

 

Consta do citado Acórdão:

 

”6.1. Conhecer do Relatório de Auditoria realizada na Prefeitura Municipal de Capinzal e no Fundo de Saúde daquele Município, com abrangência aos exercícios de 2003 e 2004, para considerar irregulares, com fundamento no art. 36, §2º, alínea "a", da Lei Complementar n. 202/2000, as Dispensas de Licitação ns. 13 e 99/2003 e 02 e 20/2004.

 

6.2. Aplicar aos Responsáveis abaixo discriminados, com fundamento no art. 70, II, da Lei Complementar n. 202/2000 c/c o art. 109, II, do Regimento Interno, as multas a seguir especificadas, fixando-lhes o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial Eletrônico desta Corte de Contas, para comprovarem ao Tribunal o recolhimento ao Tesouro do Estado das multas cominadas, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos artigos 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000:

 

6.2.1. à Sra. KAMILLE SARTORI BEAL - Gestora do Fundo Municipal de Saúde de Capinzal em 2003 e 2004, CPF n. 982.040.179-87, as seguintes multas:

 

6.2.1.1. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em razão da ausência de licitação quando da realização de despesas decorrentes das Dispensas de Licitação ns. 13/2003 e 02/2004, contrariando o art. 2º da Lei (federal) n. 8.666/93 c/c art. 37, XXI, da Constituição Federal;

 

6.2.1.2. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em decorrência da falta de justificativa para as Dispensas de Licitação n. s 13/2003 e 02/2004, contrariando o art. 26, parágrafo único, I, da Lei (federal) n. 8.666/93 (item 3.1.1 do Relatório DLC);

 

6.2.1.3. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em razão da ausência das certidões negativas de débito perante o FGTS e INSS dos contratados nas Dispensas de Licitação ns. 13/2003 e 02/2004, contrariando o art. 29, IV, da Lei (federal) n. 8.666/93 c/c o art. 195, §3o, da Constituição Federal (item 3.1.1 do Relatório DLC).

 

6.2.2. ao Sr. NILVO DORINI - ex-Prefeito Municipal de Capinzal, CPF n. 482.175.149-68, as seguintes multas:

 

6.2.2.1. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em razão da ausência de licitação quando da realização de despesas decorrentes das Dispensas de Licitação ns. 99/2003 e 20/2004, contrariando o art. 2º da Lei (federal) n. 8.666/93 c/c art. 37, XXI, da Constituição Federal;

 

6.2.2.2. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em decorrência da falta de justificativa para as Dispensas de Licitação ns. 99/2003 e 20/2004, contrariando o art. 26, parágrafo único, I, da Lei (federal) n. 8.666/93 (item 3.2.1 do Relatório DLC).

 

6.3. Dar ciência deste Acórdão, do Relatório e Voto do Relator que o fundamentam, bem como do Relatório de Instrução DLC/Insp.2/Div.6 n. 472/07, à Vara Única da Comarca de Capinzal, à Prefeitura Municipal de Capinzal e aos Responsáveis nominados no item 3 desta deliberação.

 

Irresignados com o teor do Acórdão retro citado, o Senhor Nilvo Dorini, Prefeito Municipal à época, e a Senhora Kamille Sartori Beal, Gestora do Fundo Municipal de Saúde à época, através de procurador legalmente constituído, ingressaram com recurso de reexame, buscando a reforma da decisão do E. Tribunal Pleno.

 

2. ANÁLISE

 

2.1 Pressupostos de admissibilidade

 

O Processo que deu origem ao Acórdão nº 882/2009, ora recorrido, trata de Representação sobre irregularidades em atos de dispensas de licitações e contratos decorrentes, logo o manejo do recurso de reexame é o adequado para buscar a reforma do decisório, consoante disposto nos arts. 79 e 80 da Lei Complementar nº 202, de 15 de dezembro de 2000. 

 

O Acórdão nº 882/2009 foi publicado no Diário Oficial Eletrônico do Tribunal de Contas – DOTCe nº 285, do dia 06 de julho de 2009 e o Recurso de Reexame foi protocolado no dia 21 de julho de 2009. Assim, verifica-se o cumprimento da tempestividade, uma vez que o recurso foi impetrado no trintídio legal, consoante disposto no art. 80 da Lei Complementar nº 202/2000.

 

Igualmente foram cumpridos os requisitos da legitimidade dos Recorrentes, que figuram na condição de responsáveis no processo, e o da singularidade da peça recursal.

 

Desta forma, verifica-se o preenchimento dos requisitos de admissibilidade, consoante disposto no art. 27, § 1º, da Resolução nº TC-09/2002,  com a redação dada pelo art. 6º da Resolução nº TC-05/2005, podendo o recurso ser conhecido, atribuindo-se-lhe, efeito suspensivo.

 

 

2.2. Da análise do mérito   

 

2.2.1 Da preliminar suscitada

 

Os Recorrentes alegam, em sede preliminar, que o objeto da representação foi apreciado pelo Poder Judiciário em ação popular, que declarou judicialmente válidas as contratações, devendo ser extinta a demanda administrativa pela perda de objeto, não cabendo ao Tribunal de Contas reapreciar a matéria.

 

Simples leitura da ação popular (fls. 03/10), revela que o requerido naquela demanda judicial foi a nulidade das dispensas de licitações 02/04 e 20/04 e respectivos contratos, da Prefeitura Municipal de Capinzal e do Fundo Municipal de Saúde, respectivamente,  e sobre esta matéria foi a sentença proferida.

 

Por sua vez, os autos da representação neste Tribunal de Contas trata de irregularidades nas dispensas de licitações 099/03, 20/04, 13/03 e 02/04 e respectivos contratos.

 

Como se pode notar, são matérias distintas, que não se confundem. O Tribunal de Contas nem poderia declarar diretamente a nulidade dos contratos, nem das dispensas de licitação porquanto não tem competência para tal.

 

Por outro lado, o Juízo que proferiu a sentença não poderia analisar os procedimentos sob a ótica da fiscalização do Controle Externo pelas mesmas razões, e, ainda, porque tinha que se limitar ao requerido na inicial que era a declaração de nulidade das dispensas 02/04 e 20/04 e respectivos contratos.

 

A ação popular tem finalidade especifica para pleitear a anulação de ato da Administração, consoante art. 5º, LXXIII, da Constituição Federal e não poderia ser manejada para a verificação da regularidade de procedimentos desvinculada de sua natureza que é a obtenção da nulidade.

 

Nos dizeres do saudoso Hely Lopes Meirelles[1]

 

“Ação popular é o meio constitucional posto a disposição de qualquer cidadão para obter a invalidação de atos ou contratos administrativos - ou a estes equiparados – ilegais e lesivos do patrimônio federal, estadual e municipal, ou de suas autarquias, entidades paraestatais (sociedades de autonomia mista, empresas públicas, serviços sociais autônomos e entes de cooperação) e pessoas jurídicas subvencionadas com dinheiro público.”

 

Temos, ainda, que o Tribunal de Contas tem autonomia para realizar a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da Administração Pública jurisdicionada, verificando aspectos de legalidade, legitimidade e economicidade, consoante disposto nos arts. 70, 71 e 75 da Constituição Federal e arts. 59 e 60 da Constituição Estadual.

 

É bem verdade que esta autonomia não é absoluta, pois cabe ao Poder Judiciário a verificação da legalidade do procedimento e decisão, todavia, sem adentrar no mérito propriamente dito da decisão do Tribunal de Contas.

 

Nos ensinamentos de Teori Albino Zavascki[2]:

 

“(...) as decisões tomadas em procedimentos fiscalizatórios do Tribunal de Contas, previstas no art. 71, § 3º, da Constituição. Nesses procedimentos, esgotados os mecanismos aptos a impugnar a decisão tomada, opera-se coisa julgada, vinculativa em relação aos interessados. Trata-se toda via de coisa julgada administrativa, ou seja, mera preclusão, que de modo algum inibe a garantia, que é constitucionalmente assegurada ao interessado, de submeter a controle jurisdicional a legitimidade formal e material do procedimento e da própria decisão. Dir-se-á que é controle limitado, porque restrito apenas a juízos de legalidade. É verdade, mas nem poderia ser de outra forma, já que os juízos de legalidade são os juízos próprios das decisões jurisdicionais. Esse mesmo limite – de controle de legalidade, e não da conveniência ou oportunidade – tem o Judiciário quando examina outras formas privadas de solução de litígios, como é o caso, por exemplo, da transação celebrada entre particulares (...).” Grifo nosso)

 

Esta matéria já foi exaustivamente apreciada pelo Poder Judiciário que deu o norte a ser seguido. Vejamos:

 

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL EM AÇÃO ORDINÁRIA. APLICAÇÃO DE MULTA PELO TRIBUNAL DE CONTAS ESTADUAL EM RAZÃO DE ATRASO NA REMESSA DE DADOS POR GESTOR DE CÂMARA MUNICIPAL. OBSERVÂNCIA AO DEVIDO PROCESSO LEGAL (CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA). IMPOSSIBILIDADE DE INCURSÃO DO PODER JUDICIÁRIO NO MÉRITO DO ATO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA QUE SE IMPÕE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Apelação Cível2009.006551-5, TJ/RN.

 

"ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE CONTAS ESTADUAL. TOMADA DE CONTAS E APLICAÇÃO DE PENALIDADES AOS ADMINISTRADORES. CABIMENTO DO MANDAMUS PARA ANÁLISE DA REGULARIDADE DA DECISÃO ADMINISTRATIVA. I - O mandado de segurança foi instruído com os documentos necessários à solução da controvérsia, cabendo ao Judiciário, em homenagem ao princípio da inafastabilidade da jurisdição, sem entrar no mérito do ato administrativo, verificar a regularidade da decisão administrativa. II - Conforme se depreende dos documentos acostados aos autos, o desenvolvimento do processo administrativo deu-se de forma regular, tendo sido oferecida oportunidade para defesa e interposição de recursos, com observância do devido processo legal, contraditório e ampla defesa, concluindo-se pela responsabilização dos recorrentes. III - Recurso ordinário improvido" (RMS 12.349/RO, Rel. Ministro  FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 15/02/2005, DJ 14/03/2005 p. 194)

 

"APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. EMBARGOS À EXECUÇÃO. DECISÃO PROFERIDA PELO TRIBUNAL DE CONTAS. (...). EFICÁCIA DE TÍTULO EXECUTIVO. IMPUTAÇÃO DE DÉBITO OU MULTA. REAPRECIAÇÃO DA DECISÃO PELO PODER JUDICIÁRIO. IMPOSSIBILIDADE DE O JUDICIÁRIO INGRESSAR NO MÉRITO DO ATO ADMINISTRATIVO, LIMITANDO-SE AO EXAME DE SUA LEGALIDADE. 1. As decisões do Tribunal de Contas de que resulte imputação de débito ou multa possuem eficácia de título executivo, e geram crédito de natureza não-tributária, não se aplicando, portanto, o prazo prescricional previsto no art. 174 do CTN, regulando-se pela regra geral prevista no Código Civil. (...) 2. A cópia autenticada da certidão do Tribunal de Contas constitui título hábil a aparelhar a execução. Precedentes deste Tribunal. 3. Não cabe ao Poder Judiciário analisar o mérito da decisão proferida pelo Tribunal de Contas do Estado, mas tão-somente sua legalidade. 4. Assim, tendo o procedimento adotado pelo Tribunal de Contas sido conduzido dentro da legalidade, bem como em observância aos princípios constitucionais da ampla defesa e do devido processo legal, não podem prosperar as razões de inconformidade do embargante, que não se referem à legalidade da decisão, mas sim ao seu mérito. Precedentes deste Tribunal de Justiça e do colendo STJ. PRELIMINARES REJEITADAS, APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação Cível Nº 70023424864, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Arno Werlang, Julgado em 05/08/2009)

 

Administrativo. Civil e Processual Civil. Ação de rito ordinário. Imposição de multa a chefe de executivo municipal. Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro. Prejudicial de prescrição. Rejeição. Cerceamento de defesa. Inocorrência. Impossibilidade de reapreciação do mérito administrativo. Improcedência do pedido. Desprovimento do recurso. Não há dúvida que a doutrina e a jurisprudência dos Tribunais Superiores já começaram a construir o entendimento de ser cabível a aplicação do instituto da prescrição nos processos administrativos de competência das Cortes de Contas, como, aliás, sabe-se que vem sendo admitido pelo Tribunal de Contas da União em seu âmbito. O que prepondera, na hipótese em exame, é saber se ocorreria aqui a incidência da prescrição administrativa, sobretudo com base nos diplomas legais que a esse respeito são invocados pelo autor-apelante. Seja com base na Lei Estadual n. 3.870/2002 (art. 2.), seja com base na Lei Federal n. 9.784/1999 (art. 54), não favorece ao autor-apelante a invocação do fenômeno extintivo da sanção que lhe foi aplicada. A uma, porque a decisão do Tribunal de Contas, foi prolatada em 20/07/2000, não tendo ocorrido, pois, o prazo de cinco anos previsto no aludido artigo 54 da Lei n. 9.784/1999, como consagrado na jurisprudência do Eg. Superior Tribunal de Justiça. A duas, porque, consoante esse mesmo entendimento jurisprudencial, a aplicação do prazo qüinquenal ali estabelecido deve ser aplicado a partir da vigência da Lei Federal em foco (9.784/1999), e não a contar da prática dos atos eivados de ilegalidade, realizados antes do advento do referido diploma legal. Também não comporta, no caso em exame, a aplicação das disposições da Lei Federal n. 9.873, de 23/11/1999, que estabelece prazo de prescrição para o exercício de ação punitiva pela Administração Pública Federal, direta e indireta, porquanto o artigo 54 da referida Lei Federal n. 9.784/1999 determina idêntico prazo de cinco anos para anulação dos atos administrativos, da mesma forma "contados da data em que foram praticados". Bem por isso, qual seja, a identidade de situações, é que a regra do artigo 1º da Lei n. 9.873/1999, não pode retroagir para alcançar hipóteses como a dos autos, consoante o entendimento consagrado pelo Eg. Superior Tribunal de Justiça, no que tange a aplicabilidade do artigo 54, da Lei n. 9.784/1999, que trata , basicamente, do mesmo tema. A reapreciação do mérito da decisão proferida pelo Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro não é possível de ser realizada pelo Poder Judiciário, restringindo-se o mesmo a averiguar apenas os aspectos da legalidade de tal "decisum". Tendo em vista que a renúncia do patrono do autor se operou no dia 28/11/1996, três dias após o vencimento do prazo concedido pelo Tribunal de Contas para que o autor exercesse seu direito de defesa, prazo esse prorrogado pela segunda vez por aquela Corte, não há que falar em violação dos princípios do contraditório e da ampla defesa. Inexiste a alegada ausência de fundamentação na pena imposta pelo Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro, porquanto o Acórdão proferido refere-se às irregularidades enumeradas no Relatório de Inspeção Especial exibido, onde consta a análise das irregularidades encontradas. (Apelação Cível 65277/2006, Vigésima Câmara Cível, Tribunal de Justiça RJ, Rel. Des. Leticia Sardas; Julgado 18/04/2007).

 

Desta forma, não merece prosperar a preliminar da perda de objeto em face da sentença proferida no julgamento da ação popular.

 

 

2.2.2 Do mérito

 

No mérito, os Recorrentes alegam, em apertada síntese, o que segue abaixo:

 

O Município de Capinzal dispõe de assessoria jurídica e contábil e controle interno, os quais fazem análise prévia de todos os atos, aferem a legitimidade e legalidade, e o controle e fiscalização, respectivamente, não cabendo a responsabilização do Prefeito ou da gestora do Fundo, que adotaram todas as cautelas e providências administrativas ao alcance, não havendo culpa ou dolo nas ações.

 

As dispensas de licitação 99/03 e 13/03 resultaram das rescisões dos contratos com a empresa Auto Posto Elide Ltda, à qual, por dificuldades financeiras, foi “assumida” por outra empresa, o que impossibilitava a continuidade do fornecimento e, para não paralisar serviços essenciais, foram realizadas as dispensas de licitação.

 

Para formalizar estas dispensas, a Administração realizou pesquisa de preços em todos os fornecedores, contratando com aqueles que forneceram o menor preço, motivando, inclusive, a celebração de termo aditivo em outros dois contratos do Município com o mesmo objeto, para redução de valores.

 

As dispensas de licitação 02/04 e 20/04 resultaram da revogação de tomada de preços para aquisição de combustíveis, em face dos preços elevados praticados no certame licitatório e, para não interromper suas atividades, teve que fazer as contratações diretas, onde foram obtidos preços inferiores àqueles da licitação.

 

Imediatamente após contratar o fornecimento de combustível por dispensa de licitação, foi realizada uma concorrência pública com a mesma finalidade, obtendo-se preços ainda menores.

 

 O Ministério Público do Estado ao apreciar representação criminal interposta contra os acusados pela suposta prática de crime nas dispensas de licitações, decidiu pelo arquivamento dos autos, por entender que os procedimentos não resultaram em prejuízo ao Erário, ilícito penal ou ato de improbidade administrativa.

 

Por fim, requerem o conhecimento do recurso e seu provimento, para ver anuladas as multas aplicadas.

 

Cabe, preliminarmente, o registro que o Recorrente menciona em sua peça recursal a existência de documentos em anexo, os quais não foram juntados, todavia, sem prejuízo da análise, já que referidos documentos constavam do processo RPJ 04/01314677.

 

A tese da isenção de responsabilidade do Prefeito e da Gestora do Fundo de Saúde, sob a alegação da existência de assessoria jurídica e contábil e do controle interno e, ainda, da inexistência de culpa ou dolo nas ações, é improcedente.

 

O Prefeito Municipal tomou todas as decisões relevantes nos procedimentos da Prefeitura Municipal, firmando os respectivos atos e contratos, a exemplo, da rescisão do contrato 03/2003 com o Auto Posto Elide, a revogação do processo licitatório 105/2003, as dispensas de licitação 99/2003 e 20/2004 e respectivos atos de homologação e adjudicação e, ainda, os contratos delas decorrentes – vide fls. 85/93, 133/134, 155/160 e 788.

 

A Gestora do Fundo seguiu na mesma linha em relação à rescisão do contrato 14/2003 com o Auto Posto Elide, a revogação do processo licitatório 14/2003 e as dispensas de licitação 13/2003 e 02/2004, conforme se pode observar nos documentos às fls. 170/175, 179/180, 186, 188/193, 198/199 e 897, todos relacionados com o Fundo Municipal de Saúde.

 

Assim, não há como se eximir da responsabilidade por eventuais irregularidades nos atos retro citados, nem como atribuir a responsabilização à equipe técnica dos escalões inferiores.

 

Ao chamar para si todas as decisões relevantes em relação às licitações, dispensas e contratos da Prefeitura Municipal de Capinzal e do Fundo Municipal de Saúde, respectivamente, o Senhor Nilvo Dorini e a Senhora Kamille Sartori Beal, assumem a responsabilidade por eventuais irregularidades praticadas.

 

Cabe, ainda, lembrar, que em se tratando de dispositivo de lei, não se pode alegar desconhecimento, consoante disposto no art. 3º da Lei de Introdução ao Código Civil, ainda mais para se isentar de responsabilidade.

 

Logo, quem tomou as decisões e firmou os respectivos atos, responde pelas irregularidades praticadas, suportando as sanções eventualmente aplicadas.

 

As questões de mérito propriamente dito serão adiante analisadas, seguindo os itens/matéria do Acórdão.

 

2.2.2.1 Da ausência de licitação quando da realização de despesas decorrentes das Dispensas de Licitação nº 13/2003 e 02/2004 – Item 6.2.1.1 do Acórdão e 99/2003 e 20/2004 – item 6.2.2.1 do Acórdão.

 

As dispensas de licitação nºs 13/2003 e 99/2003, respectivamente do Fundo Municipal de Saúde e da Prefeitura Municipal de Capinzal, foram realizadas pelas mesmas razões, nas mesmas datas e com o mesmo fundamento jurídico. Desta forma, faremos a análise conjunta, ainda que tenham responsáveis distintos, o mesmo se aplicando em relação às dispensas de licitação nº 02/2004 e 20/2004.

 

2.2.2.1.1 Das Dispensas de Licitação nºs 13/2003 e 99/2003

 

O Fundo Municipal de Saúde de Capinzal realizou a licitação para aquisição de combustíveis para o ano de 2003 através do convite nº 08/2003 (fls. 640/716), onde sagrou-se vencedora do item gasolina a empresa Auto Posto Elide Ltda, tendo sido firmado o contrato 14/2003.

 

Por sua vez, a Prefeitura Municipal de Capinzal realizou a licitação para aquisição de combustíveis para o ano de 2003, através da Tomada de Preços nº 128/2002 (fls. 461/623), tendo como vencedora para o fornecimento de óleo diesel a mesma empresa Auto Posto Elide Ltda, tendo sido firmado o contrato nº 03/2003.                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                 

 

Através de correspondência datada de 31 de outubro de 2003 (fl. 424), a empresa Auto Posto Elide Ltda informa da impossibilidade de continuar fornecendo combustível, resultando na rescisão dos referidos contratos no dia 03 de novembro de 2003, conforme documentos às fls. 87, 169, 186 e 423.

 

A razão da impossibilidade do fornecimento foi melhor explicitada no documento à fl. 721, onde alegou-se que o Posto Mediterrâneo, credor do primeiro, assumiu todos os bens da sede física e passou a funcionar no local.

 

A cronologia dos fatos permite inferir que o Fundo Municipal de Saúde e a Prefeitura Municipal ficaram sem o fornecimento de gasolina e óleo diesel, respectivamente, o que comprometeu parte considerável dos serviços.

 

Desta forma, a realização da dispensa de licitação era o único caminho possível para obter novamente o combustível de forma imediata, pois uma licitação demandaria cerca de 30 dias, ou mais, até sua conclusão.

 

É cediço que o combustível para a Administração é um item essencial e sua falta pode ocasionar prejuízos em quase todos os serviços, comprometendo inclusive a segurança de pessoas, já que não poderia haver o transporte de pacientes no âmbito da Saúde e também o serviço de coleta de lixo, por exemplo.

 

Consta do art. 37, XXI, da Constituição Federal:

 

“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

............

XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.” (grifo nosso)

 

Por sua vez, a Lei nº 8.666/93 estabeleceu os casos de dispensa de licitação, onde restou consignada a hipótese nos casos de emergência, quando caracterizada urgência de atendimento que possa ocasionar prejuízo ao patrimônio ou comprometer a segurança de pessoas. Vejamos:

 

“Art. 24. É dispensável a licitação:

..............

IV - nos casos de emergência ou de calamidade pública, quando caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares, e somente para os bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou calamitosa e para as parcelas de obras e serviços que possam ser concluídas no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias consecutivos e ininterruptos, contados da ocorrência da emergência ou calamidade, vedada a prorrogação dos respectivos contratos;”

 

Inegável que a situação fática permite o enquadramento no citado dispositivo legal acima e que a licitação, naquele momento, era impossível de ser realizada para obter o resultado imediato, como era necessário.

 

No dia 31 de outubro de 2003 o contratado notificou da impossibilidade de fornecimento do combustível. Tratando-se de insumo essencial, no dia 03 de novembro a Prefeitura e o Fundo já possuíam novo fornecedor, ambos contratados através de dispensa de licitação.

 

A licitação é sim a regra para a contratação de bens e serviços para a administração pública, todavia, nos casos em que o legislador admite a possibilidade de dispensa ou inexigibilidade, este caminho pode e deve ser trilhado, quando necessário.

 

Importante registrar que houve o planejamento para a realização da licitação visando aquisição do combustível para o exercício de 2003. O procedimento licitatório foi concluso no início do ano, resultando nas contratações necessárias – vide convite nº 08/2003 (fls. 640/716) e tomada de preços nº 128/2002 (fls. 461/623).

 

Todavia, fato imprevisível ocorreu com o comunicado do contratado dando conta da impossibilidade de continuar o fornecimento do combustível. A Administração não teve qualquer participação neste fato, quer seja por ação ou omissão.

 

Ao comentar a dispensa de licitação por situação de emergência, Hely Lopes Meirelles[3] assevera:

 

“ A emergência que dispensa a licitação caracteriza-se pela urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares. Situação de emergência é, pois, toda aquela que põe em perigo ou causa dano à segurança, à saúde ou à incolumidade de pessoas ou bens de uma coletividade, exigindo rápidas providências do poder Público para debelar ou minorar suas consequências lesivas (art. 24, IV)”.

 

Sobre a mesma matéria Marçal Justen Filho[4] nos ensina:

 

 

“O dispositivo enfocado refere-se aos casos em que o decurso de tempo necessário ao procedimento licitatório normal impediria a adoção de medidas indispensáveis para evitar danos irreparáveis. Quando fosse concluída a licitação, o dano já estaria concretizado. A dispensa de licitação e a contratação imediata representam uma modalidade de atividade acautelatória do interesse público.

.........

Para dispensa da licitação, incumbe à Administração avaliar a presença de dois requisitos:

 

a) Demonstração concreta e efetiva da potencialidade de dano: a urgência deve ser concreta e efetiva. Não se trata de urgência simplesmente teórica. Deve ser evidenciada a situação concreta existente, indicando-se os dados que evidenciam a urgência. Suponha-se, por exemplo, uma aquisição de medicamentos a ser efetivada pela Administração Pública. Colocada a questão em termos gerais, nunca caberia a licitação. Sempre seria possível argumentar que a demora na aquisição de medicamentos traria prejuízos à saúde pública. Como decorrência, a aquisição de medicamentos  nunca se sujeitaria a prévia licitação. A solução é claramente equivocada, eis que o fundamental reside na relação entre a necessidade a ser atendida e a solução concreta adequada. Em muitos casos, a Administração dispõe de tempo suficiente para realizar a licitação e promover o contrato que atenderá à necessidade.

.........

b) Demonstração de que a contratação é via adequada e efetiva para eliminar o risco: a contratação imediata apenas será admissível se evidenciado que será instrumento adequado e eficiente de eliminar o risco. Se o risco de dano não for suprimido através da contratação, inexiste cabimento da dispensa de licitação.”

 

 

O Tribunal de Contas também já se manifestou sobre a matéria no Prejulgado 1311[5], nos seguintes termos:

 

“O Poder Público não poderá dispensar o procedimento licitatório, com fundamento no artigo 24, IV, da Lei Federal nº 8.666/93, sem que esteja plenamente configurada a situação emergencial ou calamitosa, o risco seja concreto e efetivo e a contratação afaste o risco iminente detectado.”

 

A situação fática do Município de Capinzal atende aos três requisitos do Prejulgado citado, conforme adiante demonstrado.

 

a) configuração da situação emergencial – A Prefeitura e o Fundo realizaram licitação para contratação de empresa visando o fornecimento de combustível para o exercício de 2003 e firmaram os respectivos contratos. No dia 31 de outubro, o contratado informou que não poderia mais continuar fornecendo o combustível porque já não possuía mais o posto de combustíveis. De uma hora para outra, o município se viu sem combustível para abastecer sua frota.

 

b) risco concreto e efetivo – No caso, não havia apenas o risco, mas a certeza de que toda a frota de veículos e máquinas iria paralisar sem o combustível, interrompendo, consequentemente, todos os serviços municipais que dependem de transporte ou movimentação de máquinas, como por exemplo, transporte escolar e de pacientes, coleta de lixo, além de todas as máquinas rodoviárias.

 

c) contratação afastar o risco detectado – Com a contratação emergencial de um novo posto de combustíveis para realizar o abastecimento da frota, a paralisação restou afastada e os serviços puderam ter a necessária continuidade. 

 

Por todo o exposto, a licitação era dispensável nesta situação, sendo regular a contratação direta, com fulcro no art. 24, IV, da Lei nº 8.666/93. Registre-se que a escolha do contratado foi resultado de uma coleta de preços em quatro postos, onde o Fundo contratou com aquele que ofereceu o menor valor, conforme documentos às fls. 181/185, e a Prefeitura fez o mesmo, conforme documentos às fls. 96/105, o que justifica o preço e a razão da escolha do fornecedor para ambos, consoante preconizado no art. 26 da Lei nº 8.666/93.

 

 

2.2.2.1.2 – Das Dispensas de Licitação nºs 02/2004 e 20/2004

 

O Fundo Municipal de Saúde de Capinzal realizou a licitação para aquisição de combustíveis para o ano de 2004 através da Tomada de Preços nº 14/2003 (fls. 897/994) e, no dia 09 de janeiro de 2004, a Gestora do Fundo decidiu revogar a licitação, sob a justificativa que os valores estavam “acima dos valores orçados pela administração”, conforme documento à fl. 897.

 

O mesmo ocorreu com a Prefeitura Municipal, tendo realizado a licitação para aquisição de combustíveis para o ano de 2004 através da tomada de preços 105/2003 (fls. 787/892) e na mesma data, 09 de janeiro de 2004, o Senhor Prefeito Municipal tomou decisão idêntica, revogando a licitação, pela mesma razão, ou seja, preço acima do orçado pela Administração (fl. 788).

 

No dia 16 de janeiro de 2004, portanto uma semana depois, o Município de Capinzal publicou novo edital, desta feita na modalidade concorrência, sob número 11/2004, para registro de preços de combustíveis, visando atender a Prefeitura e o Fundo, conforme documento à fl. 1034.

 

No dia 22 de janeiro de 2004, o Fundo Municipal de Saúde formalizou a dispensa de licitação nº 02/2004 para suprir suas necessidades de combustível até a conclusão da nova licitação (fls. 187/209) e a Prefeitura seguiu o mesmo caminho, com a realização da dispensa de licitação nº 20/2004 (fls. 133/163).

 

Das dispensas de licitação foram firmados os contratos nº 20/2004 (fls. 188/191) e 06/2004 (fls.157/160), respectivamente do Fundo e da Prefeitura, e conforme consta das suas cláusulas quarta, o prazo de duração iria até o dia 29 de fevereiro de 2004.

 

No dia 1º de março de 2004, a concorrência nº 11/2004 foi finalizada, sendo lavrada a Ata de registro de preços, conforme consta às fls. 1035/1047.

 

Da cronologia dos fatos, temos que em janeiro de 2004 tanto o Fundo Municipal de Saúde, através de sua Gestora, quanto a Prefeitura Municipal, através de seu Prefeito, decidiram revogar as suas licitações para aquisição de combustível sob a justificativa de preço acima do orçado, ficando sem o fornecedor do insumo.

 

Ato seguinte, desencadearam nova licitação com a mesma finalidade e, após, lançaram mão do instituto da dispensa de licitação para suprir momentaneamente suas necessidades, até a conclusão do procedimento licitatório que estava em curso.

 

No dia 22 de janeiro de 2004, data das dispensas de licitação, o Fundo e a Prefeitura não tinham fornecedor de combustível e já se sabia que a nova licitação – concorrência nº 11/2004, somente teria seu desfecho no final de fevereiro.

 

Estes fatos caracterizam a situação de dispensa de licitação, com fundamento no art. 24, IV, da Lei nº 8.666/93, pelas mesmas razões e fundamentos que constam do item 2.2.2.1.1 deste parecer.

 

Naquela data, o procedimento foi escorreito. Não poderia a população arcar com as conseqüências, inclusive com possibilidade de riscos à própria vida, já que estamos falando também de ambulâncias, ou da paralisação de serviços essenciais como o transporte escolar, a coleta de lixo, por exemplo, em razão da não contratação de empresa através de licitação prévia.

 

O equívoco não está nas dispensas de licitação realizadas no dia 22 de janeiro de 2004 e sim, na revogação sumária das tomadas de preços 14/2003 e 105/2003, ante a alegação de preço acima do orçamento, fato que ocorreu no dia 09 de janeiro de 2004.

 

Nestes casos, a Lei manda desclassificar as propostas com preço excessivo, facultando à Administração, caso não haja tempo de deflagrar novo procedimento licitatório, estipular prazo para que os licitantes apresentem novas propostas.

 

Desta reapresentação de propostas, havendo licitante que tenha ofertado preço compatível, o de menor valor deve ser declarado vencedor do certame, suprindo assim a necessidade da Administração.

 

Caso os preços continuem acima do orçamento, é admissível a dispensa de licitação, tudo conforme disposto no art. 48, II e § 3º e 24, VII, da Lei nº 8.666/93. É do texto da Lei:

 

Art. 24. É dispensável a licitação:

..........

VII - quando as propostas apresentadas consignarem preços manifestamente superiores aos praticados no mercado nacional, ou forem incompatíveis com os fixados pelos órgãos oficiais competentes, casos em que, observado o parágrafo único do art. 48 desta Lei e, persistindo a situação, será admitida a adjudicação  direta dos bens ou serviços, por valor não superior ao constante do registro de preços, ou dos serviços;

.........

Art. 48. Serão desclassificadas:

.........

II - propostas com valor global superior ao limite estabelecido ou com preços manifestamente inexeqüiveis, (...).

..................

§ 3º Quando todos os licitantes forem inabilitados ou todas as propostas forem desclassificadas, a administração poderá fixar aos licitantes o prazo de oito dias úteis para a apresentação de nova documentação ou de outras propostas escoimadas das causas referidas neste artigo, facultada, no caso de convite, a redução deste prazo para três dias úteis.”

 

Este deveria ter sido o caminho seguido pela Gestora do Fundo e pelo Prefeito Municipal no dia 09 de janeiro de 2004, ao invés de revogarem a tomada de preços 14/2003 e 105/2003, respectivamente.

 

O procedimento até poderia resultar numa dispensa de licitação, todavia, com outro fundamento, não concorrendo a Administração para a sua consumação, quer seja por ação ou omissão, muito menos por falhas.

 

Todavia, não foi o caminho trilhado. Após a revogação das respectivas licitações, a dispensa com fulcro no art. 24, IV, se tornou imperativa, pois caracterizada estava a situação de emergência com o comprometimento do patrimônio e da segurança das pessoas.

 

E a discussão da legalidade das dispensas de licitação nºs 02/2004 e 20/2004, do Fundo Municipal de Saúde e da Prefeitura Municipal, respectivamente, foi objeto da Ação Popular nº 016.04.000328-6, cuja sentença foi confirmada pelo Egrégio Tribunal de Justiça nos autos da Apelação Cível nº 2008.045238-2.  

 

Da citada decisão que confirmou a legalidade dos procedimentos, extraímos o trecho a seguir, que sintetiza o posicionamento do Judiciário:

 

“14.1 Ora, revogada a licitação haveria necessidade de se fazer outra. Evidentemente que haveria um curto espaço de tempo em que a Prefeitura Municipal e o Fundo Municipal de Saúde ficariam sem combustível para seus veículos.

14.2 Evidentemente que, para suprir com combustível os veículos da Prefeitura Municipal e do Fundo Municipal de Saúde, neste curto espaço de tempo que levaria o processo licitatório, lícita foi a compra com dispensa de licitação. Ainda mais quando provada que a compra de combustível, sem licitação, foi por valor inferior ao valor ganho na licitação revogada.”

 

Desta forma, a situação fática do dia 22 de janeiro de 2004, permite concluir que a licitação era dispensável naquela situação, sendo regular a contratação direta, com fulcro no art. 24, IV, da Lei nº 8.666/93.

 

Registre-se que a escolha do contratado foi resultado de uma coleta de preços em quatro postos, onde a Administração contratou com aquele que ofereceu o menor valor, sendo o mesmo inferior ao menor valor observado na tomada de preços 14/2003 e dentro do orçamento da Administração, conforme documentos às fls. 143/151, 200/204 e 904/905, o que justifica o preço e a razão da escolha do fornecedor, consoante preconizado no art. 26 da Lei nº 8.666/93.

 

Por todo o exposto, deve ser dado provimento ao recurso para cancelar as multas dos itens 6.2.1.1 e 6.2.2.1 do Acórdão recorrido.

 

 

2.2.2.2 Da falta de justificativa para as Dispensas de Licitação nº 13/2003 e 02/2004 – Item 6.2.1.2 do Acórdão e 99/2003 e 20/2004 – item 6.2.2.2 do Acórdão.

 

De acordo com o art. 26 da Lei nº 8.666/93, os processos de dispensa de licitação realizados com fundamento no art. 24, IV, da referida norma, como é o caso em comento, devem ser instruídos para caracterizar a situação emergencial que justifique o procedimento. Consta da Lei:

 

“Art. 26.  As dispensas previstas nos §§ 2o e 4o do art. 17 e nos incisos III a XXIV do art. 24, as situações de inexigibilidade referidas no art. 25, necessariamente justificadas, e o retardamento previsto no final do parágrafo único do art. 8o, deverão ser comunicados dentro de três dias a autoridade superior, para ratificação e publicação na imprensa oficial, no prazo de cinco dias, como condição para eficácia dos atos.

Parágrafo único.  O processo de dispensa, de inexigibilidade ou de retardamento, previsto neste artigo, será instruído, no que couber, com os seguintes elementos:

I - caracterização da situação emergencial ou calamitosa que justifique a dispensa, quando for o caso;

.....”

 

Nos processos das dispensas de licitação nºs 13/2003, 99/2003, 02/2004 e 20/2004, solicitados na fase inicial da Instrução dos Autos e juntados às fls. 167/209, 85/109, 186/209 e 133/163 respectivamente, pouco ou nada consta para caracterizar a situação emergencial que justificasse o procedimento.

 

Apenas encontramos nos processos 13/2003 e 99/2003 o termo de rescisão do contrato 14/2003 (fl.186) do Fundo Municipal de Saúde com a publicação do seu extrato (fl. 169), e a publicação do extrato da rescisão do contrato 03/2003 (fl. 87) da Prefeitura Municipal.

 

A simples anexação de uma rescisão contratual não é suficiente para justificar a realização de uma dispensa de licitação calcada numa situação de emergência, como era o caso. 

 

Todavia, na fase da Audiência, farta documentação foi juntada aos autos, justificando plenamente as razões das dispensas de licitação 13/2003, 99/2003, 02/2004 e 20/2004, conforme demonstrado no item 2.2.2.1 deste Parecer.

 

Apesar de não constar inicialmente dos autos, o que pode ser considerado uma simples falha formal, quando da concretização das dispensas de licitação havia motivos para a sua realização.

 

Por todo o exposto, deve ser dado provimento ao recurso para cancelar as multas dos itens 6.2.1.2 e 6.2.2.2 do Acórdão recorrido.

 

 

2.2.2.3 Da ausência das certidões negativas de débito perante o FGTS e INSS dos contratados nas Dispensas de Licitações nºs 13/2003 e 02/2004 – Item 6.2.1.3 do Acórdão.

 

Verificando as dispensas de licitação nºs 13/2003 e 02/2004, juntadas às fls. 167/209, não consta a documentação comprobatória da regularidade com o INSS e com o FGTS dos contratados.

 

Na fase de Audiência, o Tribunal de Contas apontou a ausência dos comprovantes de regularidade com o INSS e FGTS dos contratados, solicitando fosse apresentada as justificativas e documentos pertinentes.

 

A Responsável, Senhora Kamille Sartori Beal, Gestora do Fundo Municipal de Saúde, na sua resposta à Audiência, silenciou sobre os fatos, o que acabou resultando no julgamento que considerou irregular a contratação com aplicação de multa, conforme item 6.2.1.3 do Acórdão.

 

Em grau de recurso, novamente silencia a Recorrente sobre a irregularidade apontada o que de plano justifica a mantença da deliberação.

 

Em toda e qualquer contratação com o Poder Público, imperativo que o contratado esteja em situação regular perante a Seguridade Social, consoante disposto no art. 195, § 3º, da Constituição Federal. Consta da Carta Magna:

 

Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:

..........

§ 3º - A pessoa jurídica em débito com o sistema da seguridade social, como estabelecido em lei, não poderá contratar com o Poder Público nem dele receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios.”

 

A matéria também está disciplinada no art. 47, da Lei 8.212/91:

 

“Art. 47. É exigida Certidão Negativa de Débito-CND, fornecida pelo órgão competente, nos seguintes casos:

I - da empresa:

a) na contratação com o Poder Público e no recebimento de benefícios ou incentivo fiscal ou creditício concedido por ele;

......”

 

Situação idêntica ocorre em relação ao FGTS, onde deve ser exigida a comprovação de regularidade do contratado.  Consta do art. 27, da Lei nº 8036/90:

 

“Art. 27. A apresentação do Certificado de Regularidade do FGTS, fornecido pela Caixa Econômica Federal, é obrigatória nas seguintes situações:

a) habilitação e licitação promovida por órgão da Administração Federal, Estadual e Municipal, direta, indireta ou fundacional ou por entidade controlada direta ou indiretamente pela União, Estado e Município;

............”

 

No mesmo sentido, consta do art. 2º da Lei nº 9012/95:

 

“Art. 2º As pessoas jurídicas em débito com o FGTS não poderão celebrar contratos de prestação de serviços ou realizar transação comercial de compra e venda com qualquer órgão da administração direta, indireta, autárquica e fundacional, bem como participar de concorrência pública.”

 

Desta forma, deve ser mantida a decisão que considerou irregular a contratação da empresa Irmãos Dambrós Ltda na dispensa de licitação nº 13/2003, e da empresa Bordignon Combustíveis e Transportes Ltda na dispensa de licitação nº 02/2004, porquanto não restou demonstrada a situação de regularidade dos contratados com a Seguridade Social e FGTS.

 

 

3. CONCLUSÃO

 

Diante do exposto, a Consultoria Geral emite o presente Parecer no sentido de que o Conselheiro Wilson Rogério Wan-Dall proponha ao Egrégio Tribunal Pleno decidir por:

 

          3.1. Conhecer do Recurso de Reexame interposto nos termos do art. 80 da Lei Complementar nº 202, de 15 de dezembro de 2000, contra o Acórdão nº  0882/2009, exarada na Sessão Ordinária de 22 de junho de 2009, nos autos do Processo nº RPJ 04/01314677, e no mérito dar provimento parcial para:

                    3.1.1. Cancelar as multas de 400,00 cada, aplicada à Senhora Kamille Sartori Beal, ex-Gestora do Fundo Municipal de Saúde de Capinzal, constante dos itens 6.2.1.1 e 6.2.1.2 do Acórdão Recorrido  e ao Senhor Nilvo Dorini, ex-Prefeito Municipal de Capinzal, constante dos itens 6.2.2.1 e 6.2.2.2 do Acórdão recorrido.

                    3.1.3. Ratificar os demais termos do Acórdão Recorrido.

          3.2. Dar ciência da Decisão ao Sr. Noel Antonio Tavares de Jesus, procurador da Senhora Kamille Sartori Beal e do Senhor Nilvo Dorini, e à Prefeitura Municipal de Capinzal.

 

Consultoria Geral, em 18 de julho de 2011.

 

 Wilson Dotta

Analista Técnico Administrativo II

 

De acordo:

 

 JULIANA FRITZEN

COORDENADORA

 

Encaminhem-se os Autos à elevada consideração do Exmo. Sr. Relator Conselheiro Wilson Rogério Wan-Dall, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.

 

 HAMILTON HOBUS HOEMKE

CONSULTOR GERAL



[1] Meirelles, Hely Lopes. Mandado de Segurança, ação popular. Malheiros Editores, São Paulo, 2004. 27ª Edição, pág. 135.

[2] Zavascki, Teori Albino. Título Executivo e Liquidação. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p.90

[3] MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e Contrato Administrativo. Malheiros Editores, São Paulo, 2006. 14ª Edição, pág. 114.

[4] JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 8. ed. São Paulo: Dialética, 2000, p. 238 e 240

[5] Processo nº CON-03/00098472.