PROCESSO Nº:

REC-11/00412406

UNIDADE GESTORA:

Companhia de Habitação do Estado de Santa Catarina - Cohab

INTERESSADO:

Wilson Rogério Wan - Dall

ASSUNTO:

Recurso de Reexame contra decisão exarada no Processo n. ALC 04/03567017 - Auditoria sobre Licitações, Contratos, Convênios e Atos Jurídicos Análogos do exercício de 2003 - REC-07/00328076 + ALC-04/03567017

PARECER Nº:

COG - 339/2011

 

Reexame de Conselheiro. Administrativo. Emissão de Parecer Técnico ou Jurídico. Inexigibilidade de licitação. Necessidade. Negar provimento.

A emissão de parecer técnico ou jurídico é imprescindível quando da análise dos casos de inexigibilidade de licitação. (Parecer COG nº 514/09)

Lei de Licitações. Publicidade extemporânea do extrato do termo contratual. Multa. Negar provimento.

A Administração tem o dever de publicar o extrato do instrumento de contrato ou de seus aditamentos na imprensa oficial no prazo de vinte dias contados do quinto dia útil do mês seguinte ao da assinatura, nos termos do parágrafo único do art. 61 da Lei nº 8.666/93.

Contrato Administrativo. Cláusula necessária. Ausência. Multa. Normas de Direito Público. Aplicação. Prescindibilidade para o seu cumprimento. Dar provimento.

A cláusula apontada como ausente do contrato (manutenção das condições de habilitação e qualificação - inc. XIII do art. 55 da Lei nº 8.666/93), não tem o condão de descaracterizar o contrato como administrativo ou acarretar a sua nulidade, não incidindo de modo a invalidar o ajuste encetado e não sendo suficiente para imputar ao fato uma antijuridicidade e culpabilidade capaz de ensejar a aplicação de multa. (Parecer COG nº 39/08)

A ausência de cláusula específica de manutenção das condições de habilitação e qualificação não motiva o seu descumprimento, haja vista tratar-se de norma de Direito Público.  O não preenchimento das exigências formuladas ensejará a rescisão do contrato, nos termos da Lei nº 8.666/93.

Contratos de Prestação de Serviços. Contratação Direta. Dispensa de Licitação. Limite. Parcelamento do objeto. Vedação. Ausência de processo licitatório. Multa. Negar provimento.

O administrador público é submisso à obrigatoriedade constitucional da efetiva licitação, ressalvados os casos de dispensa e inexigilidade. (Parecer COG nº 514/09)

É vedado o fracionamento de despesas para a adoção de dispensa de licitação ou modalidade de licitação menos rigorosa que determinada para a totalidade do valor do objeto a ser licitado. (TCU)

Para a Administração contratar de forma direta por dispensa de licitação deve se ater aos limites fixados em lei, caracterizando burla à norma legal e parcelamento a contratação de serviços de mesma natureza e com a mesma finalidade, por meio de dois processos de dispensa. (Parecer COG 815/07)

Fundamentação da decisão. Capitulação diversa. Ampla defesa. Correlação entre o fato descrito e a multa aplicada. Ausência de prejuízo à defesa. Negar provimento.

O responsável defende-se do fato exposto, assim como o julgador profere a decisão sobre os fatos e atos analisados no processo.

Não há que se falar em cerceamento de defesa se, apesar do uso de capitulação diversa, há estrita correspondência entre o fato descrito no relatório da área técnica e a multa aplicada à responsável.

 

Sr. Consultor,

 

1. INTRODUÇÃO

 

Trata-se de Recurso de Reexame de Conselheiro (art. 81 da Lei Complementar nº 202/2000) interposto pelo Conselheiro Wilson Rogério Wan-Dall, referente ao Recurso de Reexame nº 07/00328076, o qual manteve as multas aplicadas no processo ALC nº 04/03567017.

 

O processo em análise é resultante de Auditoria Ordinária in loco realizada sobre licitações, contratos, convênios e atos jurídicos análogos do exercício de 2003 da Companhia de Habitação do Estado de Santa Catarina (COHAB).

Autuada a documentação, o corpo técnico, através da Diretoria de Controle da Administração Estadual (DCE), emitiu o Relatório de Instrução DCE/Insp.4/Div.12 nº 151/2004 (fls. 4-39 dos autos principais), sugerindo a audiência da Diretora Presidente da COHAB à época, Sra. Maria Darci Mota Beck.

A sugestão foi acolhida pelo Sr. Conselheiro Substituto Clóvis Mattos Balsini, conforme despacho de fls. 40-43 dos autos principais.

A Sra. Maria Darci Mota Beck apresentou justificativas e juntou documentos (fls. 45-120 dos autos principais).

A equipe técnica então elaborou o Relatório de Reinstrução DCE/Insp.4/Div.12  nº 20/2006 (fls. 123-153 dos autos principais), propôs o julgamento regular de atos e contratos listados.

O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, através do Parecer nº MPTC-0076/2007 (fls. 155-179 dos autos principais), não acompanhou o exame técnico, manifestando-se pela aplicação de sanção pecuniária.

Conclusos os autos ao Sr. Relator – Conselheiro Moacir Bertoli, foi lavrado voto (fls. 180-184 dos autos principais) no sentido de aplicar multas.

Em Sessão Ordinária realizada no dia 07/05/07, o processo foi julgado pelo Tribunal Pleno, que, por unanimidade, acompanhou o voto do Relator, exarando a Decisão nº 0869/2007 (fls. 185/186 dos autos principais) nos seguintes termos:

 

ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro nos arts. 59 da Constituição Estadual e 1° da Lei Complementar n. 202/2000, em:

 

6.1. Conhecer do Relatório de Auditoria realizada na Companhia de Habitação do Estado de Santa Catarina - COHAB/SC, com abrangência sobre licitações, contratos, convênios e atos jurídicos análogos, referente ao exercício de 2003, para considerar irregulares, com fundamento no art. 36, §2º, alínea "a", da Lei Complementar n. 202/2000, a Inexigibilidade de Licitação n. 01/2003, os Contratos ns. 001, 003, 008, 013 a 016, 018 e 019/03, os Termos Aditivos 4º TA ao Contrato n. 018/99, 1º TA ao Contrato n. 098/02, 4º TA ao Contrato n. 012/99, 4º TA ao Contrato n. 009/01, 1º TA ao Contrato n. 010/03 e 2º TA ao Contrato n. 097/02, a prorrogação do Contrato n. 097/02.

 

6.2. Aplicar à Sra. Maria Darci Mota Beck - Diretora-Presidente da Companhia de Habitação do Estado de Santa Catarina - COHAB/SC, CPF n. 070.403.699-15, com fundamento no art. 70, II, da Lei Complementar n. 202/2000 c/c o art. 109, II, do Regimento Interno, as multas abaixo relacionadas, fixando-lhe o prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste Acórdão no Diário Oficial do Estado, para comprovar ao Tribunal o recolhimento ao Tesouro do Estado das multas cominadas, sem o que, fica desde logo autorizado o encaminhamento da dívida para cobrança judicial, observado o disposto nos arts. 43, II, e 71 da Lei Complementar n. 202/2000:

 

 6.2.1. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face da ausência de parecer jurídico no procedimento de inexigibilidade n. 01/2003, caracterizando descumprimento do art. 38, parágrafo único da Lei Federal n. 8.666/93;

 

 6.2.2. R$ 400,00 (quatrocentos reais), devido à ausência de publicidade do extrato do termo contratual, caracterizando descumprimento ao disposto no art. 61, parágrafo único, da Lei Federal n. 8666/93, nos Contratos ns. 001, 003, 013 a 015/03, 018 e 019/03, e nos termos aditivos 4º TA ao Contrato n. 018/99, 1º TA ao Contrato 098/02, 4º TA ao Contrato n. 012/99, 4º TA ao Contrato n. 009/01, 1º TA ao Contrato n. 010/03 e 2º TA ao Contrato n. 097/02;

 

 6.2.3. R$ 400,00 (quatrocentos reais), pela ausência de cláusula específica que contemple as penalidades exigíveis na legislação aplicável no Contrato n. 008/03, em descumprimento ao disposto no art. 55, inciso VII, da Lei Federal n. 8666/93;

 

 6.2.4. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em razão da ausência de cláusula específica que estabeleça a obrigatoriedade de o contratado manter as condições de habilitação e qualificação exigidas no processo licitatório que originou o Contrato n. 016/03, revelando o descumprimento do disposto no art. 55, inciso XIII, da Lei Federal n. 8666/93;

 

 6.2.5. R$ 400,00 (quatrocentos reais), em face da ausência de justificativa que autorizasse a prorrogação do contrato n. 097/02, em descumprimento ao disposto no art. 57, § 4º, da Lei Federal n. 8666/93;

 

 6.2.6. R$ 400,00 (quatrocentos reais), devido à ausência de processo licitatório para celebração dos Contratos ns. 014 e 015/03, em afronta ao disposto no art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal.

 

Inconformada com a supracitada decisão, a Sra. Maria Darci Mota Beck  interpôs o Recurso de Reconsideração nº 07/00328076.

Essa Consultoria Geral, através do Parecer COG nº 514/09 (fls. 13-37 do REC nº 07/00328076), sugeriu o provimento parcial do recurso para cancelar a multa do item 6.3.

 O Ministério Público, através do MPTC nº 6293/2010 (fls. 38-47 do REC nº 07/00328076), manifestou-se pela negativa de provimento ao recurso.

Conclusos os autos ao Sr. Relator – Auditor Gerson dos Santos Sicca, foi lavrado voto (fls. 48-54 do REC nº 07/00328076) no sentido de negar provimento ao recurso.

Em Sessão Ordinária realizada no dia 11/04/11, o processo foi julgado pelo Tribunal Pleno, que, por unanimidade, acompanhou o voto do Relator, exarando a Decisão nº 0250/2011 (fl. 55 do REC nº 07/00328076) nos seguintes termos:

 

ACORDAM os Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, reunidos em Sessão Plenária, diante das razões apresentadas pelo Relator e com fulcro nos arts. 59 da Constituição Estadual e 1° da Lei Complementar n. 202/2000, em:

 

6.1. Conhecer do Recurso de Reexame, nos termos do art. 80 da Lei Complementar n. 202/2000, interposto contra o Acórdão n. 0869/2007, exarado na Sessão Ordinária de 07/05/2007, nos autos do Processo n. ALC-04/03567017, para, no mérito, negar-lhe provimento, ratificando na íntegra a decisão recorrida.

 

Irresignado com a supracitada decisão, o Conselheiro Wilson Rogério Wan-Dall interpôs o presente Reexame de Conselheiro (fls. 02-30 dos autos do recurso), para que sejam consideradas insubsistentes as multas aplicadas nos itens 6.2.1, 6.2.2, 6.2.4 e 6.2.6 do Acórdão nº 0869/2007.

É o relatório.

2. ANÁLISE

 

2.1. Pressupostos de admissibilidade

 

 

Quanto aos pressupostos legais e regimentais tangentes à legitimidade, foram estes atendidos, uma vez que o recurso foi manejado por parte legítima - no caso um Conselheiro, nos termos do art. 81 da Lei Complementar nº 202/2000 (Lei Orgânica do TCE/SC), in verbis:

 

Art. 81. Conselheiro do Tribunal de Contas poderá propor ao Tribunal Pleno Recurso de Reexame de decisão prolatada em qualquer processo, dentro do prazo de dois anos contados da publicação da última deliberação no Diário Oficial do Estado.

 

 

O supracitado dispositivo foi reprisado o art. 142 da Resolução nº TC-06/2001, que institui o Regimento Interno do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina.

 

O § 1º do artigo 142 do Regimento Interno preceitua ainda que:

 

Art. 142. (...)

 

§ 1º O Recurso de Reexame de Conselheiro será acompanhado de exposição circunstanciada e proposta de decisão devidamente fundamentada.

 

No caso em apreço, constata-se que a peça recursal apresenta as razões do inconformismo, assim como a fundamentação legal e a proposta de decisão.

 

Em relação à tempestividade, verifica-se ser o recurso tempestivo, vez que o Acórdão nº 0250/2011 foi publicado no Diário Oficial Eletrônico (DOTC-e) nº 724, de 20/04/11 (fl. 55 dos autos do REC nº 07/00328076). Tendo o presente recurso sido protocolado no dia 12/07/11, foi interposto, portanto, dentro do prazo de dois anos estabelecido no art. 81 da Lei Complementar nº 202/2000 e no caput do art. 142 da Resolução nº TC-06/2001.

 

 

Restam cumpridos, portanto, os pressupostos de admissibilidade indispensáveis ao conhecimento do presente Reexame de Conselheiro.

 

Passa-se agora à análise do mérito.

 

2.2. Da multa em razão da ausência de parecer jurídico no procedimento de Inexigibilidade de Licitação nº 01/2003

 

Foi aplicada multa à responsável em função da ausência de Parecer Jurídico relativo ao procedimento de Inexigibilidade de Licitação nº 01/2003,  caracterizando o descumprimento do art. 38, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93 (item 6.2.1 do Acórdão nº 0869/2007).

 

O recorrente alega que houve a apresentação posterior de Parecer Jurídico datado de 29/01/03, o qual trata da contratação, por inexigibilidade de licitação, da empresa Elevadores Atlas Schindler S.A. Requer por isso o afastamento da penalidade imposta.

 

Razão não assiste ao recorrente.

 

O Parecer Jurídico de fls. 18 é idêntico ao documento de fl. 96 (anexo 13) dos autos principais e trata do Contrato de Locação de Prestação de Serviços Técnicos Especializados para Elevador Marca Atlas nº 01/2003 (fls. 91-95 dos autos principais e fls. 10-15 dos autos do REC nº 11/00412406), e que tem por objeto a execução dos serviços de manutenção preventiva e corretiva do elevador da sede da COHAB.

 

Ocorre que a multa aplicada refere-se à Inexigibilidade de Licitação nº 01/2003 (fl. 90 dos autos principais – anexo 11), cujo objeto é a contratação da Empresa NEC do Brasil S/A, para compra de equipamento destinado a uma atualização da central telefônica NEC[1], consistente em troncos digitais, atualização de software de tarifação, isolador óptico, placa etc.

 

Não se pode confundir o Contrato de Locação de Prestação de Serviços nº 01/2003, referente a serviços da empresa Elevadores Schindler S.A., com a Inexigibilidade de Licitação nº 01/2003, relativa à empresa NEC do Brasil S/A.

 

Essa Consultoria já se manifestou, através do Parecer COG nº 514/09, de autoria da Auditora Fiscal de Controle Externo Marianne da Silva Brodbeck, acerca dessa irregularidade, o que foi feito nos seguinte termos[2]:

 

Aduz a recorrente que restou demonstrado nos autos, anexo 11, que o referido parecer foi devidamente instruído, tendo sido assinado pela advogada Olinda F. B. Diotallevy, onde a mesma fundamenta a inexigibilidade no art. 25, inciso I, da Lei nº 8.666/93.

 

Segundo o entendimento da recorrente  a Lei nº 8.666/93 quando pede o parecer jurídico, " ela não está a pedir um judicioso parecer ou um parecer extenso, de muitos, parágrafos e página. A relevância nesse parecer está a certeza da legalidade do ato. E, quando a advogada da empresa assina junto o processo, destacando, inclusive o fundamento jurídico (art. 25, inciso I, da Lei 8666/93, tem-se como realizado tal ato formal, de modo que a multa imposta não tem procedência e a sua extinção é medida que se impõe."

 

Exposta a justificativa do recorrente, passa-se a sua análise:

 

Vale ressaltar que a recorrente não trouxe quaisquer dados novos aos autos de recurso. A Diretoria Técnica acolheu os argumentos da responsável e entendeu que a aposição de carimbo e a citação do fundamento legal  no documento de fls. 90 - autos originários -  preenchiam os requisitos do  artigo 38, parágrafo único da Lei nº 8.666/93,  que dispõe o que segue:

 

Art. 38. O procedimento da licitação será iniciado com a abertura de processo administrativo, devidamente autuado, protocolado e numerado, contendo a autorização respectiva, a indicação sucinta de seu objeto e do recurso próprio para a despesa, e ao qual serão juntados oportunamente:

(omissis)

 

Parágrafo único. As minutas de editais de licitação, bem como as dos contratos, acordos, convênios ou ajustes devem ser previamente examinadas e aprovadas por assessoria jurídica da Administração.

 

O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas por meio do Parecer nº 76/2007 da lavra do Procurador Diogo Roberto Ringenberg, não acatou o posicionamento da Diretoria Técnica e manifestou-se nestes termos:

 

" Quanto ao procedimento de inexigibilidade nº 01/2003, a simples aposição do carimbo e assinatura no documento de fl. 90 não confere o caráter da opinião jurídica preconizada pelo art. 38, parágrafo único da Lei 8.666/93, notadamente em um feito que traduza a exceção ao procedimento licitatório.

Fundada que foi no art. 25, I da Lei de Licitações, o mínimo que se poderia almejar é que fosse esclarecido o porquê da inexigibilidade para aquisição de materiais, equipamentos, ou gêneros que só possam ser fornecidos por produtor, empresa ou representante comercial exclusivo. Este esclarecimento ocorreu apenas por ocasião da resposta oferecida ao apontamento feito pela equipe de auditoria da Corte. Desta forma, em relação a este procedimento, entendo não atendido ao requisito legal."

 

A posição do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas foi acatada pelo Relator.

O texto do artigo 38, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93 requer expressamente que as minutas de editais de licitação, bem como as dos contratos, acordos, convênios ou ajustes sejam previamente examinadas e aprovadas por assessoria jurídica da Administração. Em análise ao documento de fls. 90 - autos originários - observa-se que há simples citação de dispositivo legal, não sendo possível considerar que houve prévio exame jurídico da minuta. Não foi apresentado qualquer motivo que fundamentasse a escolha pela contratação direta, na modalidade de inexigibilidade de licitação. Há minimamente a necessidade de justificar qual o procedimento a ser adotado, justificação esta que não se confunde com a mera citação da fundamentação legal.

Tratando desta matéria o Advogado da União Marcos Weis Bliacheris elaborou artigo intitulado "Questões práticas atinentes ao parecer jurídico em licitações e contratos administrativos", onde ressaltou a importância do exame do certame licitatório visto que  o parecer jurídico emitido pela assessoria jurídica de órgão ou entidade é  acatado pelo ordenador de despesas, constitui fundamentação jurídica e integra a motivação da decisão adotada, in verbis[3]:

Não se pode deixar de assinalar que o edital é parte de um processo, tomando-se esta expressão tanto em sua acepção material como formal. Assim, sua existência somente se justifica enquanto tomado como parte de um procedimento, qual seja, de um certame licitatório. Um edital não tem vida própria, não produz efeitos por si só, pelo contrário, somente existe e possui sentido neste contexto e é desta forma que deverá ser examinado. Igualmente argumente-se que seria uma verdadeira burla ao espírito da norma, já que uma análise restrita ao edital em si atenderia somente formalmente a Lei. Ora, melhor seria que a previsão de parecer jurídico fosse substituída pela análise de um professor de Redação ou Português. Edgar Guimarães, em trabalho sobre o tema adverte o controle interno (nas licitações) não é apenas de natureza formal, apresenta conteúdo material e substancial vinculado à idéia de legalidade ampla. Remetendo aos princípios fundamentais da Constituição, Juarez Freitas aponta que o controle deve ser exercido, em novas bases, evidentemente não mais restrito ao tradicional controle de legalidade, por maior que seja o elastério que se empreste ao termo. Concluindo, adverte: Cresce a importância do controle de consistência das motivações dos atos, contratos e procedimentos administrativos.

A visão exposta pelos juristas acima é lapidarmente sintetizada em decisão do Tribunal de Contas da União, o parecer jurídico emitido por consultoria ou assessoria jurídica de órgão ou entidade, via de regra acatado pelo ordenador de despesas, constitui fundamentação jurídica e integra a motivação da decisão adotada, estando, por isso, inserido na verificação da legalidade, legitimidade e economicidade dos atos relacionados com a gestão de recursos públicos no âmbito da fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da administração pública federal, exercida pelo Congresso Nacional com o auxílio deste Tribunal, ex vi do art. 70 caput, e 71, II, da Constituição Federal.

 

 

Sobre o tema, esta Consultoria Geral manifestou-se no REC 07/00307230 - COG nº 812/07, processo com decisão - Acórdão nº 256/08 - data da Sessão: 05/03/2008, em que o Tribunal Pleno acompanhou o entendimento esposado no referido parecer, da lavra do Auditor Fiscal de Controle Externo Murilo Ribeiro de Freitas, em que restou consignado o que segue:

 

Licitação. Emissão de parecer técnico ou jurídico. Art. 38, inciso VI da Lei n. 8.666/93. A emissão de parecer técnico ou jurídico está previsto expressamente no art. 38, IV da Lei n. 8.666/93. A sua imprescindibilidade contempla licitação, dispensa ou inexigibilidade.

 

 Cabe aqui recordar que o artigo 38 da Lei de Licitações estabelece um procedimento a ser seguido quando da realização de uma licitação, portanto, não é possível ao administrador desconsiderar ou cumprir de forma insatisfatória fases do processo licitatório.  Tal conduta não se coaduna com os ditames da lei, sendo passível de responsabilização.

Ante o exposto, sugere-se a manutenção da multa aplicada, tendo em vista a ausência de parecer jurídico, em desconformidade com o art. 38, parágrafo único, da Lei n. 8.666/93. 

 

Diante do exposto, sugere-se a manutenção da multa constante do item 6.2.1 da decisão guerreada.

 

 

2.2. Da multa em razão do descumprimento das regras de publicidade do extrato do termo contratual

 

O item 6.2.2 do Acórdão nº 0869/2007 aplicou multa à responsável devido ao descumprimento do disposto no art. 61, parágrafo único, da Lei 8.666/93, por “ausência de publicidade do extrato do termo contratual”, nos Contratos nº 001, 003, 013 a 015/03, 018 e 019/03, e nos termos aditivos 4º TA ao Contrato nº 018/99, 1º TA ao Contrato nº 098/02, 4º TA ao Contrato nº 012/99, 4º TA ao Contrato nº 09/01, 1º TA ao Contrato nº 010/03 e 2º TA ao Contrato nº 097/02.

 

Oportuno observar que, em verdade, o descumprimento do disposto no parágrafo único do art. 61 da Lei nº 8.666/93 refere-se à desobediência do prazo legal de publicidade do extrato contratual, e não a sua ausência, conforme se verifica nos relatórios da área técnica.

 

Tendo em vista se tratar do mesmo dispositivo legal e considerando ainda que o recorrente apresentou defesa tanto em relação à ausência de publicação quanto em relação à publicação intempestiva, não há qualquer prejuízo à parte.

 

Na peça recursal o recorrente lista as publicações dos extratos dos contratos e/ou aditivos aos contratos no Diário Oficial do Estado (DOE), afirma que a publicação extemporânea de alguns não é causa de invalidade do ato e que não restou configurada irregularidade grave capaz de ensejar a aplicação de multa.

 

Sem razão o recorrente.

 

O cerne da questão nesses autos não está na validade dos contratos firmados por ausência de publicação, mas sim na sua publicação fora do prazo. Não há que se discutir aqui, portanto, a validade dos contratos, especialmente considerando que todos os contratos foram publicados, seja tempestivamente ou não.

 

Dispõe o art. 61, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93 (Lei de Licitações):

Art. 61. Todo contrato deve mencionar os nomes das partes e os de seus representantes, a finalidade, o ato que autorizou a sua lavratura, o número do processo da licitação, da dispensa ou da inexigibilidade, a sujeição dos contratantes às normas desta Lei e às cláusulas contratuais.

Parágrafo único. A publicação resumida do instrumento de contrato ou de seus aditamentos na imprensa oficial, que é condição indispensável para sua eficácia, será providenciada pela Administração até o quinto dia útil do mês seguinte ao de sua assinatura, para ocorrer no prazo de vinte dias daquela data, qualquer que seja o seu valor, ainda que sem ônus, ressalvado o disposto no art. 26 desta Lei.

 

 

No caso em apreço as publicações no Diário Oficial do Estado deram-se da seguinte maneira:

 

Contrato/Aditivo

Data assinatura  

Data Publicação

prazo      / atraso (dias)

Contrato 001/03 (fls. 20-25)

30/01/03 (fl. 25)

26/02/03 (fl. 27)

27/02/03 /     -

Contrato 003/03 (fls. 28-30)

15/03/03 (fl. 30)

30/04/03 (fl. 31)

28/04/03 /      2

Contrato 013/03 (fls. 33/34)

07/07/03 (fl. 34)

16/10/03 (fl. 35)

27/08/03 /     50

Contrato 014/03 (fls. 38/39)

10/09/03 (fl. 39)

16/10/03 (fl. 41)

27/10/03 /       -

Contrato 015/03 (fls. 42-44)

15/09/03 (fl. 44)

16/10/03 (fl. 50)

27/10/03 /       -

Contrato 018/03 (fls. 51/52)

01/11/03 (fl. 52)

10/12/03 (fl. 53)

29/12/03 /       -

Contrato 019/03 (fls. 56/57)

01/11/03 (fl. 57)

10/12/03 (fl. 58)

29/12/03 /       -

4º TA ao Contrato 18/99 (fl. 64)

24/11/03 (fl. 64)

16/01/04 (fl. 65)

26/12/03 /      21

1º TA ao Contrato 98/02 (fl. 68)

25/03/03 (fl. 68)

30/04/03 (fl. 70)

28/04/03 /       2

4º TA ao Contrato 12/99 (fl. 71)

30/01/03 (fl. 71)

26/02/03 (fl. 72)

27/02/03 /        -

4º TA ao Contrato 09/01 (fl. 75)

25/03/03 (fl. 75)

30/04/03 (fl. 77)

28/04/03 /       2

1º TA ao Contrato 10/03 (fl. 78)

03/11/03 (fl. 78)

10/12/03 (fl. 80)

29/12/03 /       -

2º TA ao Contrato 97/02 (fls.81/82)

05/03/03 (fl. 82)

11/07/03 (fl. 84)

28/04/03 /     74 

 

Verifica-se assim que alguns dos atrasos na publicação dos contratos são bastante expressivos.

 

O recorrente traz aos autos citação do doutrinador Marçal Justen Filho acerca da validade do extrato de contrato não publicado, o qual entende que a publicação em prazo superior não vicia a contratação, nem desfaz o vínculo.

 

Como já dito, não se discute aqui a validade da contratação em função da publicação como condição de sua eficácia, mas sim a sua publicação a destempo, irregularidade essa que foi reconhecida pela própria responsável.

 

Cumpre aqui trazer a citação de Marçal Justen Filho[4] na sua íntegra para uma correta interpretação do seu entendimento:

 

A lei determina que a publicação deverá ocorrer no prazo de vinte dias contados do quinto dia útil do mês seguinte ao da assinatura. A Administração tem o dever de promover a publicação dentro desse prazo. Nada impede que o faça em prazo menor, até mesmo pelo interesse em que os prazos contratuais iniciem seu curso imediatamente. E se o fizer em prazo superior? O descumprimento a esse prazo não vicia a contratação, nem desfaz o vínculo. Acarreta a responsabilidade dos agentes administrativos que descumpriram tal dever e adia o início do cômputo dos prazos contratuais. (grifou-se)

 

Verifica-se assim que é um dever do administrador o cumprimento do prazo legal de publicação do termo contratual.

 

Essa Consultoria já se manifestou acerca do tema no já mencionado Parecer COG 514/09:

 

Em sua peça recursal esclarece a recorrente que o contrato nº 001/03 não foi objeto de restrição quando da emissão do Relatório de Auditoria nº 151/2004, relativamente à ausência de publicidade, e sim quanto à falta de Parecer Jurídico, ao qual foi apresentada justificativa ao TCE.

Informa que todos os contratos referidos na restrição foram ou tiveram seus extratos tornados públicos, ainda que fora do prazo, o que demonstra a lisura da empresa a pactuação de seus contratos. Afirma que todas as adjudicações foram centradas no melhor preço de cada vencedor de cada licitação.

Em seu entendimento é severa ou indevida a multa imposta no valor de R$ 400,00 pela ausência de publicidade, pois a publicidade foi efetivada, mesmo que intempestivamente, conforme apontado no próprio relatório da DCE nº 151/2004.

Assevera que os contratos foram assinados pelas partes e cumpridas todas as demais diretrizes legais, o que não trouxe nenhum prejuízo à COHAB, nem favorecimento a terceiros.

Por fim, argumenta que:

 

" Não se trata pois de nenhuma grave infração a norma legal ou regulamentar, e impor multas tão só pela ausência de publicidade desses contratos seria banalizar o instituto da multa, instrumento válido para coibir abusos e omissões dos órgãos públicos que operem a margem da lei visando facilitar a burla e o favorecimento de empresas.

Não foi este o caso da COHAB, onde tudo se fez dentro das normas legais, contratando-se o melhor e mais vantajoso e vendendo pelo melhor preço. Em suma, todos os contratos forma publicados e contra nenhum deles houve algum tipo de insurgência ou recursos, de modo que os participantes dos atos licitatórios confirmaram iu legitimaram cada uma das adjudicações ao não se insurgirem ou não recorrerem dos resultados."

 

Exposta a justificativa do recorrente, passa-se a sua análise:

A recorrente em suas justificativas admite que houve descumprimento ao artigo 61, parágrafo único da Lei nº 8.666/93,  afirmando que houve publicação em atraso do extrato do termo contratual, portanto em descumprimento ao artigo 61, parágrafo único da Lei nº 8.666/93, que prescreve o seguinte:

Art. 61. (...)

Não fosse suficiente o reconhecimento da irregularidade pela própria recorrente, transcreve-se parte do Parecer nº 076/2007 (fls. 164/165 dos autos originários) do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas referente a esta matéria:

" Outro apontamento preliminarmente suscitado pela Diretoria de Controle do Estado identificou a inobservância do prazo de publicidade do termo contratual dos seguintes contratos: nº 003/03, nº 012/03; 4º Termo Aditivo ao Contrato nº 018/99; 1º Termo Aditivo ao Contrato ao nº 098/02; 4º Termo Aditivo ao Contrato nº 12/99; 4º Termo ao Contrato nº 009/01; 1º Termo Aditivo nº 010/03.

Tal fato teria implicações na própria eficácia dos referidos contratos, e caracterizaria infração ao disposto no art. 61, parágrafo único, da Lei Federal nº 8.666/93 e suas alterações posteriores.

Referida irregularidade, no que tange ao Contrato nº 03/2003 resta confirmada, não obstante a inexplicável conclusão da Instrução Técnica, construída sem amparo em qualquer documento: "diante dos esclarecimentos prestados a cerca das restrições apontadas, entende-se como satisfatórios. Entretanto é necessário que a empresa através de departamento responsável atente para o cumprimento de prazos, pois este é relevante e dará eficácia o termo contratual' (sic).

Os esclarecimentos prestados pela COHAB foram satisfatórios apenas para confirmar o apontamento restritivo, não para afastá-lo. Afirmou a Companhia: " (...) no caso em tela por ter havido retardamento no retorno do referido Contrato nº 003/03, com a devida assinatura por parte do Locador, que tem domicílio na cidade de Canoinhas, (...) acabou por efetuar a publicação fora do prazo estabelecido no art. 61, § único, da Lei Licitatória".

1Ademais, não vejo que relação se possa estabelecer entre o retorno do instrumento de contrato do Município em que tem domicílio uma das partes, com a publicação do extrato do contrato, no prazo estabelecido pela Lei de Licitações, que só começa a fluir após a efetiva assinatura.

Como sabemos, o que será publicado não é o instrumento de contrato (o documento físico), mas tão somente um extrato (um resumo) do contrato (o negócio jurídico estabelecido). Completamente infundada, portanto, a justificativa da COHAB. A mera informação da assinatura já demarca o período para a publicidade legalmente prevista na Lei de Licitações, não sendo necessário aguardar o " retorno" de qualquer documento.

Em sua defesa a Gestora afirma "como se vê", mesmo que tardiamente, a COHAB/SC visando o cumprimento do art. 37 da Constituição Federal, tornou público o referido Contrato de Locação". A mesma assertiva foi apresentada pela Gestora responsável em relação às seguintes avenças: Contrato nº 12/03; 4 º Termo Aditivo ao Contrato 018/99; 1º Termo Aditivo ao Contrato nº 098/02; 4º Termo Aditivo ao Contrato nº 012/99; 4º Termo Aditivo ao Contrato nº 009/01 e 1º Termo Aditivo ao Contrato nº 010/03.

Tal assertiva, contudo, não lhe  favorece, porque nada pode se ver nos autos, que confirmasse a realização, mesmo que intempestiva, da publicação legalmente exigida. Aparentemente, nenhum documento foi remetido pela COHAB.

É incompreensível o raciocínio esposado pela Instrução técnica ao examinar os atos acima referidos (fls. 137). Depois de reafirmar o descumprimento do comando insculpido no parágrafo único do art. 61 do diploma legal aplicável, sem que tivesse o respaldo de qualquer documento, culmina por sanar a restrição.

Transcrevo a paradoxal passagem do Relatório nº DCE/INSP. 4/DIV.12/Nº 020/2006:

omissis...

1 Trata-se de incoerência gritante!

Configurado está o descumprimento do disposto no art. 61, parágrafo único, da Lei Federal nº 8.666/93 em relação aos Contratos: nº 003/03; nº 012 Contrato nº 12/03; 4 º Termo Aditivo ao Contrato 018/99; 1º Termo Aditivo ao Contrato nº 098/02; 4º Termo Aditivo ao Contrato nº 012/99; 4º Termo Aditivo ao Contrato nº 009/01 e 1º Termo Aditivo ao Contrato nº 010/03."

 

Quanto às demais argumentações da recorrente, tem-se a esclarecer o que segue:

A questão em discussão não está vinculada ao prejuízo ao erário e sim ao cumprimento da Lei nº 8.666/93, que visa garantir, não só a lisura do certame, mas também assegurar a observância do princípio constitucional da isonomia e a selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração.

 

A jurista Maria Sylvia Zanella Di Pietro ensina que  licitação é procedimento administrativo e explica que ao falar-se em procedimento administrativo, está-se fazendo referência a uma série de atos preparatórios do ato final objetivado pela Administração. A licitação é um procedimento integrado por atos e fatos da Administração e atos e fatos do licitante, todos contribuindo para formar a vontade contratual. Por parte de Administração, o edital ou convite, o recebimento das propostas, a habilitação, a classificação, a adjudicação, além de outros atos intermediários e posteriores, como o julgamento de recursos interpostos pelos interessados, a revogação, a anulação, os projetos, as publicações, anúncios, atas etc. Por parte do particular, a retirada do edital, a proposta, a desistência, a prestação de garantia, a apresentação de recursos, as impugnações[5].

 

O encadeamento de atos que formam o procedimento administrativo e  que levam a escolha mais vantajosa para Administração deve ser rigorosamente cumprido pelo administrador, sob pena de responsabilização. A publicação dos extratos em atraso não satisfaz aos ditames da Lei nº 8.666/93.

 

 Explica Gasparini[6] (2002, p.139) que: "ao administrador público cabe desempenhar, a tempo, as atribuições do cargo, função ou emprego público de que é titular. Reconhece-se nessa oportuna atuação um dever do agente público. As competências do cargo, função ou emprego público devem ser exercidas na sua plenitude e no momento legal. Não se satisfaz o direito com o desempenho incompleto ou a destempo da competência e, pior ainda, com a omissão da autoridade".

 

Ante o exposto, sugere esta Consultoria a manutenção da multa aplicada, por descumprimento ao artigo 61, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93.

 

 

Contudo, em sentido contrário foi o Parecer COG nº 362/07[7] e o Parecer COG 039/08[8], ambos de autoria do Auditor Fiscal de Controle Externo Theomar Aquiles Kinhirin, opinando pela configuração de uma mera falha formal, a qual não ensejaria a aplicação de multa.

 

Oportuno aqui esclarecer que o objetivo da Lei nº 8.666/93 (art. 61, parágrafo único), ao exigir a publicação resumida do contrato e de seus aditamentos, não se restringe tão somente a prestigiar o princípio da publicidade, mas é também uma promoção do controle da gestão pública.

 

Não se pode olvidar, ainda, que “a publicidade não é mero elemento formativo do ato; é requisito de eficácia e moralidade[9]”. E por isso mesmo, ao estipular um prazo para essa publicação, está o legislador também controlando a utilização do dinheiro público e inibindo abusos e irregularidades. Segundo Hélio Saul Mileski, o controle tem por finalidade “assegurar que a Administração atue de acordo com os princípios que lhe são impostos pelo ordenamento jurídico[10]”.

 

Ao tratar da inobservância do prazo legal para a publicação do termo contratual, Carlos Ari Sundfeld[11] faz o alerta:

(...) não se deve esquecer o motivo que levou o legislador a estipular prazo para a publicação: coibir a prática, não rara na Administração, de antedatar contratos. Assim, a não publicação no prazo pode ser considerada como forte indício de que tal expediente foi adotado, o que levará, dependendo do caso, à desconsideração da data de celebração apontada no instrumento, com as consequências daí decorrentes: invalidade do empenhamento da despesa, por ocorrido depois do termo para tanto fixado por norma administrativa; impossibilidade de prorrogação, por já vencido o prazo contratual quando da prorrogação (se a perda do prazo para a publicação referir-se a instrumento de prorrogação), etc. (grifou-se)

 

Diante disso, a publicação intempestiva do extrato do termo contratual não consiste numa mera falha formal, mas sim numa regra a ser cumprida à risca pelo gestor público.

 

Diante da importância da publicação do extrato do termo contratual tempestivamente, não há como dar guarida aos argumentos do recorrente.

 

Destarte, deve ser mantida a multa constante do item 6.2.2 da decisão recorrida.

 

2.3. Da multa em razão da ausência de cláusula específica de manutenção das condições de habilitação e qualificação

 

O item 6.2.4 do Acórdão nº 0869/2007 aplicou multa à responsável devido à ausência de cláusula específica que estabelecesse a obrigatoriedade de o contratado manter as condições de habilitação e qualificação exigidas no processo licitatório que originou o Contrato nº 016/03, revelando o descumprimento ao disposto no art. 55, XIII, da Lei nº 8.666/93.

 

O recorrente afirma que nem todas as cláusulas exigidas no art. 55 da Lei nº 8.6669/3 são obrigatórias e que a cláusula correspondente ao inciso XIII é facultativa.

 

Com razão o recorrente.

 

Preceitua o inciso XIII do art. 55 da Lei nº 8.666/93:

 

Art. 55 - São cláusulas necessárias em todo contrato as que estabeleçam:

(...)

XIII - a obrigação do contratado de manter, durante toda a execução do contrato, em compatibilidade com as obrigações por ele assumidas, todas as condições de habilitação e qualificação exigidas na licitação.

 

 

Segundo Marçal Justen Filho[12],

 

O texto do caput do art. 55 induz à necessidade de que todo contrato administrativo contenha as cláusulas enumeradas nos diversos incisos. Porém, nem todas as hipóteses dos diversos incisos são realmente obrigatórias. Ou seja, a ausência de algumas delas descaracteriza um contrato administrativo e acarreta a nulidade da avença. Quanto a outras cláusulas, sua presença é desejável, mas não obrigatória. São obrigatórias as cláusulas correspondentes aos incs. I, II, III, IV e VI. As demais ou são dispensáveis (porque sua ausência não impede a incidência de princípios e regras legais) ou são facultativas, devendo ser previstas de acordo com a natureza e as peculiaridades de cada contrato. (...)

 

E acrescenta[13]:

 

O inc. XIII destina-se a evitar dúvidas sobre o tema. A sua ausência não dispensaria o particular dos efeitos do princípio de que a habilitação se apura previamente, mas se exige a presença permanente de tais requisitos, mesmo durante a execução do contrato. O silêncio do instrumento não significará dispensa da exigência. Se o particular, no curso da execução do contrato, deixar de preencher as exigências formuladas, o contrato deverá ser rescindido. [14]

 

Também Carlos Ari Sundfeld[15]  leciona nesse sentido:

 

 

A ausência de referência a essas disposições no instrumento de contrato é de total irrelevância. Por serem normas de ordem pública, cuja necessária aplicação deriva de imposição legislativa, incidem na relação independentemente da vontade das partes, que é impotente para modificá-las ou afastá-las.

 

E extrai-se do já citado Parecer COG nº 39/08:

Assim, como se observa do apontamento da instrução a multa foi aplicada por não constar dos contratos indicados no item 6.2.4 do Acórdão 2241/2004, a cláusula enumerada no artigo 55 inciso XIII, enquadra-se justamente dentre aquelas cláusulas consideradas dispensáveis pela doutrina.

 

À luz deste entendimento doutrinário, sem todavia negar a vigência do dispositivo legal dito vulnerado, mas considerando-se que as cláusulas apontadas como ausentes do contrato, não tem o condão de descaracterizar o contrato como administrativo ou acarretar a sua nulidade não incidindo de modo a invalidar o ajuste encetado, entende-se que a ausência de tais cláusulas não são suficientes para imputar ao fato uma antijuridicidade e culpabilidade capaz de ensejar a aplicação de multa, pelo que, sugere-se transformar a multa aplicada em recomendação a Administração Pública Municipal, para observar nas futuras contratações os ditames da Lei licitatória.

 

Constata-se, portanto, que a ausência de cláusula específica de manutenção das condições de habilitação e qualificação não motiva o seu descumprimento, haja vista as disposições da Lei nº 8.666/93.  O não preenchimento das exigências formuladas ensejará a rescisão do contrato pela Administração, no uso de suas prerrogativas, pois “é exigido para celebração e execução do contrato que o contratado mantenha obrigatoriamente todas as condições de habilitação e qualificação estabelecidas na licitação”[16].

 

Embora o dispositivo legal enumere as cláusulas que devam integrar o contrato decorrente da Lei nº 8.666/93, mostra-se razoável a conversão da multa aplicada em determinação à Unidade Gestora para que inclua em todos os seus contratos a cláusula necessária quanto à obrigação de o contratado manter, durante a execução das obras e dos serviços, em compatibilidade com as obrigações por ele assumidas, todas as condições de habilitação e qualificação exigidas na licitação, respeitando o inciso XIII do art. 55 da Lei nº 8.666/93.

 

Nesse sentido a jurisprudência do Tribunal de Contas da União (TCU):

 

(...) 2) julgar as contas da Universidade Federal de Roraima, relativas ao período de 01.11 a 31.12.95, regulares com ressalvas, dando-se quitação ao Sr. Sebastião Alcântara Filho, sem prejuízo das seguintes determinações: XXV) incluir, em todos os contratos, cláusula necessária quanto à obrigação de o contratado manter, durante toda a execução das obras e dos serviços, em compatibilidade com as obrigações por ele assumidos, todas as condições de habilitação e qualificação exigidas na licitação, respeitando o inciso XIII do artigo 55 da Lei 8.666/93 (TCU. Processo nº TC-825.125/1996-0. Acórdão nº 584/1997, 1ª Câmara, Relator Ministro Marcos V. Vilaça, DOU 12/12/1997 - Página 29852)

 

(...)9.1. sugerir ao Senado Federal, caso deseje publicar o Edital de Concorrência das Obras de Construção do Prédio Anexo III, que: (...)

9.1.23. complemente a Cláusula (...) da minuta contratual, explicitando a obrigação de mantença, pela contratada, de todas as condições de habilitação e qualificação exigidas na licitação, de modo a adaptá-la à exigência constante do Art. 55, inciso XIII da Lei nº 8.666/93; (...)

(Acórdão 597/2008, Plenário, Ministro Relator Guilherme Palmeira, DOU 14/04/2008)[17]

 

 

 

(...)9.1 - determinar ao Tribunal Regional do Eleitoral - TRE/RN que: (...)

9.1.6. inclua no Termo de Contrato (...), por meio da celebração de aditivo,  a  cláusula necessária prevista no  inciso xIII do artigo 55 da Lei nº 8.666/1993, que estabelece a “obrigação do contratado de manter, durante toda a execução do contrato, em compatibilidade com as obrigações por ele assumidas, todas as condições de habilitação e qualificação exigidas na licitação; (...) (Acórdão 908/2003, Plenário, Relator Ministro Lincoln M. da Rocha, DOU 24/07/2003)[18]

 

Assim sendo, tendo em vista todo o expendido, sugere-se o cancelamento da multa constante do item 6.2.4 do Acórdão nº 0869/2007, com a sua conversão em recomendação para que a Unidade Gestora inclua em todos os seus contratos a cláusula necessária quanto à obrigação de o contratado manter, durante a execução das obras e dos serviços, em compatibilidade com as obrigações por ele assumidas, todas as condições de habilitação e qualificação exigidas na licitação, respeitando o inciso XIII do art. 55 da Lei nº 8.666/93, sob pena de aplicação de multa.

 

2.4. Da multa em razão da ausência de processo licitatório

 

O item 6.2.6 do Acórdão nº 0869/2007 aplicou multa à responsável em razão da ausência de processo licitatório para celebração dos Contratos nº 014 e 015/03, em afronta ao art. 37, XXI, da Constituição Federal.

 

O recorrente aduz que a instrução técnica apontou o descumprimento do art. 22 da Lei nº 8.666/93[19], ao passo que a decisão guerreada utilizou como fundamento o art. 37, XXI, da Constituição Federal; e que em razão disso a responsável não exerceu seu direito de defesa quanto à infração constitucional. Requer por isso o cancelamento da multa aplicada.

 

O argumento do recorrente, todavia, não tem o condão de elidir a irregularidade.

 

Extrai-se do item 11.2 do Relatório de Instrução nº DCE/INSP.4/DIV.12 nº 151/2004 (fls. 23 e 38 dos autos principais):

 

(...) 1.4.8 – Contrato nº 15/03

(...) b) Do Descumprimento Modalidade Licitatória:

b1) Quando da análise do contrato em tela, observa-se que, o mesmo possui objeto semelhante ao contrato nº 14/03, ambos formalizados sem o devido processo licitatório, o que caracteriza o parcelamento do objeto, fugindo a empresa da obrigação de executar a respectiva modalidade licitatória, nos termos do art. 22, da Lei Federal nº 8.666/93.(...)

II – CONCLUSÃO (...)

11) Contratos nº 14/03 e 15/03 (...)

11.2) Por semelhança do objeto, observa-se que houve parcelamento do objeto, fugindo da obrigatoriedade de executar a respectiva modalidade licitatória, nos termos do art. 22, da Lei Federal nº 8.666/93 e suas alterações posteriores (item 1.4.8.b) (...)

 

Em sua defesa (fls. 52/53 dos autos principais), alegou a responsável:

 

O Contrato nº 14/03 (Anexo 20), determina em sua cláusula primeira como objeto: “O presente contrato tem como objeto que a CONTRATADA, desenvolva serviços de Auditoria de Gestão, de acordo com os sistemas da empresa, e que consistirão na análise e avaliação dos procedimentos de controle interno, bem como de seus processos de gestão relativa à estrutura financeira, administrativa e contábil dos exercícios de 2001 e 2002, apresentando um relatório circunstanciado, compreendendo comentários, procedimentos, resultados, sugestões e conclusão relativos a gestão da CONTRATANTE nos exercícios de 2001 e 2002, identificando pontos de melhoria e apoio à atual administração da CONTRATANTE”.

Os serviços contratados na referida Auditoria de Gestão se fizeram necessários em função da constatação, quando assumiu a atual Administração, da existência de diversas situações inerentes aos exercícios de 2001 e 2002, nos que causavam excessiva preocupação devido aos procedimentos internos adotados anteriormente e que apresentavam posição financeira dificultosa, contratos de financiamento pendentes e outros celebrados sem suporte da Lei de Responsabilidade Fiscal, obras paralisadas, ações judiciais, inadimplência em níveis inaceitáveis, entre outras. Cabe salientar, que tal situação nos levou a solicitar em diversas oportunidades, manifestação, auxílio e orientações da Secretaria de Estado da Fazenda, da Procuradoria do Estado e até desse egrégio Tribunal. Algumas das constatações originaram inclusive documentação encaminhada ao Ministério Público. Era mister ter amplo conhecimento da situação encontrada e para tanto se fez necessária a referida contratação.

Já o Contrato nº 015/03 (Anexo 21), descreve como objeto em sua cláusula primeira: “O presente contrato tem por objeto a contratação de uma empresa de Auditoria Externa para a execução dos seguintes serviços:”  Os serviços em extensa relação (ver Anexo 21) estão discriminados nos subitens A a P da cláusula primeira e referem-se a serviços de Auditoria Externa do exercícios de 2003. A COHAB/SC por ser empresa de economia mista regida pela Lei nº 6.404/76 (Lei das Sociedades Anônimas), necessita por obrigação legal, de auditagem externa, serviço este sempre desenvolvido anualmente, a cada exercício fiscal.

Diante do exposto, verifica-se a diferenciação existente entre os objetos dos dois contratos acima epigrafados.

 

A área técnica não tratou de tema no Relatório de Reinstrução DCE/INSP.4/DIV.12 nº 20/2006. Todavia, assim entendeu o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas no Parecer MPTC nº 76/2007 (fls. 173-175 dos autos principais):

 

O Contrato nº 14/2003 tinha por objeto:

 

O presente contrato tem por objeto que a CONTRATADA, desenvolva serviços de Auditoria de Gestão, de acordo com os sistemas da empresa, e que consistirão na análise e avaliação dos procedimentos de controle interno, bem como de seus processos de gestão relativa à estrutura financeira, administrativa e contábil dos exercícios de 2001 e 2002, apresentado um relatório circunstanciado compreendendo comentários, procedimentos, resultados, sugestões e conclusão relativos a gestão da CONTRATANTE nos exercícios de 2001 e 2002, identificando pontos de melhoria e apoio à atual administração da CONTRATANTE.

 

Já o Contrato nº 15/2003 visava a procedimentos típicos de controle interno no exercício de 2003:

 

O presente contrato tem por objeto que a contratação de uma empresa de Auditoria externa para a execução

 

A distinção existente entre os objetos não permitiria a contratação direta.

Efetivamente, a diferença entre um e outro contrato reside no exercício fiscal de abrangência e no grau de detalhamento do objeto. A expressão “análise e avaliação dos procedimentos de controle interno, bem como de seus processos de gestão relativa à estrutura financeira, administrativa e contábil”, que caracteriza o objeto do Contrato de nº 14/2003, bem poderia resumir o extenso objeto veiculado pelo Contrato nº 15/2003.

A atividade comum entre ambos os contratos poderia ser resumida ainda como relacionada à avaliação do controle interno e auditoria. A semelhança de conteúdo entre os contratos traduz-se até mesmo no preço semelhante dos mesmos, R$ 15.651,00 no Contrato nº 14/2003, e R$ 15.900,00, no Contrato nº 15/2003.

Também quanto às circunstâncias de tempo, é de se observar que os Contratos nº 14 e 15/2003 foram assinados em datas muito próximas. O primeiro em 10 de setembro e o segundo 5 (cinco) dias após.

Mesmo que em sua essência fossem considerados distintos os objetos dos Contratos nº 14 e 15/2003, não há como negar que ambos tratam de serviços da mesma natureza, prestados no mesmo local, e com plena possibilidade de serem realizados conjunta e concomitantemente (Lei 8.666/93, art. 23, §5º[20]). Em casos como este, é vedada a contratação direta como decorrência do fracionamento de contratos, ou a adição de modalidade licitatória que não se harmonize com o montante das distintas contratações.

As contratações de nº 14 e 15/2003 poderiam ter ocorrido separadamente, como ocorreram, mas cada uma delas por intermédio do procedimento licitatório cabível para a soma do valor de ambas. Caracterizada está a ilegal contratação direta.

 

Destaca-se também que, além dos mencionados contratos terem sido firmados em datas muito próximas, com preços semelhantes, serviços de mesma natureza e prestados no mesmo local, os contratos foram firmados com a mesma empresa – TREVISAN AUDITORES INDEPENDENTES. Não se mostra razoável, portanto, aceitar que os referidos contratos possuem objetos distintos.

 

Para a lei, é necessário que todo o serviço seja sempre planejado em sua totalidade, a fim de evitar o desperdício de recursos, sendo vedado o parcelamento de serviços de mesma natureza e no mesmo local que possam ser realizados conjunta e concomitantemente.

 

Preceitua o art. 8º, caput, da Lei nº 8.666/63:

 

Art. 8º.  A execução das obras e dos serviços deve programar-se, sempre, em sua totalidade, previstos seus custos atual e final e considerados os prazos de sua execução.

(...)

 

Segundo Marçal Justen Filho[21], “a lei impõe, como regra, a execução integral da obra ou serviço. Obra ou serviço executados parcialmente não trazem benefícios ao interesse coletivo”.  Acrescenta ainda que:

 

É inadmissível que se promova dispensa de licitação fundando-se no valor de contratação que não é isolada. Existindo pluralidade de contratos homogêneos, de objeto similar, considera-se seu valor global – tanto para fins de aplicação do art. 24, incs. I e II, como relativamente à determinação da modalidade cabível de licitação. Não se admite o parcelamento de contratações que possam ser realizados conjunta e concomitantemente.[22]

 

E conforme o Tribunal de Contas da União, em publicação oficial, “é vedado o fracionamento de despesas para a adoção de dispensa de licitação ou modalidade de licitação menos rigorosa que determinada para a totalidade do valor do objeto a ser licitado[23]”.

 

Ora, comprovado o parcelamento do objeto nos Contratos nº 14/03 e 15/03, tem-se, por conseguinte, a correspondente fuga ao obrigatório procedimento licitatório. E isso porque se forem somados os valores dos Contratos nº 14/03 (R$ 15.651,00) e nº 15/03 (R$ 15.900,00), supera-se o valor previsto na lei para a dispensa de licitação.

 

Assim dispõem os arts. 23, II, “a”, e 24, II e parágrafo único, da Lei nº 8.666/93:

 

Art. 23.  As modalidades de licitação a que se referem os incisos I a III do artigo anterior serão determinadas em função dos seguintes limites, tendo em vista o valor estimado da contratação:

(...)

II - para compras e serviços não referidos no inciso anterior:

a)        convite - até R$ 80.000,00 (oitenta mil reais); 

(...)

 

Art. 24.  É dispensável a licitação: 

(...)

II - para outros serviços e compras de valor até 10% (dez por cento) do limite previsto na alínea "a", do inciso II do artigo anterior e para alienações, nos casos previstos nesta Lei, desde que não se refiram a parcelas de um mesmo serviço, compra ou alienação de maior vulto que possa ser realizada de uma só vez; 

(...)

Parágrafo único. Os percentuais referidos nos incisos I e II do caput deste artigo serão 20% (vinte por cento) para compras, obras e serviços contratados por consórcios públicos, sociedade de economia mista, empresa pública e por autarquia ou fundação qualificadas, na forma da lei, como Agências Executivas.[24]

 

 

Nesse sentido foi o Parecer COG nº 815/07, de autoria do Auditor Fiscal de Controle Externo Theomar Aquiles Kinhirin, referente ao REC nº 04/00314975, cuja ementa segue abaixo:

Contratação Direta. Dispensa de Licitação. Limite. Parcelamento.

A Administração para contratar de forma direta por Dispensa de Licitação deve ater-se aos limites fixados em lei, caracterizando burla a norma legal e parcelamento a contratação de serviços de mesma natureza e com a mesma finalidade, por meio de dois processos de dispensa.

 

Com relação à fundamentação da decisão guerreada, constata-se que a responsável defendeu-se do seguinte fato: o irregular parcelamento do objeto. Como não logrou êxito em comprovar que os objetos dos contratos eram distintos, restou patente a ocorrência da irregularidade.  Caso o objeto dos contratos fosse distinto, não haveria irregularidade, pois os contratos teriam valor inferior ao exigido para licitação.

 

Se lei prevê que nesses casos não pode haver contratação direta, pela lógica, houve fuga ao procedimento licitatório previsto no art. 37, XXI, da Constituição Federal, in verbis:

 

 Art. 37. (...)

XXI – ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.

 

A comprovação do fato apontado pela área técnica – parcelamento do objeto - teve como corolário, portanto, a infração ao dispositivo constitucional – ausência de procedimento licitatório.

 

Ao tratar das decisões proferidas nos Tribunais de Contas, Hélio Saul Mileski afirma que, na sessão de julgamento – de Câmara ou Plenário -, o Ministro Relator irá proferir a decisão sobre os fatos e atos analisados no processo, consoante a instrução realizada[25].

 

Se a responsável defendeu-se da exposição do fato (parcelamento de objeto) e o Relator igualmente apreciou o fato (parcelamento de objeto), houve estrita correspondência entre o fato descrito no relatório de instrução da área técnica e a multa aplicada à responsável.

 

Por certo que não poderá a responsável ser penalizada sem que tenha tido a oportunidade de se defender do fato que lhe foi atribuído, mas não é essa a hipótese dos autos.

 

Restou patente também que não houve uma divergência de fundamentação entre a área técnica e a decisão dessa Corte de Contas, mas sim uma capitulação diversa que manteve a correlação entre o relatório de instrução e a Deliberação. Não se pode olvidar ainda que a Lei nº 8.666/93 “regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências”[26].

 

Diante disso, ainda que o Acórdão nº 0869/2007 tenha baseado a multa em dispositivo legal (art. 37, XXI, da CF) aparentemente diverso do apontado pela área técnica (art. 22 da Lei nº 8.666/93), não houve qualquer prejuízo à defesa da responsável. E isso porque a responsável apresentou defesa em relação ao fato, e não em relação ao dispositivo legal.

 

Oportuno trazer ainda, por analogia, as disposições do Direito Processual Penal acerca do tema.

 

Quando o art. 383 do Código de Processo Penal estabelece que “o juiz poderá dar ao fato definição jurídica diversa da que constar da queixa ou da denúncia (...)”, permite que o julgador confira aos fatos descritos na peça acusatória capitulação jurídica diversa, haja vista que o seu julgamento refere-se aos fatos descritos.

 

 

 

Considerando que é atribuição dessa Corte de Contas a fiscalização da legalidade dos atos e contratos administrativos em geral[27], isto é, a verificação da conformidade do ato administrativo com a lei, e que a legalidade é o princípio basilar do regime jurídico-administrativo, urge ser mantida a sanção imposta ao gestor que descumpre a lei.

 

Destarte, sugere-se a manutenção da multa constante do item 6.2.6 do Acórdão nº 0869/2007.

 

 

3. CONCLUSÃO

 

Diante do exposto, a Consultoria Geral emite o presente Parecer no sentido de que o Conselheiro Herneus de Nadal proponha ao egrégio Tribunal Pleno decidir por:

 

          3.1. Conhecer e dar provimento parcial ao Recurso de Reexame, de iniciativa do Conselheiro Wilson Rogério Wan-Dall, fundamentado no art. 81 da Lei Complementar nº 202, de 15 de dezembro de 2000, interposto contra o
Acórdão nº 0250/2011, exarado na Sessão Ordinária de 11/04/11, nos autos do processo REC nº 07/00328076, para:

                    3.1.1. Cancelar a multa de R$ 400,00, aplicada a Sra. Maria Darci Mota Beck, constante do item 6.2.4 do Acórdão nº 0869/2007 (ALC nº 04/03567017).

3.1.2 Recomendar à Unidade Gestora para que inclua em todos os seus contratos a cláusula necessária quanto à obrigação de o contratado manter, durante a execução das obras e dos serviços, em compatibilidade com as obrigações por ele assumidas, todas as condições de habilitação e qualificação exigidas na licitação, respeitando o inciso XIII do art. 55 da Lei nº 8.666/93.

                    3.1.3. Ratificar os demais termos da Deliberação recorrida.

          3.2. Dar ciência da Decisão, do Relatório e Voto do Relator e do Parecer da Consultoria Geral, ao recorrente e à responsável, Sra. Maria Darci Mota Beck.

Consultoria Geral, em 15 de agosto de 2011.

 

 ANDREZA DE MORAIS MACHADO

AUDITOR FISCAL DE CONTROLE EXTERNO

 

 

 

 

 

    De acordo:

 

 THEOMAR AQUILES KINHIRIN

COORDENADOR

 

 

DE ACORDO. Encaminhem-se os autos à elevada consideração do Exmo. Sr. Relator Conselheiro Herneus de Nadal, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.

 

 HAMILTON HOBUS HOEMKE

CONSULTOR GERAL



[1] Segundo alega a Sra. Maria Darci Mota Beck na fl. 48 dos autos principais.

[2] Fls. 18-21 do REC nº 07/00328076.

[3]Autor: Marcos Weis Bliacheris. Advogado da União. https://redeagu.agu.gov.br/unidade agu/CEAGU/revista/ANO V-fevereiro 2005

[4] in Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 14 ed.  São Paulo: Dialética, 2010. pp. 758/759.

[5]Di Pietro, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 15ª edição. São Paulo: Atlas, 2003, fl. 299.

[6]GASPARINI, Diogenes. Direito Administrativo. 7 ed. São Paulo: Saraiva, 2002.

[7] Referente ao REC nº 03/05634020. O Tribunal Pleno acatou o entendimento e cancelou a multa através da Decisão nº 1955/07.

[8] Referente ao REC nº 05/01049932. O Tribunal Pleno acatou o entendimento e cancelou a multa através da Decisão nº 1123/08.

[9] MILESKI, Hélio Saul. O Controle da Gestão Pública. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003. p.40.

[10] in O Controle da Gestão Pública. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003. pp. 138/139.

[11] in Licitação e Contrato Administrativo. São Paulo: Malheiros, 1994. p. 217.

[12] in Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 14 ed. São Paulo: Dialética, 2010. pp. 717/718.

[13] Ob. cit., p. 714.

[14] Para Carlos Ari Sundfeld (esta cláusula não é necessária e sua supressão não causa invalidade do contrato. Carlos Pinto Coelho Motta, (Eficácia nas Licitações e Contratos, 11 ed., Belo Horizonte: Del Rey, 2008,  p. 570),  e Jessé Torres Pereira Júnior (Comentários à Lei das Licitações e Contratações da Administração Pública, 7 ed., Rio de Janeiro: Renovar, 2007)  entendem que a cláusula é necessária.

[15]Licitação e Contrato Administrativo. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 225.

[16] Licitações e Contratos – Orientações e Jurisprudências do TCU. 4ª ed. Brasília: TCU, Secretaria-Geral da Presidência: Senado Federal,  Secretaria Especial de Editoração e Publicações, 2010. p. 761.

[17] http://www.tcu.gov.br/Consultas/Juris/Docs/judoc/Acord/20080411/021-103-2005-0-GP.doc

[18] http://www.tcu.gov.br/Consultas/Juris/Docs/judoc/Acord/20030806/TC%20007.052.doc

[19] Lei nº 8.666/93. Art. 22.  São modalidades de licitação:  I - concorrência;  II - tomada de preços;  III - convite;  IV - concurso; V - leilão.  (...)

[20] Lei nº 8.666/93. Art. 23. (...) §5º. § 5o  É vedada a utilização da modalidade "convite" ou "tomada de preços", conforme o caso, para parcelas de uma mesma obra ou serviço, ou ainda para obras e serviços da mesma natureza e no mesmo local que possam ser realizadas conjunta e concomitantemente, sempre que o somatório de seus valores caracterizar o caso de "tomada de preços" ou "concorrência", respectivamente, nos termos deste artigo, exceto para as parcelas de natureza específica que possam ser executadas por pessoas ou empresas de especialidade diversa daquela do executor da obra ou serviço.

[21] in Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 14ª ed. São Paulo: Dialética, 2010. p. 159.

[22] Ob. cit., p. 302.

[23] Tribunal de Contas da União, Licitações & Contratos – Orientações Básicas, Brasília: TCU, Secretaria de Controle Interno, 2003, p. 31.

[24] A COHAB/SC é empresa de economia mista estadual.

[25] in O Controle da Gestão Pública. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003. p. 364.

[26] Ementa da Lei nº 8.666/93. A ementa ou rubrica da lei é a parte do ato que sintetiza o conteúdo da lei, a fim de permitir, de modo imediato, o conhecimento da matéria legislada.

[27] Art. 25 da Lei Orgânica e art. 46 do Regimento Interno.