PROCESSO
Nº: |
CON-11/00373249 |
UNIDADE
GESTORA: |
Câmara Municipal de Bocaina do Sul |
INTERESSADO: |
Pedro Souza da Cruz |
ASSUNTO:
|
Possibilidade de concessão de benefício
auxílio-alimentação aos servidores do Legislativo Municipal |
PARECER
Nº: |
COG - 305/2011 |
Câmara Municipal.
Vale-Alimentação. Concessão. Registro contábil e orçamentário.
O Chefe do Poder Legislativo possui competência para
iniciar projeto de lei visando a instituição de vale-alimentação aos
servidores da Câmara. As respectivas despesas devem estar previstas no
orçamento serão classificadas na rubrica 3.3.90.46, bem como excluídas do rol
de despesas com pessoal a que se refere o art. 18 da LRF.
Sr. Consultor,
1. INTRODUÇÃO
Trata-se de Consulta
sobre a possibilidade de concessão de benefício auxílio-alimentação aos
servidores do Legislativo Municipal, formulado pelo Sr. Pedro Souza da Cruz,
Presidente da Câmara Municipal de Bocaina do Sul, nos seguintes termos:
1.
Considerando, um determinado município que conforme disposição expressa na LOM
e no Regimento Interno da Câmara de Vereadores, possui competência legal para
no âmbito do Poder Legislativo, levar a plenário, aprovar e implementar,
projeto de Resolução, dispondo sobre a concessão de vale-alimentação a seus
servidores.
2.
Considerando, a existência legalmente prevista do benefício do vale-alimentação
e a existência de parecer jurídico sobre o mesmo assunto,
Consulta-se:
a)
O Poder Legislativo Municipal, pode implementar o benefício aos servidores, em
face da competência interna corporis para tal ato?
b)
Caso seja afirmativa a resposta da consulta do item anterior, qual procedimento
a ser tomado, quanto ao registro orçamentário e contábil do lançamento e quais
os valores monetários que o benefício pode ser fixado?
2.1
Da legitimidade do Consulente
A
consulta foi subscrita pelo Presidente da Câmara Municipal de Bocaina do Sul
que é autoridade legitimada à formulação de indagações por escrito ao Tribunal
de Contas, consoante o disposto nos artigos 103, II, e 104, III, da Res. nº
TC-06/01.
2.2
Da competência em razão da matéria
A
fiscalização da despesa com pessoal é inerente à competência desta Corte de
Contas, preenchendo, assim, a condicionante posta no inciso I do artigo 104 da
Res. nº TC-06/01.
2.3
Do objeto
Verifica-se
que a indagação apresentada pelo Consulente foi formulada em tese, pois requer
o posicionamento deste Tribunal acerca da possibilidade de concessão de
vale-alimentação exclusivamente aos servidores do Poder Legislativo Municipal,
razão pela qual se encontra preenchido o requisito previsto no art. 104, inciso
II, do Regimento Interno.
2.4
Da indicação precisa da dúvida
A
dúvida do Consulente na resolução da questão está precisamente evidenciada, o
que faz com que o requisito previsto no art. 104, inciso IV, do Regimento
Interno, esteja preenchido.
2.5
Do parecer da Assessoria Jurídica
A
consulta está acompanhada do parecer jurídico do ente consulente, pressuposto
estabelecido no inciso V do artigo 104 da Res. nº 06/01.
2.6
Do cumprimento dos requisitos de admissibilidade
Do
exame de admissibilidade, resta evidenciada a satisfação dos pressupostos insertos
no artigo 104 da Res. nº TC-06/01, o que autoriza ao egrégio Plenário a
conhecer da presente consulta.
3. ANÁLISE
Inicialmente, convém
referir os termos do art. 1°, § 3°, da Lei Orgânica deste Tribunal de Contas
(Lei Complementar nº 202/2000), em que “As decisões do Tribunal de Contas em
processo de consulta, tomadas por no mínimo dois terços dos Conselheiros que o
compõem, têm caráter normativo e constituem prejulgamento da tese”.
Destarte, a resposta ora oferecida não constitui prejulgamento do fato ou caso
concreto, mas apenas o prejulgamento da tese apresentada pelo Consulente.
A
consulta versa, em síntese, sobre a possibilidade de a Câmara Municipal
conceder a seus servidores vale-alimentação, se esse benefício teria natureza
jurídica de ato interna corporis (o
que possibilitaria sua implementação por meio de Resolução). Questiona, ainda,
qual o procedimento a ser adotado e os valores em que seria possível o
benefício.
Cumpre
ressaltar que a questão dos valores não há como se aferir em Consulta, pois não
se estaria auferindo o fato em tese, mas concretamente, motivo pelo qual não
será respondido esse questionamento.
Em
relação aos demais questionamentos cumpre uma prévia análise sobre a diferença
entre vale-alimentação e auxílio-alimentação, pois os questionamentos
formulados pelo Consulente se referem a vale-alimentação e o parecer jurídico
trata do tema como auxílio-alimentação, que são conceitos diferentes.
Tanto
o vale quanto o auxílio-alimentação, estão inseridos em um conceito amplo de
remuneração[1], a
diferença é que o primeiro é fornecido através de ticket (bilhete ou cartão magnético)
e o segundo é pago em pecúnia.
Outra
diferença que pode ser destacada é que o auxílio-alimentação pago em pecúnia,
na hipótese de servidores regidos pelo Regime Geral de Previdencia Social
vinculados ao INSS, compõe a base de cálculo para fins de contribuição
previdenciária, o que não ocorre com o vale-alimentação pago em ticket, desde
que os bilhetes sejam emitidos de acordo com o Programa de Alimentação do
Trabalhador – PAT previsto na Lei n° nº 6.321,
de 14 de abril de 1976.
Nesse
sentido, o estudo realizado pelo Assessor Jurídico da FECAM, Marcos Fey Probst[2]:
Sugere-se que o benefício
não seja concedido em forma de pecúnia, em decorrência deste valor compor a
base de cálculo para a contribuição previdenciária, conforme já nos
manifestamos em outras oportunidade:
"Para a análise do
presente caso, faz-se necessário a leitura atenta do artigo 28 da Lei nº
8.212/91, que disciplina o custeio da Previdência Social no Brasil. Transcreve-se
excertos do artigo: Art. 28 (caput)
I - para o empregado e
trabalhador avulso: a remuneração auferida em uma ou mais empresas, assim
entendida a totalidade dos rendimentos pagos, devidos ou creditados a qualquer
título, durante o mês, destinados a retribuir o trabalho, qualquer que seja a
sua forma, inclusive as gorjetas, os ganhos habituais sob a forma de utilidades
e os adiantamentos decorrentes de reajuste salarial, quer pelos serviços
efetivamente prestados, quer pelo tempo à disposição do empregador ou tomador
de serviços nos termos da lei ou do contrato ou, ainda, de convenção ou acordo
coletivo de trabalho ou sentença normativa;
§ 9º Não integram o
salário-de-contribuição para os fins desta Lei, exclusivamente:
c) a parcela "in
natura" recebida de acordo com os programas de alimentação aprovados pelo
Ministério do Trabalho e da Previdência Social, nos termos da Lei nº 6.321, de
14 de abril de 1976;
Pelo exposto, o vale
refeição, desde que não seja pago em pecúnia e esteja de acordo com o Programa
de Alimentação do Trabalhador - PAT, não possui caráter remuneratório,
inexistindo incidência de contribuição para o custeio da Previdência Social.
Assim, entendemos que a parcela do vale refeição não entra na base de cálculo
para fins de INSS.
É importante frisar que o
Superior Tribunal de Justiça - STJ posicionou-se pela incidência de
contribuição para o custeio da Previdência Social quando o auxílio-alimentação
é pago em pecúnia. Cita-se repertório jurisprudencial deste egrégio Tribunal:
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA.
RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃOPREVIDENCIÁRIA.
AUXÍLIO-ALIMENTAÇÃO.1. O pagamento in natura do auxílio-alimentação, vale
dizer, quando a própria alimentação é fornecida pela empresa, não sofre a incidência
da contribuição previdenciária, por não possuir natureza salarial, esteja o
empregador inscrito ou não no Programa de Alimentação do Trabalhador - PAT ou
decorra o pagamento de acordo ou convenção coletiva de trabalho.2. Ao revés,
quando o auxílio alimentação é pago em dinheiro ou seu valor creditado em
conta-corrente, como na hipótese dos autos, em caráter habitual e
remuneratório, integra a base de cálculo da contribuição previdenciária.3.
Embargos de divergência conhecidos e improvidos. (ERESP 603509 / CE, julgado em
22/09/2004)
TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À
EXECUÇÃO. RECURSO ESPECIAL.AUXÍLIO-ALIMENTAÇÃO. PARCELAS PAGAS EM PECÚNIA, EM
CARÁTER HABITUALE REMUNERATÓRIO. INCIDÊNCIA DA CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. PRECEDENTES.
1. Recurso especial interposto pelo INSS contra acórdão proferido pelo TRF da
5ª Região segundo o qual: "A ajuda-alimentação, paga pelo Banco do Brasil,
mediante crédito em conta-corrente, aos seus empregados, não configura salário
in natura, e sim, salário, sobre o qual incidirá desconto de contribuição
previdenciária, nos temos do Regulamento do Custeio da Previdência
Social."2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento
no sentido de que o pagamento in natura do auxílio-alimentação, isto é, quando
a própria alimentação é fornecida pela empresa, não sofre a incidência da
contribuição previdenciária, por não constituir natureza salarial, esteja o empregador
inscrito ou não no Programa de Alimentação do Trabalhador- PAT. Com tal atitude,
a empresa planeja, apenas, proporcionar o aumento da produtividade e eficiência
funcionais. 3. Na espécie, as parcelas referentes à ajuda-alimentação foram pagas
em pecúnia, em caráter habitual e remuneratório, mediante depósito em
conta-corrente dos respectivos valores, integrando, assim, a base de cálculo da
contribuição previdenciária.4. Precedentes: REsp nº 433230/RS; REsp nº
447766/RS; REsp nº330003/CE; REsp nº 320185/RS; REsp nº 180567/CE; REsp nº
163962/RS;REsp nº 199742/PR; REsp nº 112209/RS; REsp n º 85306/DF e
EREsp603509/CE.5. Recurso especial não-provido. (RESP nº 895146/CE, julgado em
27/03/2007)
Neste sentido é o
parecer."
Contudo,
no Regime Próprio de Previdência Social, o benefício pago em pecúnia pode ou
não compor a base de cálculo para fins de salário de contribuição, dependendo do
que dispuser a lei local.
No
Estado de Santa Catarina, por exemplo, a Lei Complementar nº 412, de 26 de junho de
2008 exclui o auxílio-alimentação da base de cálculo do salário de
contribuição, atribuindo-lhe caráter indenizatório, senão veja-se:
Art. 27. Entende-se como
base do salário de contribuição o subsídio do cargo efetivo, em parcela única,
o vencimento do cargo efetivo acrescido das vantagens pecuniárias permanentes
estabelecidas em lei, dos adicionais de caráter individual e das vantagens
pessoais permanentes, os proventos e as pensões, excluídas:
I - as diárias para viagens;
II - a ajuda de custo;
III - a indenização de
transporte;
IV - o salário-família;
V - o auxílio-alimentação;
VI - o auxílio-creche;
VII - as parcelas
remuneratórias pagas em decorrência do local de trabalho;
VIII - a parcela percebida
em decorrência do exercício de cargo em comissão ou de função de confiança;
IX - o abono de permanência
de que trata o art. 84 desta Lei Complementar; e
X - as demais verbas de
natureza indenizatória, não-incorporáveis, previstas em lei. [...]
Feitas
essas considerações preliminares, passa-se a análise dos questionamentos
formulados pelo Consulente.
a) O Poder Legislativo
Municipal, pode implementar o benefício aos seus servidores, em face da
competência interna corporis para tal ato?
Para
responder a presente indagação, necessário se faz uma análise prévia sobre o
que se entende por atos interna corporis,
bem como se a concessão do vale-alimentação faz parte desse tipo de ato.
Atos
interna corporis, segundo Cretella
Junior[3]:
As “Interna Corporis” são só aquelas questões ou assuntos
que entendem direta e imediatamente com a economia interna da corporação
legislativa, com seus privilégios e com a formação ideológica da lei, que, por
sua própria natureza, são reservados à exclusiva apreciação e deliberação do
Plenário da Câmara. Tais são os atos de escolha da Mesa (eleições internas), os
de verificação de poderes e incompatibilidade de seus membros (cassação de
mandatos, concessão de licenças etc.) e os de utilização de suas prerrogativas
institucionais (modo de funcionamento da Câmara, elaboração de regimento,
constituição de comissões, organização de serviços auxiliares etc.) e a
valoração das votações.
Desta
feita, verifica-se que a concessão de vale-alimentação não se afigura como ato interna corporis e, destarte, não deve
ser disciplinado por resolução, mas sim por lei específica, especialmente por
se tratar de concessão de benefício que trará impacto orçamentário.
Nesta
seara, o art. 51, inciso IV, da Constituição Federal, aplicado à Câmara de
Vereadores pelo Princípio da Simetria, estabelece que compete à Câmara dos
Deputados a fixação da respectiva remuneração por lei.
De
acordo com o prejulgado 1378, o auxílio-alimentação, apesar de possuir em
sentido estrito natureza indenizatória, para fins de iniciativa de lei a que se
refere o art. 37, X, da Constituição, insere-se no conceito amplo de
remuneração, cabendo ao chefe do Poder Legislativo a iniciativa de lei para
instituição do citado benefício aos servidores da Câmara.
Eis
o teor do prejulgado 1378:
Prejulgado 1378: |
1. Diante da nova redação do inciso IV do art. 51 da
Constituição Federal, conferida pela Emenda Constitucional nº 19/98, cabe ao
Legislativo a iniciativa das leis que versem sobre a remuneração de cargos,
empregos e funções de seus serviços. 2. Apesar de as vantagens pecuniárias decorrentes tanto do
auxílio-transporte, quanto do auxílio-alimentação
possuírem, em sentido estrito, caráter indenizatório, no que se refere, especificamente, à iniciativa de lei, de que
trata o art. 37, X, da Carta Magna, tais
verbas inserem-se no conceito amplo de remuneração, da mesma forma que as
diárias e as ajudas de custo, cabendo,
portanto, ao Chefe do Legislativo municipal a iniciativa do respectivo
processo legislativo. (g.n.) |
Importante
colacionar recente estudo formulado por esta Consultoria Geral (parecer COG
213/10 – CON 10/00189128) que trata da possibilidade de concessão de plano de
saúde para os membros da Câmara Municipal. Apesar de não se tratar de tema
idêntico, também foi abordada a questão da competência do Poder Legislativo
para iniciativa de lei no que se refere à respectiva remuneração, nos seguintes
termos:
A
Câmara Municipal de Joinville apresenta dúvida no que aduz a possibilidade de
implementar e subsidiar um plano de saúde aos servidores do Legislativo,
independente do Executivo Municipal. Isto porque os Prejulgados desta Corte,
que pacificaram a possibilidade da concessão de plano de saúde aos servidores
municipais, se referem aos servidores públicos de uma maneira geral, ou seja,
estende o benefício a todos os servidores da municipalidade, inclusive, da edilidade
local.
O
parecer jurídico trazido pelo consulente conclui pela possibilidade do Legislativo
Municipal contratar e subsidiar um plano de saúde para seus servidores,
independente do Executivo, com fulcro no princípio constitucional da
independência dos poderes, que resulta na sua autonomia administrativa,
financeira e orçamentária para custear parte do plano, além do fato de os
servidores da Câmara possuírem plano de carreira distinto dos demais servidores
municipais. Também afirma que, aparentemente, o Executivo não teria
viabilidade, por ora, de oferecer este subsídio, eis que conta com mais de
10.000 servidores.
De
fato, a harmonia e a independência entre os poderes constituem princípios
fundamentais da República Federativa do Brasil, expressamente consagrados na
Constituição Federal, que dispõe:
Art. 2º São
Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o
Executivo e o Judiciário.
Conforme
estabelece o artigo 60, § 4°, inciso III, da Constituição Federal, não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a
abolir a separação dos poderes, elevando o princípio a condição de cláusula
pétrea. Nesse sentido, o prejulgado 1985 deste Tribunal dispõe:
Prejulgado 1985
1. Constitui princípio fundamental da República
Federativa do Brasil a harmonia e independência entre os poderes, princípio
este que possui status constitucional de cláusula pétrea.
2. Corolário deste princípio, a Câmara de Vereadores
possui autonomia para publicar seus atos oficiais de forma separada do Poder
Executivo.
O
Poder Legislativo Municipal detém sua autonomia administrativa, bem como lhe é
facultado o exercício da autonomia financeira e orçamentária, que devem ser
formalizadas mediante aprovação, pelo Plenário, de Resolução. Nesse sentido,
rege o Prejulgado 368:
É facultado à Câmara Municipal o exercício de sua
autonomia financeira e orçamentária, tendo a seu encargo o empenhamento,
pagamento e contabilização de suas despesas e a gestão dos recursos referentes
às dotações que lhe são destinadas no Orçamento Municipal. [4]
A
autonomia do Legislativo Federal é igualmente aplicável aos Estados, Distrito
Federal e Municípios, pelo princípio da simetria, “entendido como aquele que
identifica as normas da Constituição Federal que podem ou devem ser
reproduzidas perante as Constituições Estaduais e as Leis Orgânicas Municipais,
visando à harmonização do modelo Federativo Brasileiro (...)”.[5]
Nos
termos do prejulgado 1753 a contribuição da Administração para o custeio de
plano de saúde de seus agentes públicos deve estrita observância à Lei
Complementar nº 101/00 (LRF), com destaque para o art. 24 e as normas relativas
aos limites com despesas de pessoal. Sendo considerada despesa de pessoal,
constitui vantagem pecuniária de natureza remuneratória.
Nessa
toada, tendo por premissa que a remuneração dos servidores públicos somente
poderá ser fixada ou alterada mediante lei específica, observada a iniciativa
privativa em cada caso, conforme preconizado no art. 37, X, da Constituição da
República, a primeira observação a ser feita é de que a instituição do plano de
saúde deve ser formalizada através de lei.
Considerando
o princípio da separação e autonomia dos poderes, a Constituição Federal
atribuiu à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal, privativamente, a
competência para a iniciativa de lei que verse sobre a remuneração de seus
servidores, in verbis:
Art. 51. Compete privativamente à
Câmara dos Deputados:
IV - dispor sobre sua
organização, funcionamento, polícia, criação, transformação ou extinção dos
cargos, empregos e funções de seus serviços, e a iniciativa de lei para
fixação da respectiva remuneração, observados os parâmetros estabelecidos
na lei de diretrizes orçamentárias; (Redação dada pela Emenda Constitucional n°
19, de 1998). (Grifo nosso)
Art.
52. Compete privativamente ao Senado Federal:
XIII -
dispor sobre sua organização, funcionamento, polícia, criação, transformação ou
extinção dos cargos, empregos e funções de seus serviços, e a iniciativa de lei
para fixação da respectiva remuneração, observados os parâmetros estabelecidos
na lei de diretrizes orçamentárias
De
outra banda, incumbiu ao Presidente da República a iniciativa de leis que
disponha sobre servidores públicos da União e Territórios e seu regime
jurídico:
Art. 61. A
iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou
Comissão da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional,
ao Presidente da República, ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais
Superiores, ao Procurador-Geral da República e aos cidadãos, na forma e nos
casos previstos nesta Constituição.
§
1º - São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que:
(...)
II -
disponham sobre:
(...)
c)
servidores públicos da União e Territórios, seu regime jurídico, provimento de
cargos, estabilidade e aposentadoria; (Redação dada pela Emenda Constitucional
n° 18, de 1998)
Acerca
das competências privativas trazidas pela Constituição, o Presidente da
República ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade contra as Leis Federais
n° 11.169 e 11.170, de 2005, de iniciativa do Congresso Nacional, que concedeu
o reajuste remuneratório de 15% aos servidores das suas respectivas Casas
Legislativas. Na ação, foi alegada a inconstitucionalidade das leis por vício
de iniciativa, que seriam privativas do Presidente da República (art. 61, §
1°, II, ‘a’ da Constituição Federal), além da ofensa ao princípio da
isonomia (art. 5°, caput, da CF), pelo fato das leis terem concedido
um reajuste remuneratório a apenas uma parcela do funcionalismo público -
servidores do Legislativo - o qual não foi estendido aos demais servidores
públicos federais.
Ao
analisar o caso, o Excelso Pretório decidiu pela ausência de vício de
iniciativa de lei, in verbis:
Ementa. Ação direta de inconstitucionalidade.
2. Leis Federais n° 11.169/2005 e 11.170/2005, que alteram a remuneração dos
servidores públicos integrantes dos Quadros de Pessoal da Câmara dos Deputados
e do Senado Federal. 3. Alegações de vício de iniciativa legislativa (arts. 2°,
37, X, e 61, §1°, II, a, da Constituição Federal); desrespeito ao princípio da
isonomia (art. 5°, caput, da Carta Magna); e inobservância da exigência
de prévia dotação orçamentária (art. 169, §1°, da CF/88). 4. Não configurada a
alegada usurpação de iniciativa privativa do Presidente da República, tendo em
vista que as normas impugnadas não pretendem a revisão geral anual de
remuneração dos servidores públicos. 5. Distinção entre reajuste setorial de
servidores públicos e revisão geral anual da remuneração dos servidores
públicos: necessidade de lei específica para ambas as situações. 6. Ausência de
violação ao princípio da isonomia, porquanto normas que concedem aumentos para
determinados grupos, desde que tais ajustes sejam devidamente compensados, se
for o caso, não afrontam o princípio da isonomia. 7. Ausência de dotação
orçamentária prévia em legislação específica não autoriza a declaração de
inconstitucionalidade de lei, impedindo tão somente a sua aplicação naquele
exercício financeiro. 8. Ação direta não conhecida pelo argumento da violação
do art. 169, § 1°, da Carta Magna. Precedentes: ADI1585-DF, Rel. Min. Sepúlveda
Pertence, unânime, DJ 3.4.98; ADI2339-SC, Rel. Min. Ilmar Galvão, unânime, DJ
1.06.2001; ADI 2343-SC, Rel. Min. Nelson Jobin, maioria, DJ 13.06/2003. 9. Ação
direta de inconstitucionalidade parcialmente conhecida e, na parte conhecida, julgada
improcedente.
(...)
2. Vício de Iniciativa - projeto de
lei que altera remuneração - violação do art. 61, § 1°, II, a da CF/88.
A Constituição Federal, em seu art.
37, X, na redação que lhe foi dada pela Emenda Constitucional n° 19/1998,
estabeleceu expressamente que a remuneração dos servidores públicos somente
poderá ser fixada ou alterada por lei específica, observada a iniciativa
privativa em cada caso. Esta situação distingue-se daquela que, já prevista na
redação original da Constituição, estabelecia revisão geral anual, sempre na
mesma data, e sem distinção de índices, para todos os servidores públicos.
Nota-se que na fórmula constitucional
afirmava que “a revisão geral da remuneração dos servidores públicos, sem
distinção de índices entre servidores públicos civis e militares, far-se-á na
mesma data” (art. 37, X, CF/88). Não havia qualquer referência a necessidade de
lei específica, nem menção a iniciativa privativa em cada caso para alteração
remuneratória.
Assim, não há ofensa ao referido dispositivo,
nem mácula ao art. 61, § 1°, II, ‘a’ da Constituição pelo fato de as normas
impugnadas serem de iniciativa das respectivas Casas Legislativas. É a
própria Constituição, também após as alterações supramencionadas, advindas da
Emenda Constitucional n° 19/1998, que lhes dá tal prerrogativa:
“Art. 51. Compete privativamente à Câmara dos
Deputados:
IV - dispor sobre sua
organização, funcionamento, polícia, criação, transformação ou extinção dos
cargos, empregos e funções de seus serviços, e a iniciativa de lei para fixação
da respectiva remuneração, observados os parâmetros estabelecidos na lei de
diretrizes orçamentárias;”
“Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:
(...)
XIII - dispor sobre sua organização, funcionamento,
polícia, criação, transformação ou extinção dos cargos, empregos e funções de
seus serviços, e a iniciativa de lei para fixação da respectiva remuneração,
observados os parâmetros estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias;”
Por fim, também não há que se falar em ofensa ao
princípio da separação dos poderes, pois, conforme demonstrado, é a própria
Constituição que estabelece as competências nesse âmbito.
O pedido de ação direta, por este fundamento, não
merece ser acolhido.
3. Princípio da isonomia - ofensa ao art. 5°, caput,
da CF/88
A concessão de aumento de remuneração ao número
restrito de funcionários públicos, sem que o mesmo seja concedido a outro(s)
grupo(s), sempre suscita debates e ampla discussão. O tema não é novo na
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.
No caso dos autos, a alegação do Autor de que os
outros segmentos do funcionalismo público irão pleitear, ao fundamento da
isonomia, alteração remuneratória equivalente ao que foi concedido aos
servidores da Câmara dos Deputados e do Senado Federal não se revela
substancialmente consistente para sustentar a tese da inconstitucionalidade dos
referidos diplomas normativos. Na verdade, se o texto constitucional previu
(art. 51, IV e 52, XIII) a competência privativa das Casas Legislativas para a
iniciativa de lei que fixe a remuneração de seus servidores, é porque estava
privilegiando a autonomia administrativa-financeira desses órgãos.
Afirmar a inconstitucionalidade das normas ora
impugnadas, - editadas com amparo na referida competência constitucional -, em
nome do princípio da isonomia, seria esvaziar o comando constitucional e
olvidar a vontade do legislador constituinte derivado. É pressuposto da
interpretação constitucional que se busque interpretação harmonizadora dos
dispositivos constitucionais, a fim de que não se anule completamente uma das
normas envolvidas a pretexto de concretizar a outra.
No caso, do confronto que se estabelece entre a
possibilidade de concessão de aumentos diferenciados e o princípio da isonomia,
deve-se privilegiar o entendimento que, harmonizando os conceitos de majorações
remuneratórias específicas para determinados segmentos e carreiras (desde que
respeitados os limites das respectivas autonomias administrativo-financeiras) com
a revisão geral anual do funcionalismo público, revela-se constitucional a
norma que concede aumentos para determinados grupos, desde que tais reajustes
sejam devidamente compensados, em caso de eventual revisão geral anual (nesse
sentido: ADI 2.726, Rel. Maurício Correa, DJ 29/08/2003).
O pedido da ação direta também não prospera neste
particular. (Grifo nosso).[6]
Desta
forma, afere-se do art. 51, IV, da CF/88, que o Poder Legislativo detém
competência para a iniciativa de lei que altera a remuneração de seus
servidores, como decidiu a Suprema Corte. Por outro lado, especificamente
quanto a possibilidade de implementar e subsidiar um plano de saúde aos
servidores do Legislativo, independente do Executivo Municipal, o tema se
mostra novo e divergente, pois a
autonomia do poder Legislativo encontraria óbice na competência privativa do
Chefe do Executivo para o trato de matéria afeta ao regime jurídico dos
servidores públicos (art. 61, §1°, II, ‘c’ da CF/88).
[...]
Portanto,
tendo em vista que o prejulgado 1378 responde ao questionamento formulado,
sugere-se o seu encaminhamento ao consulente com o acréscimo que será sugerido no
próximo item referente ao registro contábil do auxílio/vale-alimentação.
b) Caso seja afirmativa a
resposta da consulta do item anterior, qual procedimento a ser tomado, quanto
ao registro orçamentário e contábil do lançamento e quais os valores monetários
que o benefício pode ser fixado?
Com
relação ao registro contábil, tanto o vale-alimentação (bilhete ou cartão magnético)
quanto o auxílio-alimentação (pago em pecúnia), devem ser contabilizados na
categoria econômica 3 – “despesas correntes”, no grupo de natureza 3 – “outras
despesas correntes”, modalidade de aplicação 90 “aplicações diretas” e no
elemento de despesa nº 46 “auxílio alimentação”, de acordo com as Portarias
Conjuntas nº STN/SOF nº 4/2010 e 1/2011, da
Secretaria do Tesouro Nacional – STN, válidas para os exercícios de 2011 e 2012
respectivamente, da quais se destaca:
Grupo
de Natureza
[...]
3 – Outras
despesas correntes
Despesas
orçamentárias com aquisição de material de consumo, pagamento de diárias,
contribuições, subvenções, auxílio – alimentação, auxílio-transporte, além de
outras despesas da categoria econômica “Despesas Correntes” não classificáveis
nos demais grupos de natureza de despesa.
[...]
Elemento
de Despesa
[...]
46 –
Auxílio-alimentação
Despesas
orçamentárias com auxílio-alimentação pagas
em forma de pecúnia, de bilhete ou de cartão magnético, diretamente aos
militares, servidores, estagiários ou empregados da Administração Pública
Direta e indireta. (g.n.)
No
concernente ao registro orçamentário, os valores pagos a título de
auxílio-alimentação ou vale-alimentação devem estar previstos no orçamento e ser
excluídos do rol das despesas de pessoal previsto no art. 18 da Lei de
Responsabilidade Fiscal, uma vez que os referidos benefícios, nos termos das
Portarias Conjuntas nº STN/SOF nº 4/2010 e 1/2011, da
Secretaria do Tesouro Nacional – STN, não são classificados no grupo de
natureza 1 – “despesas com pessoal”e sim no grupo de natureza 3 – “outras
despesas correntes”, conforme informado acima.
Nesse
sentido enuncia o Prejulgado 1386 a seguir transcrito:
Prejulgado 1386: |
O art. 18 da Lei de
Responsabilidade Fiscal caracteriza como despesa de pessoal aquelas que
constituam "espécie remuneratória", devendo, pois, excluir deste
rol as despesas com o pagamento de auxílio-alimentação, de cunho meramente
indenizatório. |
Por
conseguinte, sugere-se com relação a classificação orçamentária do
auxílio/vale-alimentação, responder ao consulente acrescendo item
correspondente ao prejulgado 1378, o qual trata especificamente do assunto e no
que se refere ao registro orçamentário, encaminhar o prejulgado 1386, o qual
responde ao questionamento proposto.
4. CONCLUSÃO
Diante
do exposto, a Consultoria Geral emite o presente Parecer no sentido de que o
Corregedor Geral Salomão Ribas Junior proponha ao Egrégio Tribunal Pleno
decidir por:
3.1.
Conhecer
da presente Consulta por preencher os requisitos e formalidades preconizados
nos arts. 103 e 104 do Regimento Interno (Resolução nº TC-06, de 28 de
dezembro de 2001) do Tribunal de Contas.
3.2.
Responder
ao consulente, acrescentado o seguinte item ao prejulgado 1378:
As despesas com vale-alimentação (bilhete ou cartão
magnético) e o auxílio-alimentação (pago em pecúnia) devem estar previstas no
orçamento e contabilizadas na categoria econômica 3 – “despesas correntes”, no
grupo de natureza 3 – “outras despesas correntes”, modalidade de aplicação 90
“aplicações diretas” e no elemento de despesa nº 46 “auxílio alimentação”, de
acordo com as Portarias Conjuntas STN/SOF nº 4/2010 e 1/2011, da Secretaria do Tesouro Nacional – STN,
válidas para os exercícios de 2011 e 2012 respectivamente.
3.3.
Remeter
ao Sr. Pedro Souza da Cruz, e à Câmara Municipal de Bocaina do Sul, nos termos
do art. 105, § 3º, do Regimento Interno (Resolução nº TC-06, de 28 de dezembro
de 2001) os Prejulgados nº 1378 com a redação
alterada e o prejulgado 1386.
3.4.
Dar
ciência da Decisão, do Relatório e Voto do Relator e do Parecer da Consultoria
Geral ao Sr. Pedro Souza da Cruz e à Câmara Municipal de Bocaina do Sul.
Consultoria Geral, em 05 de julho de
2011.
GEORGE BRASIL
PASCHOAL PÍTSICA
AUDITOR FISCAL DE CONTROLE EXTERNO
De acordo:
VALERIA ROCHA LACERDA
GRUENFELD
COORDENADORA
De acordo.
Encaminhem-se os Autos à elevada consideração do Exmo.
Sr. Relator CORREGEDOR GERAL SALOMÃO RIBAS JUNIOR, ouvido preliminarmente o
Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.
HAMILTON HOBUS HOEMKE
CONSULTOR GERAL
[1] Nesse sentido, o item 2 do prejulgado
1378:
[...] 2. Apesar de as vantagens pecuniárias decorrentes
tanto do auxílio-transporte, quanto do auxílio-alimentação
possuírem, em sentido estrito, caráter indenizatório, no que se refere,
especificamente, à iniciativa de lei, de que trata o art. 37, X, da Carta
Magna, tais verbas inserem-se no
conceito amplo de remuneração, da mesma forma que as diárias e as ajudas de
custo, cabendo, portanto, ao Chefe do Legislativo municipal a iniciativa do
respectivo processo legislativo. (g.n.)
[2]Parecer nº 681 disponível em http://www.fecam.org.br/consultoria/pareceres.php?cod_parecer=681. Acesso em 31/10/2011
[3] CRETELLA JÚNIOR, José. Dos Atos Administrativos Especiais.
2. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1998. p. 162.
[4]Processo: CON-TC0128902/61. Parecer: COG-296/96. Origem: Câmara Municipal de Guatambu. Relator: Auditor José Carlos Pacheco. Data da Sessão: 12/08/1996.
[5]Prejulgado 1947.
[6]ADIN n° 3.599-1/DF. Relator: Min. Gilmar Mendes. Requerente: Presidente da República. Requerido: Congresso Nacional. Interessados: Sindicato dos servidores do Poder Legislativo e e do Tribunal de Contas da União - SINDILEGIS. Tribunal Pleno em 21/05/2007. Dj em 14/09/2007. Disponível em <www.stf.jus.br> Consulta em 1°/06/2010.