PROCESSO Nº:

CON-11/00532908

UNIDADE GESTORA:

Câmara Municipal de Joaçaba

INTERESSADO:

Sueli Teresinha de Campos Ferronato

ASSUNTO:

Projeto de Lei Complementar para criação de quadro de carreiras para servidores efetivos

PARECER Nº:

COG - 478/2011

 

 

Criação de quadro de carreira. Irredutibilidade de vencimentos dos servidores públicos. Art. 37, XV da CF.

Na implantação de novo plano de carreira que implicar em decréscimo no valor da remuneração do servidor, em razão do princípio constitucional da irredutibilidade de vencimentos, deve ser assegurada a  percepção da diferença referente à remuneração anteriormente recebida como vantagem pessoal nominalmente identificável, a ser absorvida por futuros reajustes de vencimento e progressões. Para fins de aposentadoria, devem ser consideradas as rubricas incorporáveis, aplicando-se a regra da média das contribuições ou da última remuneração, conforme a situação funcional em que se encontrar o servidor.

 

 

Criação de quadro de carreira. Cargo de nível médio transformado em cargo de nível superior. Enquadramento. Tabela específica para servidor.

A transformação dos cargos de nível médio para cargos de nível superior encontra óbice na Constituição Federal. Os cargos de nível médio modificados devem ser previstos em tabela anexa ao quadro de carreira como cargos em extinção, suprimindo-se na medida em que houver vacância.

 

Progressão funcional por mérito. Lançamento na folha de pagamento.

A progressão funcional por mérito não deve ser lançada em separado na folha de pagamento, pois está atrelada a própria natureza do cargo.

 

Progressão funcional. Adicional de titulação. Curso de graduação e especialização

O adicional de titulação deve ser lançado em separado na folha de pagamento, salvo se o plano de carreira o prever como forma de progressão por merecimento.

 

 

 

Sr. Consultor,

 

 

1. INTRODUÇÃO

Trata-se de consulta subscrita pela Presidente da Câmara de Vereadores de Joaçaba, Senhora Sueli Teresinha de Campos Ferronato, por meio de expediente recepcionado nesta Corte de Contas em 27 de agosto de 2011, formulada nos seguintes termos: 

1.         Gostaríamos de saber, se, caso uma câmara de vereadores fizesse um projeto de lei complementar para criação de um quadro de carreira para seus servidores efetivos, tendo em vista a necessidade de graduação para os referidos cargos e a premente necessidade de concurso público para efetivação de novos servidores, além de atender o princípio da eficiência, qual seria o procedimento a ser adotado com seus servidores efetivos atuais se:

1.1      Como fica o direito adquirido do funcionário em relação ao seu vencimento, se o mesmo já está em vias de aposentadoria? Qual é o valor base desta aposentadoria? Seria este o último vencimento que recebe? Como fica o enquadramento na tabela de salários se seu vencimento é maior do que onde ele deve se enquadrar na nova tabela, eis que não tem nova habilitação exigida? É possível fazer uma tabela específica para este funcionário?

Ex.: funcionário X ocupa cargo Y:

 

Atual

Futuro

Cargo Y – Nível médio

Cargo Y – Curso superior

 

1.2      Na mudança de denominação do cargo, sendo que as atribuições, as prerrogativas e as funções continuem as mesmas, como enquadrar o funcionário efetivo atual, com nível superior ou especialização, se na época do concurso por ele prestado o nível exigido era nível médio (funcionário com curso superior) e agora o nível exigido para o novo cargo fosse modificado?

1.3       Se o Estatuto do funcionário público falar que as Progressões por Mérito do servidor devem ser lançadas em separado na folha de pagamento (contra cheque) do mesmo, como enquadrar o servidor no novo plano de carreira, tendo em vista que as promoções seriam horizontais, com nível de graduação e classe de “A até Z”? Como proceder com adicional de titulação por ele percebidos em função de sua graduação/especialização?

1.4       Como proceder o enquadramento dos servidores?

 

A consulta não se faz acompanhada de parecer da assessoria jurídica do órgão consulente.

É o sucinto relatório.

 

1.1  PRELIMINARES DE ADMISSIBILIDADE

Prefacialmente, cabe a análise das formalidades inerentes às consultas, definidas no art. 104 do Regimento Interno desta Corte de Contas (Resolução nº TC-06/2001), in verbis:

Art. 104 - A consulta deverá revestir-se das seguintes formalidades:

I - referir-se à matéria de competência do Tribunal;

II - versar sobre interpretação de lei ou questão formulada em tese;

III - ser subscrita por autoridade competente;

IV - conter indicação precisa da dúvida ou controvérsia suscitada;

V - ser instruída com parecer da assessoria jurídica do órgão ou entidade consulente, se existente.

Os requisitos de admissibilidade foram atendidos parcialmente.

Trata-se de matéria relativa a atos de pessoal, afeta, portanto, ao exercício das atribuições do TCE.

O objeto da consulta foi abordado em tese.

Foi subscrita por autoridade competente[1] e houve indicação precisa da dúvida.

A consulta não se faz acompanhada do parecer jurídico da Câmara Municipal, deixando de atender o pressuposto estabelecido no inciso V do art. 104 da Resolução nº TC-06/2001. Contudo, forçoso lembrar que § 2º do art. 105 da Resolução nº TC-06/2001 possibilita o conhecimento da Consulta que deixe de atender essa formalidade.

Do exame de admissibilidade resta evidenciado o atendimento parcial do art. 104 da Resolução nº TC-06/2001, o que não serve como impeditivo para que esta Consultoria Geral bem como o Exmo. Sr. Conselheiro Relator propugnem, preliminarmente, pelo conhecimento da consulta.

 

2. ANÁLISE

Preliminarmente, é importante registrar que como o processo de consulta não envolve julgamento ou exame de legalidade para fins de registro por este Tribunal de Contas, conforme leciona Hélio Saul Mileski, a resposta ora oferecida não constitui prejulgamento do fato ou caso concreto, mas apenas o prejulgamento da tese apresentada pelo consulente.

Ensina Hélio Saul Mileski[2]:

Como a resposta à consulta não corresponde à decisão de nível jurisdicional do Tribunal de Contas, envolvendo julgamento ou exame de legalidade para fins de registro, mas sim o posicionamento técnico-jurídico do órgão fiscalizador sobre determinada matéria, a resposta oferecida pelo Tribunal de Contas tem caráter normativo e constitui prejulgamento da tese, mas não do fato ou caso concreto.

Nesse sentido, assim dispõe o § 3º, do art. 1º, da Lei Orgânica deste Tribunal de Contas (Lei Complementar nº 202/2000):

Art. 1º Ao Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, órgão de controle externo, compete, nos termos da Constituição e do Estado e na forma estabelecida nesta Lei:

...

§ 3º As decisões do Tribunal de Contas em processo de consulta, tomadas por no mínimo dois terços dos Conselheiros que o compõem, têm caráter normativo e constituem prejulgamento da tese.

Quanto ao mérito da consulta, refere-se ao plano de carreira dos servidores públicos. A consulente apresenta hipótese em que seria criado um novo quadro de carreira e contrapõe o novo quadro à situação dos atuais servidores.

Sobre a matéria perquirida, de antemão, cabe destacar que a Constituição Federal atribui aos municípios, além da autonomia política e financeira, a autonomia para organizar o respectivo serviço público, como se verifica:

Art. 18 – A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.

...

 

Art. 30 – Compete aos Municípios:

I – legislar sobre assuntos de interesse local;

...

 

A respeito dessa autonomia, José Afonso da Silva[3] comenta:

A autonomia municipal é assegurada pelos arts. 18, 29 e 30 da Constituição. Autonomia significa capacidade ou poder de gerir os pró­prios negócios, dentro de um círculo prefixado por entidade superior. E é a Constituição Federal que se apresenta como poder distribuidor de competências exclusivas entre as três esferas de governo. As constituições anteriores outorgavam aos Municípios o governo próprio e competências exclusivas que correspondem ao mínimo para que uma entidade territo­rial tenha autonomia político-constitucional.

6 Com a Constituição de 1988, foi-lhes reconhecido também o poder de auto-organização, ao lado do governo próprio e de competências exclusivas, ainda com ampliação destas, de sorte que a Constituição criou verdadeiramente uma nova instituição municipal no Brasil. Por outro lado, não há mais qualquer hipótese de prefeitos nomeados. Tornou-se plena, pois, a capacidade de autogoverno municipal entre nós.

7 A autonomia municipal, assim, assenta em quatro capacidades:

a) capacidade de auto-organização, mediante a elaboração de lei orgânica própria;

b) capacidade de autogoverno pela eletividade do Prefeito e dos Vereadores às respectivas Câmaras Municipais;

c) capacidade normativa própria, ou capacidade de autolegislação, mediante a competência para a elaboração de leis municipais sobre áreas que são reservadas à sua competência exclusiva e suplementar;

d) capacidade de autoadministração (administração própria, para manter e prestar os serviços de interesse local).

Nessas quatro capacidades, encontram-se caracterizadas a autono­mia política (capacidades de auto-organização e de autogoverno), a auto­nomia normativa (capacidade de fazer leis próprias sobre matéria de sua competência), a autonomia administrativa (administração própria e orga­nização dos serviços local) e a autonomia financeira (capacidade de decre­tação de seus tributos e aplicação de suas rendas, que é uma caracterís­tica da autoadministração).

Nesse diapasão, cada município, pode através de lei que lhe seja própria, elaborar o estatuto dos seus servidores, com o intuito de organizar o quadro de pessoal, sempre observando as regras gerais ditadas pela Constituição Federal, assim como, leis de abrangência nacional e a própria lei orgânica.

Sobre a competência dos municípios, é válido citar ainda Hely Lopes Meirelles[4]:

A competência do Município para organizar o serviço público e seu pessoal é consectário da autonomia administrativa de que dispõe (CF, art. 30, I). Atendidas as normas constitucionais aplicáveis ao servidor público (CF, arts. 37-41), bem como os preceitos das leis de caráter nacional e de sua lei orgânica, pode o Município elaborar o regime jurídico de seus servidores, segundo as conveniências locais. Nesse campo é inadmissível a extensão das normas estatutárias federais ou estaduais aos servidores municipais. Só será possível a aplicação do estatuto da União ou do Estado-membro se a lei municipal assim o determinar expressamente.

 

Como a consulta foi apresentada no âmbito de uma Câmara de Vereadores, impõe ainda destacar a competência da Casa Legislativa Municipal para deliberar a respeito do seu quadro funcional.

As duas funções precípuas do Legislativo Municipal são legislar e fiscalizar, conforme inciso XI do art. 29 e art. 31 da CF. José Afonso da Silva[5], classifica as atribuições da Câmara Municipal em quatro grupos, quais sejam:

I.   a função legislativa que é exercida com a participação do Prefeito. No exercício dessa função é que ela legisla sobre as matérias de competência do Município. Por meio dela se estabelecem, como todos sabem, as leis municipais, e se cumpre, no âmbito local, o princípio da legalidade a que se submete a Administração (art. 37). A lei orgânica do Município indica as matérias de com­petência legislativa da Câmara. Deverá também estabelecer o processo legislativo das leis em geral assim como do orçamento, não sendo lícito à Constituição do Estado cuidar dessa matéria, como algumas fizeram;

II.  a função meramente deliberativa por meio da qual a Câmara exerce atribuições de sua competência privativa que envolvem a prá­tica de atos concretos, de resoluções referendárias, de aprovação, de autorização, de fixação de situações, de julgamento técnico, que independem de sanção do Prefeito, as quais também são indicadas pela lei orgânica própria;

III.   a função fiscalizadora, de grande relevância, tanto que é prevista na Constituição, que declara que a fiscalização financeira e orça­mentária do Município será exercida pela Câmara Municipal, mediante controle externo, com auxílio do Tribunal de Contas do Estado ou do Conselho ou Tribunal de Contas dos Municí­pios (que também é órgão estadual), onde houver, mantidos assim os Tribunais de Contas Municipais já existentes, ou seja, os das Capitais de São Paulo e Rio de Janeiro, vedada, porém, a criação de outros ou de Conselhos de Contas municipais, ou seja, Conselho de Contas como órgãos de Município (art. 31). Acrescenta-se que as contas dos Municípios ficarão, durante sessenta dias, anualmente, à disposição dos contribuintes, para exame e apreciação e qualquer cidadão poderá questionar-lhes a legitimidade, nos termos que a lei orgânica ou mesmo a lei ordinária local deverá estatuir. Mas a atividade fiscalizadora da Câmara efetiva-se mediante vários mecanismos, tais como pedido de informações ao Prefeito, convocação de auxiliares direitos deste, investigação mediante comissão especial de inquérito, tomada e julgamento das contas do Prefeito, observando-se que só por voto de dois terços de seus membros pode ela rejeitar o parecer prévio do órgão de Contas competente;

IV. a função julgadora pela qual a Câmara exerce um juízo político, quando lhe cabe julgar o Prefeito e os Vereadores por infrações político-administrativas reguladas na respectiva lei orgânica, não vigorando mais os arts. 4º a 8º do Decreto-Lei nº 201/67 que as previam, que ficaram superados pela Constituição de 1988, especialmente pelo seu art. 29. As leis orgânicas variaram bas­tante sobre o tema. Muitas delas, como as de Belo Horizonte e São Paulo, copiaram o texto pertinente do Decreto-Lei nº 201. Outras, como as de Fortaleza e Teresina, disseram que são infrações político-administrativas do Prefeito as previstas na lei federal! Há as omissas como as de Belém e Salvador; esta chega a afirmar, no art. 54, II, "a", que o Prefeito perderá o cargo por cassação através do voto de dois terços dos membros da Câmara Municipal quando incidir em infração político-administrativa, nos termos do art. 56, mas este artigo trata de coisa diferente e não localizamos a matéria em outro lugar. Há aquelas que imitam o esquema da responsabilidade do Presidente da República, sem perceber que há diferenças marcantes a considerar. Observe, finalmente, que a função julgadora da Câmara só se refere às infrações político-administrativas, porque o julgamento dos crimes comuns e de responsabilidade (Decreto-Lei nº 201, arts. 1º e 2º, que continuam em vigor) é de competência do Tribunal de Jus­tiça do Estado (Constituição Federal, art. 29, VIII).

21 A essas podemos ainda acrescentar outra, que é o exercício do poder constituinte municipal, pois a lei orgânica própria estabelece regras para ser emendada, atribuindo à Câmara competência para tanto. Com isso também, como se vê, a lei orgânica própria assume uma caracte­rís­tica de certa rigidez, pois como só pode ser elaborada com o voto de dois terços da Câmara, igualmente só poderá ser alterada com igual quorum. Assim, as leis locais contrárias à lei orgânica serão ilegítimas e inválidas, desde que assim seja declarada pelo Judiciário, por via indi­reta, não estando prevista na Constituição Federal a possibilidade de ação direta de ilegitimidade da lei local em face da lei orgânica do Muni­cípio. Se o nosso Poder Judiciário fosse um pouco mais aberto à defesa do espírito das Constituições, bem que poderíamos sustentar a possi­bilidade de a Constituição do Estado estatuir perante o Juiz da Comarca competente o ajuizamento de ação direta de ilegitimidade de lei ou ato normativo municipal em face da sua própria lei orgânica, com recurso para o Tribunal de Justiça.

Por força do inciso XI do art. 29 da Constituição Federal[6], a Câmara detém competência para organização das atividades fiscalizadoras e legislativas. Por certo que tal organização requer um quadro de servidores para a consecução dos serviços e esses servidores, a teor do que dispõe o art. 51, IV[7], da Constituição Federal, ainda que submetidos ao estatuto dos servidores do município, o qual engloba servidores do poder executivo e do poder legislativo, necessitam de quadro de carreira estabelecido através de plano de carreira, cargos e vencimentos.

A manutenção dos serviços básicos da Câmara de Vereadores é tratada em prejulgado desta Corte de Contas, como se vê:

Prejulgado 949[8]

1.         A manutenção dos serviços básicos da Câmara de Vereadores enseja o provimento de cargos mediante realização de concurso público. A contratação de pessoal embasada no inciso IX do artigo 37 da Carta Federal só pode ser realizada quando surgir necessidade temporária, que não possa ser desempenhada pelos servidores ocupantes do quadro de pessoal do órgão/entidade, e que não pode aguardar para ser suprida sem que haja prejuízo ao interesse público.

...

No mesmo sentido são os seguintes prejulgados:

Prejulgado 1136[9]

Compete privativamente à Câmara de Vereadores dispor sobre seu quadro de pessoal, criação, transformação e extinção dos cargos e funções por instrumento normativo previsto na Lei Orgânica ou no seu regimento interno. No entanto, a remuneração dos cargos e funções deve ser fixada e alterada por lei (com sanção do Prefeito) de iniciativa do Poder Legislativo, sempre com observância dos limites de despesas da Câmara e gastos com pessoal previstos nos arts. 29 e 29-A da Constituição Federal e 18 a 23 da Lei Complementar nº 101/00 (Lei de Responsabilidade Fiscal), bem como autorização da lei de diretrizes orçamentárias, existência de recursos na lei do orçamento (art. 169 da Constituição Federal) e atendimento aos requisitos dos arts. 16 e 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal.

...

 

Prejulgado 1541[10]

1. De acordo com o art. 37, II, da Constituição Federal, toda e qualquer investidura em cargo ou emprego público depende de prévia aprovação em concurso público, podendo o Poder Legislativo realizar o certame para os cargos vinculados a este Poder.

2. Compete de forma privativa à Câmara de Vereadores dispor sobre seu quadro de pessoal e criação, transformação e extinção dos cargos e funções por instrumento normativo previsto na Lei Orgânica ou no seu regimento interno.

3. A remuneração dos cargos e funções deve ser fixada e alterada por lei (com sanção do Prefeito) de iniciativa do Poder Legislativo, obedecidos os comandos dos arts. 29 e 29-A da Constituição Federal e 18 a 23 da Lei Complementar nº 101/00 (Lei de Responsabilidade Fiscal, autorização da lei de diretrizes orçamentárias, existência de recursos na lei do orçamento (art. 169 da Constituição Federal) e atendimento dos requisitos dos arts. 16 e 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal.

4. Quando se tratar de ano de eleições municipais, deverão ser também obedecidos os preceitos do art. 73 da Lei nº 9.504/97, que trata da legislação eleitoral, e art. 21, parágrafo único, da Lei Complementar nº 101/00, este também aplicável ao final de mandato do titular de Poder, visto que a nomeação de candidatos aprovados em concurso público dentro dos últimos cento e oitenta dias de final de mandato do titular de Poder ou órgão somente é possível se as despesas decorrentes destas nomeações tiverem a proporcional compensação, relativamente ao aumento da receita corrente líquida ou à diminuição da despesa com pessoal, de forma que o percentual de comprometimento verificado no mês anterior ao início do 180º (centésimo octagésimo) dia não seja ultrapassado até o último dia do mandato.

5. A remuneração de Vereadores e servidores do Poder Legislativo Municipal deve ser compatível com a receita da municipalidade, de forma a permitir o cumprimento dos limites constitucionais e legais, bem como a admissão de pessoal em cargo efetivo para as funções essenciais e permanentes.

6. Quando as despesas com pessoal estiverem acima do limite legal, devem ser tomadas as providências para adequação, dentre elas as previstas no §3º do art. 169 da Constituição Federal e art. 23 da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Restando clara a competência da Câmara de Vereadores para dispor sobre o seu quadro de servidores e volvendo ao cerne da consulta, passaremos a discutir o plano de carreira e suas repercussões.

Para entendermos a correta aplicação de um plano de carreira, vejamos inicialmente o que diz Celso Antônio Bandeira de Mello[11] a respeito da classificação dos cargos:

Os cargos públicos, quanto à sua posição no “quadro”, classificam-se em (I) de carreira ou (II) isolados.

Quadro é o conjunto de cargos isolados ou de carreira.

Os cargos serão (I) de carreira quando encartados em uma série de “classes” escalonada em função do grau de responsabilidade e nível de complexidade das atribuições.

Classe é o conjunto de cargos da mesma natureza de trabalho.

Os cargos dizem-se (II) isolados quando previstos sem inserção em carreiras.

No magistério de Helly Lopes Meirelles[12]:

Os cargos distribuem-se em classes e carreiras, e excepcionalmente criam-se isolados.

Classe – É o agrupamento de cargos da mesma profissão, e com idênticas atribuições, responsabilidades e vencimentos. As classes constituem os degraus de acesso na carreira.

Carreira – É o agrupamento de classes da mesma profissão ou atividade, escalonadas segundo a hierarquia do serviço, para acesso privativo dos titulares dos cargos que a integram, mediante provimento originário. O conjunto de carreiras e de cargos isolados constitui o quadro permanente do serviço dos diversos Poderes e órgãos da Administração Pública. As carreiras iniciam-se e terminam nos respectivos quadros.

Quadro – É o conjunto de carreiras, cargos isolados e funções gratificadas de um mesmo serviço, órgão ou Poder. O quadro pode ser permanente ou provisório, mas sempre estanque, não admitindo promoção ou acesso de um para o outro.

Cargo de carreira – É o que se escalona em classes, para acesso privativo de seus titulares, até o da mais alta hierarquia profissional.

Cargo isolado – É o que não se escalona em classes, por ser o único na sua categoria. Os cargos isolados constituem exceção no funcionalismo, porque a hierarquia administrativa exige escalonamento das funções para aprimoramento do serviço e estímulo dos servidores, através da promoção vertical. Não é o arbítrio do legislador que deve predominar na criação de cargos isolados, mas sim a natureza da função e as exigências do serviço.

Quanto à definição de plano de carreira[13]:

É o conjunto de princípios, diretrizes e normas que regulam o ingresso, o desenvolvimento profissional e a remuneração dos servidores titulares de cargos que integram determinada carreira, bem como a estrutura da mesma.

 

O plano de carreira é o instrumento de organização e valorização de determinada carreira, através dele se “materializam as relações de trabalho entre uma categoria de servidores públicos e a Administração”[14]. Assim, o que se deve implantar é o Plano de Carreira, Cargos e Vencimentos no qual constará o quadro de carreira dos servidores.

Após as colocações, passaremos às respostas aos questionamentos formulados pela consulente.

1.1  Como fica o direito adquirido do funcionário em relação ao seu vencimento, se o mesmo já está em vias de aposentadoria? Qual é o valor base desta aposentadoria? Seria este o último vencimento que recebe? Como fica o enquadramento na tabela de salários se seu vencimento é maior do que onde ele deve se enquadrar na nova tabela, eis que não tem nova habilitação exigida? É possível fazer uma tabela específica para este funcionário?

Ex.: funcionário X ocupa cargo Y:

 

Atual

Futuro

Cargo Y – Nível médio

Cargo Y – Curso superior

 

Por certo que o novo plano não poderá implicar em redução de vencimento. O inciso XV do art. 37 da CF estabelece:

XV – Os subsídios e os vencimentos dos ocupantes de cargos e empregos públicos são irredutíveis, ressalvando o disposto nos incisos XI e XVI deste artigo e nos arts. 39 §4º, 150, II, 153, III e 153 §2º, I;

José Nilo de Castro[15] comenta:

...

4.1 Insta transcrever o art. 37, incisos X e XV, da Constituição da República, o qual dispõe sobre a irredutibilidade de vencimentos, ressaltando que os atos de competência do Município devem ser seguidos em estrita consonância com as normas constitucionais, verbis:

 Art. 37 (...)

X – a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o §4º do art. 38, somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa de cada caso, assegurada a revisão anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices:

(...)

XV – Os subsídios e os vencimentos dos ocupantes de cargos e empregos públicos são irredutíveis, ressalvando o disposto nos incisos XI e XVI deste artigo e nos arts. 39 §4º, 150, II, 153, III e 153 §2º, I; 

4.2 Com efeito, entendeu o STJ que “a garantia constitucional da irredutibilidade de vencimentos impede que ato superveniente do Estado afete, reduza ou suprima o direito ao estipêndio que já se incorporara ao patrimônio jurídico do servidor público” (MS nº 1.948-7/DF, Ementário do STJ 08: 341). É que o valor do vencimento dos servidores públicos não pode ser alterado para menos, para não infringir o preceito constitucional da irredutibilidade de vencimentos, delineado pelo artigo supracitado.

4.3 Os vencimentos só podem ser fixados ou alterados mediante lei específica segundo as conveniências e possibilidades da Administração.

... 

Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal decidiu:

"O Supremo Tribunal Federal fixou jurisprudência no sentido de que não há direito adquirido a regime jurídico-funcional pertinente à composição dos vencimentos ou à permanência do regime legal de reajuste de vantagem, desde que eventual modificação introduzida por ato legislativo superveniente preserve o montante global da remuneração, não acarretando decesso de caráter pecuniário. Precedentes." (RE 593.304-AgR, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 29-9-2009, Segunda Turma, DJE de 23-10-2009.) No mesmo sentido: RE 464.946-AgR, Rel. Min. Dias Toffoli, julgamento em 3-5-2011, Primeira Turma, DJE de 5-8-2011; RE 597.838-AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 1º-2-2011, Primeira Turma, DJE de 24-2-2011; RE 539.370, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 30-11-2010, Segunda Turma, DJE de 4-3-2011; RE 160.361-AgR-AgR, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 19-10-2010, Segunda Turma, DJE de 12-11-2010; AI 730.096-AgR, Rel. Min. Ayres Britto, julgamento em 31-8-2010, Segunda Turma, DJE de 22-10-2010; RE 469.834-AgR, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 30-6-2009, Primeira Turma, DJE de 21-8-2009; AI 609.997-AgR, Rel. Min. Cezar Peluso, julgamento em 10-2-2009, Segunda Turma, DJE de 13-3-2009; AI 679.120-AgR, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 4-12-2007, Segunda Turma, DJE de 1º-2-2008; RE 403.922-AgR, Rel. Min. Ellen Gracie, julgamento em 30-8-2005, Segunda Turma, DJE de 30-9-2005. Vide: RE 599.618-ED, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 1º-2-2011, Primeira Turma, DJE de 14-3-2011.

Assim, não deve haver redução nos vencimentos em virtude do novo plano a ser implantado. Se a posição na tabela de vencimentos implicar em remuneração inferior ao que o servidor recebia até então, pode ser assegurada a  percepção da diferença como vantagem pessoal nominalmente identificável, a ser absorvida por futuros reajustes de vencimento e progressões funcionais, a exemplo do que foi determinado na Lei Complementar Estadual nº 311[16], de 12/12/2005.

Nesse sentido orienta o Prejulgado 2104 (item 3), nos seguintes termos:

1. A manutenção dos benefícios adquiridos pelos empregados públicos sob o comando do regime celetista somente permanecem válidos, quando da alteração para o regime estatutário, caso haja previsão expressa no respectivo estatuto;

2. Em caso de alteração do regime celetista para o estatutário, o tempo de serviço prestado durante o regime celetista somente poderá ser computado para fins de licença-prêmio caso haja expressa previsão no estatuto dos servidores.

3. Se com a alteração do regime houver decréscimo do valor global da remuneração, o valor da diferença referente a gratificações auferidas por servidor durante o tempo prestado no regime celetista é protegido pelo princípio constitucional da irredutibilidade do salário, devendo constar como vantagem pessoal nominalmente identificável, a qual deve ser absorvida progressivamente, à medida que forem concedidos aumentos reais ou específicos. (g.n.)

 

Conforme decidiu o STF[17], a absorção de vantagem pecuniária por reajustes sucessivos não viola o princípio da irredutibilidade de vencimentos.

Indaga a consulente qual o valor base da aposentadoria do servidor que está em vias de inativação ao ser implantado o novo plano e ainda se esse valor deve referir-se à última remuneração.

Em primeiro lugar, há de ser observada a modalidade aposentatória para definir o valor dos proventos.

Após a reforma introduzida pela Emenda Constitucional nº 41/2003 o que se observa é o caráter contributivo da previdência. Nenhuma parcela integrará os proventos aposentatórios se sobre ela não incidir contribuição previdenciária, quando na ativa. Há uma relação direta entre a contribuição recolhida e o benefício a ser auferido. A regra é válida, tanto para as aposentadorias do art. 40 da CF, como para as aposentadorias pelas regras de transição ou ainda pelo direito adquirido. A diferença é que nas regras de transição, com exceção daquela prevista no art. 2º da EC 41/2003, os proventos correspondem à última remuneração, considerando as rubricas incorporáveis e os limites estabelecidos no art. 37, XI da CF. O mesmo é válido para aposentadorias concedidas com base no art. 3º da EC 20/1998 ou art. 3º da EC 41/2003, ou seja, pelo direito adquirido. Nas demais aposentadorias, aplica-se a média das contribuições, conforme regulamentado pela Lei nº 10.887/2004, sempre respeitando o limite da última remuneração e aqueles impostos pelo art. 37, XI da CF.

Sobre a matéria, vale citar o magistério de Ivan Barbosa Rigolin[18]:

...

O valor da aposentadoria não mais é dado doravante, portanto, apenas pelo valor do último vencimento do servidor, mas sim por uma complexa imbrincação de fatores, que é sobremodo trabalhosa e efetivamente difícil de calcular.

Não interessam para aquele cálculo, senão os valores sobre os quais incidiu contribuição, e não outros. Se deveria ou se não deveria ter havido contribuição sobre o fator x, ou o fator y, por estarem ou por não estarem incorporados ao vencimento, isso pouco passa a importar após ter havido a contribuição mensal. Interessa, após a contribuição ter sido realizada, saber sobre que base foi calculada, porque essa mesma base é que será levada em conta para o, complexo e difícil, cálculo final dos proventos, tudo, agora, na forma da lei, como jamais fora anteriormente à EC nº 41/2003.

Desta feita, ainda que introduzido novo plano de carreira, devem ser levadas em conta as regras pertinentes à inativação, ou seja, verificar se aposentadoria fundamenta-se em regra cuja qual remete à média das contribuições ou se a aposentadoria embasa-se em regra que assegura a última remuneração, considerando para tanto as parcelas incorporáveis, como explanado acima.

Quanto ao questionamento apresentado em relação ao posicionamento do servidor na nova tabela se o mesmo não tem a habilitação que passará a ser exigida para o cargo, poder-se-ia dizer que mesmo possuindo a habilitação exigida, o servidor não deve ser enquadrado em nível superior, pois poderia representar concurso de acesso, vedado pela CF[19]. Nesse caso, tais servidores deveriam permanecer em “cargos em extinção”, os quais seriam suprimidos na medida em que vagassem. Nesse sentido há orientação desta Casa:

Prejulgado 1138[20]

1.         O concurso público de provas ou de provas e títulos, acessível a todos aqueles que preencham os requisitos da lei, instrumentaliza a garantia constitucional da igualdade, constituindo método inafastável de seleção para provimento originário de cargo público (isolado ou de carreira), sendo expressamente vedada a utilização do acesso para tal mister.

O art. 37, inc. II, da CF/88, extirpou do ordenamento jurídico brasileiro, como forma de provimento derivado, a ascensão funcional, caracterizada pelo acesso de servidor, sem se submeter a novo concurso público, a cargo de carreira diversa daquela na qual ingressou originariamente por concurso, como por exemplo, de cargo de Professor de Nível Médio para cargo de Professor de Nível Superior.

É admitida a ascensão funcional vertical (promoção vertical) quando o cargo esteja vinculado a carreiras, as quais se constituem um conjunto de classes da mesma natureza de trabalho, escalonadas segundo a responsabilidade, complexidade das atribuições e habilitação específica para os cargos. A passagem para cargos de classes superiores dentro da mesma carreira não significa investidura inicial, a demandar concurso público. Havendo concurso interno ou promoção por titulação e merecimento (art. 67, IV, da Lei nº 9.394/96) dele só poderão participar integrantes da carreira titulares de cargos da classe imediatamente inferior aos cargos objeto de disputa, pois tal processo é inerente à existência de carreira.

Os cargos iniciais das carreiras de professor terão a habilitação formal de nível médio ou de nível superior, não se admitindo o ingresso automático de cargos da carreira de nível médio para o cargo inicial da carreira de nível superior pela simples titulação, requerendo concurso público do qual possa participar qualquer interessado que preencham as exigências para o cargo (concurso externo).

Quando a carreira de professor de nível superior for escalonada em classes (ex.: Professor I - licenciatura, Professor II - licenciatura plena, Professor III - especialização, Professor IV - mestrado etc.) A progressão vertical poderá se dar por titulação ou por concurso interno de provas e títulos (titulação), conforme critérios e condições especificadas na legislação local, observada a existência de cargos vagos.

O Plano de Cargos do Município pode estabelecer que os cargos de Professor de nível médio sejam considerados cargos isolados, extinguindo-se a medida em que houver vacância. Paralelamente, deverá ser ampliado o quadro de cargos efetivos de nível superior, permitindo atender à demanda educacional, em cumprimento às diretrizes da educação nacional, que buscam a capacitação profissional do educadores, de modo que para qualquer nível de ensino os professores tenham formação de nível superior. (g.n.)

...

 

Prejulgado 1594[21]

 

O Chefe do Poder Executivo tem legitimidade para iniciar o processo legislativo objetivando propor a transformação de cargo de Auxiliar de Enfermagem para Técnico em Enfermagem e a respectiva reclassificação de servidor público de um para outro, desde que os cargos tenham a mesma qualificação, mesmo nível de escolaridade e a mesma área de conhecimento, e que o servidor reclassificado preencha todos os requisitos para a investidura, bem como, que tal situação não se configure Ascensão ou Transferência. (g.n.)

Ainda respondendo ao primeiro questionamento, não se mostra adequada a criação de tabela para determinado servidor. O Plano de Carreira, Cargos e Vencimentos será direcionado a todos os servidores e como é uno, do mesmo modo deve se apresentar a tabela de vencimento, a qual abrangerá todos os níveis e referências existentes no quadro de pessoal.

Em suma, a primeira pergunta pode obter a seguinte resposta:

. A implantação de novo plano de carreira não modificará as regras pertinentes à aposentadoria do servidor, a qual se fundamentará na regra da média das contribuições ou da última remuneração, conforme a situação funcional em que se encontrar o servidor.

. Não deve haver redução nos vencimentos em função da implantação de novo plano de carreira.

. O Plano de Carreira, Cargos e Vencimentos pode estabelecer que os cargos de nível médio sejam considerados cargos em extinção, suprimindo-se a medida em que houver vacância, se a escolaridade exigida passa a ser de nível superior.

. O Plano de Carreira, Cargos e Vencimentos é uno e será direcionado a todos os servidores, sendo descabida a criação de tabela específica para determinado servidor.

 

a.         Na mudança de denominação do cargo, sendo que as atribuições, as prerrogativas e as funções continuem as mesmas, como enquadrar o funcionário efetivo atual, com nível superior ou especialização, se na época do concurso por ele prestado o nível exigido era nível médio (funcionário com curso superior) e agora o nível exigido para o novo cargo fosse modificado?

A pergunta já foi respondida no item anterior, ou seja, determinados cargos deverão ser considerados isolados ou em extinção.

 

b.        Se o Estatuto do funcionário público falar que as Progressões por Mérito do servidor devem ser lançadas em separado na folha de pagamento (contra cheque) do mesmo, como enquadrar o servidor no novo plano de carreira, tendo em vista que as promoções seriam horizontais, com nível de graduação e classe de “A até Z”? Como proceder com adicional de titulação por ele percebidos em função de sua graduação/especialização?

Vejamos em primeiro lugar o que é progressão funcional e quando essa pode ocorrer.

A progressão funcional, que pode ocorrer por promoção horizontal ou vertical, é o provimento de servidores estáveis, ocupantes de cargos efetivos em nível ou referência de vencimento imediatamente superior. “Está atrelada à própria natureza do cargo, que propicia a possibilidade de ascensão a seu ocupante, galgando, hierarquicamente, diferenciados padrões no mesmo cargo.”[22]

Se a progressão representa melhora no vencimento e está atrelada a este, não será lançada em separado, pois a mudança de referência ou nível implica em acréscimo no vencimento. Na definição de Hely Lopes Meirelles[23], vencimento significa:

Assim, o vencimento (no singular) corresponde ao padrão do cargo público fixado em lei, e os vencimentos são representados pelo padrão do cargo (vencimento) acrescido dos demais componentes do sistema remuneratório do servidor público da Administração direta, autárquica e fundacional.

Para Diogenes Gasparini[24]:

Vencimento tem acepção estrita e corresponde à retribuição pecuniária a que faz jus o servidor pelo efetivo exercício do cargo. É igual ao padrão ou valor de referência do cargo fixado em lei. Nesse sentido, a retribuição é sempre indicada por essa palavra (vencimento), grafada no singular. Vencimentos tem sentido lato e corresponde à retribuição pecuniária a que tem direito o servidor pelo efetivo exercício do cargo, acrescida pelas vantagens pecuniárias (adicionais e gratificações) que lhe são incidentes. Compreende o padrão e as vantagens pecuniárias: as do cargo ou as pessoais.

A progressão, tanto horizontal, como vertical, implica na melhoria do padrão do cargo, o qual faz parte da parcela fixa da remuneração.

Então, numa progressão o pagamento não deve ser feito de forma individualizada, ou seja, lançado em separado na folha de pagamento, como mencionou a consulente. A progressão não é adicional ou gratificação e sim integrante da parcela fixa do vencimento, acrescentando valor a esse, funcionando como um plus e integrando-se ao mesmo, razão pela qual não poderia ser apartada do vencimento.

A progressão não deve ser calculada em percentuais em relação ao vencimento, deve isto sim, corresponder a valor estipulado na tabela de remuneração do plano de cargos e vencimentos. O servidor estará migrando de uma referência para outra ou mesmo de um nível para outro, os quais terão os valores determinados na tabela de remuneração.

Convém destacar que a progressão não pode ser confundida com um adicional por tempo de serviço, enquanto naquela o servidor galga a outra referência ou nível do cargo, neste há o auferimento de uma vantagem pecuniária que recompensa o tempo de serviço. No magistério de Hely Lopes Meirelles[25]:

Adicional por tempo de serviço é o acréscimo pecuniário que se adita definitivamente ao padrão do cargo em razão exclusiva do tempo de exercício estabelecido em lei para o auferimento da vantagem. É um adicional ex facto temporis, resultante de serviço já prestado – pro labore facto. Daí por que se incorpora automaticamente ao vencimento e o acompanha na disponibilidade e na aposentadoria.

Este adicional adere ao vencimento para todos os efeitos legais, salvo “para fins de concessão de acréscimos ulteriores” (CF, art. 37, XIV), pois a regra é a sua vinculação ao padrão de vencimento do beneficiário.

O adicional por tempo de serviço, ao contrário da progressão funcional, deve ser apartado do vencimento. É o que disciplinam os seguintes prejulgados:

Prejulgado 671[26]

O pagamento de adicional por tempo de serviço não se confunde com a progressão do servidor no cargo e a consequente melhoria no vencimento que decorre da elevação do padrão. A utilização do mesmo parâmetro, tempo de serviço, não implica na repetição do mesmo benefício concedido por lei.

É correto o lançamento em separado, na folha de pagamento de servidor, da parcela correspondente ao adicional trienal.

A progressão e a promoção configuram a ascensão do servidor a um padrão e a uma classe superiores no cargo, conferindo-lhe um novo vencimento com valor majorado; não há porque apartar o montante correspondente ao aumento no vencimento se este lhe é integrado. (g.n.)

 

Prejulgado 1995[27]

1. O adicional por tempo de serviço, embora configure vantagem pessoal permanente, não deve somar-se ao vencimento de modo a compor, com ele, parcela única. Por se tratarem o vencimento e as vantagens pecuniárias de rubricas remuneratórias distintas, devem ser expressos de forma separada, de modo a identificar o valor correspondente de cada componente remuneratório.

2. A fusão entre o vencimento e as demais vantagens pecuniárias pode mascarar equívocos nos valores isolados dos elementos que compõem a remuneração e, no caso dos servidores inativos, dificultar a verificação e a manutenção da paridade com os servidores em atividade, posto que o critério a ser utilizado para tanto perfaz-se com o confronto entre o valor referencial do cargo pago ao servidor ativo e o correspondente vencimento percebido já a título de proventos pelo inativo, excluindo-se as vantagens pessoais.

 

Em relação ao adicional de titulação, procede-se da mesma maneira que o adicional por tempo de serviço, ou seja, deve ser lançado em separado. No entanto, esse pode funcionar como uma forma de progressão por merecimento, a exemplo da Lei Complementar Estadual nº 223, de 10/01/2002, com alterações da Lei Complementar Estadual nº 483, de 04/01/2010, pertinentes aos servidores do Ministério Público Estadual de Santa Catarina, como se vê:

...

Art. 11. A progressão funcional, horizontal ou vertical, decorrente de promoção por aperfeiçoamento, dar-se-á com a movimentação do servidor de uma para outra referência ou nível do mesmo cargo, considerando-se os seguintes critérios:

I - uma referência por conclusão de curso de atualização ou aperfeiçoamento que compreenda carga horária mínima de 120 (cento e vinte) horas/aula;

II - duas referências por conclusão de curso de graduação; e

III - uma referência por conclusão de pós-graduação.

§ 1º A promoção por aperfeiçoamento fica limitada a duas referências por ano civil.

§ 2º Os cursos referidos neste artigo deverão relacionar-se com as áreas de conhecimento técnico-administrativas do Ministério Público, cabendo à Administração Superior, a requerimento do interessado, reconhecê-los ou não para efeito de imediata promoção por aperfeiçoamento no seu cargo efetivo, desde que finalizados pelo servidor a partir de 15 de janeiro de 2002, com repercussão financeira a contar da data do protocolo do pedido de reconhecimento do curso.

§ 3º Os servidores que ingressaram no Ministério Público a partir de 15 de janeiro de 2002 poderão aproveitar, para aperfeiçoamento, apenas cursos realizados a partir do início de exercício no cargo para o qual foi concursado.

...

 

Quanto à posição na tabela, dependerá do que estiver disciplinado no Plano de Carreira, Cargos e Vencimentos. Ressaltando, que nesse caso, isto é, funcionando como forma de progressão, não deve ser lançada em separado, conforme explanado acima. Essa Casa já firmou orientação nesse sentido, como se verifica:

 Prejulgado 1928[28]

1.    As progressões por desempenho (merecimento) e por curso de aperfeiçoamento não devem ser consideradas como adicionais, mas sim como uma mera movimentação nas referências e níveis da tabela de vencimentos.

...

Desta feita, a resposta que melhor se coaduna é a seguinte:

A progressão funcional por mérito não deve ser lançada em separado na folha de pagamento, pois está atrelada a própria natureza do cargo.

O plano de carreira pode prever a progressão funcional do servidor que adquirir titulação mediante movimentação nas referências e níveis da tabela de vencimentos.

 

 

c.  Como proceder o enquadramento dos servidores?

Repete-se: o enquadramento dos servidores deverá ser feito de acordo com o disposto no Plano de Carreira, Cargos e Vencimentos, o qual certamente buscará “o crescimento profissional de forma horizontal e vertical, fundamentado na busca de maiores níveis de qualificação profissional”[29]. Contudo, não cabe a este Tribunal disciplinar o plano, o qual deverá ser elaborado pela Câmara, respeitando as regras supramencionadas.

 

3. REVOGAÇÃO DE PREJULGADOS

 

O Tribunal de Contas de Santa Catarina conta com base de prejulgados que servem de orientação aos jurisdicionados. Sempre que for firmada nova interpretação ou quando os mesmos se apresentarem em descompasso com nova legislação, é imperioso que haja revogação ou alteração do mesmo, a teor do que dispõe o art. 156 do Regimento Interno desta Casa[30].

No estudo demandado neste parecer, detectou-se a necessidade de revogação do Prejulgado 1792, o qual possui a seguinte redação:

1. A Administração Pública pode, mediante lei, alterar o nível de escolaridade exigido para investidura em determinado cargo, passando a exigir nível superior em detrimento do nível médio.

2. Na hipótese de serem mantidas as mesmas funções e denominação para o cargo, sendo apenas modificada a escolaridade exigida para investidura, os servidores concursados e investidos na forma da lei regente à época, ou seja, sob o requisito anterior (nível médio), adquiriram o direito de exercer as atribuições e responsabilidades afetas ao cargo e perceber a remuneração correspondente, não precisando prestar novo concurso público, ou comprovar possuir nível superior, podendo a lei municipal automaticamente os enquadrar em novos patamares, sem que isso caracterize ascensão funcional (acesso).

A orientação firmada no Prejulgado 1792 apresenta-se em descompasso com o entendimento desta Casa consubstanciado nos prejulgados 1135 e 1594 transcritos acima e também com o entendimento do Supremo Tribunal Federal[31] que julgou inconstitucional essa espécie de aproveitamento, quando o cargo passa a ser de nível superior e os atuais ocupantes, mesmo ingressando em cargo de nível médio, passariam a nível superior se apresentassem a habilitação exigida. Assim, o prejulgado apresenta redação defasada, com orientação contrária à Constituição Federal, em seu art. 37, inciso II, motivo pelo qual deve ser revogado.

 

4. CONCLUSÃO

Diante do exposto, a Consultoria Geral emite o presente Parecer no sentido de que o Vice-Presidente César Filomeno Fontes proponha ao Egrégio Tribunal Pleno decidir por:

4.1 Conhecer da presente Consulta por preencher os requisitos e formalidades essenciais preconizados nos arts. 103 e 104 do Regimento Interno (Resolução nº TC-06, de 28 de dezembro de 2001) do Tribunal de Contas.

4.2 Responder à Consulta nos seguintes termos:

4.2.1 Na implantação de novo plano de carreira que implicar em decréscimo no valor da remuneração do servidor, em razão do princípio constitucional da irredutibilidade de vencimentos, deve ser assegurada a percepção da diferença referente à remuneração anteriormente recebida como vantagem pessoal nominalmente identificável, a ser absorvida por futuros reajustes de vencimento e progressões. Para fins de aposentadoria, devem ser consideradas as rubricas incorporáveis, aplicando-se a regra da média das contribuições ou da última remuneração, conforme a situação funcional em que se encontrar o servidor.

4.2.2 A transformação dos cargos de nível médio para cargos de nível superior encontra óbice na Constituição Federal. Os cargos de nível médio modificados devem ser previstos em tabela anexa ao quadro de carreira como cargos em extinção, suprimindo-se na medida em que houver vacância.

4.2.3 A progressão funcional por mérito não deve ser lançada em separado na folha de pagamento, pois está atrelada a própria natureza do cargo.

4.2.4 O adicional de titulação deve ser lançado em separado na folha de pagamento, salvo se o plano de carreira o prever como forma de progressão por merecimento.

4.3 Remeter à Exma. Sra. Sueli Terezinha de Campos Ferronato e à Câmara Municipal de Joaçaba, nos termos do art. 105, § 3º, do Regimento Interno (Resolução nº TC-06, de 28 de dezembro de 2001), cópia do Prejulgado 1594.

4.4 Revogar, com fundamento no art. 156 da Resolução TC-06/2001, o Prejulgado 1792.

4.5 Recomendar à consulente e à Câmara Municipal de Joaçaba que doravante as consultas encaminhadas ao Tribunal de Contas do Estado sejam instruídas com parecer da assessoria jurídica, conforme preconiza o inciso v do art. 104 do Regimento Interno (Resolução nº TC-06, de 28 de dezembro de 2001).

4.6 Determinar o arquivamento do processo.

 

Consultoria Geral, em 04 de novembro de 2011.

 

 

 ADRIANA REGINA DIAS CARDOSO

AUDITOR FISCAL DE CONTROLE EXTERNO

 

 

De acordo:

 

 

 VALERIA ROCHA LACERDA GRUENFELD

COORDENADORA

 

De acordo. Encaminhem-se os Autos à elevada consideração do Exmo. Sr. Relator Vice-Presidente César Filomeno Fontes, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.

 

 

 HAMILTON HOBUS HOEMKE

CONSULTOR GERAL



[1]Presidente da Câmara Municipal: autorizado pelo inciso II do art. 103 da Resolução nº TC-06/2001.

[2]MILESKI, Hélio Saul. O Controle da Gestão Pública. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 362.

[3]SILVA, José Afonso da. O regime constitucional dos Municípios. Biblioteca Digital A&C - Revista de Direito Administrativo & Constitucional, Belo Horizonte, ano 10, n. 42,  out./dez. 2010. Disponível em: www.bidforum.com.br. Acesso em: 13 julho 2011.


 

[4]MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2006, 15ª ed., p. 594.

[5]SILVA, José Afonso da. O regime constitucional dos Municípios. Biblioteca Digital A&C - Revista de Direito Administrativo & Constitucional, Belo Horizonte, ano 10, n. 42,  out./dez. 2010. Disponível em: <http://www.bidforum.com.br/bid>. Acesso em: 21 junho 2011.

 

[6]Art. 29 - ...

XI- organização das funções legislativas e fiscalizadoras da Câmara Municipal;

...

[7] Art. 51. Compete privativamente à Câmara dos Deputados:

[...]IV - dispor sobre sua organização, funcionamento, polícia, criação, transformação ou extinção dos cargos, empregos e funções de seus serviços, e a iniciativa de lei para fixação da respectiva remuneração, observados os parâmetros estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias;

[8]Processo: CON-00/03986675. Parecer: COG-513/2000. Decisão: 4205/2000. Origem: Câmara Municipal de São Francisco do Sul. Relator: Conselheiro Otávio Gilson dos Santos. Data da sessão: 20/12/2000. DOE: 03/04/2001.

[9]Processo: CON-01/01121709. Parecer: COG-075/2002. Decisão: 615/2002. Origem: Câmara Municipal de Barra Velha. Relator: Auditor José Carlos Pacheco. Data da sessão: 15/04/2002. DOE: 07/06/2002.

[10]Processo: CON-04/01530701. Parecer: COG-115/2004. Decisão: 1187/2004. Origem: Câmara Municipal de Palmitos. Relator: Conselheiro José Carlos Pacheco. Data da sessão: 31/05/2004. DOE: 02/08/2004.

[11]MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2010, 27ª ed., p. 305.

[12]MEIRELLES, Helly Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2009, 35ª ed., p. 423-424.

[13]Definição obtida no endereço eletrônico www.planejamento.gov.br/conferencia/arquivos “Diretrizes de Planos de Carreira”.

[14]Trecho extraído do Parecer CNE/CBE nº 9/2009, obtido no endereço eletrônico do Ministério da Educação.

[15]CASTRO, José Nilo de; RODRIGUES, Tais Erthal; ALMEIDA, Carla Cruz Guimarães de. Irredutibilidade de vencimentos: servidores estáveis: impossibilidade: redução dos subsídios dos detentores de cargos comissionados: possibilidade: extrapolação dos limites fixados na Lei de Responsabilidade Fiscal. Biblioteca Digital Revista Brasileira de Direito Municipal – RBDM, Belo Horizonte, ano 12, n. 40, abr./jun. 2011. Parecer. Disponível em: <http://www.bidforum.com.br/bid/PDI0006.>. Acesso em: 11 outubro 2011.

[16] Art. 21 da LCE 311, de 12/12/2005.

[17]A absorção de vantagem pecuniária por reajustes sucessivos não viola o princípio da irredutibilidade de vencimentos." (AI 318.209-AgR-ED-ED, Rel. Min. Cezar Peluso, julgamento em 7-8-2007, Primeira Turma, DJ de 24-8-2007.)

[18]RIGOLIN, Ivan Barbosa. O servidor público nas reformas constitucionais. 2 ed. Belo Horizonte: Fórum, 2006, pág. 140.

[19] Inciso II do art. 37 CF.

[20] Processo: CON-01/01958668. Parecer: COG-076/2002. Decisão: 626/2002. Origem: Prefeitura Municipal de Tubarão. Relator: Auditora Thereza Apparecida Costa Marques. Data da sessão: 15/04/2002. DOE: 07/06/2002. Item 3 reformado pelo Tribunal Pleno em sessão de 22/09/2003, através da decisão nº 3236, exarada no processo nº CON-03/02722386.

[21]Processo: CON-04/03647398. Parecer: COG-280/2004. Decisão: 3102/2004. Origem: Prefeitura Municipal de Guaraciaba. Relator: Conselheiro Otávio Gilson dos Santos. Data da sessão: 13/10/2004. DOE: 04/01/2005.

[22] Processo: CON TC 0434300/88. Parecer: 184/1999. Origem: Prefeitura Municipal de Içara. Relator: Clovis Mattos Balsini. Data da sessão: 19/05/1999.

[23] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2006. 34ª ed. p. 488. 

[24] Obra já citada, p 242/243

[25] Obra já citada, p. 496.

[26] Processo: CON-TC0434300/88. Parecer: 184/1999. Origem: Prefeitura Municipal de Içara. Relator: Aud. Clovis Mattos Balsini. Data da sessão: 19/05/1999.

[27]Processo: CON-09/00136626. Parecer: 182/2009. Decisão: 1.925/2009. Origem: Prefeitura Municipal de Laguna. Relatora: Auditora Sabrina Nunes Iocken. Data da sessão: 03/06/2009. Data do Diário Oficial eletrônico: 09/06/2009.

[28]Processo: CON-07/00397809. Parecer: COG-641/2007 – com acréscimos do relator – GCWRW/2007/910/ES. Decisão: 4106/2007. Origem: Prefeitura Municipal de Irani. Relator: Conselheiro Wilson Rogério Wan-Dall. Data da sessão: 18/12/2007. Data do Diário Oficial: 26/02/2007

[29]Conceito extraído da Lei Complementar Estadual nº 311/2005.

[30]Resolução nº TC-06/2001.

[31]Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1030-1- Santa Catarina. Relator: Ministro Carlos Velloso. Requerente: Procurador Geral da República. Requerido: Estado de Santa Catarina. Requerida: Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina. Diário da Justiça: 13/12/1996.