PROCESSO Nº:

REP-11/00508357

UNIDADE GESTORA:

Prefeitura Municipal de Água Doce

RESPONSÁVEL:

Nelci Fátima Trento Bortolini

INTERESSADO:

Odilon Sganzerla

ASSUNTO:

Irregularidades concernentes à concessão de incentivos econômicos a empresas

RELATÓRIO DE INSTRUÇÃO:

DLC - 638/2011

 

 

1. INTRODUÇÃO

 

Trata-se de representação, protocolada, em 13 de setembro de 2010, juntada às folhas 02 a 09, subscrita pelo Sr. Odilon Sganzerla, Vereador do Município de Água Doce/SC, comunicando supostas irregularidades concernentes à concessão de incentivos econômicos a empresas realizadas pelo Poder Executivo do Município de Água Doce através das seguintes Leis Municipais:

- Lei Municipal nº 1.757/2009 de 19 de maio de 2009;

- Lei Municipal nº 1.758/2009 de 26 de maio de 2009; e

- Lei Municipal nº 1.967/2011 de 15 de fevereiro de 2011.

 

 

2. ANÁLISE

 

2.1. Admissibilidade

 

Conforme o § 1º do art. 113 da Lei Federal nº 8.666/93, qualquer licitante, contratado ou pessoa física ou jurídica poderá representar ao Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina.

Art. 113. O controle das despesas decorrentes dos contratos e demais instrumentos regidos por esta Lei será feito pelo Tribunal de Contas competente, na forma da legislação pertinente, ficando os órgãos interessados da Administração responsáveis pela demonstração da legalidade e regularidade da despesa e execução, nos termos da Constituição e sem prejuízo do sistema de controle interno nela previsto.

§ 1º Qualquer licitante, contratado ou pessoa física ou jurídica poderá representar ao Tribunal de Contas ou aos órgãos integrantes do sistema de controle interno contra irregularidades na aplicação desta Lei, para os fins do disposto neste artigo.

Na mesma linha o art. 65 c/c parágrafo único do art. 66 da Lei Complementar Estadual nº 202/00 (Lei Orgânica do Tribunal de Contas de Santa Catarina) que prescreveu:

 

Art. 65. Qualquer cidadão, partido político, associação ou sindicato é parte legítima para denunciar irregularidades perante o Tribunal de Contas do Estado.

Art. 66. Serão recepcionados pelo Tribunal como representação os expedientes formulados por agentes públicos comunicando a ocorrência de irregularidades de que tenham conhecimento em virtude do exercício do cargo, emprego ou função, bem como os expedientes de outras origens que devam revestir-se dessa forma, por força de lei específica.

Parágrafo único. Aplicam-se à representação as normas relativas à denúncia.

 

Ainda, o art. 2º da Resolução nº TC-07/2002 do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina prevê quais são os requisitos indispensáveis que devem estar presentes na representação para que ela possa ser admitida.

Art. 2º São requisitos de admissibilidade da Representação:

I – ser endereçada ao Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, em petição contendo:

a) a indicação do ato ou do procedimento administrativo considerado ilegal, bem como do órgão ou entidade responsável pela irregularidade apontada;

b) a descrição clara, objetiva e idônea dos fatos e das irregularidades objeto da Representação, juntando conforme o caso, documentos de sustentação apropriados;

c) o nome e o número da Carteira de Identidade, se pessoa física, ou do Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica – CNPJ, se pessoa jurídica, o endereço e assinatura do signatário da Representação;

d) a comprovação da habilitação legal em caso do signatário ser procurador regularmente constituído ou dirigente de pessoa jurídica.

II – referir-se à licitação, contrato, convênio, acordo ou outro instrumento congênere de que seja parte entidade ou órgão sujeitos à jurisdição do Tribunal.

 

No caso em tela, verifica-se que a Representação versa sobre matéria sujeita à apreciação do Tribunal de Contas, decorrente de atos praticados no âmbito da Administração Pública; com possível infração a norma legal; refere-se a responsável sujeito à sua jurisdição; está redigida em linguagem clara e objetiva; está acompanhada de indício de prova e contêm o nome legível e assinatura do representante, sua qualificação e endereço.

 

Portanto, considera-se que foram atendidos os requisitos necessários a apreciação desta Corte de Contas previstos na Resolução nº 07/02 do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina.

2.2. Do item questionado

 

O teor da representação trazida a esta Corte de Contas, está descrito às fls. 04 a 09, nos seguintes termos:

 

Nelci Fátima Trento Bortolini, Prefeita de Água Doce, após aprovação da Câmara Municipal, sancionou leis que concederam incentivos econômicos a determinadas pessoas jurídicas do município, contudo, deixou de observar as regras jurídicas que são obrigatórias.

A Lei n° 1.757, de 19 de maio de 2009, concedeu incentivos econômicos às pessoas jurídicas OSELAME GRÃOS LTDA. ME; AGROPECUÁRIA E CEREALISTA MARTENDAL LTDA. E; MECÂNICA SCHULE LTDA., todas localizadas nas intermediações do município de Água Doce. As duas primeiras empresas receberam, para expansão das instalações, doação de equipamentos limitados ao valor de R$ 80.000,00 (oitenta mil reais), ao passo que para a última pessoa jurídica fora concedida a doação de máquinas de uso em mecânica e/ou reforma do barracão, até o valor máximo de R$ 21.000,00 (vinte e um mil reais). Em contrapartida, os beneficiados por aquela lei se submeteram a cumprir certos encargos sob pena de as doações serem revertidas para o município, como bem assevera os próprios dispositivos da mencionada norma.

A Lei n° 1.758, de 26 de maio de 2009, também autorizou a concessão de incentivos econômicos, como estímulo à instalação de empresa no município. A pessoa jurídica METALVI FUNILARIA LTDA recebeu doação de equipamentos limitados ao montante máximo de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais), com encargos que deveriam ser observados, sob pena de perder o benefício em proveito do próprio município, nos exatos termos estabelecidos pela norma.

Tais benefícios econômicos foram concedidos sem que fossem observadas as regras jurídicas obrigatórias, como é o caso da exigência de prévia licitação pública, conforme será demonstrado e provado a seguir.

4 - DAS REGRAS JURÍDICAS VIOLADAS

A Lei Nacional nº 8.666/93, que rege a matéria de licitações e contratos administrativos, ao abordar o tópico das doações assim assevera:

Art. 17. A alienação de bens da Administração Pública, subordinada à existência de interesse público devidamente justificado, será precedida de avaliação e obedecerá às seguintes normas:

(...)

A doação com encargo será licitada e de seu instrumento constarão, obrigatoriamente os encargos, o prazo de seu cumprimento e cláusula de reversão, sob pena de nulidade do ato, sendo dispensada a licitação no caso de Interesse público devidamente justificado.

O referido dispositivo se aplica muito bem ao presente caso, pois como fora demonstrado, a Administração Pública Municipal, por meio das Leis n° 1.757/09, 1.758/09 e 1.957/11, concedeu incentivos econômicos a determinadas pessoas jurídicas de Água Doce. Tais benefícios consistiram em doações de equipamentos industriais, condicionadas ao cumprimento dos encargos previstos no Termo de Adesão. Porém, o município acabou doando os bens públicos sem observância às regras de alienação, sendo certo que a Lei 8.666/93, exige para a doação de bens móveis públicos prévia licitação, até mesmo nas doações com encargo, o que não ocorreu na hipótese, nem sequer foi cogitado.

Ora, o procedimento adotado pelos agentes municipais não merece guarida, pois deixou de observar o regramento constitucional, notadamente os princípios norteadores da boa administração, sendo claramente irregulares os atos praticados.

As doações realizadas ferem e muito o princípio constitucional da isonomia, pois o município doou bens públicos a particulares sem prévia licitação, beneficiando determinadas pessoas jurídicas em detrimento dos demais, o que nem de perto condiz com a atual sistemática do nosso ordenamento jurídico, em especial as regras do direito administrativo que não permitem a alienação patrimonial sem licitação.

Com absoluta propriedade, ensina Renato Geraldo Mendes (Mendes, Renato Geraldo. Lei de Licitações e Contratos Anotada - notas e comentários à Lei nº 8.666/93. Curitiba: Zénite, 2011, p.227)

para poder realizar uma doação com encargo, a regra é a licitação prévia. O dever de licitar existe em razão do fato de que o donatário (quem recebe o bem) passa a ter um benefício exclusivo e pessoal. Sempre que o negócio proporcionar um benefício exclusivo dessa ordem, a regra é realizar a licitação para escolher o futuro beneficiário, garantindo o tratamento isonômico (grifei).

O art. 17, § 4º da Lei 8.666/93, é claro ao tratar das alienações, não pairando dúvidas que nas doações com encargo - obrigatoriamente - devem ser precedidas por processo licitatório, assegurando tratamento isonômico para benefício dos potenciais interessados. Assim, suponha-se uma pluralidade de sujeitos competindo pela obtenção dos incentivos econômicos oferecidos pelo município, é evidente que o principio da isonomia imporá o tratamento não discriminatório entre os interessados, adotando-se critério compatível com a impessoalidade, o que não aconteceu no presente caso, pois a administração concedera as doações de bens públicos a determinados particulares ao alvedrio de seus agentes, após a "aprovação dos pedidos apresentados junta ao Conselho Municipal de Desenvolvimento Econômico".

Veja-se que o mero pedido formulado pelos beneficiários, por si só não enseja a concessão dos incentivos, pois se assim fosse, o que se admite apenas a título de argumentação, estar-se-ia diante de flagrante ilegalidade (inobservância da lei 8.666/93), bem como ofensa direta ao princípio constitucional da isonomia e demais preceitos que a moralidade administrativa exige. Ora, como pode a Administração Municipal querer privilegiar uns poucos com as doações em detrimento da maioria que nem sequer tiveram a chance de competir pelos benefícios?

Por ser a licitação procedimento que tem por objetivo propiciar igualdade de oportunidades entre os interessados e conceder à Administração opções para a realização da melhor escolha, é medida que deve ser aplicada nas doações, doando responsavelmente os bens públicos e não como se procedeu no presente caso. Não há que se falar em interesse público a fim de dispensar o processo seletivo, pois não fora devidamente justificado. A lei ao erigir o interesse público como um dos requisitos gerais de alienação dos bens da Administração, nada mais fez do que enfatizar o alicerce fundamental de toda atividade administrativa, sendo certo que tal requisito deve ser explicitado e amplamente demonstrado.

Destarte, a falta de justificativa suficiente implica a necessidade de licitação, cuja ausência acarreta a nulidade do ato.

Nesse sentido, colaciona-se jurisprudência do Tribunal de Justiça Catarinense:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DOAÇÃO DE IMÓVEL PÚBLICO A PARTICULAR. INTERESSE PÚBLICO NÃO JUSTIFICADO DEVIDAMENTE. NECESSIDADE DE LICITAÇÃO. INOBSERVÂNCIA. ESCRITURA PÚBLICA DE DOAÇÃO SEM ESTIPULAÇÃO DE ENCARGO, PRAZO DE CUMPRIMENTO E CLÁUSULA DE REVERSÃO. ILEGALIDADE. INCIDÊNCIA DO ART. 17, CAPUT E § 4º, DA LEI N. 8.666/93. ATO NULO.

"A doação de bem público a particular imprescinde de prévia licitação, devendo constar da Escritura Pública, sob pena de nulidade do ato, o encargo imposto, o prazo de cumprimento e a cláusula de reversão. [..j" (Apelação Cível n. 2007.063027-5, de Biguaçu, rel. Des. Sérgio Roberto Baasch Luz, j. em 11-6-2008). (TJSC. Apelação Cível n. 2005.033883-2, de Ascurra, rel. Des. Subst. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva em 25/08/2009)

E ainda:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE NULIDADE DE ATO JURÍDICO. DOAÇÃO DE BEM PÚBLICO COM ENCARGO. INTERESSE PÚBLICO. NÃO VERIFICAÇÃO. SITUAÇÃO QUE NÃO PERMITE PRESUMIR A SUA OCORRÊNCIA. DOAÇÃO MODAL. NÃO CUMPRIMENTO DO ENCARGO CORRESPONDENTE. RESOLUÇÃO DO CONTRATO. ATO QUE MERECE SER ANULADO, COM A REVERSÃO DO BEM AO PATRIMÔNIO PÚBLICO. RECURSO PRINCIPAL E ADESIVO DESPROVIDOS. (TJSC. Apelação Cível n. 2007.039499-1, de Biguaçu, rel. Des. Substituto Ricardo Roesler em 17/06/2009).

Assim também é o entendimento do Egrégio Superior Tribunal de Justiça - STJ:

ADMINISTRATIVO - DOAÇÃO DE VEÍCULO PÚBLICO SEM PRÉVIA LICITAÇÃO - ART. 53 DA LEI 9.784/99 - ATO NULO DE PLENO DIREITO- DESNECESSIDADE DE INSTAURAÇÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO - CANCELAMENTO DO REGISTRO DE PROPRIEDADE DO VEÍCULO EM NOME DO DONATÁRIO. (RECURSO ESPECIAL NP 685.551 - AP 2004/0119799-6, RELATORA: MINISTRA ELIANA CALMON)

Sendo irrazoável presumir a ocorrência do interesse público na situação, a doação dos bens públicos a particulares precedida obrigatoriamente de licitação é a medida que se impõe. E como não fora observada tal regra no presente caso, os atos praticados pela Administração Municipal de Água Doce, no tocante as doações realizadas por meio das leis 1.757/09, 1.758/09 e 1.957/11, devem ser anulados, pois são completamente ilegais. (grifos no original)

 

 

O representante questionou as doações de equipamentos realizadas pelo Poder Executivo do Município de Água Doce através das Leis Municipais nºs 1.757/2009 (fls. 10/11), 1.758/2009 (fls. 12/13) e 1.967/2011 (fls. 14/15), alegando que não foi observado às regras de alienação previstas no §4º do artigo 17 da Lei Federal nº 8.666/93 e no princípio da isonomia.

 

 

Quanto se trata de bens patrimoniais, a Lei Orgânica do Município de Água Doce prescreve o que segue:

Da Administração dos Bens Patrimoniais

Art. 145. Compete ao Prefeito Municipal à administração dos bens municipais, respeitada a competência da Câmara quanto àqueles empregados em seus serviços.

Art. 146. A alienação de bens municipais será feita de conformidade com a legislação pertinente, especialmente no que tange ao processo licitatório.

Art. 147. A afetação e desafetação de bens municipais dependerá de lei autorizativa.

Parágrafo Único – As áreas transferidas ao Município, em decorrência da aprovação de loteamentos, serão consideradas bens dominiais, enquanto não se efetivarem benfeitorias que lhes dêem outra destinação.

Art. 148. O uso de bens municipais por terceiros poderá ser feito mediante concessão, permissão ou autorização, conforme o interesse público o exigir.

Parágrafo Único – O Município poderá ceder seus bens a outros entes públicos, inclusive os da Administração indireta, desde que atendido o interesse ou a finalidade pública.

Art. 149. O Município poderá ceder a particulares, para serviços de caráter transitório, conforme regulamentação a ser expedida pelo Prefeito Municipal, máquinas com operadores da Prefeitura, desde que os serviços da Municipalidade não sofram prejuízo e o interessado  recolha, previamente, a remuneração arbitrada e assine o termo de responsabilidade pela conservação e devolução dos bens cedidos.

Art. 150. A concessão administrativa dos bens municipais de uso especiais e dominais, dependerá de lei e de licitação e far-se-á mediante contrato por prazo determinado, sob pena de nulidade do ato.

§ 1.º A licitação poderá ser dispensada nos casos permitidos na legislação aplicável.

§ 2.º A permissão, que poderá incidir sobre qualquer bem público, será feita mediante licitação, a título precário e por decreto.

§ 3.º A autorização pode incidir sobre qualquer bem público e será feita por portaria, para atividades ou uso específicos e transitórios.

Art. 151. Nenhum servidor será dispensado, transferido, exonerado ou terá aceito o seu pedido de exoneração ou rescisão, sem que o órgão responsável pelo controle dos bens patrimoniais da Prefeitura ou da Câmara, ateste que o mesmo devolveu os bens do Município que estavam sob sua guarda.

Art. 152. O órgão competente do Município será obrigado, independentemente de despacho de qualquer autoridade, a abrir inquérito administrativo e a propor, se for o caso, a competente ação civil e penal, contra qualquer servidor, sempre que forem apresentadas denúncias contra o extravio ou dano de bens municipais. 

Art. 153. O Município, preferentemente para a venda ou a doação de bens imóveis, cederá direito real de uso, mediante concorrência.

Parágrafo Único – A concorrência poderá ser dispensada quando o uso se destinar a concessionário de serviço público, a entidades assistenciais, ou se verificar relevante interesse público na concessão, devidamente justificado.

 

Assim, a Lei Orgânica do Município de Água Doce prescreve que para a venda ou a doação de bens deverá ser feita mediante concorrência. Mas quando se trata de incentivos, a Lei Orgânica do Município de Água Doce nada diz como segue:

Da Política Econômica

Art. 114. Na promoção do desenvolvimento econômico, o Município agirá, sem prejuízos de outras iniciativas, no sentido de:

[...]

c) estímulos fiscais e financeiros

[...]

(grifou-se)

 

 

Nesse sentido, em 1996, a Lei Municipal nº 943/96 de Água Doce foi promulgada estabelecendo normas referentes às políticas de incentivos e estímulos para a expansão de empreendimentos e a geração de condições ocupacionais (fls. 16/23 dos autos).

 

Todavia, no caso representado, o Prefeito sancionou leis municipais que dispuseram sobre a concessão de incentivos econômicos como estímulo à expansão das instalações de indústrias e empresas já existentes, sem prejudicar os benefícios da Lei nº 943/2009 (art. 4º e 5º) acima citada que seguem:

 

QUADRO 1: LISTA DE LEIS MUNICIPAIS DE ÁGUA DOCE – CONCESSÃO DE INCENTIVOS ECONÔMICOS

 

Lei Municipal

Beneficiados

Valor

(R$)

1

 

Lei nº 1.757,

de 19 de maio de 2009

I – Oselame Grãos Ltda. Me, inscrita no CNPJ sob n. 10.618.439/0001-36, com atuação no ramo de recebimento e armazenagem de cereais, localizada na SC 454, KM 39, Trevo Água Doce/Catanduvas, neste Município, consistente na doação de equipamentos para expansão das instalações,

limitados ao valor de R$ 80.000,00 (oitenta mil reais);

II – Agropecuária e Cerealista Martendal Ltda., inscrita no CNPJ sob n. 10.618.415/0001-87, atuante no ramo de recebimento e armazenagem de cereais, localizada na SC 452 Km 50, Linha Santo Antonio, consistente na doação de equipamentos para expansão das instalações,

limitados ao valor de R$ 80.000,00 (oitenta mil reais).

III – Mecânica Schule Ltda., inscrita no CNPJ sob n. 06.134.825/0001-85, com atuação no ramo de serviços de reparação e manutenção de veículos e equipamentos pesados, comércio de peças e acessórios, consistente na doação de máquinas de uso em mecânica e/ou reforma do barracão,

até o valor máximo de R$ 21.000,00 (vinte e um mil reais).

2

Lei nº 1.758,

de 26 de maio de 2009

 - METALVI FUNILARIA Ltda., com atuação no ramo de fabricação e comércio de estruturas metálicas, esquadrias e funilaria em geral através da doação de equipamentos

limitados ao valor de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais);

3

Lei nº 1.967,

de 15 de fevereiro de 2011

I - Friana Frigorifico Ana Carolina Ltda., inscrito no CNPJ sob n. 02.016.325/0001-98, com atuação no ramo de Frigorífico - abate de bovinos, localizado na Linha Nova Vicenza neste Município, consistente na doação com encargos de uma Balança Rodoviária usada;

(*)

II - Agroindústria Embutidos Santo Antônio Ltda. ME, inscrita no CNPJ sob n. 12.526.85710001-29, com atuação no ramo de embutidos de carnes, localizado na Linha Santo Antônio, SC-452 KM 38, consistente na doação de equipamentos de uso Industrial, consubstanciados em: um picador de carne em inox; uma câmara frigorífica para resfriamento com dimensões de 2,00x1,00x2,00 e uma embaladora a vácuo com câmara,

até o valor global máximo de R$ 18.000,00 (dezoito mil reais).

 

Total

 

224.000,00

(*) Obs.: no item 3 – I – sem valor

 

As doações realizadas pelo Município através das três leis municipais, citadas acima, estão em desacordo com a Lei Municipal nº 943/96, de 19 de março de 1996, onde em seus artigos 5º e 6º, prescreve a forma de concessão de incentivos fiscais, como segue:   

 

Art. 5º: Os incentivos fiscais serão concedidos mediante a comprovação de enquadramento nesta Lei e compreenderão:

I - redução de até 80% do Imposto Sobre Propriedade Urbana - IPTU pelo prazo de até 5 (cinco) anos, a contar do início das atividades específicas da empresa;

II - redução de até 80% do Imposto Sobre Serviço - ISS, pelo prazo de até 5 (cinco) anos, a contar do início das atividades específicas da empresa;

III - redução da Contribuição de Melhoria, até o limite de 80% de seu custo apurado;

IV - exclusão ao pagamento de taxas Municipais nas condições definidas pelo Conselho de Desenvolvimento Econômico do Município.

§ 1°: Na forma da Lei poderão ser concedidos outras reduções de tributos municipais, caracterizados no respectivo enquadramento.

§ 2º: Os benefícios previstos neste artigo, quando concedidos à empresa já existente, somente atingirão ao acréscimo das instalações efetivamente em concordância com o projeto específico, nas condições desta Lei.

Art. 6º: Os estímulos materiais constituem-se pela ajuda ou participação do Município mediante:

I - alienação de área de terra em região compreendida como parque ou área industrial do município, mediante processo licitatório pelo valor estipulado pela Comissão de Avaliação;

II - serviços de preparo do solo a ser utilizado para a implantação ou ampliação da empresa;

III - construção ou pavimentação de acessos ao local destinado à implantação da empresa;

IV - co-participação nas linhas de transmissão           de energia elétrica, da rede d' água e telefônica;

V - co-participação em programas de treinamento da mão-de-obra a ser utilizada pela empresa, desde que esta seja atividade pioneira no Município;

(VI) - outros estímulos materiais, na forma que estabelecer o Conselho de Desenvolvimento Econômico do Município.

Parágrafo Único: Os custos relativos aos benefícios especificados neste artigo, poderão ser financiados à empresa em até 5 (cinco) anos, ou isentados, a contar de seu efetivo recebimento. (grifou-se)

 

Como os incentivos não foram com base na Lei Municipal nº 943/96, de 19 de março de 1996 (já citada acima), e como se trata de doação pela Administração Pública, onerosa ou não, busca-se o fundamento na Lei Federal nº 8.666/93, em especial no seu artigo 17 que prescreveu:

Art. 17.  A alienação de bens da Administração Pública, subordinada à existência de interesse público devidamente justificado, será precedida de avaliação e obedecerá às seguintes normas:

[...]

I - quando imóveis, dependerá de autorização legislativa para órgãos da administração direta e entidades autárquicas e fundacionais, e, para todos, inclusive as entidades paraestatais, dependerá de avaliação prévia e de licitação na modalidade de concorrência, dispensada esta nos seguintes casos:

a) dação em pagamento;

b) doação, permitida exclusivamente para outro órgão ou entidade da administração pública, de qualquer esfera de governo, ressalvado o disposto nas alíneas f, h e i; (Redação dada pela Lei nº 11.952, de 2009)

c) permuta, por outro imóvel que atenda aos requisitos constantes do inciso X do art. 24 desta Lei;

d) investidura;

e) venda a outro órgão ou entidade da administração pública, de qualquer esfera de governo; (Incluída pela Lei nº 8.883, de 1994)

f) alienação gratuita ou onerosa, aforamento, concessão de direito real de uso, locação ou permissão de uso de bens imóveis residenciais construídos, destinados ou efetivamente utilizados no âmbito de programas habitacionais ou de regularização fundiária de interesse social desenvolvidos por órgãos ou entidades da administração pública; (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007)

g) procedimentos de legitimação de posse de que trata o art. 29 da Lei no 6.383, de 7 de dezembro de 1976, mediante iniciativa e deliberação dos órgãos da Administração Pública em cuja competência legal inclua-se tal atribuição; (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005)

h) alienação gratuita ou onerosa, aforamento, concessão de direito real de uso, locação ou permissão de uso de bens imóveis de uso comercial de âmbito local com área de até 250 m² (duzentos e cinqüenta metros quadrados) e inseridos no âmbito de programas de regularização fundiária de interesse social desenvolvidos por órgãos ou entidades da administração pública; (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)

i) alienação e concessão de direito real de uso, gratuita ou onerosa, de terras públicas rurais da União na Amazônia Legal onde incidam ocupações até o limite de 15 (quinze) módulos fiscais ou 1.500ha (mil e quinhentos hectares), para fins de regularização fundiária, atendidos os requisitos legais; (Incluído pela Lei nº 11.952, de 2009)

II - quando móveis, dependerá de avaliação prévia e de licitação, dispensada esta nos seguintes casos:

a) doação, permitida exclusivamente para fins e uso de interesse social, após avaliação de sua oportunidade e conveniência sócio-econômica, relativamente à escolha de outra forma de alienação;

b) permuta, permitida exclusivamente entre órgãos ou entidades da Administração Pública;

c) venda de ações, que poderão ser negociadas em bolsa, observada a legislação específica;

d) venda de títulos, na forma da legislação pertinente;

e) venda de bens produzidos ou comercializados por órgãos ou entidades da Administração Pública, em virtude de suas finalidades;

f) venda de materiais e equipamentos para outros órgãos ou entidades da Administração Pública, sem utilização previsível por quem deles dispõe.

§ 1º Os imóveis doados com base na alínea "b" do inciso I deste artigo, cessadas as razões que justificaram a sua doação, reverterão ao patrimônio da pessoa jurídica doadora, vedada a sua alienação pelo beneficiário.

§ 2º A Administração também poderá conceder título de propriedade ou de direito real de uso de imóveis, dispensada licitação, quando o uso destinar-se: (Redação dada pela Lei nº 11.196, de 2005)

I - a outro órgão ou entidade da Administração Pública, qualquer que seja a localização do imóvel; (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005)

II - a pessoa natural que, nos termos da lei, regulamento ou ato normativo do órgão competente, haja implementado os requisitos mínimos de cultura, ocupação mansa e pacífica e exploração direta sobre área rural situada na Amazônia Legal, superior a 1 (um) módulo fiscal e limitada a 15 (quinze) módulos fiscais, desde que não exceda 1.500 ha (mil e quinhentos hectares); (Redação dada pela Lei nº 11.952, de 2009)

§ 2º-A. As hipóteses do inciso II do § 2º ficam dispensadas de autorização legislativa, porém submetem-se aos seguintes condicionamentos: (Redação dada pela Lei nº 11.952, de 2009)

I - aplicação exclusivamente às áreas em que a detenção por particular seja comprovadamente anterior a 1o de dezembro de 2004; (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005)

II - submissão aos demais requisitos e impedimentos do regime legal e administrativo da destinação e da regularização fundiária de terras públicas; (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005)

III - vedação de concessões para hipóteses de exploração não-contempladas na lei agrária, nas leis de destinação de terras públicas, ou nas normas legais ou administrativas de zoneamento ecológico-econômico; e (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005)

IV - previsão de rescisão automática da concessão, dispensada notificação, em caso de declaração de utilidade, ou necessidade pública ou interesse social. (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005)

§ 2o-B. A hipótese do inciso II do § 2o deste artigo: (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005)

I - só se aplica a imóvel situado em zona rural, não sujeito a vedação, impedimento ou inconveniente a sua exploração mediante atividades agropecuárias; (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005)

II – fica limitada a áreas de até quinze módulos fiscais, desde que não exceda mil e quinhentos hectares, vedada a dispensa de licitação para áreas superiores a esse limite; (Redação dada pela Lei nº 11.763, de 2008)

III - pode ser cumulada com o quantitativo de área decorrente da figura prevista na alínea g do inciso I do caput deste artigo, até o limite previsto no inciso II deste parágrafo. (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005)

IV – (VETADO) (Incluído pela Lei nº 11.763, de 2008)

§ 3º Entende-se por investidura, para os fins desta lei: (Redação dada pela Lei nº 9.648, de 1998)

I - a alienação aos proprietários de imóveis lindeiros de área remanescente ou resultante de obra pública, área esta que se tornar inaproveitável isoladamente, por preço nunca inferior ao da avaliação e desde que esse não ultrapasse a 50% (cinqüenta por cento) do valor constante da alínea "a" do inciso II do art. 23 desta lei; (Incluído pela Lei nº 9.648, de 1998)

II - a alienação, aos legítimos possuidores diretos ou, na falta destes, ao Poder Público, de imóveis para fins residenciais construídos em núcleos urbanos anexos a usinas hidrelétricas, desde que considerados dispensáveis na fase de operação dessas unidades e não integrem a categoria de bens reversíveis ao final da concessão. (Incluído pela Lei nº 9.648, de 1998)

§ 4º A doação com encargo será licitada e de seu instrumento constarão, obrigatoriamente os encargos, o prazo de seu cumprimento e cláusula de reversão, sob pena de nulidade do ato, sendo dispensada a licitação no caso de interesse público devidamente justificado; (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994)

§ 5º Na hipótese do parágrafo anterior, caso o donatário necssite oferecer o imóvel em garantia de financiamento, a cláusula de reversão e demais obrigações serão garantidas por hipoteca em segundo grau em favor do doador. (Incluído pela Lei nº 8.883, de 1994)

§ 6º Para a venda de bens móveis avaliados, isolada ou globalmente, em quantia não superior ao limite previsto no art. 23, inciso II, alínea "b" desta Lei, a Administração poderá permitir o leilão. (Incluído pela Lei nº 8.883, de 1994)

§ 7º (VETADO). (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007) (grifou-se)

 

 

Marçal Justen Filho comentou assim o artigo citado:

 

1) A Péssima Técnica Legislativa

O art. 17 é eivado de sério defeito de técnica legislativa. O dispositivo cuida de dois temas diversos e inconfundíveis. Disciplina, conjuntamente, os requisitos para alienação de bens e direitos da Administração e as hipóteses de dispensa de licitação. Em algumas passagens, os dispositivos estabelecem limitações e exigências a propósito dos requisitos para alienação dc bens públicos. Em outros tópicos, prevêem os pressupostos para a contratação direta. Em outras palavras, é necessário cautela para distinguir as hipóteses em que a exigência legal se dirige à validade da alienação daquelas em que a alienação é plenamente possível, mas dependerá de licitação. Para tornar mais simples a interpretação, pode-se dizer que as exigências sobre a alienação propriamente dita constam do capta do art. 17 e do texto propriamente dito dos incs. I c II. Já as alíneas desses dois incisos disciplinam as hipóteses de dispensa de licitação para alienação.

No entanto, há situações em que a identificação da exigência propicia sérias dúvidas. Um exemplo claro é o dispositivo do art. 17, inc. I, al. "b". O inc. I do art. 17 estabelece exigências para a alienação de bens imóveis, estabelecendo a regra geral da obrigatoriedade da prévia licitação, a qual pode ser dispensada em algumas hipóteses, arroladas nas alíneas subseqüentes. Entre elas, encontra-se o caso da doação, previsto na al. "h". Mas a parte final do aludido dispositivo propõe uma séria dúvida para o intérprete. E problemático identificar que a condição imposta na lei ("permitida exclusivamente para outro órgão ou entidade ...") limita a possibilidade jurídica da doação ou delimita as hipóteses de dispensa de licitação. Ou seja, a determinação legal visava a proibir a doação de imóveis para terceiros ou a subordiná-la à prévia licitação? Essa dúvida essencial é que se encontrava na origem da ADIn n° 927-3, promovida pelo Estado do Rio Grande do Sul. A época que a liminar foi apreciada, a questão ainda não estava suficientemente maturada para permitir o adequado aprofundamento. O STF decidiu a matéria sem tomar em vista essa diferenciação, o que não impediu decisão razoavelmente satisfatória. Sobre o tema, voltar-se-á adiante.

2) A Abrangência Objetiva do Dispositivo

Alienação é expressão de acepção ampla. O termo é utilizado para abranger todas as modalidades de transferência voluntária do domínio de um bem ou direito.

2.1) Manifestações típicas: contratos de venda e de doação

No direito privado, os instrumentos jurídicos mais utilizados para transferência de domínio são a compra e venda - contrato oneroso e bilateral - e a doação - contrato gratuito e unilateral. As alienações de bens públicos também se operam por meio desses institutos de direito privado. No entanto e corno adverte MARIA SYLVIA Z. Dl PIETRO, "... à semelhança do que ocorre com outros institutos de direito privado utilizados pela Administração, a sujeição ao direito privado nunca é integral. Sob vários aspectos tais contratos se submetem ao direito público".'8'

As restrições e limites derivados do regime de direito público atingem os institutos privados. Ainda que se aperfeiçoe uma compra e venda, aplicar-se-ão os princípios de direito público sempre que o regime de direito privado for com eles incompatível. Significa que a alienação onerosa dos bens públicos faz-se pela via de uma compra e venda; a gratuita, pela via de uma doação. Mas nenhuma cláusula ou regra peculiar a esses contratos privados será aplicável quando contrariar os princípios de direito público.

[...]

2.3) A doação com encargo

Uma hipótese específica, objeto de tratamento específico no § 4°, é a doação com encargo. A opção por essa alternativa dependerá da relevância do encargo para consecução dos interesses coletivos e supra-individuais. Em determinadas hipóteses, a doação com encargo apresentará regime jurídico próprio, inclusive com a obrigatoriedade da licitação.

O §5º, introduzido pela mesma Lei, disciplinou a hipótese de necessidade de oneração do imóvel objeto da doação com encargo, fornecendo solução cuja necessidade se impõe especialmente nos casos de recurso pelo particular a linhas de crédito agrícola. A inalienabilidade do imóvel doado representava obstáculo que acabava por frustrar a própria finalidade que orientara a doação.

2.1) Hipóteses excluídos

O art. 17 não dispõe sobre alienações relacionadas com o Programa Nacional de Privatização nem com operações relacionadas com o mercado de títulos de dívida pública, que se subordinam a regulação própria.

3) Âmbito de Abrangência Subjetiva do Dispositivo

Como visto, a interpretação do art. 17 propõe séria dificuldade hermenêutica, em virtude da cumulação da disciplina relativa aos requisitos de validade da alienação e dos pressupostos da dispensa de licitação. Essa complexidade normativa se traduz na própria amplitude de abrangência do dispositivo. Aliás, esse foi o núcleo da discussão levada à análise do STF, a propósito de alguns dos incisos do art. 17.

Rigorosamente, uma lei federal não poderia imiscuir-se na disciplina da alienação de bens públicos estaduais, municipais e distritais. Uma das características essenciais da Federação reside na autonomia para decidir o destino jurídico dos próprios bens. As normas gerais editadas pela União apenas podem tornar concretos princípios e regras inerentes à estruturação constitucional da Federação. Mas as normas gerais poderiam dispor sobre as hipóteses de dispensa de licitação para alienação - considerando-se especificamente o permissivo do art. 37, inc. XXI, da CF/88 (que remete à lei federal a especificação das hipóteses em que a licitação prévia obrigatória poderia ser dispensada).

Daí se extrai que as regras do art. 17 vinculam, sem margem de dúvida, à União, que pode dispor legislativamente sobre o destino dos próprios bens. Qualquer interferência sobre a autonomia dos outros entes federativos para gerir os próprios bens seria incompatível com a Constituição. Já no tocante aos pressupostos de dispensa de licitação, a competência legislativa da União é mais ampla.

Partindo de tais pressupostos, é possível produzir interpretação conforme, que evite a configuração de inconstitucionalidade e assegure a maior utilidade normativa para os dispositivos.

(JUSTEN FILHO. Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 11ª. Ed. São Paulo: Dialética, 2005, pg. 169/171) (grifou-se)

 

Já Jessé Torres comentou assim o inciso citado:

 

2 – Caráter da norma

A norma é geral, importando ao cumprimento dos princípios da isonomia e da moralidade.

3 – Conteúdo da norma

A Lei n° 8.883/94 veio fixar a regra geral de ser devida a licitação no caso de doação com encargo, admitindo a dispensa se houver interesse público. Inverteu, pois, a orientação da Lei n° 8.666/93, que considerava facultativa a licitação. Superior a diretriz da norma retificadora, posto que respeita o dever geral estabelecido na Constituição. Mas o espaço outorgado à discrição administrativa é incompatível com a natureza das hipóteses de dispensa por determinação da lei, mais aproximando-se da categoria de dispensabilidade ao nuto da Administração. Mitiga-se a discrição pela motivação necessária do ato de dispensa, que haverá de evidenciar as razões de interesse público que a justificam, indispensável a publicação (v. comentários ao art. 26).

Aperfeiçoada, com ou sem licitação, a doação com encargo será deduzida por instrumento, público ou particular conforme a natureza do bem. Do instrumento constarão os encargos, o prazo para seu cumprimento e cláusula de reversão do bem ao doador na hipótese de inadimplemento dos encargos.

Será nula a doação com encargo que omita qualquer desses requisitos, como se o bem doado jamais houvesse deixado a esfera patrimonial do doador. E a sanção expressamente cominada para a violação do negócio jurídico, que se funda em norma cogente e de ordem pública, inafastável, pois, pela vontade de doador e donatário, ainda que ambos integrem a Administração Pública.

(PEREIRA JUNIOR. Jessé Torres. Comentários à Lei de Licitações e Contratações da Administração Pública. 5ª. Ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, pg. 210) (grifou-se)

 

 

Segundo o artigo 17 da Lei Federal nº 8.666/93 (já citado), na doação são necessários dos seguintes requisitos:

a)    a existência de interesse público devidamente justificado; e

b)    a avaliação prévia.

 

E o § 4º do artigo 17, coloca duas exigências na doação com encargos:

a)  através de licitação; e

b)  dispensada a licitação no caso de interesse público devidamente justificado.

 

Ainda, prescreve o § 4º, na doação com encargo, sob pena de nulidade do ato, em seu instrumento, constarão obrigatoriamente:

- os encargos,

- o prazo de seu cumprimento; e

- a cláusula de reversão.

 

O representante alegou ainda que “as doações realizadas ferem e muito o princípio constitucional da isonomia, pois o município doou bens públicos a particulares sem prévia licitação, beneficiando determinadas pessoas jurídicas em detrimento dos demais, o que nem de perto condiz com a atual sistemática do nosso ordenamento jurídico, em especial as regras do direito administrativo que não permitem a alienação patrimonial sem licitação”.

 

Buscamos no comentário de Celso Ribeiro Bastos do princípio da igualdade quando da contratação que também serve para a doação:

 

O princípio da igualdade constitui um dos alicerces da licitação, na medida em que esta visa não apenas permitir à Administração a escolha da melhor proposta, como também assegurar à igualdade de direitos a todos os interessados diante da possibilidade de contratar com o Poder Público. Esse princípio, que hoje está expresso no art. 37, XXI do Texto Constitucional, veda o estabelecimento de condições que impliquem preferência em favor de determinado licitante em detrimento dos demais.

O princípio da igualdade é, sem dúvida nenhuma, basilar ao instituto licitatório. Pode se afirmar que, de longe, ultrapassa os limites desse instituto para altear-se, na verdade, a uma das vigas mestras de todo o nosso sistema jurídico. Leia-se o art. 5° da Constituição que trata dos direitos fundamentais, cujo capuz enuncia expressamente a igualdade, não como um entre os múltiplos princípios, mas, como o princípio que capitaneia todos os demais, tanto é assim que pertence ao caput do artigo, além de constar do próprio preâmbulo da Constituição como valor supremo da formação do Estado brasileiro.

O princípio da igualdade permeia todo o procedimento licitatório, na exata medida em que este tem que assegurar igualdade de condições a todos os participantes, estando vedado qualquer favorecimento a um dos concorrentes, sob pena de nulidade de todo o certame. Todas as exigências feitas aos participantes devem constar expressamente do edital, não podendo a Administração Pública alterá-las no curso do procedimento, de modo a favorecer ou prejudicar qualquer dos participantes. É bom lembrar que o procedimento licitatório é escrupulosamente definido em lei que descreve as exigências que podem ser feitas aos licitantes através do edital, para que possam ser habilitados. (BASTOS. Celso Ribeiro, Curso de Direito Administrativo, São Paulo: Celso Bastos Editora, 2002, pág. 178/179).

 

Há no município de Água Doce, outras empresas que também poderiam receber a doação, como aquelas das Leis nº 1.757 e 1.758/2009 e 1.967/2011. Em atendimento ao princípio da isonomia, que assegura à igualdade de direitos a todos os interessados, diante da possibilidade de receber também os mesmos benefícios, é necessário que a Administração faça a doação através da licitação, onde estabelece os critérios para a seleção de possíveis interessados.

 

Em caso semelhante, o Relator acolheu a representação nos autos do processo RPA-00/05813131, como segue:

 

Tratam os autos de expediente formulado a esta Corte de Contas, a qual relata a possível ocorrência de irregularidades na gestão administrativa do Executivo de Campos Novos, no tocante à doação de área de terras à empresa Indústria de Máquinas Bruno Ltda., através da Lei Municipal n. 1.697/90, posteriormente prorrogado pelo Decreto n. 4.182/00, para implantação de uma indústria de papel, cartolina e papelão, assim como possível aporte de recursos financeiros na ordem de R$ 32.585,73, conforme Projeto de Lei n. 1.914/96, sem que nenhuma construção tenha sido feita na área doada.

VOTO DO RELATOR:

ESTE RELATOR, diante das razões apresentadas pelo órgão de instrução e com fulcro no que dispõem os arts. 96 e 102 da Resolução TC-06/2001, alterados pelos arts. 4º e 5º da Resolução TC-05/2005, respectivamente, decide:

6.1. Em preliminar, conhecer da Representação acerca de supostas irregularidades praticadas no âmbito da Prefeitura Municipal de Campos Novos, por preencher os requisitos necessários previstos no art. 96, caput, da Resolução n. TC-06/2001 e 65, § 1º, c/c o art. 66 da Lei Complementar n. 202/2000.

6.2. Determinar à Diretoria de Denúncias e Representações – DDR que sejam adotadas providências, inclusive auditoria, inspeção ou diligência, que se fizerem necessárias junto à Prefeitura Municipal de Campos Novos, com vistas à apuração dos fatos apontados como irregulares e transcritos na inicial deste.

(fonte: disponível no Siproc)

 

Portanto, a representação deve ser acolhida, tendo em vista que as doações realizadas pelas Leis municipais nºs 1.757/2009, 1.758/2009 e 1.967/2011, são irregulares em face da ausência de licitação, da ausência de termo de justificativa, com a exposição da existência de interesse público e da ausência de avaliação prévia (no caso do bem correspondente a Lei nº 1.758/2009). O fato, contraria o disposto no caput e no §4º do artigo 17 da Lei Federal nº 8.666/93 e ainda os princípios da legalidade, da isonomia e da moralidade, previstos no caput do artigo 37 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 que prescreveu:

 

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

[...]

 

 

3. CONCLUSÃO

 

Considerando que a representação atende os requisitos para o seu conhecimento;

Considerando que a representação se restringe ao fato representado, conforme dispõe o §2º do artigo 65 da Lei Complementar Estadual nº 202/00; e

 

Diante do exposto, a Diretoria de Controle de Licitações e Contratações sugere ao Exmo. Sr. Relator:

 

3.1. Conhecer da Representação, nos termos do art. 66 da Lei Complementar Estadual nº 202/00, por preencher os requisitos e formalidades preconizados no art. 65, § 1º, do mesmo diploma legal, no tocante ao seguinte fato:

                    3.1.1. As doações realizadas pelas Leis municipais nºs 1.757/2009, 1.758/2009 e 1.967/2011, são irregulares em face da ausência de licitação, da ausência de termo de justificativa com a exposição da existência de interesse público e da ausência de avaliação prévia (no caso do bem da Lei nº 1.758/2009), contrariando o disposto no caput e no §4º do artigo 17 da Lei Federal nº 8.666/93 e ainda os princípios previstos da legalidade, da isonomia e da moralidade previstos no caput do artigo 37 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (item 2.2 do presente Relatório).

 

3.2. Determinar a audiência da Sra. Nelci Fátima Trento Bortolini – Prefeita Municipal de Água Doce, inscrita no CPF nº 517.949.269-68, com endereço na Praça João Macagnan, 322, Centro – Água Doce/SC, nos termos do art. 29, § 1º, da Lei Complementar Estadual nº 202, de 15 de dezembro de 2000, para, no prazo de 15 dias, a contar do recebimento desta deliberação, com fulcro no art. 46, I, b, do mesmo diploma legal c/c o art. 124 do Regimento Interno do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina (Resolução nº TC-06, de 28 de dezembro de 2001), apresentar alegações de defesa acerca da irregularidade apontada no item 3.1.1 da Conclusão deste Relatório, irregularidade esta, ensejadora de aplicação de multa prevista no art. 70 da Lei Complementar nº 202, de 15 de dezembro de 2000.

 

3.3. Dar ciência da Decisão, do Relatório Técnico ao Sr. Odilon Sganzerla, à Sra. Nelci Fátima Trento Bortolini (com cópia da inicial) e à Prefeitura Municipal de Água Doce, à Assessoria Jurídica e ao responsável pelo Controle Interno do Órgão.

É o Relatório.

Diretoria de Controle de Licitações e Contratações, em 20 de setembro de 2011.

 

 

 LUIZ CARLOS ULIANO BERTOLDI

AUDITOR FISCAL DE CONTROLE EXTERNO

 

De acordo:

 

 NADYA ELIANE ZIMMERMANN VENTURA

CHEFE DA DIVISÃO

 

FLAVIA LETICIA FERNANDES BAESSO MARTINS

COORDENADORA

 

Encaminhem-se os Autos à consideração do Exmo. Sr. Relator Conselheiro Wilson Rogério Wan-Dall, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.

 

 PEDRO JORGE ROCHA DE OLIVEIRA

DIRETOR