PROCESSO
Nº: |
REC-11/00516708 |
UNIDADE
GESTORA: |
Instituto de Previdência do Estado de Santa
Catarina - Iprev |
RESPONSÁVEL: |
|
INTERESSADO: |
Adriano Zanotto |
ASSUNTO:
|
Recurso de Reexame da decisão exarada no
processo SPE-07/00428291 - Solicitação de Atos de Pessoal - Aposentadoria de
Teresinha Salete Gomes Vaz |
PARECER
Nº: |
COG - 921/2011 |
RECURSO DE REEXAME.
APOSENTADORIA. CARGO ÚNICO. DENEGAÇÃO DE REGISTRO. PREJUDICIALIDADE DO ART.
41, CAPUT DO REGIMENTO INTERNO DO TCE/SC. CONHECER E NEGAR PROVIMENTO.
A reestruturação do quadro de pessoal deve respeitar o
imposto pelos arts. 37, II e 39, § 1º da Constituição Federal de 1988.
É entendimento desta Corte de Contas que a edição de uma
lei prevendo um cargo único, no qual restariam inseridas todas e quaisquer
tipos de atividades - de níveis fundamental, médio e superior - estaria
acometida pelo vício da inconstitucionalidade, inviabilizando o registro do
ato de aposentadoria.
Em que pese a irregularidade cometida pela Administração
Estadual, ao serem preenchidos os requisitos constitucionais e legais para
obtenção da aposentadoria, torna-se inviável qualquer determinação de retorno
ao posto de trabalho.
Impedimento de compensação previdenciária nos termos da
Portaria n. 6.209/99 do Ministério da Previdência Social é consequência da
inconstitucionalidade apontada e não argumento para alteração do entendimento
adotado por esta Corte de Contas.
Senhor Consultor,
1. INTRODUÇÃO
1.1
Relatório
Tratam os autos de Recurso de Reexame
interposto pelo Sr. Adriano Zanotto, Presidente do Instituto de Previdência do
Estado de Santa Catarina no exercício de 2011, nos termos do art. 80 da Lei
Complementar Estadual nº 202/00, em face da Decisão nº 2105/2011 (fls. 185/186
dos autos do SPE-07/00428291),
que denegou o registro do ato de aposentadoria de Teresinha
Salete Gomes Vaz servidora da
Secretaria de Estado da Saúde, matrícula nº 176438-1-01, no cargo de Analista
Técnico em Gestão e Promoção de Saúde nível GEPRO-SES-14-J (Portaria nº 720/IPESC
fl.119), considerado ilegal conforme pareceres emitidos nos autos.
Registre-se que, o
Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina encaminhou a este Tribunal
de Contas, em 16/07/07 por meio do Ofício nº 271/2007, os documentos relativos
à aposentadoria da referida servidora (fls. 03/120) tendo o Relatório nº 05850/2010
(fls. 122/127), da Diretoria de Controle de Atos de Pessoal (DAP), apontado
irregularidades, sugerindo a manifestação do Instituto de Previdência do Estado
de Santa Catarina, nos termos do art. 29, §1º e 35 da Lei Complementar Estadual
nº 202/00.
Efetivada a audiência
(fls. 131/132), foram apresentadas justificativas às fls. 133/154.
O Relatório de
Reinstrução nº 07057/2010 (fls. 155/162) propôs a denegação do registro de
aposentadoria, ressalvando a prejudicialidade do art. 41, caput do regimento interno desta Corte de Contas.
O Ministério Público
junto ao Tribunal de Contas se manifestou em favor do registro do ato
aposentatório (fls. 164/178).
Conclusos os autos ao
Relator, Wilson Rogério Wan-Dall, foi lavrado voto no sentido da denegação do
registro do ato de aposentadoria em análise e ressalvada a prejudicialidade do
art. 41, caput do regimento interno
desta Corte de Contas, em simetria ao entendimento exarado pela equipe técnica.
Em sessão ordinária
realizada em 03/08/2011, o Tribunal Pleno, acompanhou o voto do Relator e
decidiu por denegar o registro do ato de aposentadoria da servidora Teresinha
Salete Gomes Vaz, lavrando a Decisão
nº 2105/2011, nos seguintes termos (fls. 185/186):
O TRIBUNAL PLENO, diante das razões apresentadas
pelo Relator e com fulcro nos arts. 59 da Constituição Estadual e 1º da Lei
Complementar n. 202, de 15 de dezembro de 2000, decide:
6.1. Denegar
o registro, nos termos do art. 36, § 2º, “b” da Lei Complementar n. 202/2000,
do ato de aposentadoria de Teresinha Salete Gomes Vaz, servidora da Secretaria
de Estado da Saúde, ocupante do cargo de Analista Técnico em Gestão e Promoção
de Saúde, na competência de Enfermeiro, nível 14, referência J, grupo
GEPRO-SES, matrícula n. 176438-1-01, CPF n. 250.959.949-68, consubstanciado na
Portaria n. 720/IPESC, de 18/05/2007, considerado ilegal, conforme pareceres
emitidos nos autos, em face da seguinte restrição:
6.1.1. Enquadramento da servidora Teresinha Salete
Gomes Vaz no cargo único de Analista Técnico em Gestão e Promoção de Saúde, na
competência de Enfermeiro, considerado irregular por agrupar funções que
indicam graus extremamente desiguais de responsabilidade e complexidade de
atuação, já que essa situação agride o disposto no §1º, incisos I a III, do
art. 39 da Constituição Federal.
6.2. Ressalvar a prejudicialidade do art. 41,
caput, do Regimento Interno desta Corte de Contas, haja vista que a servidora
cumpriu os requisitos constitucionais para a aposentadoria (art. 6º, Emenda
Constitucional n. 41/2003) muito embora a alteração na denominação do cargo
levou à conclusão pela denegação do registro, conforme exposto acima.
6.3. Alertar o Presidente do Instituto de
Previdência do Estado de Santa Catarina – IPREV, que a denegação do registro
repercutirá na ausência da compensação previdenciária, se a servidora em
análise contribuiu para o regime de origem.
6.4. Recomendar à Secretaria de Estado da
Administração, órgão central do Sistema Administrativo de Gestão de Recursos
Humanos no âmbito do Poder Executivo Estadual, conforme art. 57 da Lei
Complementar n. 381/2007, a adoção de providências visando à adequação das Leis
Complementares (estaduais), que tratam dos planos de carreiras e vencimentos de
diversos Órgãos, em que foi adotado “cargo único”, que agrupou no mesmo cargo
funções com graus extremamente desiguais de responsabilidade e complexidade de
atuação, em desrespeito ao art. 39, § 1º, da Constituição Federal.
6.5. Dar ciência desta Decisão, do Relatório e Voto
do Relator que a fundamentam, ao Instituto de Previdência do Estado de Santa
Catarina - IPREV e às Secretarias de Estado da Administração e da Saúde.
6.6. Determinar a devolução dos autos ao Instituto
de Previdência do Estado de Santa Catarina – IPREV, após o trânsito em julgado
da decisão plenária.
A Decisão nº 2105/2011
foi publicada no Diário Oficial Eletrônico do Tribunal de Contas do Estado de
Santa Catarina nº 806 em 17/08/2011 (fls. 185/186).
Em 16/09/2011,
irresignado, o Sr. Adriano Zanotto, Presidente do Instituto de
Previdência do Estado de Santa Catarina, interpôs o presente Recurso de
Reexame.
É o relatório.
1.2
Pressupostos
de admissibilidade
Os arts. 79 e 80 da Lei Complementar Estadual
nº 202/00, disciplinam o Recurso de Reexame nos seguintes termos:
Art. 79. De decisão
proferida em processos de fiscalização de ato e contrato e de atos sujeitos a registro, cabem Recurso
de Reexame e Embargos de Declaração.
Art. 80. O Recurso de
Reexame, com efeito suspensivo, poderá ser interposto uma só vez por
escrito, pelo responsável, interessado ou pelo Ministério Público junto ao
Tribunal, dentro do prazo de trinta dias contados a partir da publicação
da decisão no Diário Oficial do Estado. (grifou-se)
Desta
forma, diante dos dispositivos supracitados, os pressupostos de admissibilidade
do Recurso de Reexame são cabimento, adequação, legitimidade, tempestividade e
singularidade.
No
que se refere ao cabimento e adequação, verifica-se que o ato impugnado é uma
decisão proferida quando da fiscalização de ato sujeito a registro, portanto, o
Recurso de Reexame foi interposto corretamente.
No
que diz respeito aos requisitos de singularidade e prazo recursal, observa-se
que o recurso em análise cumpriu as exigências legais pertinentes, uma vez que,
a decisão nº 2105/2011 (fls. 185/186) foi publicada em 17/08/2011 no Diário
Oficial Eletrônico do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina nº 806,
tendo o recurso sido protocolado em 16/09/2011, bem como, interposto uma única
vez.
Quanto
ao requisito da legitimidade para o manejo do recurso, constata-se a condição
de responsável do recorrente – Presidente do Instituto de Previdência do Estado
de Santa Catarina -, em conformidade com o disposto no art. 133, § 1º, da
Resolução nº 16/2001 do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina que,
assim dispõe:
Art. 133. Em
todas as etapas do processo de julgamento de contas, de apreciação de atos
sujeitos a registro e de fiscalização de atos e contratos será assegurada aos
responsáveis ou interessados ampla defesa.
§
1° Para efeito do disposto no caput, considera-se:
a)
responsável aquele que figure no processo em razão da utilização,
arrecadação, guarda, gerenciamento ou administração de dinheiro, bens, e
valores públicos, ou pelos quais o Estado ou o Município respondam, ou que, em
nome destes assuma obrigações de natureza pecuniária, ou por ter dado causa a
perda, extravio, ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário;
b)
interessado o administrador que, sem se revestir da qualidade de
responsável pelos atos objeto de julgamento ou de apreciação pelo Tribunal de
Contas, deva se manifestar nos autos na condição de atual gestor. (grifei)
2. ANÁLISE
O Recurso de Reexame - proposto pelo
Presidente do Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina/IPREV – levanta duas teses na tentativa de alterar a negativa do registro do ato de
aposentadoria da servidora Teresinha
Salete Gomes Vaz.
Inicialmente, o recorrente suscita o mesmo fundamento das informações
prestadas no processo SPE-07/00428291, aduzindo, em síntese, que a Administração do Estado de Santa
Catarina, ao reenquadrar a então servidora Teresinha Salete Gomes Vaz do cargo
de Enfermeiro – regulado pela Lei Complementar estadual n. 81/93 - para o cargo
de Analista Técnico em Gestão e Promoção de Saúde, em decorrência do texto da
Lei Complementar estadual n. 323/06, não originou uma transposição de cargo,
portanto, não teria incorrido na inconstitucionalidade apontada pelo TCE-SC,
uma vez que “[...] a situação fática da
servidora, quando do reenquadramento no cargo de Analista Técnico em Gestão
Promoção Saúde, permaneceu inalterada” (fl. 11).
Ainda, dentro do
contexto da primeira tese, o recorrente defende que a reestruturação no plano
de cargos e carreira instituída pela LC n. 323/2006 não teria criado um cargo
único para o setor da Saúde no Estado de Santa Catarina - como conclui o TCE/SC
– posto que “todos os cargos
anteriormente existentes” permaneceram existentes através das denominadas
competências, onde restaria este ou aquele servidor reenquadrado (fl. 12).
Sobre este fundamento
recursal em particular, oportuno registrar que a Consultoria Geral do Tribunal
de Contas do Estado de Santa Catarina, avaliou o instituto do reenquadramento
de cargos no âmbito da legislação estadual em outros recursos de reexames, a
exemplo: REC-08/00576160, REC-08/00625129, REC-09/00584882, onde nos respectivos
pareceres COG 762/2009, 198/1010 e 38/2010 consolidaram posicionamento no
sentido de ordenar o registro dos atos de aposentadoria, quando o reenquadramento trazido pela legislação estadual não houvesse
alterado a natureza e complexidade das atribuições do servidor atingido pelo
reenquadramento, bem como, tivesse mantido isonômico o nível de
escolaridade exigido para ingresso no cargo advindo do reenquadramento, em
relação ao cargo anterior.
Por sua vez, nos
feitos em que o reenquadramento houvesse permitido o deslocamento de um cargo a
outro, seja pelo fato de o reenquadramento ter propiciado uma alteração no
nível de escolaridade exigido ou pela circunstância de as atribuições
funcionais terem sido alteradas de forma a comprometer a complexidade e coerência
na linha de correlação das atribuições, a sugestão da Consultoria Geral era de
manter a denegação do registro do ato de aposentadoria submetido a análise do
TCE/SC.
Este posicionamento,
no entanto, não foi acolhido pelo Tribunal de Contas de Santa Catarina, que em sessão administrativa de 29/09/2010
- ATA n. 06/2010 – reavaliou a questão dos reenquadramentos dos servidores
estaduais, ocasião em que estavam presentes os Conselheiros Wilson Rogério
Wan-Dall, César Filomeno Fontes, Luiz Roberto Herbst, Salomão Ribas Junior,
Herneus de Nadal e Júlio Garcia, os Auditores Substitutos de Conselheiros
Cleber Muniz Gavi e Sabrina Nunes Ioken e o membro do Ministério Público junto
ao TCE-SC - Dr. Márcio de Souza Rosa -, deliberando
pela manutenção da posição até então adotada, ou seja, de denegar
os registros das aposentadorias operacionalizadas sob o fundamento das leis
viciadas pela inconstitucionalidade.
O fundamento do posicionamento adotado
por esta Corte de Contas é coerente e juridicamente defensável, tendo por ponto
de partida que ao editar uma lei prevendo um cargo único, no qual estariam
inseridas toda e qualquer tipo de atividade – de níveis fundamental, médio e
superior - a lei estadual restaria acometida pelo vício da
inconstitucionalidade, independentemente de haver previsão legal de classes
dentro deste cargo único, ou, como configurado no presente feito, competências
a serem acometidas a este ou aquele servidor.
No ato de aposentadoria em debate, em
que pese a alegação do recorrente de que a LC n. 323/2006 não teria criado um
cargo único, o parágrafo segundo do art. 1º da referida lei é claro,
expressamente evidenciando a opção administrativa adotada pelo Estado de Santa
Catarina. Aliás, cabe destacar que, em que pese não terem sido levados a
efeito, os arts. 14 e 15 da LC n. 323/2006, inclusive, permitiriam aos
ocupantes do cargo único em discussão, transpor de uma para outra área de
competência, haja vista, a particularidade da LC n. 323/2006 ter criado um
único cargo.
Neste sentido, oportuno citar o teor do
texto legal em debate:
Art. 1º Ficam
instituídas, nos termos desta Lei Complementar, as diretrizes para a
implantação do Plano de Carreira e Vencimentos - PCV para os servidores lotados na Secretaria de Estado da Saúde.
[...]
§ 2º Nos termos do presente PCV, fica criada carreira única constituída por cargo de provimento efetivo.
Art. 14. Consiste na passagem do servidor de uma
competência para o nível e referência iniciais de competência superior ou de
uma competência para outra competência, observados os seguintes critérios:
I - disponibilidade de vagas;
II - conclusão do pré-requisito para o exercício
profissional da competência;
III - processo seletivo com a aplicação de prova de
conhecimento, caso o número de vagas for inferior ao número de servidores
interessados; e
IV - possuir 5 (cinco) anos de tempo de serviço em
competências do cargo em que se encontra, nos termos do enquadramento previsto
nesta Lei Complementar.
§ 1º Para fins do tempo de serviço previsto no
inciso IV deste artigo, considerar-se-á o tempo prestado no cargo anterior ao
enquadramento no presente Plano de Carreira.
§ 2º O servidor que exerce competência prevista
nos níveis 1 ao 8 da estrutura de carreira, observado o disposto nos incisos
deste artigo, poderá progredir para competências do nível 13, desde que possua,
no mínimo, 10 (dez) anos de tempo de serviço na referida competência.
Art.
Parágrafo único. A primeira progressão nesta modalidade
ocorrerá a partir da vigência desta Lei Complementar.
Por
oportuno, cabe trazer o conceito de cargo público, defendido pelos autores de
Direito Administrativo.
Neste
sentido:
“Cargo público é o
lugar instituído na organização do serviço público, com denominação própria, atribuições e responsabilidades específicas e estipêndio correspondente, para ser
provido e exercido por um titular, na forma estabelecida em lei.
[...]
Classe - é o agrupamento de cargos da mesma profissão, e com idênticas
atribuições, responsabilidades e vencimentos. As classes constituem os degraus de acesso na carreira. [Ressaltando o
autor que]
A transformação de cargos, funções e
empregos do Executivo é admissível desde que realizada por lei de sua
iniciativa. Pela transformação extingui-se os cargos anteriores e se criam os
novos, que serão providos por concursos ou simples enquadramento dos servidores
já integrantes da Administração, mediante apostila de seus títulos de nomeação.
[...]. Todavia, se a transformação
‘implicar em alteração do título e das
atribuições do cargo, configura novo
provimento’, que exige concurso
público.” (Hely Lopes Meirelles. Direito Administrativo Brasileiro. Editora
Malheiros: 36ª Ed, 2010. Pág. 444/448. Grifei)
“A Constituição
estabelece o princípio da ampla acessibilidade aos cargos, funções e empregos
públicos [...].
O que a Lei Magna
visou com os princípios da acessibilidade e do concurso público foi, de um
lado, ensejar a todos iguais oportunidades de disputar cargos ou empregos na
Administração direita ou indireta. De outro lado, propôs-se impedir o ingresso
sem concurso, ressalvada as exceções previstas na Constituição, quanto obstar
a que o servidor habilitado por concurso para cargo ou emprego de
determinada natureza viesse depois a ser agraciado com cargo
ou emprego permanente de outra
natureza, pois esta seria uma forma
de fraudar a razão de ser do concurso público.(Celso Antônio Bandeira de
Mello. Curso de Direito Administrativo. Editora Malheiros: 20ª Ed, 2005. Pág.
257/258. Grifei)
Portanto, no entender desta Corte de Contas, a Administração
Pública estadual, ao promulgar a LCE n. 323/06, com o objetivo de
reestruturação administrativa, criando um único cargo – denominado Analista Técnico em Gestão e Promoção de
Saúde -, incorreu em erro, gerando uma lei com vício de
inconstitucionalidade que, no presente feito, inviabiliza o registro do ato de
aposentadoria da servidora Teresinha
Salete Gomes Vaz.
Por
sua vez, em que pese a irregularidade cometida pela Administração Estadual, a servidora Teresinha Salete Gomes Vaz de sua parte preencheu os requisitos
constitucionais e legais para obtenção de sua aposentadoria, tornando inviável
qualquer determinação de retorno ao posto de trabalho.
Por
esta razão, a decisão recorrida denegou o registro do ato de aposentadoria e
ressalvou a prejudicialidade do art. 41 do regimento interno do TCE/SC, o que
causou no ente previdenciário a inconformidade com a posição adotada.
Desta
forma, na segunda tese levantada pelo
recorrente, está sua oposição à ressalva do item 6.2 da Decisão n. 2105/2011, ou seja, sustenta o
recorrente que a negativa de registro do ato aposentatório implica no corte do
pagamento da aposentadoria ou, imediato retorno da servidora aposentada ao
cargo anterior.
Defende
o recorrente que não poderia continuar pagando os proventos da servidora Teresinha Salete Gomes Vaz se seu ato de aposentadoria teve registro
denegado.
Em suas razões recursais, o recorrente sustenta,
inclusive, que o Tribunal de Contas não disporia da faculdade de denegar o
registro de um ato de aposentadoria e efetuar a ressalva da prejudicialidade do
art. 41 do Regimento Interno, levantando a hipótese de ser o retorno ao
trabalho uma decorrência lógica da denegação do ato de aposentadoria.
No
entanto, ao avaliar as colocações lançadas pelo recorrente, a Consultoria Geral
constatou a ausência de fundamento legal que sustente a tese recursal.
Em
verdade, são duas situações distintas, uma relacionada a reestruturação
administrativa do Estado efetuada no ano de 2006 por inúmeras leis
complementares que se utilizaram da criação de um único cargo – em regra
denominado analista técnico – no qual as mais variadas pastas do Estado tinham
que recolocar seus servidores, tendo quando muito, uma subdivisão interna de
classes para diferenciar níveis de escolaridade.
Outra
situação é o cumprimento por parte da servidora reenquadrada dos requisitos
para obtenção de aposentadoria, bem como, se o benefício previdenciário foi
calculado corretamente.
No
que se refere a tentativa de movimentar servidores entre classes do mesmo cargo
único, constata-se que a hipótese legal restou inviabilizada diante das ações
diretas de inconstitucionalidades movidas, no entanto, a irregularidade
auferida pela criação de um único cargo para cada pasta do Estado gerou
irregularidades nos atos de aposentadorias submetidos a análise desta Corte de
Contas.
Portanto,
em sendo constatado pelo Tribunal de Contas que de sua parte a servidora
cumpriu requisitos legais e constitucionais para obtenção do benefício
previdenciário, não teria qualquer amparo legal a determinação de retorno ao
posto de trabalho.
Por
sua vez, ao defender que a negativa de registro do ato aposentatório
inviabiliza a continuidade do pagamento do benefício da servidora Teresinha Salete Gomes Vaz, o Instituto de Regime Próprio de Previdência dos
Servidores Públicos Estaduais de Santa Catarina incide em equívoco.
O pagamento do benefício da servidora Teresinha
Salete Gomes Vaz, cabe registrar, vem
sendo efetuado desde a edição do ato de sua aposentadoria (Portaria n. 720/IPESC,
publicada em 28/05/07, fl. 119). Tanto a lei quanto a Constituição Federal não
exigem ou condicionam o pagamento do benefício à avaliação efetuada por
Tribunais de Contas.
São duas relações jurídicas distintas, tanto que,
no presente feito, apenas em 16/07/07 o IPREV encaminhou a esta Corte de Contas
os assentamentos da servidora e seu ato de aposentadoria para análise e
registro (fl. 2).
A aferição de legalidade dos atos de aposentadoria,
pensão e reforma por Tribunais de Contas decorre de expressa previsão no texto
constitucional, e visa controlar os atos de pessoal, no sentido de evitar a
utilização da máquina pública em descompasso com os preceitos legais e
constitucionais vigentes.
Neste sentido, oportuno trazer a este parecer
partes do relatório do voto do Ministro Jorge Mussi que, ao relatar o Recurso
Especial nº 1047524, teceu as seguintes considerações:
O Supremo Tribunal
Federal há muito entende que o ato de aposentadoria é complexo,
aperfeiçoando-se com o registro perante o Tribunal de Contas. Como está
submetido a condição resolutiva, os efeitos da decadência não se operam antes
da vontade final da Administração.
Este posicionamento
foi amplamente adotado por esta Corte [...].
Entretanto, o tema merece algumas reflexões, pois a solução adotada por esta Corte e pelo
Excelso Pretório não traduz o Direito Administrativo moderno, que pugna
pela observância dos princípios constitucionais da segurança jurídica e da
proteção da boa-fé.
Em primeiro lugar,
convida-se à reflexão sobre o conceito de ato complexo.
A classificação
proposta por Hely Lopes Meirelles, seguida por toda a doutrina, divide os atos
administrativos em simples, compostos e complexos. Eis a definição que
interessa para o exame do presente caso:
Ato complexo: é o que se forma
pela conjugação de vontades de mais de
um órgão administrativo. O essencial, nesta categoria de atos, é o concurso
de vontades de órgãos diferentes para a formação de um ato único. Não se
confunda ato complexo com procedimento administrativo. No ato complexo integram-se as vontades de vários órgãos para a
obtenção de um mesmo ato; no procedimento administrativo praticam-se
diversos atos intermediários e autônomos para a obtenção de um ato final e
principal. Exemplos: a investidura de um funcionário é um ato complexo
consubstanciado na nomeação feita pelo Chefe do Executivo e complementado pela
posse e exercício dados pelo chefe da repartição em que vai servir o nomeado;
(...) Essa distinção é fundamental para saber-se em que momento o ato se torna
perfeito e impugnável: o ato complexo só se aperfeiçoa com a integração da
vontade final da Administração, e a partir desse momento é que se torna
atacável por via administrativa ou judicial (in Direito Administrativo
Brasileiro, 34ª ed., São Paulo: Malheiros, 2008, p. 174).
Verifica-se do texto
transcrito que o elemento primordial para o conceito é a necessidade de várias
vontades conjugadas para a formação ou existência do ato administrativo.
No entanto, a inativação de servidor público, ato
que se sujeita ao registro nos Tribunais de Contas, não se enquadra nesse conceito. Independentemente da
manifestação da Corte de Controle, a concessão da aposentadoria pela
Administração produz efeitos desde sua expedição e publicação.
O beneficiário, com a
concessão da aposentadoria pela Administração, afasta-se da atividade e passa a
perceber proventos, tornando vago o cargo, nos termos do que dispõe o art. 33,
VII, da Lei n. 8.112/90. Esses efeitos são típicos do ato de afastamento, que
se consolidam com a expressão da vontade de um único órgão, aquele que concede
a aposentadoria.
A
produção de efeitos da concessão de aposentadoria realizada pela
Administração permite concluir que não existe a conjugação de vontades para
a formação de um ato único, mas sim duas decisões independentes e
autônomas, quais sejam, o ato propriamente dito e seu registro, com o
consequente controle de legalidade pelo Tribunal de Contas competente.
Não se conjugam as
vontades da Administração e do Tribunal de Contas para
conceder a aposentadoria. São atos
distintos e praticados no manejo de competências igualmente diversas, na
medida em que a primeira concede e o
segundo controla sua legalidade.
A doutrina tem
demonstrado o desejo de refletir sobre o tema, como demonstram os artigos
publicados pelos professores Rafael Da Cás Maffini (Atos Administrativos
Sujeitos a Registro pelos Tribunais de Contas e a decadência da Prerrogativa
Anulatória da Administração Pública) e Luísa Cristina Pinto e Netto (Ato de
Aposentadoria - Natureza jurídica, registro pelo Tribunal de Contas e
decadência), ambos publicados na Revista Brasileira de Direito Público - RDPB.
[...]
No âmbito do Supremo
Tribunal Federal, o Excelentíssimo Senhor Ministro Cezar Peluzo, por oportunidade do julgamento do Mandado de
Segurança n. 26.353-9/DF, DJ de 7/3/2008, manifestou dúvida acerca da
classificação doutrinária em questão, verbis : A segunda observação, Senhor
Presidente, é que, embora eu tenha votado a favor da súmula, estou repensando
seriamente a própria exceção que a súmula contempla, porque, não obstante o
que esta Corte tem professado há muito tempo, me parece duvidosa a
afirmação de que os registros de aposentadoria correspondam à categoria dos
atos administrativos ditos complexos. Os atos administrativos ditos complexos
são aqueles que só se aperfeiçoam com o último ato de todos aqueles que deva
integrar. Não é o caso do regime de aposentadoria. [...].
(REsp 1047524/SC.
Ministro Jorge Mussi. Quinta Turma. Julgamento em 16/06/2009. DJe 03/08/2009.
Grifei)
Por sua vez, tendo a servidora cumprido os
requisitos legais e constitucionais para obtenção de benefício previdenciário,
não poderá ter seu direito ceifado por erro não atribuído a sua
responsabilidade.
Por outro lado, a questão da compensação
previdenciária é fato que evidencia como as irregularidades cometidas podem vir
a gerar dano ao erário, pois sem o registro dos atos de aposentadoria de
servidores que também tenham contribuído para o regime geral de previdência, o
regime próprio no qual a servidora se aposentou, terá de arcar com o pagamento
do benefício previdenciário sem obter junto ao regime geral a denominada
compensação previdenciária.
Neste
sentido, oportuno citar os artigos primeiro e onze da Portaria n. 6.209/99 do
Ministério da Previdência Social:
“Art. 1º. A compensação previdenciária entre o Regime
Geral de Previdência Social - RGPS e os regimes próprios de previdência social,
na hipótese de contagem recíproca de
tempo de contribuição, será realizada conforme as disposições contidas
na Lei nº 9.796, de 5 de maio de 1999, no Decreto nº 3.112, de 6 de julho 1999,
alterado pelo Decreto nº 3.217, de 22 de outubro de 1999, e nesta Portaria.
Art. 2º Para os fins da compensação previdenciária de
que trata esta Portaria, considera-se:
I - Regime Geral de Previdência Social: o regime
previsto no art. 201 da Constituição Federal, gerido pelo Instituto Nacional do
Seguro Social - INSS;
II - regimes próprios
de previdência social: os regimes de previdência constituídos exclusivamente
por servidores públicos titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios;
III - regime de origem: o regime
previdenciário ao qual o segurado ou servidor público esteve vinculado sem que
dele receba aposentadoria ou tenha gerado pensão para seus dependentes;
IV - regime instituidor: o regime
previdenciário responsável pela concessão e pagamento de benefício de
aposentadoria ou pensão dela decorrente a segurado, servidor público ou a seus
dependentes com cômputo de tempo de
contribuição devidamente certificado pelo regime de origem, com base na contagem recíproca prevista no art.
94 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991;”
“Art. 11. Cada administrador do regime próprio de
previdência social, como regime instituidor, deverá apresentar ao INSS requerimento de compensação.
§ 1º O requerimento de que trata este artigo
deverá conter os dados e documentos indicados no Anexo I desta Portaria.
§ 2º A não
apresentação das informações e dos
documentos a que se refere este
artigo veda a compensação previdenciária
entre o RGPS e o regime instituidor.
[...]”
[Estabelece o anexo
I, Capítulo I, item V, referido no § 1º do art. 11, acima transcrito:]
“V - DOCUMENTOS QUE
DEVERÃO ACOMPANHAR OS REQUERIMENTOS DE COMPENSAÇÃO PREVIDENCIÁRIA – RGPS REGIME
DE ORIGEM - REQUERIMENTO INICIAL DE APOSENTADORIA
• Certidão de Tempo
de Serviço - CTS ou Certidão de Tempo de Contribuição - CTC, acompanhada de
prova dos recolhimentos das contribuições relativas ao período de vínculo
indicado, caso este não conste do Cadastro Nacional de Informações Sociais -
CNIS. (Redação dada pela Portaria MPS nº
98, de 06/03/2007)
Original: • Certidão de Tempo de Serviço - CTS ou
Certidão de Tempo de Contribuição - CTC.
• Portaria expedida
pela autoridade competente que concedeu a Aposentadoria.
• Homologação do ato concessório da
Aposentadoria, expedido pelo
Tribunal ou Conselho de Contas.
• Quando se tratar de
Aposentadoria por Invalidez, deverá ser apresentado também o Laudo Médico que
reconheceu a invalidez do servidor.” (disponível:http://www.previdenciasocial.gov.br/arquivos/office/3_100730-183114-785.pdf.
Grifei).
No entanto, este não é um fundamento capaz de
alterar o posicionamento adotado pelo TCE/SC nos atos de aposentadoria
irregular, poderia, em hipótese, ensejar auditorias específicas para apuração
de um eventual dano ao erário decorrente de compensação previdenciária, mas não
serve para alterar o teor da decisão recorrida.
O fato incontroverso nos inúmeros feitos que
tramitam nesta Corte de Contas revelam que a reforma efetuada pelo Governo do
Estado no ano de 2006 e que tinham por objetivo uma reestruturação de cargos e
atribuições nas mais variadas pastas e setores do serviço público estadual, pecou pelo fato de ter se utilizado da
transformação dos vários cargos até aquela ocasião existentes em um único
cargo, no qual a Administração inseriria, ou reenquadraria, seus servidores em
conformidade com as competências e grau de escolaridade exigidos nos cargos sucedidos e sucessor.
Resta expressamente consignado nos textos das leis
estaduais, em particular a LC n. 323/2006 objeto de análise no presente
recurso, que a Administração se utilizou da criação de cargo único para sua
reestruturação, bem como que pretendia permitir – na medida do seu interesse –
a movimentação entre classes - ou competências -, em total afronta aos
preceitos básicos de ingresso no serviço público.
Portanto,
considerando que no presente feito, a servidora de sua parte, cumpriu as
exigências constitucionais para o usufruto de direito de aposentadoria,
estando, portanto, a irregularidade apontada no ato de aposentadoria submetido
ao controle do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, restrita a
inconstitucionalidade do reenquadramento decorrente da Lei Complementar
estadual nº 323/06 – que, por sua vez, inclusive foi impugnada por duas Ações
Diretas de Inconstitucionalidade, ainda não avaliadas pelo Poder Judiciário -,
o presente parecer é no sentido de sugerir a manutenção da decisão recorrida.
3. CONCLUSÃO
Considerando
que a irregularidade configurada no reenquadramento da servidora Teresinha
Salete Gomes Vaz inviabiliza o registro do ato de aposentadoria veiculado na Portaria
n. 720/IPREV publicada no DOE n. 18131 de 28/05/2007.
Considerando
que a edição do ato de aposentadoria de servidores públicos e a posterior
análise por esta Corte de Contas são duas relações jurídicas distintas.
Considerando
que a irregularidade apontada no ato de aposentadoria submetido ao controle do
Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, restringe-se a
inconstitucionalidade do reenquadramento decorrente da Lei Complementar
estadual nº 323/06, tendo a servidora aposentada cumprido as exigências constitucionais
para o usufruto de direito de aposentadoria.
A Consultoria Geral emite o presente Parecer no sentido de
sugerir ao relator do processo – Auditor Gerson dos Santos Sicca – propor ao
Egrégio Tribunal Pleno decidir por:
3.1. Conhecer
do Recurso de Reexame, interposto nos termos do art. 80 da Lei Complementar nº
202, de 15 de dezembro de 2000, contra Deliberação nº 2105/2011, exarada na
Sessão Ordinária de 03/08/2011 nos autos do Processo SPE-07/00428291, e no
mérito negar provimento, ratificando na íntegra a Deliberação Recorrida.
3.2. Dar
ciência da Decisão, ao Sr. Adriano Zanotto e ao Instituto de Previdência do
Estado de Santa Catarina – IPREV.
Consultoria Geral, em 13 de dezembro de
2011.
JULIANA FRITZEN
COORDENADORA
Encaminhem-se os Autos à elevada consideração do Exmo.
Sr. Relator Gerson dos Santos Sicca, ouvido preliminarmente o Ministério
Público junto ao Tribunal de Contas.
HAMILTON HOBUS HOEMKE
CONSULTOR GERAL