PROCESSO Nº:

CON-08/00541537

UNIDADE GESTORA:

Prefeitura Municipal de Araranguá

RESPONSÁVEL:

 

INTERESSADO:

Mariano Mazzuco Neto

ASSUNTO:

Aposentadoria espontânea de servidores públicos municipais

PARECER Nº:

COG - 412/2011

 

Administração Pública Direta. Servidor. Regime Celetista. Aposentadoria Voluntária. Extinção do contrato de trabalho.

A aposentadoria voluntária dos servidores públicos municipais da Administração Pública Direta regidos pela CLT,  extingue o contrato de trabalho, constituindo irregularidade a manutenção do vínculo de emprego sem nova aprovação em concurso público em respeito ao disposto no art. 37, inciso II, da Constituição Federal.

Administração Pública Direta. Regime Celetista. Servidor aposentado. Novo concurso público.

Ao servidor celetista da Administração Pública Direta aposentado pelo Regime Geral da Previdência Social aprovado por novo concurso público se aplicam as regras da acumulação remunerada de cargos públicos previstas no art. 37, inciso XVI e XVII da Constituição Federal.

 

Sr. Consultor,

 

 

1. INTRODUÇÃO

 

1.1 - Do relatório

 

Trata-se de Consulta formulada pelo Prefeito do Município de Araranguá - Sr. Mariano Mazzuco Neto - que submeteu a avaliação do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina as seguintes questões:

 

1. Com o advento da aposentadoria espontânea de servidores públicos municipais, com regime celetista de trabalho, é legal a manutenção do vínculo de emprego existente, se assim desejar o servidor?

2. E caso não deseje o servidor a continuidade do vínculo, deverá ser feita a rescisão do contrato de trabalho? Se sim, de que maneira?

3. E nos casos de servidores que tenham seus contratos de trabalho rescindidos pela municipalidade por conta de suas aposentadorias voluntárias nos últimos anos, em datas anteriores e posteriores à decisão proferida pelo E. Supremo Tribunal Federal (STF) proferido nas ADIN´s nºs 1721-3 e 1770-4, que declarou a inconstitucionalidade dos parágrafos 1º e 2º do art. 453 da CLT, e cancelou a OJ n. 177 da SDI-1, é legal a reintegração desses empregados públicos? Se sim, deve ser anulado o ato rescisório?

4. Como proceder nos casos futuros de servidores públicos municipais celetistas que venham a obter a aposentadoria espontânea?

 

Sobre a consulta acima descrita a Consultoria Geral do TCE emitiu o Parecer COG n. 761/08 (fls. 6/47), manifestando-se, em síntese, e entre outros pontos, no sentido de a aposentadoria espontânea do empregado público municipal não gerar direta extinção do contrato de trabalho mantido com a Administração Pública.

O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado emitiu o parecer n. 933/2009 (fls. 48/67), no sentido de a aposentadoria ora tratada extinguir o contrato de trabalho existente entre o empregado público municipal e Administração Pública.

No despacho de fls. 68, o Conselheiro Relator considerando a “necessidade de instrução complementar manifestada pelo órgão de controle em face [...] de novas decisões judiciais relativas à matéria”, determinou a remessa dos autos para Consultoria Geral para emissão de informação/parecer, razão pela qual, ora emite-se o presente parecer.

Este é o sucinto relatório.

 

 

1.2 Dos Pressupostos de Admissibilidade

 

Sobre o cumprimento dos requisitos de admissibilidade previstos no art. 104 do Regimento Interno desta Corte, constata-se que o tema foi  especificamente apreciado no parecer COG n. 761/08 (fls. 7/10), razão pela qual, no que se refere ao cumprimento dos pressupostos de admissibilidade da consulta, o atual parecer adota a fundamentação do parecer COG n. 761/08 (fls. 7/10), mantendo o mesmo entendimento pela admissibilidade.

A Consultoria Geral, portanto, sugere ao Relator do Processo CON 08/00541537 de conhecer da consulta quanto aos itens 1, 2 e 4, e não conhecer seu item 3.

 

2. ANÁLISE

 

O objeto da consulta formulada pelo chefe do Poder Executivo do município de Araranguá, diz respeito a manutenção, ou não, da relação do contrato de trabalho existente entre a Administração Pública municipal e os empregados públicos do referido município, na hipótese destes se aposentarem pelo Regime Geral de Previdência Social.

Por decorrência, a consulta abrange os desdobramentos da questão, haja vista que, a conclusão pela legalidade ou não da extinção do contrato de trabalho, repercute na incidência da multa de 40% sobre os depósitos efetuados a título de Fundo de Garantia por tempo de Serviço pela Administração Pública municipal no decorrer dos contratos de trabalho que estejam sendo rescindidos.

A questão tomou relevância em virtude das decisões do Supremo Tribunal Federal nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade n.s 1.721-3 e 1.770-4, bem como pelo cancelamento da Orientação Jurisprudencial n. 177 do Tribunal Superior do Trabalho que tratava da matéria.

A controvérsia no tema decorre principalmente dos posicionamentos contrapostos ora adotados pelos Tribunais Regionais do Trabalho, outra pelos Tribunais de Justiça Estaduais.

Portanto, o presente parecer, considerado as colocações exaradas pelo Ministério Público de Contas, reavalia a matéria, aprofundando o estudo das questões suscitadas.

 

 

2. a) Do quadro de servidores públicos municipais

 

Inicialmente, oportuno fazer uma breve ponderação sobre as possibilidades, em tese, do quadro de servidores da esfera municipal.

A Constituição Federal traça regras básicas a serem seguidas pela União, Estados e Municípios, nas suas esferas de Administração Direta e Indireta.

No que se refere à Administração Pública Municipal, em que pese esta ter em sua Lei Orgânica municipal os dispositivos legais aplicáveis a seu âmbito de atribuições e competências, é certo que a base e o limite de todo seu sistema normativo restará afetado pelas imposições do texto da Constituição Federal.

Neste sentido:

Art. 29, caput, da CF: O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos (Grifo nosso)

 

Desta forma, o quadro de servidores da Administração Pública municipal, nas esferas direta e indireta, terá em regra – ressalvadas as excepcionalidades presentes no texto da Constituição Federal -, de ser preenchido via concurso público, objetivando esta imposição alcançar um ingresso ao quadro de servidores revestido de um maior potencial de isonomia, moralidade e eficiência no gerir da coisa pública.

Ainda, necessariamente, suas empresas estatais – empresas públicas e sociedades de economia mista – terão quadros de empregos públicos, submetidos ao regime da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, e seus empregados serão contribuintes obrigatórios do Regime Geral de Previdência Social/RGPS, dada a imposição constitucional de não permitir as empresas estatais privilégios não extensivos ao setor privado.   

Por sua vez, na esfera da Administração Pública direta, bem como, na esfera da Administração indireta, relativa a autarquias e fundações públicas, poderá o ente municipal instituir o regime jurídico e o plano de carreira de seus servidores.

Neste sentido, Constituição Federal:

Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, no âmbito de sua competência, regime jurídico único e planos de carreira para os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas.(Grifo nosso)

Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.

§ 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre:

[...]

II - a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários;

[...]

§ 2º - As empresas públicas e as sociedades de economia mista não poderão gozar de privilégios fiscais não extensivos às do setor privado. (Grifo nosso)

 

Portanto, conclui-se que o município consulente, no que se refere aos servidores que mantém vínculo de trabalho com a Administração Direta, suas autarquias e fundações, poderá pelo texto constitucional regular a relação laboral por lei própria – vínculo institucional ou estatutário -, ou, pelo sistema normativo inserido na Consolidação das Leis do Trabalho, conforme opção administrativa do chefe do executivo a ser estipulada por texto legal.

Na mesma linha de raciocínio, caso o município consulente descentralize atividades em empresas públicas e sociedades de economia mista, estas terão, necessariamente, de ter quadro de empregos públicos, submetidos a regulação da Consolidação das Leis do Trabalho, afim de manter isonomia em relação as empresas do setor privado que submetem-se ao mesmo sistema normativo nas relações de emprego que estabelecem.

O fator relevante neste ponto da discussão está na percepção da peculiaridade de a submissão ao sistema normativo da Consolidação das Leis do Trabalho, ser um meio de aproximar o setor empresarial público do setor empresarial privado. Ou seja, a imposição constitucional submete às mesmas imposições legais laborais, qualquer empresa – pública ou privada - que atue no mercado econômico brasileiro, dada a possibilidade concreta de concorrência entre as mesmas.

No entanto, cabe destacar que todo o sistema normativo próprio e peculiar da Administração Pública, incidirá sobre a gestão das empresas estatais, dada a peculiar condição destas de integrantes da Administração Pública Indireta - cuja criação, inclusive, depende de lei que autorize -, ou seja, se por um lado  submete-se ao sistema normativo da área privada quando o objetivo é impedir privilégios em detrimento das empresas do setor privado, por outro, tem suas ações delimitadas por um extensivo rol de normas de direto público que a submetem a um controle público rigoroso.

No que se refere a municipalidade consulente, o regime jurídico dos seus servidores é o celetista, ou seja, exercendo sua competência constitucional, o executivo municipal de Araranguá instituiu o regime jurídico único para seus servidores  adotando o texto da Consolidação das Leis do Trabalho.

Por oportuno, Lei Complementar n. 33/2002:

Art. 1º Esta lei dá nova redação à Lei Complementar nº 14, de 24 de junho de 1999, que institui o Sistema de Carreiras, Benefícios e Vantagens do quadro de funcionários permanentes da Administração Municipal de Araranguá.

Art. 2º Ficam criados no Quadro Permanente da Administração Municipal os cargos de que trata esta lei, organizados em Grupos Ocupacionais, Níveis e Referências, regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, nos termos da Lei Complementar nº
2, de 22 de agosto de 1997.(Grifo nosso)

 

Apenas para registro, um aspecto que chama a atenção na leitura do art. 2º supracitado, está no fato de a Lei Complementar n. 33/2002 dispor sobre a criação de cargo público, regido pela Consolidação das Leis do Trabalho, o que se revela uma impropriedade, posto que somente empregos públicos submetem-se as regras da CLT.

Cargos públicos, necessariamente, são regidos por lei específica, gerando entre o trabalhador e a Administração um vínculo estatuário ou institucional, o que, para um amplo rol de juristas da esfera do Direito Administrativo seria o defensável.

Neste sentido:

[...] para os servidores da Administração direta, autarquias e fundações de Direito Público (ou seja: servidores das pessoas jurídicas de Direto Público), indubitavelmente, o regime norma, corrente, terá de ser de cargo público, admitindo-se, entretanto [...] casos em que é cabível a aplicação do regime de emprego para certas atividades subalterna.(Celso Antônio Bandeira de Mello. Curso de Direto Administrativo. 2010: Malheiros, 27ª edição, p. 260)

[...] o regime jurídico pode ser estatutário, celetista, (o da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT) e o administrativo especial. [...]. O regime estatutário é o que melhor atende aos interesses e necessidades do serviço público local, porque somente dispondo da faculdade de impor e alterar unilateralmente as normas disciplinadoras da vinculação jurídica do seu pessoal pode a Administração Municipal agir com liberdade [...] para assegurar pleno atendimento de seus objetivos, com a continuidade, a segurança e o rendimento desejados. (Hely Lopes Meirelles. Direito Municipal Brasileiro. 2006: Malheiros, 15ª edição, pag. 585/586.) 

 

Portanto, optou o município consulente regulamentar as relações laborais com seus servidores públicos - na esfera da Administração Direta - pelas disposições normativas da Consolidação das Leis do Trabalho, texto este, cabe pontuar, elaborado para incidir nas relações de emprego do setor empresarial brasileiro, autônomo em relação aos demais ramos do Direito e detentor de uma peculiar base de princípios jurídicos, construídos a partir de uma avaliação lançada sob a realidade configurada na rotina laboral da esfera privada.

Tais ponderações são oportunas no texto deste parecer, posto que, uma vez concluída que a aposentadoria do empregado público da Administração Direta municipal, bem como dos empregados públicos de autarquias e fundações públicas, não gere a automática extinção da relação laboral – em simetria ao que ocorre no caso de cargo públicos regulados por Lei (Estatuto do servidor) – deverá, necessariamente, o município consulente, e os demais municípios que tenham optado por regulamentar a relação laboral de seus servidores pelo texto da Consolidação das Leis do Trabalho, na hipótese de exonerar, ou melhor dizendo, rescindir os contratos de trabalho dos seus empregados públicos aposentados pelo RGPS, de arcar com um verba indenizatória no importe de 40% (quarenta por cento) do valor de todos os depósitos efetuados na conta vinculada do empregado no decorrer de toda a contratualidade.

Ou seja, um empregado público, que mantenha com a Administração Pública Direta municipal vínculo de emprego no ato de sua aposentadoria – aposentadoria esta que obteve utilizando-se do tempo de contribuição desta relação de trabalho - poderia manter o contrato de trabalho com a Administração Pública mesmo após a concessão da aposentadoria que teve por fundamento a relação laboral havida com o ente público, restando a Administração na hipótese de encerrar unilateralmente o contrato de trabalho sob a alegação de que a aposentadoria do empregado extinguiu a relação de emprego, o ônus de pagar uma indenização pela despedida sem justa causa, cuja base de cálculo será o valor total dos depósitos efetuados na conta vinculada do FGTS do trabalhador no decorrer do contrato que manteve com a Administração Pública.

Sobre o aspecto legal que normatiza a multa do FGTS, oportuno fazer a citação do dispositivo para melhor visualização.

Neste sentido, Lei n. 8.036/90 (FGTS):

Art. 1º O Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), instituído pela Lei nº 5.107, de 13 de setembro de 1966, passa a reger-se por esta lei.

Art. 15. Para os fins previstos nesta lei, todos os empregadores ficam obrigados a depositar, até o dia 7 (sete) de cada mês, em conta bancária vinculada, a importância correspondente a 8 (oito) por cento da remuneração paga ou devida, no mês anterior, a cada trabalhador, incluídas na remuneração as parcelas de que tratam os arts. 457 e 458 da CLT e a gratificação de Natal a que se refere a Lei nº 4.090, de 13 de julho de 1962, com as modificações da Lei nº 4.749, de 12 de agosto de 1965.

§ 1º Entende-se por empregador a pessoa física ou a pessoa jurídica de direito privado ou de direito público, da administração pública direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, que admitir trabalhadores a seu serviço, bem assim aquele que, regido por legislação especial, encontrar-se nessa condição ou figurar como fornecedor ou tomador de mão-de-obra, independente da responsabilidade solidária e/ou subsidiária a que eventualmente venha obrigar-se.

Art. 18. Ocorrendo rescisão do contrato de trabalho, por parte do empregador, ficará este obrigado a depositar na conta vinculada do trabalhador no FGTS os valores relativos aos depósitos referentes ao mês da rescisão e ao imediatamente anterior, que ainda não houver sido recolhido, sem prejuízo das cominações legais.

§ 1º Na hipótese de despedida pelo empregador sem justa causa, depositará este, na conta vinculada do trabalhador no FGTS, importância igual a quarenta por cento do montante de todos os depósitos realizados na conta vinculada durante a vigência do contrato de trabalho, atualizados monetariamente e acrescidos dos respectivos juros.

Art. 26. É competente a Justiça do Trabalho para julgar os dissídios entre os trabalhadores e os empregadores decorrentes da aplicação desta lei, mesmo quando a Caixa Econômica Federal e o Ministério do Trabalho e da Previdência Social figurarem como litisconsortes. (Grifo nosso)

Por sua vez, a conclusão contrária, qual seja, de que o empregado público - de autarquias, fundações públicas e da Administração Direta - ao se aposentar pelo Regime Geral de Previdência Social teria sua relação de trabalho extinta com a Administração Pública que o contratou, em simetria ao que ocorre com os ocupantes de cargos públicos, posto que, embora não descrita na CLT como causa justa para extinção de contrato de trabalho (art. 482 da CLT), a rescisão contratual não seria considerada arbitrária, injusta ou sem justa causa, conferirá ao empregado o direito de sacar os valores depositados em sua conta vinculada do FGTS, sem direito a indenização no importe de 40%(quarenta por cento) sobre o valor de seu FGTS.

Este é o cerne do objeto da presente consulta.

Um dos pontos que merece destaque quando da avaliação da questão sobre a possibilidade de estender à relação laboral havida entre Administração Pública (Direta, suas autarquias e fundações) e o servidor celetista, o mesmo tratamento existente na esfera privada está na questão da Estabilidade ou garantia de emprego.

Historicamente, o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) surgiu para substituir a estabilidade decenal, hipótese legal de proteção ao trabalhador da área privada de uma demissão imotivada.

Desta forma, o legislador instituiu um Fundo (operacionalizado por contas individualizadas em nome de cada empregado na Caixa Econômica Federal), no qual o empregador mensalmente está obrigado a depositar a título de FGTS o importe de 16,5% da remuneração paga a seu empregado (8% financiado pelo empregado) e, na hipótese de demissão sem uma justa causa legal, terá o empregador de arcar com uma indenização, cuja base de cálculo é de 40% do valor depositado a título de FGTS no decorrer da contratualidade que está sendo objeto de rescisão sem justa causa.  

Portanto, o FGTS foi uma alternativa a extinção da estabilidade decenal - prevista na CLT - existente nas relações de emprego que eram regidas pela Consolidação das Leis do Trabalho.

Por sua vez, a Lei n. 8.036/90 (art. 15) expressamente incluiu a Administração Direta na condição de empregadora - na hipótese desta admitir trabalhadores pelo regime de emprego, haja vista cargos públicos terem regulação específica sobre o instituto da estabilidade – e não ressalvou, ou excluiu o ônus da indenização de 40% sobre o montante do FGTS, na hipótese de despedida sem justa causa (art. 18).

Sendo assim, oportuna e razoável a consulta ora analisada.

A questão em torno da possibilidade de desoneração do pagamento da multa do FGTS no caso de rescisão contratual motivada pela aposentadoria do servidor celetista terá de enfrentar o tema da aposentadoria do servidor, e se esta é ou não causa extinção do contrato de trabalho estabelecido com a Administração Pública.

Sendo a aposentadoria causa de extinção do contrato de trabalho do empregado público contratado pela Administração Pública Direta, o rompimento da relação laboral – mesmo que por ato unilateral da Administração - não poderia ser tida por injusta, desta forma, não haveria causa para pagamento da verba indenizatória do art. 18, § 1º da Lei 8.036/90.

Ainda, há de se considerar que a extinção do contrato de trabalho – regidos pela CLT - pactuado entre a Administração Pública Direta ou Indireta na esfera das Autarquias e Fundações Públicas, harmoniza-se com a vedação constitucional de acumulação remunerada de proventos com vencimentos, ressalvadas exceções constitucionalmente permitidas, bem como, o princípio da acessibilidade aos cargos e empregos públicos, conforme pontuou o Ministério Público de Contas em seu parecer ministerial.

 

2.b) – Da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1.721-3

 

 

Diante da perspectiva lançada pelo Ministério Público de Contas, segundo o qual os julgados das Ações Diretas de Inconstitucionalidade n. 1.721 e n. 1.770 não abrangeriam os empregados públicos da Administração Direta (fls. 51/58), mas tão somente de empresas públicas e sociedades de economia mista, a Consultoria geral reavalia o tema em questão.

O Partido dos Trabalhadores, o Partido Democrático Trabalhista e o Partido Comunista do Brasil ingressaram com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade suscitando a inconstitucionalidade da nova redação do § 2º do art. 453[1] da Consolidação das Leis do Trabalho, decorrente da alteração promovida pela Medida Provisória n. 1.596-14/97, posteriormente convertida na Lei n. 9.528/97.

Nos termos do voto do Relator – Ministro Carlos Brito – o Supremo Tribunal Federal julgou procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1.721-3 e considerou inconstitucional o teor do § 2º do art. 453 da CLT, ou seja, considerou que a mera concessão de aposentadoria voluntária a empregado segurado do Regime Geral de Previdência Social não era hipótese de rescisão unilateral de contrato de trabalho como pretendia o texto normativo referido.

O argumento do Ministro Relator da ADI n. 1.721-3 para considerar inconstitucional a pretensão legislativa de encerrar o contrato de trabalho pela mera concessão de aposentadoria voluntária ao trabalhador segurado, sem que este ou seu empregador sequer avaliasse a hipótese, foi a constatação de que a mera opção pelo exercício de direito - atrelado ao fato deste direito impor ao ente previdenciário, e não ao seu empregador, o ônus pelo pagamento do benefício previdenciário - pudesse causar o mesmo prejuízo imposto ao empregado demitido por justa causa.

Além destes aspectos, o relator considerou que o texto constitucional vigente foi construído no sentido de o trabalho humano ser a base de uma ordem social justa, que propicia ao agente humano a dignidade, tendo, inclusive, expressamente o inciso IV do art. 1º da Constituição Federal de 1988, feito referência ao valor social do trabalho como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil.

Neste sentido, corroborando os apontamentos acima trazidos à reflexão, oportuno citar trechos do Ministro Relator da ADI n. 1.721-3:

[...] sobre a questão de fundo. [...] a Constituição de 1988 substituiu a garantia “absoluta” do emprego (estabilidade decenal de que trata o art. 492 da CLT) por outras modalidades de proteção: a) [...] hipóteses legais listadas em lei complementar; b) [...] majoração do custo das despedidas sem outra causa que não seja a vontade unilateral do empregador. [...]. Sucede que o novidadeiro § 2º do art. 453 da CLT, objeto da presente ADI, instituiu uma outra modalidade de extinção do vínculo de emprego. E o fez inteiramente à margem do cometimento da falta grave pelo empregado e até mesmo da vontade do empregador. [...] a Constituição versa a aposentadoria do trabalhador como um benefício. Não como um malefício. [...] é claro que esse exercício regular de um direito não é de colocar o seu titular em uma situação jurídica-passiva de efeitos ainda mais drásticos do que aqueles que resultariam do cometimento de uma falta grave. [...]. E também desatento para o fato de que o direito à aposentadoria previdenciária, uma vez objetivamente constituído, se dá [...] não às custas deste ou daquele empregador. [...] a cobertura financeira do benefício da aposentadoria passa se desenvolver do lado de fora da própria relação empregatícia [...]. Nada impede, óbvio, que uma vez concedida a aposentadoria voluntária, possa o trabalhador ser despedido. Mas, acontece que, em tal circunstância, deverá o patrão arcar com todos os efeitos legais e patrimoniais que são próprios da extinção de um contrato de trabalho sem justa motivação. (Grifo nosso)

 

Da leitura do voto acima transcrito, ainda podemos destacar que a declaração de inconstitucionalidade do § 2º do art. 453 da CLT não implica em tornar eterna a relação de emprego existente entre o trabalhador e o seu empregador, ou de penalizar este na hipótese de optar por encerrar o contrato de trabalho após a aposentadoria voluntária de seu empregado.

A rescisão unilateral do contrato de trabalho pelo empregador sem uma justa causa - destaca o relator da ADI n. 1.721-3 - é possível, desde que assumida pelo empregador as responsabilidades decorrentes desta despedida apontada pela lei como arbitrária - já que não houve uma justa causa -, ou seja, terá o empregador de arcar com as verbas rescisórias legais e o pagamento da multa de 40% que tem por base cálculo o valor depositado a título de Fundo de Garantia por Tempo de Serviço na conta vinculada do empregado no lapso temporal da relação de trabalho que se está encerrando.

Portanto, constata-se que para o empregador a principal consequência da declaração de inconstitucionalidade do § 2º do art. 453 da CLT, será a manutenção do dever ao pagamento da multa - no importe de 40% sobre os valores que depositou na conta vinculada de seu empregado no decorrer da contratualidade -, caso opte por encerrar o contrato laboral de seu empregado em virtude da mera obtenção de aposentadoria deste, salvo se o empregado optar por rescindir o contrato laboral.  

Por sua vez, cabe registrar que os votos proferidos pelos ministros presentes na sessão de julgamento da ADI n. 1.721-3, ressalvada a improcedência defendida pelo ministro Marco Aurélio - e destacando que o único membro do STF ausente foi a Ministra Carmem Lúcia – foi no sentido de acompanhar o voto do Relator.

 

 

2.c) Da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1.770-4

 

 

O Partido Democrático Trabalhista e o Partido Comunista do Brasil propuseram uma segunda Ação Direta de Inconstitucionalidade contra a Lei n. 9.528/97, suscitando, entre outros apontamentos, que o § 1º do art. 453 da CLT também restaria inconstitucional, na medida em que permitiria concluir que a aposentadoria de empregado de empresas públicas e sociedades de economia mista teriam seus contratos rescindidos pela concessão de aposentadorias.

Ao avaliar o teor da ADI 1.770-4, em especial o teor do texto do § 1º do art. 453[2] da CLT, o Ministro Relator Joaquim Barbosa fez expressa referência ao julgamento da ADI 1.721-3, suscitando que em simetria ao julgado pela Corte na ADI referida, a ADI 1.770-4 apresentava impugnação plausível, posto que, ao permitir a recontratação de empregados aposentados das empresas estatais, o legislador presumiu a rescisão automática do contrato existente entre as citadas partes em decorrência da mera concessão de aposentadoria.

Portanto, mesmo se tratando de empregados públicos de empresas estatais, cujo ingresso no emprego público se opera pela aprovação em concurso público, concluiu o Supremo Tribunal Federal que a mera concessão de aposentadoria não pode ser justa causa de extinção do vínculo de emprego em discussão, ou seja, em simetria ao que ocorre na esfera privada, as empresas estatais teriam o ônus de pagar a multa de 40% sobre o valor depositado a título de FGTS, na hipótese de rescindir contratos de trabalho de empregados aposentados pelo RGPS (art. 173, § 2º da CF).

Além da questão de fundo, o ministro relator apontou a inconstitucionalidade do § 1º do art. 453 da CLT por permitir que o empregado público das estatais pudesse cumular proventos do benefício previdenciário com vencimentos da atividade, hipótese, destacou o relator - ressalvadas as situações excepcionais elencadas pelo texto constitucional - revestida de inconstitucionalidade, conforme decisões reiteradas proferidas pelo STF desde o julgamento do Recurso Extraordinário n. 163.204 em 1994.

Por oportuno, traz-se ao corpo do presente parecer trechos do voto do Ministro Relator Joaquim Barbosa na ADI 1.770-4:

São dois os grupos de normas impugnadas. O primeiro refere-se ao art. 11, e parágrafos, da Lei 9.528/1997. O segundo refere-se ao § 1º do art. 453 da CLT, na redação dada pelo art. 3º da referida lei. [...]. Acompanhando a jurisprudência desta Corte, não conheço da ação direta quanto ao art. 11 e parágrafos. No que se refere ao § 1º do art. 453 da CLT, na nova redação, dada pelo art. 3º da Lei 9.528/1997, permito-me acompanhar a decisão proferida na fase cautelar, quando, também por unanimidade, considerou-se inconstitucional o dispositivo. [...] desde o julgamento do RE 163.204 (rel. min. Carlos Velloso), a Corte tem decidido, já depois do advento da Constituição de 1988, que é vedada a acumulação de proventos de aposentadoria com vencimentos, a não ser nos caso excepcionalmente previstos no art. 37, XVI e XVII, da Carta. É preciso lembrar que a rationale em que se baseou o Pleno partiu do pressuposto de que a vedação de acumulação também se aplica aos empregados de empresas públicas e sociedades de economia mista [...]. Vale lembrar que o entendimento do Tribunal foi confirmado com o advento da Emenda Constitucional nº 20 [...], sem contar os reiterados pronunciamentos da Casa no mesmo sentido [...]. Há, portanto, inconstitucionalidade na norma atacada, por permitir algo que esta Corte tem entendido que a Constituição veda: acumulação de proventos com vencimentos. [...]. Também se pode vislumbrar inconstitucionalidade no § 1º do art. 453, se se considerar, como considerou esta Corte no julgamento da ADI 1.721 [...] que a aposentadoria espontânea não rompe o vínculo empregatício. Na dicção da maioria da Corte naquele julgado, o § 2º do art. 453 da CLT - aplicado aos empregados da iniciativa privada – funda-se na ideia de que a aposentadoria espontânea rompe o vínculo empregatício, o que seria vedado pela Constituição de 1988, dado seu efeito de despedida arbitrária ou sem justa causa, sem indenização. Levando-se em conta também esta perspectiva, haveria inconstitucionalidade no § 1º do art. 453 da CLT, porquanto fundado nas mesmas premissas em que elaborado o § 2º do mesmo dispositivo: o de que a aposentadoria espontânea do empregado, no caso da empresa pública ou sociedade de economia mista gera o rompimento do vínculo empregatício, o que traz como consequência a despedida arbitrária ou sem justa causa, não tendo o empregado nenhum direito à indenização. Por essas razões, voto no sentido de confirmar o julgamento liminar, para não conhecer do pedido quanto ao art. 11, e parágrafos, da Lei 9.528/1997 e, conhecendo da ação quanto ao § 1º do art. 453 da CLT, na redação dada pelo art. 3º da mesma Lei 9.528/1997, declarar sua inconstitucionalidade. (Grifo nosso) 

 

Por sua vez, cabe destacar que ao tratar dos empregados públicos regidos pelo texto da CLT, o ministro relator do processo ADI 1.770-4 fez referência expressa a condição de empregados em empresas públicas e sociedades de economia mista, bem como, indicou que a ADI 1.721-3 teria tratado de empregados de iniciativa privada.

 

2.d) Dos desdobramentos das decisões proferidas pelo STF nas ADI’s 1.770-4 e 1.721-3

 

Em decorrência das decisões do STF nas Ações Diretas de Inconstitucionalidades n. 1.721-3 e n. 1.770-4, ingressou na referida Corte a Reclamação 5.215-0, proposta pela Associação dos Docentes das Faculdades de Tecnologia do CEETEPS – ADFATEC em defesa de empregados públicos de Autarquia que tiveram seus contratos de trabalho rescindidos após a concessão de aposentadorias.

Na ocasião, em que pese o mérito não ter sido tratado com ampla fundamentação por questões de ordem processual que implicaram no não recebimento da reclamação, o Ministro Relator Carlos Brito - em outrora Ministro Relator da ADI 1.721-3 - destacou que as decisões das ADIs 1.721-3 e 1.770-4 não eram aplicáveis ao caso tratado pela Reclamação 5.215-0, posto que os empregados representados eram de autarquias, portanto, as situações jurídicas tratadas eram diferentes.

Para evidenciar a questão, citam-se trechos do voto do Ministro Relator da Reclamação:

Cuida-se de reclamação, proposta pela Associação dos Docentes das Faculdades de Tecnologia do CEETEPS – ADFATEC, contra atos administrativos do Diretor Superintendente do Centro Estadual de Educação Tecnológica “Paula Souza”, do Secretário de Gestão Pública do Estado de São Paulo do Centro Estadual de Educação Tecnológica “Paula Souza” e do Governo do Estado de São Paulo. Atos, esses, que teriam contrariado as decisões proferidas, pelo Supremo Tribunal Federal, nas ADI´s 1.721 e 1.770. 2. A reclamante sustenta que, ao julgar as mencionadas ações, este Tribunal considerou inconstitucionais os §§ 1º e 2º do art. 453 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT. Aduz que o Supremo Tribunal entendeu ilegítimas as rescisões de contrato de trabalho sem justa causa, que se fundarem na aposentadoria voluntária do trabalhador. [...]. Ora bem, a situação jurídica dos representados pela reclamante é bem diversa da tratada pelos dispositivos legais objeto das ADI’s 1721 e 1770. [...] porque eles - os representados -  ocupavam empregos públicos em pessoas administrativas (autarquia) e não em empresas estatais, como referido pelo § 1º do artigo 453 da Consolidação das Leis do Trabalho. 12. Nessa ampla moldura, nego seguimento à reclamação, restando prejudicado o pedido de medida liminar.(Grifo nosso)

 

Cabe, portanto, destacar que embora o Supremo Tribunal Federal tenha negado seguimento a Reclamação 5.215-0, por questões de ordem processual relativas a representação processual, o Ministro Relator Carlos Brito expressamente apontou como situações jurídicas diferentes a questão dos empregados de empresas públicas e sociedades de economia mista e a dos empregados em autarquias, em que pese todos terem suas relações de trabalho regidas pela CLT .

Por sua vez, a Consultoria Geral do TCE-SC, ao pesquisar o teor dos julgados da matéria em debate nas instâncias judiciais de segundo grau, constatou que as rescisões/exonerações de empregados públicos aposentados pelo RGPS operacionalizadas de ofício pela Administração Direta municipal, na hipótese de regime de trabalho regido pela CLT, foram tidas por legais no âmbito dos Estados do Paraná e Santa Catarina.

Neste sentido:

APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO. ADMINISTRATIVO. SERVIDORA PÚBLICA MUNICIPAL. APOSENTADORIA VOLUNTÁRIA. EXONERAÇÃO REALIZADA DE OFÍCIO. SENTENÇA QUE DETERMINOU O RETORNO DA AUTORA AO CARGO. INATIVIDADE QUE TEVE SEU CÔMPUTO LASTREADO EM CONTRIBUIÇÕES RECOLHIDAS EM VIRTUDE DO SERVIÇO PÚBLICO QUE PRESTOU. IMPOSSIBILIDADE DE RETORNO A ESSA FUNÇÃO, ANTE A PROIBIÇÃO DE CUMULAÇÃ1O DE PROVENTOS DA INATIVIDADE COM O VENCIMENTO DO CARGO PÚBLICO DO QUAL SE APOSENTOU. PRECEDENTES DA CORTE. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO E REMESSA PROVIDOS.

Se o tempo de serviço e suas contribuições foram objeto de contagem para a aposentadoria obtida junto ao INSS, que no caso é o órgão previdenciário do Município, fica impossibilitada a percepção simultânea dos proventos da inatividade com o vencimento desse mesmo cargo público. [...] (TJSC. Apelação Cível n. 2011.045500-3, de Seara, rel. Des. Pedro Manoel Abreu, j. em 12-7-2011. Grifo nosso).

 

Do voto proferido pelo Desembargador Relator, oportuno trazer ao presente parecer os trechos que segue:

[...]

Trata-se de apelação cível interposta pelo Município de Guarujá do Sul contra sentença que determinou a reintegração da servidora Daili Massaia, exonerada em virtude de aposentadoria voluntária.

[...]

Em análise à jurisprudência desta Corte, verifica-se que é pacífico o entendimento segundo o qual se o servidor público utilizou o tempo de serviço na administração para obter a aposentadoria junto ao INSS, é inadimissível a sua permanência no cargo público, uma vez que estaria cumulando proventos da inatividade com o vencimento do mesmo cargo do qual se aposentou.

Tal posicionamento decorre da aplicação do § 10 do art. 37 da Constituição Federal que estabelece ser "vedada a percepção simultânea de proventos de aposentadoria decorrentes do art. 40 ou dos arts. 42 e 142 com a remuneração de cargo, emprego ou função pública, ressalvados os cargos acumuláveis na forma desta Constituição, os cargos eletivos e os cargos em comissão declarados em lei de livre nomeação e exoneração".

Neste sentido:

[...]

No âmbito privado, a aposentadoria espontânea do empregado não implica na extinção do contrato de trabalho (RE 463.629-8-RS, Min. Ellen Gracie), o que, entretanto, não se dá na área pública onde "a aposentadoria voluntária produz a imediata cessação do contrato de trabalho, de forma que, se o servidor público quiser permanecer no mesmo, ou ir para outro cargo, terá de fazer um concurso, de acordo com o art. 37, II, da CF/1988" (MS 4626/DF, rel. Min. Anselmo Santiago, j. 8.10.1997). [...] (Apelação Cível n. 2011.045500-3, de Seara, rel. Des. Pedro Manoel Abreu, j. em 12-7-2011) – grifou-se.

E, ainda:

ADMINISTRATIVO – PROFESSORA MUNICIPAL – APOSENTADORIA – EXONERAÇÃO – LEGALIDADE – IMPOSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DE PROVENTOS DE APOSENTADORIA COM A REMUNERAÇÃO DO CARGO.

Diferentemente do que ocorre no sistema trabalhista privado, quando o servidor público é aposentado rompe-se o vínculo dele com a administração pública em face da impossibilidade de acumulação dos proventos de aposentadoria com a remuneração do cargo (CF/88, art. 37, § 10) (Apelação Cível n. 2009.042083-8, de São Miguel do Oeste, rel. Des. Jaime Ramos, j. em 17-6-2010) – grifou-se.

[...]

Dessa forma, imperioso reconhecer a legalidade do ato administrativo que exonerou a servidora Daili Massaia.

[...]

Ante o exposto, a Quarta Câmara de Direito Público, por votação unânime, conheceu do recurso e da remessa e deu-lhes provimento. (Apelação Cível n. 2011.045500-3, de Seara, rel. Des. Pedro Manoel Abreu, j. em 12-7-2011. Grifo nosso).

 

O Tribunal de Justiça do Estado Paraná conclui a discussão no mesmo sentido do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catariana, conforme evidencia a citação a baixo:

WALDEMAR SOARES ingressou com ação sumária em face do MUNICÍPIO DE ASSAI alegando, em síntese, que em 29/05/1972 ingressou no serviço público municipal no cargo de auxiliar do departamento pessoal e em 29/11/2007 foi exonerado do cargo que ocupava em razão da concessão de sua aposentadoria por tempo de contribuição, de acordo com o Decreto Municipal nº 181/2007. Afirmou que requereu administrativamente perante o Apelado o reconhecimento de seu direito em permanecer no seu cargo público após a concessão da aposentadoria e que seu pedido fora indeferido. Argüiu a inconstitucionalidade do artigo 60, inciso V da Lei Municipal nº 490/1994 que dispunha sobre a vacância do cargo público em decorrência de aposentadoria. Alegou ainda a violação aos preceitos constitucionais e que o STF reconheceu a inconstitucionalidade do art. 453 da CLT que determinava como causa de rescisão do vínculo empregatício a aposentadoria do trabalhador, afirmando que o direito de trabalhar não se confundia com o direito aos benefícios previdenciários, os quais podiam ser reintegração do cargo que ocupava e, no mérito, a procedência do pedido.

[...]

O Ministério Público pronunciou-se pela improcedência da demanda, defendendo a validade e eficácia do ato administrativo que exonerou o Apelante da função que ocupava perante o Apelado, não existindo direito à reintegração ao cargo que exercia antes da concessão de sua aposentadoria. Após os trâmites legais, a MMª. Juíza proferiu a r. sentença de fls. 98/106, julgando totalmente improcedente o pedido inicial, extinguindo o processo com resolução de mérito, na forma do artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil, bem como condenando o autor ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios no valor de R$ 800,00, com observância das regras da Lei nº 1060/50. Inconformado com decisão monocrática o autor interpôs recurso de Apelação (fls. 109/123), reiterando a tese de inconstitucionalidade do artigo 60, V, da Lei Municipal nº 490/1999 e da nulidade do ato que determinou sua exoneração, bem como das demais razões aduzidas na petição inicial. Afirmou ainda que a ADIN 1721-3 do STF que autorizou a manutenção do emprego após a concessão de aposentadoria, aplicava-se ao presente caso em razão do Apelante se submeter ao regime geral da previdência social.

[...]

A controvérsia dos presentes autos restringe-se à possibilidade de cumulação dos proventos de aposentadoria com os vencimentos de cargo público na ativa, bem como a viabilidade de reintegração do autor ao cargo que ocupava antes da concessão de sua aposentadoria. A Constituição Federal ao regular as disposições gerais da Administração Pública, assim dispôs: "Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, ao seguinte: (...) públicos, exceto quando houver compatibilidade de horários, observado em qualquer caso o disposto no inciso XI: a) a de dois cargos de professor; b) a de um cargo de professor com outro, técnico ou científico; c) a de dois cargos ou empregos privativos de profissionais da saúde, com profissões regulamentadas." "Art. 40 - (...) §6º Ressalvadas as aposentadorias decorrentes dos cargos acumuláveis, na forma desta Constituição, é vedada a percepção de mais de uma aposentadoria à conta do regime de previdência previsto neste artigo. Segundo se depreende da interpretação dos artigos 37, inciso XVI e 40, §6º, da Constituição Federal, a cumulação de cargos, bem como a de proventos, somente é possível, desde que observada a compatibilidade de horários e a limitação ao teto salarial. E, referida cumulação, somente pode ser admitida nas situações excepcionais constitucionalmente previstas (entre dois cargos de professor; ou entre um cargo de professor com outro técnico ou científico; bem como entre dois cargos ou empregos privativos da área da saúde, com profissões regulamentadas).

[...]

Ou seja, a cumulação pretendida pelo Apelante não encontra respaldo nas normas constitucionais, uma vez que a regra é a de quanto em caso de aposentadoria. Pois bem, conforme defendido pela Apelada, bem como pelos representantes do Ministério Público em primeiro e segundo grau, o Apelante não se enquadra em nenhuma das situações excepcionalmente previstas para percepção de proventos da inatividade cumulada com a de um cargo na ativa. Além do mais, cabe ressaltar que o Apelante não argumentou e nem apresentou provas de que a concessão de sua aposentadoria teria se dado em razão de contribuições advindas de atividade laboral do setor privado, situação esta que deve ser descartada. Isto porque pelos fatos narrados nos autos, constata-se que o tempo de contribuição utilizado para a aposentadoria foi oriundo exclusivamente do período laboral que prestou perante a Apelada, não fazendo, portanto, jus à reintegração do cargo. Os precedentes do Superior Tribunal de Justiça corroboram o entendimento acima esposado: [...].

Assim, não existindo qualquer vício no art. 60 da Lei Municipal nº 490/94, bem como do Decreto que promoveu a exoneração do Apelante, legítimo o ato de desligamento do Apelante, não possuindo o mesmo qualquer direito à reintegração ao cargo público que exercia antes da concessão de sua aposentadoria e, por conseqüência lógica improcedente o pedido de danos materiais formulado na demanda. Estando a decisão recorrida em consonância com as regras legais e constitucionais aplicadas ao caso, e ainda seguindo a orientação da jurisprudência dominante do STJ e STF, bem como deste Tribunal de Justiça, o recurso deve ser improvido de plano. Ante o exposto, nego provimento ao recurso, com base no art. 557, caput, do Código de Processo Civil, mantendo-se a decisão monocrática em sua integralidade. Intimem-se. Curitiba, 02 de setembro de 2010. FERNANDO ANTONIO PRAZERES Juiz Relator Convocado (Tribunal de Justiça do Paraná. Apelação Cível 068842-6. Relator Fernando Antônio Prazeres. Revisor Dimas Ortêncio de Melo. Publicação DJ 468 em setembro de 2010. Grifo nosso)

 

 

Portanto, a celeuma sobre a possibilidade de a Administração Pública poder rescindir os contratos de trabalho dos empregados públicos que mantenham com a Administração Direta ou suas autarquias e fundações, em razão da concessão da aposentadoria pelo RGPS, envolve uma avaliação de todo um sistema normativo incidente sobre a relação de trabalho no setor público, transcendendo os dispositivos da área trabalhista privada.

Nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade n. 1721 e 1770 os relatores dos processos suscitaram fundamentos que conduzem o leitor a concluir que a avaliação do tema tinha por base contratos de emprego estabelecido entre empregados e empresas privadas ou empresas estatais.

Em nenhum momento os relatores dos processos fizeram referência a Administração Direta como empregadora.

Ainda, na Reclamação 5.215-0, em que pese por questões de ordem processual ter negado seguimento a reclamação, o Relator do Processo fez questão de pontuar que são distintas as relações jurídicas havidas entre empregados de autarquia e a Autarquia e empregados de estatais e as empresas públicas ou sociedade de economia mista, embora a CLT seja o instrumento legal que regule as referidas relações de emprego.

Por sua vez, embora o Supremo Tribunal Federal não tenha uma manifestação pontual e aprofundada sobre o tema que aborda a presente consulta, os Tribunais de Justiça dos Estados de Santa Catarina e do Paraná afastaram a possibilidade de continuidade do vínculo de emprego quando for a Administração Direta municipal a empregadora[3].

A impossibilidade de manter o pagamento de proventos e vencimentos é o fundamento mais destacado quando da avaliação da impossibilidade de manutenção do vínculo de emprego, uma vez que os proventos tiveram por origem uma relação de emprego público, emprego este cuja pretensão do servidor é manter após a concessão de sua aposentadoria.

O que se observa é que, no caso concreto, a opção pela aplicação dos dispositivos da Consolidação das Leis Trabalho aos servidores públicos acaba trazendo para Administração Pública um sistema híbrido de trabalho, pois normas peculiares do Direito Administrativo acabarão por mitigar a aplicabilidade de um instrumento jurídico elaborado para incidir no mercado de trabalho de empresas que atuam no mercado econômico. 

 

3. Da alteração de Prejulgados

 

No que se refere à sugestão emitida no parecer COG 761/08 (fls. 30/39) de reforma/revogação de prejulgados desta Corte de Contas, cabe pontuar que tal medida não seria indicada para análise no presente feito, haja vista que:

a)    Os prejulgados 502 e 650 tratam de aposentadoria espontânea de empregados públicos de empresas de economia mista.

b)    O prejulgado 780 trata de aposentadoria compulsória;

c)    Os prejulgados 1150 e 1154 tratam de aposentadoria pelo regime estatutário e cargos isolados;

d)    Os prejulgados 1206, 1326, 1385 e 1965 tratam da possibilidade da percepção simultânea de vencimentos com proventos na hipótese de regimes jurídicos distintos.

Desta forma, apesar de serem temas correlatos à aposentadoria espontânea, os prejulgados acima indicados extrapolam o objeto da consulta em exame, razão pela qual se sugere não ser objeto de análise neste processo.

Por fim, cabe registrar no presente parecer que o tema em debate é objeto de duas outras consultas em andamento nesta Corte de Contas, quais sejam CON09/00004550 (parecer COG n. 427/2011) e CON09/00499184.

 

 

4.  CONCLUSÃO

 

Considerando todos os aspectos que envolvem o tema proposto na consulta formulada pelo chefe do Poder Executivo do Município de Araranguá, em especial atenção a avaliação do teor dos votos que conduziram as decisões do Supremo Tribunal Federal nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade n. 1721 e 1770.

Considerando que embora não tenha o Supremo Tribunal Federal proferido uma decisão pormenorizada sobre a questão dos empregados públicos da Administração Direta, suas autarquias e fundações públicas, destacou no voto proferido na Reclamação n. 5.215-0 a diversidade de situação jurídica dos empregados públicos de empresas estatais e os empregados públicos de outras esferas da área pública.

Considerado as decisões julgadas pelo Poder Judiciário Catarinense e Paranaense expostas neste parecer.

Considerando que a disciplina legal aplicável aos empregados públicos da Administração Pública direta e de suas autarquias e fundações resta pontuada na Consolidação das Leis do Trabalho em concomitância com a observância dos princípios básicos incidentes sobre a Administração Pública.

Considerando que a Lei n. 8.036/90 em seu art. 18 § 1º onera o empregador ao pagamento de uma indenização pela despedida sem uma causa justa, no sentido de penalizar as despedidas arbitrárias efetuadas ao arrepio do fundamento Republicano do valor social do trabalho previsto na ordem constitucional vigente.

Considerando que a rescisão de contrato de trabalho de um empregado vinculado a Administração Pública direta ou suas autarquias e fundações após a obtenção de uma aposentadoria obtida pela decorrência deste contrato, seria uma causa razoável diante da impossibilidade de cumulação de proventos com vencimentos, afastando a hipótese de arbitrariedade na rescisão contratual.

 

A Consultoria Geral emite o presente Parecer no sentido de sugerir ao Corregedor Geral Salomão Ribas Junior, Conselheiro Relator deste processo, propor ao Egrégio Tribunal Pleno decidir por:

 

3.1. Conhecer parcialmente a presente Consulta, em que pese a ausência de parecer da assessoria jurídica da entidade consulente, por preencher os demais requisitos e formalidades preconizados nos arts. 103 e 104 do Regimento Interno (Resolução nº TC-06, de 28 de dezembro de 2001) do Tribunal de Contas.

          3.2. Responder à Consulta nos seguintes termos:

                    3.2.1. A aposentadoria voluntária dos servidores públicos municipais  da Administração Pública Direta regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho, extingue o contrato de trabalho, sendo indevido o pagamento da multa rescisória no importe de 40% sobre o FGTS, constituindo irregularidade a manutenção do vínculo de emprego sem nova aprovação em concurso público para o mesmo cargo em respeito ao disposto no art. 37, inciso II, da Constituição Federal.

                    3.2.2. Ao servidor celetista da Administração Pública Direta, aposentado pelo Regime Geral da Previdência Social, caso aprovado por novo concurso público, se aplicam as regras da acumulação remunerada de cargos públicos previstas no art. 37, inciso XVI e XVII da Constituição Federal.

          3.3. Dar ciência da Decisão, do Relatório e Voto do Relator e do Parecer da Consultoria Geral ao Sr. Mariano Mazzuco Neto, à Prefeitura Municipal de Araranguá.

 

Consultoria Geral, em 27 de fevereiro de 2012.

 

 FABÍOLA SCHMITT ZENKER

AUDITORA FISCAL DE CONTROLE EXTERNO

 

De acordo:

 

 VALERIA ROCHA LACERDA GRUENFELD

COORDENADORA

 

Encaminhem-se os Autos à elevada consideração do Exmo. Sr. Relator Corregedor Geral Salomão Ribas Junior, ouvido preliminarmente o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas.

 

 HAMILTON HOBUS HOEMKE

CONSULTOR GERAL



[1] § 2º do art. 453 da CLT: “O ato de concessão de benefício de aposentadoria a empregado que não tiver completado 35 (trinta e cinco) anos de serviço, se homem, ou trinta, se mulher, importa em extinção do vínculo empregatício.”

 

[2] § 1º do art. 453 da CLT: “Na aposentadoria espontânea de empregados das empresas públicas e sociedades de economia mista é permitida sua readmissão desde que atendidos aos requisitos constantes do art. 37, inciso XVI, da Constituição, e condicionada à prestação de concurso público.”

 

[3] No âmbito do Tribunal de Contas, vigorava o entendimento consolidado nos prejulgados 559, 639, 658, 1150 (item 2), 1346 e 1559, segundo o qual a aposentadoria espontânea, tanto para cargos quanto para empregos públicos,  extinguia o contrato de trabalho, sendo obrigatório novo concurso público do servidor/empregado público para sua permanência na Administração Pública. Referidos prejulgados foram revogados pela Decisão nº 2394/2008 emitida no processo PAD nº 07/00024875 e Decisão nº 220/2007 proferida no processo RPJ 05/04038850 em razão do entendimento de que a ADI nº 1721 e ADI nº 1770 se aplicavam aos empregados públicos da Administração Direta.