PROCESSO
Nº: |
@CON-12/00258760 |
UNIDADE
GESTORA: |
Câmara Municipal de Ponte Serrada |
INTERESSADO: |
Jurandir de Souza Bueno |
ASSUNTO:
|
Prazo para o envio dos balancetes mensais
do Poder Executivo ao Poder Legislativo |
PARECER
Nº: |
COG - 889/2012 |
Município. Poder
Executivo. Remessa de balancetes mensais e documentos ao Poder Legislativo.
Exegese da Lei Orgânica à vista dos princípios constitucionais.
A prestação de contas dos Prefeitos deve ser anual e
encaminhada ao Tribunal de Contas do Estado, órgão que auxilia o exercício do
controle externo pela Câmara Municipal, até o dia 28 de fevereiro do exercício
seguinte, a teor do art. 113 da Constituição do Estado e dos artigos 50 e 51
da Lei Complementar Estadual nº 202/2000.
Sr. Consultor,
1. INTRODUÇÃO
Trata-se de consulta
subscrita pelo Sr. Jurandir de Souza Bueno, Presidente da Câmara de Vereadores
de Ponte Serrada, expressa, em síntese, nos seguintes termos:
[...]
Ocorre que conforme a
Lei Orgânica do Município, em seus artigos 50 a 53 (cópia anexa), a Câmara
entende que deve seguir o art. 53, § 1º, já o Poder Executivo, atualmente está
se baseando no art. 50, § 1º, o que inviabiliza os vereadores de acompanharem
mensalmente a prestação de contas, conforme vinha ocorrendo desde 1958.
Frente a esta
situação, gostaríamos que nos fosse informado qual o prazo que o Poder
Executivo deve encaminhar a esta Casa os balancetes mensais.
[...]
Este, o relatório.
2. PRELIMINARES
O consulente, na
condição de Presidente da Câmara Municipal de Ponte Serrada, possui plena
legitimidade para encaminhar consulta a este Tribunal a teor do art. 103, II,
do Regimento Interno desta Corte (Resolução TC-06/2001).
Analisando a pertinência
da matéria envolta no questionamento suscitado, a mesma encontra guarida no
inciso XII do art. 59 da Constituição do Estado de Santa Catarina, bem como no
inciso XV do art. 1º da Lei Complementar nº 202/2000.
Observa-se ainda, que
o expediente consultivo não veio instruído com parecer da assessoria jurídica
da Câmara referenciada, conforme preceitua
o inciso V do art. 104, do Regimento Interno, contudo, o Tribunal Pleno
poderá conhecer de consulta que não atenda a esta formalidade, conforme autoriza
o parágrafo 2º do art. 105, Regimental, cabendo esse discernimento ao relator e
aos demais julgadores.
3. MÉRITO
Conforme
já verificado na introdução deste parecer, a autoridade consulente deseja
esclarecimentos acerca do prazo que o Poder Executivo deve encaminhar ao
Legislativo, a respectiva prestação de contas acompanhadas de cópias das notas
de empenhos, notas fiscais e dos balancetes mensais, fazendo citar os seguintes
comandos da Lei Orgânica do Município:
Art.
50 – O controle externo da Câmara Municipal
será exercido com auxílio do Tribunal de Contas do Estado de Santa
Catarina através de parecer prévio sobre as contas que o Prefeito e a Mesa da
Câmara deverão prestar anualmente.
§ 1º
- As contas deverão ser apresentadas até
noventa dias do encerramento do exercício financeiro.
[...]
Art.
53 – Os Poderes Legislativo e Executivo manterão de forma integrada, sistema de
controle interno, com a finalidade de:
[...]
§1º
- As prestações mensais do Executivo
ao Legislativo serão acompanhadas de via dos empenhos e segunda via ou
fotocópia da nota fiscal, ou comprovante de pagamento correspondente, das
despesas efetuadas.
No
que se refere aos Municípios e à sua fiscalização contábil, financeira,
orçamentária, operacional e patrimonial, vejamos o que dispõe a Constituição Federal:
Art.
29 – O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o
interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da
Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta
Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos:
[...]
Art.
31 – A fiscalização do Município será exercida pelo Poder Legislativo
Municipal, mediante controle externo, e pelos sistemas de controle interno do
Poder Executivo Municipal, na forma da lei;
§ 1º
- O controle externo da Câmara Municipal
será exercido com o auxílio dos Tribunal de Contas dos Estados ou do Município
ou dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios, onde houver.
Por
seu turno, a Constituição do Estado de Santa Catarina estabelece:
Art.
111 – O Município rege-se por lei orgânica, votada em dois turnos, com o
interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da
Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos na
Constituição Federal e nesta Constituição, e os seguintes preceitos:
[...]
Art.
113 – A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e
patrimonial dos órgãos ou entidades da administração pública municipal, quanto
a legalidade, a legitimidade, a economicidade, a aplicação das subvenções e a
renúncia de receitas, é exercida:
I - pela Câmara Municipal, mediante controle
externo;
II - pelos sistemas de controle interno do Poder
Executivo Municipal.
§ 1º
- O controle externo da Câmara Municipal é exercido com o auxílio do Tribunal
de Contas, observado, no que couber e nos termos da lei complementar, o
disposto nos arts. 58 a 62.
No
âmbito da Lei Orgânica do Tribunal de Contas, temos:
Art.
50 – O Tribunal de Contas do Estado apreciará as contas prestadas anualmente
pelo Prefeito, as quais serão anexadas às do Poder Legislativo, mediante
parecer prévio a ser elaborado antes do encerramento do exercício em que foram
prestadas.
Art.
51 – A prestação de contas de que trata o artigo anterior será encaminhada ao
Tribunal de Contas até o dia 28 de fevereiro do exercício seguinte, e
consistirá no Balanço Geral do Município e no relatório do órgão central do
sistema de controle interno do Poder Executivo sobre a execução dos orçamentos
de que trata o art. 120, 4º, da Constituição Estadual.
Dentre
os dispositivos da Carta Estadual, o art. 59 estatui que o controle externo, a
cargo da Assembléia Legislativa, será exercido com o auxílio do Tribunal de
Contas do Estado, ao qual tem entre uma das suas competências, apreciar as
contas prestadas anualmente pelo Governador, as quais serão anexadas as dos
Poderes Legislativo e Judiciário, do Ministério Público e do Tribunal de
Contas, mediante parecer prévio que deverá ser elaborado em sessenta dias a
contar de seu recebimento.
Maria
Sylvia Zanella de Pietro [1]
assim leciona:
O
controle que o Poder Legislativo exerce sobre a Administração Pública tem que
se limitar às hipóteses previstas na Constituição Federal, uma vez que implica
interferência de um Poder nas atribuições dos outros dois.
É
ainda de sua lição [2]
que:
Não
podem as legislações complementar ou ordinária e as Constituições estaduais
prever outras modalidades de controle que não as constantes da Constituição
Federal, sob pena de ofensa ao princípio da separação de Poderes; o controle
constitui exceção a esse princípio, não podendo ser ampliado fora do âmbito
constitucional.
A
Constituição da República, em seus artigos 70 e seguintes [3],
disciplina a fiscalização contábil, financeira e orçamentária no âmbito não
apenas da União, mas também na esfera dos demais entes estatais, dentre os
quais os Municípios, tendo em vista o disposto no art. 75 [4],
que está diretamente associado ao princípio da simetria como o centro.
De
outro lado, prevê o art. 29, inciso XI, da Carta Magna federal, que os
Municípios reger-se-ão por lei orgânica, que tratará, dentre outras matérias,
da organização das funções legislativas e fiscalizadoras da Câmara de Vereadores,
atendidos os princípios estabelecidos na Constituição.
Demonstra-se
a lição do eminente professor municipalista José Nilo de Castro [5]:
Detém
o Poder Legislativo Municipal a função fundamental de fiscalização contábil,
financeira, orçamentária, operacional e patrimonial do Município. Assim reza o
art. 31 da Constituição da República: a fiscalização do Município será exercida
pelo Poder Legislativo Municipal, mediante controle externo, e pelos sistemas
de controle interno do Poder Executivo Municipal, na forma da lei, isto na
forma da Lei Federal nº 4.320/64, cujos artigos 76 a 80 disciplinam, à
saciedade, o controle interno da Administração Municipal.
A
propósito, colaciona-se dispositivo da Lei nº 4.320/64:
Art.
82 – O Poder Executivo, anualmente, prestará contas ao Poder Legislativo, no
prazo estabelecido nas Constituições ou nas Leis Orgânicas dos Municípios.
§ 1º
- As contas do Poder Executivo serão submetidas ao Poder Legislativo, com
Parecer prévio do Tribunal de Contas ou órgão equivalente.
E
prossegue o ilustre autor [6]:
Indiscutivelmente,
quanto ao tempo, as prestações de contas ou tomadas de contas serão: a) anuais,
as que se realizam por ocasião do encerramento do exercício financeiro; b) no
fim de gestão, na transmissão de cargos de Prefeito; c) em outras épocas, desde
que se julgue necessário, ocorrendo a tomada de contas, independentemente da
prestação de contas, isto é, sem prejuízo dessas.
Vejamos
a opinião do Prof. e Conselheiro do Tribunal de Contas do Rio Grande do Sul,
Helio Saul Mileski [7]:
O
controle exercido pelo Poder Legislativo é essencialmente de natureza política,
mas também ocorre no aspecto financeiro. De acordo com a clássica tripartição
dos Poderes realizada por Montesquieu e adotada pelo Estado Brasileiro, a cada
poder foi designada uma função – Executiva. Legislativa e Judiciária -, e eles
devem conviver em harmonia, limitando-se reciprocamente, mas sem ser
absolutamente separados e sem paralisar uns aos outros, no sentido de que a unidade do poder do Estado não se rompa por
tal circunstância.
Portanto,
no regime constitucional da separação dos Poderes há o controle do poder pelo
poder, mas com o dever de ser salvaguardada e respeitada a independência de
cada um, tendo-se em conta a harmonia que deve existir na atuação funcional dos
Poderes do Estado.
De
acordo com o exercício dessas funções, guardando a independência e a harmonia
entre os Poderes, é que o Legislativo procede ao seu controle sobre a
Administração Pública, com o mesmo sendo exercido nos termos do delimitado pela
Constituição Federal, uma vez que o mesmo resulta em interferência de um Poder
nas atribuições de outro.
São
exemplos de controle político e financeiro exercido pelo Poder Legislativo:
proceder à sustação de atos e contratos do Executivo; realizar convocação de
Ministros e requerimentos de informações, queixas e representações dos
administrados e convocação de qualquer autoridade ou pessoa para depor;
instalar Comissões Parlamentares de Inquérito para apurar irregularidades;
proceder ao julgamento das contas do Chefe do Poder Executivo; substituir ou
destituir (impeachment) o Presidente ou os Ministros; exercer o controle
externo da Administração Pública direta e indireta, com o auxílio do Tribunal
de Contas.
Salientadas
a legislação e a doutrina, importante citar orientação judiciária e, para o
caso, fazemos constar entendimento da Corte Superior de Minas Gerais, por
ocasião de apreciação de ações envolvendo Leis Orgânicas de alguns municípios
mineiros:
ADI
172670-2/00
Relator:
Des. Hugo Bengstsson
Comarca
de Bambuí
Representante:
Prefeito Municipal de Bom Repouso
Representada;
Câmara Municipal de Bom Repouso
Julgamento:
09/03/2001
EMENTA:
Inconstitucionalidade – Ação Direta – Lei Orgânica Municipal – Convênios –
Aprovação de contas pelo decurso de prazo – Balancetes mensais – Violação aos
princípios da harmonia e independência dos poderes – Procedência do pedido
Em
seu voto, o ilustre Relator, Des. Hugo Bengtsson, fez uma amplo arrazoado sobre
o tópico em debate:
Por
outro lado, não resta dúvida de que, pelo que dispõem os arts. 172 e 173, da
Carta Mineira, a Lei Orgânica Municipal
deverá observar os princípios norteadores contidos nas Constituição Federal e
Estadual, sendo que os poderes se manterão independentes e harmônicos entre si.
(grifamos)
Já
por imposição das determinações contidas no art. 176:
“Compete,
privativamente, à Câmara Municipal, no que couber, o exercício das atribuições
enumeradas no art. 62”.
Assim
é que:
“Art.
62 – Compete privativamente à Assembléia Legislativa:
XIX
– proceder à tomada de contas do Governador do Estado não apresentadas dentro
de sessenta dias da abertura da sessão legislativa.
XX –
Julgar, anualmente, as contas prestadas pelo Governador do Estado, e apreciar
os relatórios sobre execução de planos de governo”.
E o
controle externo, de competência da Câmara Municipal, será exercido, como
cediço, com o auxílio do Tribunal de Contas do Estado (art. 31, § 1º da CR).
[...]
Assim,
a fiscalização da Câmara Municipal sobre as contas do Prefeito é exercida após
parecer prévio do Tribunal de Contas, nos termos do art. 180 da Constituição
Estadual.
Deste
modo, também não podem subsistir as disposições legais que exigem contas
mensais dos Prefeitos, muito menos aquelas outras que permitem sua aprovação ou
rejeição por mero decurso de prazo, de acordo com a conclusão do parecer do
Tribunal de Contas do Estado, haja vista que as contas, por força do preceito
da Lei Maior, a tempo e modo, devem ser efetivamente julgadas pela Câmara
Municipal.
Em
conclusão, pelo que ressai dos autos, no caso, o legislador municipal,
realmente ultrapassou os limites de sua competência, quer ditando regras para a
prática de atos típicos da Administração Municipal, quer criando procedimentos
incompatíveis com os preceitos constitucionais elencados na peça de ingresso.
Com
estas razões de decidir, julgo procedente o pedido, para declarar a
inconstitucionalidade de todos os trechos transcritos e destacados, ao se
acolher, em substância, o lúcido parecer da Procuradora de Justiça, Dra. Hilda
Maria Porto de Paula Teixeira da Costa.
ADI
nº 000.246.576-3/00, ajuizada pelo Prefeito do Município de Alpinópolis – Des.
Relator: Isalino Lisboa
EMENTA:
Lei Orgânica Municipal. Aprovação de Contas pelo decurso de prazo. Exigência de
envio de balancetes mensais pelo Prefeito à Câmara Municipal. Violação aos
princípios da harmonia e independência dos Poderes. Procedência do pedido.
Foi
esse o entendimento do Exmo. Des. Relator Isalino Lisboa da ADI acima referida:
O
artigo 172, do mesmo Diploma Constitucional, é cristalino ao consignar que a Lei Orgânica observará os princípios
da Constituição da República e os da Carta Mineira, revelando-se incabível
àquela legislação municipal considerar julgadas as contas, se não houver
deliberação dentro do prazo.
(...)
Inadmissível,
pois, o julgamento das contas pela expiração do prazo, na medida em que impede
a efetiva fiscalização do Executivo Municipal pelo Poder Legislativo.
Lado outro, também não podem subsistir
as disposições legais que exigem contas mensais do Prefeito e estabelecem
sanções pelo descumprimento de tal exigência, sob pena de flagrante violação ao
princípio da harmonia e independência dos poderes, insculpido no artigo 173, da
Carta Mineira. (grifamos)
ADI
Nº 1.0000.00.341871-2/000 – Requerente: Prefeito Municipal de Conceição da
Aparecida. Requerido: Câmara Municipal de Conceição da Aparecida. Relator:
Desembargador Corrêa de Marins
EMENTA:
Ação direta de inconstitucionalidade. Município de Conceição da Aparecida.
Aprovação de lei complementar. Câmara Municipal. Controle externo.
É
inconstitucional o dispositivo da Lei Orgânica do Município que exige para o
voto favorável de 2/3 dos membros da Câmara Municipal para aprovação de lei
complementar, quando a Constituição Estadual determina que tal aprovação se dê
pelo voto favorável da maioria dos membros. Ofende ao princípio da harmonia e independência dos poderes o
dispositivo da LOM que amplia o poder de fiscalização da Câmara, ao exigir o
envio dos balancetes contábeis e orçamentários no prazo ali estipulado, bem
como aquele que considera julgadas as contas nos termos das conclusões do
parecer prévio do Tribunal de Contas, caso não haja deliberação no prazo de 60
dias. Procedência da representação. (grifamos)
É do
voto do Sr. Relator, que se extrai a seguinte lição:
Resultam
igualmente inconstitucionais aqueles dispositivos da Lei Municipal que suprimem
atividade fiscalizadora da Câmara, como faz o § 2º do art. 75, ora impugnado, ou o amplia demasiadamente, a exemplo do
que acontece com o art. 88, XII, da Lei Orgânica do Município de Conceição da
Aparecida, porque ofendem ao princípio da harmonia e independência dos poderes,
consagrados pelo constituinte estadual nos artigos 6º e 173, § 1º.
É
que a Câmara Municipal exerce a função fiscalizadora através do controle
externo, com o auxílio do Tribunal de Contas. Desta forma não lhe é lícito
abrir mão de sua incumbência constitucional de julgar as contas anualmente
prestadas pelo Prefeito, após o parecer do Tribunal de Contas, como igualmente ilícito é ultrapassar tais
limites, por meio de controle prévio, exigindo o envio, pelo Prefeito, de
balancetes contábeis e orçamentários, acompanhados de cópias de documentos em
prazo estipulado. (grifamos)
ADI
Nº 1.0000.05.419913-8/000 – Requerente: Prefeito do Município de Carmo do Rio
Claro – Requerido: Presidente da Câmara Municipal – Relator: Des. Gudesteu
Biber
EMENTA:
Ação direta de inconstitucionalidade – lei municipal que obriga o Prefeito a
prestar contas mensalmente à Câmara de Vereadores e trata de infrações
político-administrativas do Prefeito – Presença do “fumus boni iuris” e do
“periculum in mora” ensejadores da concessão da liminar – Liminar concedida
para suspender, em caráter provisório, a eficácia do art. 81, § 5º, do art. 88,
inciso XLVII, e do art. 99, da Lei Orgânica do Município de Carmo do Rio Claro
e da Lei 1.656/03 daquele mesmo Município, prejudicado o agravo regimental.
O
Desembargador Relator da ADI, trilhou na mesma linha de pensamento dos
relatores anteriores já citados. Confira-se:
Entende
presente, em tese, o requisito do “fumus boni iuris”, posto que a Câmara de
Vereadores, ao promulgar a Lei Orgânica Municipal, impôs ao Chefe do Poder
Executivo obrigação de prestar contas, mensalmente ao Poder Legislativo, quando se sabe que a prestação de contas é
sempre anual e após parecer técnico do Tribunal de Contas, para onde elas são
inicialmente remetidas.
Com
relação ao disposto no inciso XII, do art. 88, contendo infração
político-administrativa do Prefeito, tem-se que o colendo STF, desde os idos de
1989, já firmava que a nova Carta Magna recepcionou o disposto do Dec. Lei
201/67, inclusive o ser art. 4º e seguintes.
[...]
Por
essa razão, concedo a liminar pleiteada
para, “ad referendum” da egrégia Corte Superior, suspender, em caráter provisório,
a eficácia dos arts. 81, § 5º, 88, XII, 99, XLVI, todos da Lei Orgânica do
Município de Carmo do Rio Claro, bem como o disposto na Lei 1.656/03,
daquele mesmo município.
[...]
Não
vejo como prosperar o recurso, aliás, desnecessário, porque dirigido ao mesmo
órgão que, reapreciando a matéria decidida, poderá ou não ratificar a liminar.
Se
esta Corte Superior ratificar a liminar, ‘tollitur quaestio”, perdendo o
recurso seu objeto, e ficando prejudicado. Se a Corte Superior negar
ratificação, faltará sucumbência à recorrente e seu recurso também ficará sem
objeto, prejudicado, portanto.
Se a
decisão monocrática, concessiva de liminar, necessita ratificação do colegiado,
ela só produzirá efeitos definitivos após a ratificação. Antes, só produzirá
efeitos em caráter provisório, como aliás, dela consta.
Cumpre salientar que os dispositivos
aqui atacados de inconstitucionalidade já foram examinados centenas de vezes
nesta Corte, em processos de outras comarcas, e todos foram julgados
inconstitucionais. Não explicitei tal circunstância no despacho para se evitar
prejulgamento da causa em discussão.
Assim, meu voto é no sentido de se
ratificar a liminar, ficando prejudicado o recurso de agravo regimental.
(grifo do original)
Efetivamente,
observa-se que, a matéria então constante das Leis Orgânicas de alguns
municípios do Estado de Minas Gerais, foi julgada inconstitucional pelo
Tribunal de Justiça mineiro e, daí em diante, os Prefeitos deixaram de remeter
os balancetes mensais e a documentação já referida às Câmaras Municipais.
No
caso em exame, a Lei Orgânica do Município de Ponte Serrada, ao determinar, em
seu art. 53, § 1º, a remessa mensal à Edilidade de prestação de contas, notas
de empenho, cópias de notas fiscais ou comprovante de pagamento das despesas
efetuadas, extrapolou os limites constitucionais, pois passou a impor ao
Executivo local uma verdadeira obrigação de prestação de contas mensal, ao
passo que tal prestação, que se dá para fins de controle externo, é feita com o
auxílio do Tribunal de Contas, anualmente,
a teor do art. 31 da CF [8]
e art. 113, da Constituição Estadual, anteriormente citado.
Portanto,
não é admissível, como função fiscalizadora legítima do Poder Legislativo
Municipal, a criação de mecanismos outros de controle, não admitidos pela Ordem
Constitucional.
De
outro norte, poderia ser questionado que diante da Lei Complementar nº 131, de
27 de maio de 2009, que alterou os artigos 48 e 73 a Lei Complementar nº
101/2000 (LRF), bem como a Lei Federal nº 12.527/2011, em vigor desde 16 de
maio de 2012, conhecida como Lei de Acesso à Informação, o Poder Executivo deveria
divulgar os documentos de que tratam o art. 53 § 1º, da Lei Orgânica do
Município ou até mesmo abrangeria a obrigatoriedade da prestação de contas mensal
ao Poder Legislativo prevista no mencionado dispositivo da lei municipal.
Diante
disto, a seguir será realizada uma breve análise sobre as mencionadas
legislações.
Segundo
o art. 48 da LRF, os órgãos públicos deverão dar ampla divulgação, inclusive em
meios eletrônicos[9],
dentre outros instrumentos qualificados como de “transparência de gestão
fiscal”, das prestações de contas e o respectivo parecer prévio, nos seguintes
termos:
Art.
48. São instrumentos de transparência da gestão fiscal, aos quais será
dada ampla divulgação, inclusive em meios eletrônicos de acesso público: os
planos, orçamentos e leis de diretrizes orçamentárias; as prestações de contas
e o respectivo parecer prévio; o Relatório Resumido da Execução Orçamentária e
o Relatório de Gestão Fiscal; e as versões simplificadas desses documentos.
Parágrafo único. A transparência
ser assegurada também mediante: (Redação dada pela
Lei Complementar nº 131, de 2009).
I – incentivo à participação popular e realização de audiências públicas,
durante os processos de elaboração e discussão dos planos, lei de diretrizes
orçamentárias e orçamentos; (Incluído pela Lei
Complementar nº 131, de 2009).
II – liberação ao pleno conhecimento e acompanhamento da
sociedade, em tempo real, de informações pormenorizadas sobre a execução
orçamentária e financeira, em meios eletrônicos de acesso público; (Incluído pela Lei
Complementar nº 131, de 2009).
III – adoção de sistema integrado de administração financeira e controle, que atenda a padrão mínimo de qualidade estabelecido pelo Poder Executivo da União e ao disposto no art. 48-A. ((Incluído pela Lei Complementar nº 131, de 2009).
Ainda
de acordo com a LRF, precisamente o art. 48-A, com a redação dada pela LC
131/09, os Entes da Federação estão obrigados a publicar nos meios eletrônicos
de acesso público[10],
a respectiva execução orçamentária e financeira, o que compreende, no que tange
à despesa, a publicação de “todos os
atos praticados pelas unidades gestoras no decorrer da execução da despesa, no
momento de sua realização, com a disponibilização mínima dos dados referentes
ao número do correspondente processo, ao bem fornecido ou ao serviço prestado,
à pessoa física ou jurídica beneficiária do pagamento e, quando for o caso, ao
procedimento licitatório realizado”[11].
Destaca-se
que a obrigatoriedade de publicação na internet dos instrumentos de
transparência da gestão fiscal contemplados nos artigos 48 (incisos II e III do
parágrafo único) e 48-A da LRF,
abrangerá todos os municípios a partir
do mês de maio de 2013, pois o art. 73-B[12]
conferiu prazo aos municípios para adequação às mencionadas determinações,
sendo o maior prazo concedido aos municípios com população até 50.000
habitantes de 4 anos, o qual expirará na citada data[13].
No
que se refere à Lei Federal nº 12.527/2011, ela inovou o ordenamento jurídico regulamentando,
em suma, o direito fundamental de todos previsto no art. 5º, XXXIII, da
Constituição Federal (CF) de solicitar aos órgãos públicos informações de seu interesse
particular, coletivo ou geral, o direito inserto no art. 37, § 3º, II, da CF de
acesso dos usuários da Administração Pública aos registros administrativos e
informações sobre atos do governo, bem como regula o art. 216 § 2º, da CF, o
qual dispõe sobre a gestão da documentação governamental e as providências para
franquear sua consulta a quantos dela necessite.
Especificamente
sobre o tema em debate, a Lei Federal 12.527/2011 dispôs que o registro das
despesas dos órgãos públicos deve estar publicado em local de fácil acesso
independentemente de solicitação, devendo constar nos sites oficiais dos Municípios com população superior a dez mil habitantes.
No
seu art. 7º, a Lei Federal nº 12.527/2011 esclarece, por meio de rol
exemplificativo, quais as informações
que devem ser fornecidas pelos órgãos públicos, conforme segue:
Art. 7o
O acesso à informação de que trata esta Lei compreende, entre outros, os
direitos de obter:
I -
orientação sobre os procedimentos para a consecução de acesso, bem como sobre o
local onde poderá ser encontrada ou obtida a informação almejada;
II - informação
contida em registros ou documentos, produzidos ou acumulados por seus órgãos ou
entidades, recolhidos ou não a arquivos públicos;
III -
informação produzida ou custodiada por pessoa física ou entidade privada
decorrente de qualquer vínculo com seus órgãos ou entidades, mesmo que esse
vínculo já tenha cessado;
IV -
informação primária, íntegra, autêntica e atualizada;
V -
informação sobre atividades exercidas pelos órgãos e entidades, inclusive as
relativas à sua política, organização e serviços;
VI -
informação pertinente à administração do patrimônio público, utilização de
recursos públicos, licitação, contratos administrativos; e
[...]
Desta
forma, os documentos previstos no art. 53, § 1º da Lei Orgânica Municipal, quais sejam, os “empenhos” e as
correspondentes “notas fiscais” ou o
“comprovante de pagamento” das despesas efetuadas, devem ser disponibilizados
independentemente de requerimento não apenas pelo Poder Executivo mas como
também por todos os Entes da Federação, conforme determinam as legislações
federais acima citadas.
Da
mesma maneira, a prestação de contas, bem como os pareceres prévios, também deverão
ser disponibilizados na internet pelo
Entes.
Contudo,
a obrigatoriedade de divulgação da prestação de contas pelos órgãos
públicos espontaneamente pela internet
não confere legitimidade à obrigatoriedade da prestação de contas mensal do
Poder Executivo ao Poder Legislativo, pelas razões expostas neste parecer.
Ou
seja, os municípios deverão encaminhar as respectivas prestações de contas ao
Tribunal de Contas até o dia 28 de
fevereiro do exercício seguinte, a teor do artigo 113 da Constituição do Estado
e artigos 50 e 51 da Lei Complementar Estadual nº 202/2000 e publicá-las[14]
também na internet, para que seja dado cumprimento à LRF e à Lei de Acesso à
Informação.
Por
fim, saliente-se que, em Sessão Plenária de 01/08/1990, o Plenário desta Corte
de Contas, ao apreciar o estudo efetuado pela Diretoria de Controle dos
Municípios no Parecer nº DMU 12/90, nos autos do processo de consulta nº
15637/00, originário da Câmara Municipal de Salete, proferiu a seguinte
decisão:
A
organização das funções de fiscalização a serem exercidas pelo Legislativo
(controle externo) e pelo Executivo (controle interno) devem ser normatizadas
em legislação local obedecidos os princípios e preceitos constitucionais.
A
legislação local que instituir as normas de controle externo poderá determinar
a remessa do balancete mensal à Câmara Municipal, pelo Poder Executivo.
Na
existência de legislação local que determine a remessa de balancete mensal,
compete ao Presidente adotar as medidas cabíveis para o seu cumprimento.
Tal decisum está consubstanciado no
Prejulgado 017 e, em função do apresentado neste opinativo, sugerimos a
revogação do mesmo.
Portanto,
em resposta à consulta em apreço, afirma-se que a prestação de contas dos
Prefeitos deve ser anual e encaminhada ao Tribunal de Contas do Estado, órgão
que auxilia o exercício do controle externo pela Câmara Municipal, até o dia 28
de fevereiro do exercício seguinte, a teor do artigo 113 da Constituição do
Estado e artigos 50 e 51 da Lei Complementar Estadual nº 202/2000.
4. CONCLUSÃO
Diante
do exposto, a Consultoria Geral emite o presente Parecer no sentido de que o Conselheiro
Wilson Rogério Wan-Dall proponha ao Egrégio Tribunal Pleno decidir por:
1. Conhecer do expediente consultivo por preencher os requisitos
de admissibilidade previstos regimentalmente.
2. Responder
a consulta nos seguintes termos:
2.1. A prestação de contas dos Prefeitos deve ser
anual e encaminhada ao Tribunal de Contas do Estado, órgão que auxilia o
exercício do controle externo pela Câmara Municipal, até o dia 28 de fevereiro
do exercício seguinte, a teor do artigo 113 da Constituição do Estado e dos
artigos 50 e 51 da Lei Complementar Estadual nº 202/2000.
3. Revogar, com
fundamento no art. 156 do Regimento Interno, o
prejulgado 17.
4.
Dar ciência desta decisão, do relatório e voto do Relator, bem como deste
parecer ao Sr. Jurandir de Souza Bueno, Presidente da Câmara de Vereadores de
Ponte Serrada.
É o parecer, S.M.J.
Consultoria Geral, em 09 de agosto de
2012.
EVALDO RAMOS MORITZ
AUDITOR FISCAL DE CONTROLE EXTERNO
De acordo:
VALERIA ROCHA LACERDA
GRUENFELD
COORDENADORA
Encaminhem-se os Autos à elevada consideração do Exmo.
Sr. Relator Wilson Rogério Wan-Dall, ouvido preliminarmente o Ministério
Público junto ao Tribunal de Contas.
HAMILTON HOBUS HOEMKE
CONSULTOR GERAL
[1] Direito Administrativo, Atlas, 7ª Ed., 1996, p.488
[2] Ob. Cit., p. 488
[3] Art. 70 – A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder.
[...]
Art. 71 – O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete:
[...]
[4] Art. 75 – As normas estabelecidas nesta seção aplicam-se, no que couber, à organização, composição e fiscalização dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, bem como dos Tribunais e Conselhos de Contas dos Municípios.
Parágrafo único – As Constituições estaduais disporão sobre os Tribunais de Contas respectivos, que serão integrados por sete Conselheiros.
[5] Direito Municipal Positivo, 3ª ed. , Del Rey, 1996, pg. 304/306
[6] Ob cit. pg. 306
[7] O Controle da Gestão Pública. São Paulo.: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 143
[8] Art. 31 – A fiscalização do Município será exercida pelo Poder Legislativo Municipal, mediante controle externo, e pelos sistemas de controle interno do Poder Executivo Municipal, na forma da lei.
§ 1º - O controle externo da Câmara Municipal será exercido com o auxílio dos Tribunais de Contas dos Estados ou do Município ou dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios, onde houver;
§ 2º - O parecer prévio, emitido pelo órgão competente sobre as contas que o Prefeito deve anualmente prestar, só deixará de prevalecer por decisão de dois terços dos membros da Câmara Municipal.
[9] O Decreto 7.185/2010, ao regulamentar o art. 48 da LRF, definiu como meio eletrônico a "Internet, sem exigências de cadastramento de usuários ou utilização de senhas para acesso".
[10] A LC 135/2009 estipulou o prazo de 2
a 4 anos para cumprimento de suas determinações pelos Municípios, conforme o
número de habitantes.
[11] Texto extraído do art. 48-A, inciso
I, da LRF.
[12] Art. 73-B. Ficam estabelecidos os seguintes prazos para o cumprimento das determinações dispostas nos incisos II e III do parágrafo único do art. 48 e do art. 48-A: (Incluído pela Lei Complementar nº 131, de 2009).
I – 1 (um) ano para a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios com mais de 100.000 (cem mil) habitantes; (Incluído pela Lei Complementar nº 131, de 2009).
II – 2 (dois) anos para os Municípios que tenham entre 50.000 (cinquenta mil) e 100.000 (cem mil) habitantes; (Incluído pela Lei Complementar nº 131, de 2009).
III – 4 (quatro) anos para os Municípios que tenham até 50.000 (cinquenta mil) habitantes. (Incluído pela Lei Complementar nº 131, de 2009).
Parágrafo único. Os prazos estabelecidos neste artigo serão contados a partir da data de publicação da lei complementar que introduziu os dispositivos referidos no caput deste artigo. (Incluído pela Lei Complementar nº 131, de 2009).
[13] Os 4 anos são contados da publicação no DOU da Lei Complementar 131/2009, o que ocorreu em 28/05/2009 (a Lei Complementar 131/2009 alterou dispositivos da LRF).
[14] Esta obrigatoriedade abrangerá inclusive os municípios com até 50.000 habitantes a partir de maio de 2013.